Acessibilidade / Reportar erro

O modelo de avaliação da CAPES

DOCUMENTO

O modelo de avaliação da CAPES

Bernardete Gatti; Marli André; Osmar Fávero; Vera Maria F. Candau

Em decorrência de decisão tomada pela Assembléia Geral realizada durante a 21ª Reunião Anual (Caxambu, setembro de 1998), a Diretoria da ANPEd compôs uma Comissão formada por Bernardete Gatti, Osmar Fávero e Vera Maria Ferrão Candau, ex-presidentes da área de educação junto à CAPES, com os objetivos de: a) analisar o modelo utilizado na última avaliação; b) sugerir alternativas, tendo em vista a superação do modelo atual; c) estabelecer um cronograma de discussão que, passando pelos programas, culmine na 22ª Reunião Anual.

Essa Comissão, contando também com a participação de Marli André, Secretária Geral da ANPEd, reuniu-se pela primeira vez, em São Paulo, no dia 30 de novembro de 1998. Trabalhou nos documentos da CAPES e da Comissão da Área, assim como nos textos produzidos por diversos programas de pós-graduação que estavam disponíveis, e elaborou um documento preliminar, com vista a provocar uma discussão inicial com os coordenadores e, em seguida, com os colegiados dos programas.

A Diretoria da ANPEd ficou responsável pela coordenação do processo de discussão do material produzido pela Comissão, de acordo com o seguinte calendário: a) apresentação da versão preliminar do documento aos coordenadores de programa, no dia 16 de dezembro de 1998; b) os coordenadores promovem a discussão desse documento em seus respectivos colegiados e enviam, até o final de março de 1999, suas críticas e sugestões à Diretoria da ANPEd; c) a Comissão analisa e incorpora essas críticas e sugestões numa segunda versão do documento, nos meses de abril e maio; d) o documento retorna aos programas em junho, para análise; e) finalmente, a Comissão receberá as contribuições até o final de julho e preparará uma versão final do mesmo para ser discutida e aprovada durante a 22ª Reunião Anual, em setembro de 1999.

Apresentado aos coordenadores de 47 programas presentes na reunião do Fórum Nacional de Coordenadores de Programa de Pós-Graduação em Educação, realizada em Brasília nos dias 16 e 17 de dezembro de 1998, a primeira versão do documento foi muito bem acolhida, por contemplar, segundo a opinião dos coordenadores, "todos os aspectos importantes relativos à avaliação que vinham sendo debatidos nos programas de pós-graduação".

De acordo com o calendário proposto pela Comissão, as contribuições dos colegiados deveriam ser enviadas à ANPEd até o final de março de 1999. Entretanto, levando em conta que em muitas instituições federais o segundo semestre de 1998 só terminaria em março de 1999 e tendo sido agendada uma nova reunião do Fórum Nacional para os dias 28 e 29 de abril, foi ampliado o prazo para recebimento das sugestões dos colegiados até essa data. Assim, no início da reunião, a Coordenação do Fórum abriu espaço para que os coordenadores dos 41 programas ali presentes pudessem apresentar brevemente o resultado das discussões e os posicionamentos ante o documento. Os representantes de três programas da PUC-SP (Psicologia da Educação, Supervisão e Currículo e Educação Matemática), UFSM, USP, UNESP/Araraquara, UEM, UA, UFSCar, UFMT, UFMS, UFPB, UFC e UFRN fizeram uso da palavra, relatando as principais observações dos respectivos programas. O ponto comum a todas as manifestações foi que a versão final do documento deveria ser menos indagativa e mais propositiva.

Os documentos produzidos pelos programas também confirmaram essa intenção. A Diretoria da ANPEd recebeu documentos escritos dos seguintes programas: UFSM, USP, PUC-SP (Psicologia da Educação e Supervisão e Currículo), PUC-RJ, UFC, UFRGS, UNESP/Araraquara, PUC-RS, UC/Petrópolis e PUC-Campinas, e os encaminhou aos membros da Comissão, que se reuniu pela segunda vez no dia 14 de maio de 1999, em São Paulo. Posteriormente, a UEM também encaminhou seu documento à Comissão. Na análise do material recebido ficou evidente que alguns pontos eram claramente consensuais (por exemplo, a valorização do caráter diagnóstico da avaliação), enquanto outros ainda se mostravam pouco amadurecidos, exigindo maior discussão (por exemplo, a relação mestrado-doutorado).

Decidiu-se manter, nessa segunda versão do documento, uma estrutura similar à do anterior. Sugestões e contribuições dos programas foram, em vários casos, incorporadas integralmente ao presente texto, ao qual foram também feitos acréscimos decididos pela Comissão.

Sobre a natureza da avaliação

Como já foi afirmado, um aspecto que se mostrou consensual nos documentos recebidos dos colegiados dos programas de pós-graduação em educação e nas discussões realizadas com os representantes dos programas foi o destaque dado ao caráter diagnóstico da avaliação. Isso significa que, ao lado do apoio e incentivo aos cursos melhor qualificados, a avaliação deve ser sistematicamente acompanhada de medidas orientadas para a consolidação ou a recuperação dos programas que tivessem obtido qualificações mais baixas. A valorização e a sustentação de um processo de avaliação continuada em uma sociedade democrática depende de seus pares, mas sobretudo do retorno construtivo de seus resultados. Se a avaliação se define como diagnóstica, deve ser evitado o caráter punitivo e reforçado seu aspecto educativo, de detectar pontos críticos e encaminhar propostas para que possam ser trabalhadas.

Uma das estratégias mais adequadas a essa função são as visitas de acompanhamento, geradoras de recomendações, negociadas com a administração superior das respectivas universidades, em especial as pró-reitorias de pós-graduação, das quais devem decorrer projetos institucionais, negociados com a CAPES ou com as respectivas fundações de amparo à pesquisa estaduais. Esses projetos devem prever assessoria continuada e por tempo suficiente, a ser prestada por especialistas credenciados, ou efetivada através de convênio com um programa consolidado, ambas as formas assumidas pelas universidades e mediadas pela CAPES. É conveniente que, no contrato feito pelo programa em reestruturação, conste um compromisso de suspensão do processo seletivo de novos alunos, pelo menos durante o primeiro ano de implementação do projeto ou até que se faça a primeira avaliação.

Em especial, assumindo uma função formativa, a avaliação não deve ser usada para descredenciar programas, mas para detectar os problemas eventualmente existentes e para definir as medidas apropriadas ao seu aperfeiçoamento. Aliás, esse procedimento consta na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (lei nº 9.394/96), quando prevê, após processo regular de avaliação, um prazo para saneamento das deficiências por ele identificadas, ao qual deve se seguir reavaliação que poderá resultar, esta sim, em desativação e em descredenciamento (artigo 46, que trata da autorização e do reconhecimento de cursos).

Registra-se que a CAPES, em 1999, deu um passo bastante importante na concretização da avaliação diagnóstica ao propor a avaliação continuada, um esquema de acompanhamento da situação dos programas de pós-graduação, embora ela não preveja a alteração de conceitos – ponto que deveria ser revisto.

Sobre a flexibilização do modelo

O modelo de avaliação da CAPES é bastante homogeneizador e tende a uma padronização dos programas. Esse é um dos aspectos mais discutidos por vários consultores, e até assumido pela CAPES, conforme se pode constatar nos Infocapes e nos anais de reuniões e seminários por ela promovidos ou apoiados. No entanto, o modelo caminha na direção oposta dessas discussões e colaborações.

Várias alternativas ajudariam a flexibilizar a sistemática de avaliação, enfatizando seu caráter diagnóstico e respeitando as especificidades dos programas. Contemplar a história do programa numa escala temporal de no mínimo cinco anos; incorporando os dados de auto-avaliação do programa; aproveitar melhor os "itens abertos" da ficha de avaliação e agregar novos componentes que podem ser revistos ano a ano, são algumas das possibilidades.

Além disso, é preciso que haja uma revisão dos quesitos e itens que compõem o instrumento de avaliação, construindo uma matriz que possa ser revisada a cada ano. Os itens básicos da avaliação devem ser claramente especificados, mas não fechados, havendo espaço para criação e pontuação de itens novos, na medida em que diferentes cursos possuam especificidades não contempladas nos itens predeterminados (como, por exemplo, a relação graduação, pós-graduação e os convênios inter-institucionais). Esses itens podem ir sendo incorporados aos instrumentos, passando a fazer parte de um rol alternativo de itens para avaliação, predominando mais a lógica do "ou... ou" do que a do "e... e".

Não se considera obrigatório que todas as áreas sejam avaliadas com os mesmos critérios. Parece mais conveniente ter critérios gerais, de âmbito nacional, e flexibilizar sua operacionalização segundo as especificidades e o amadurecimento das diversas áreas. Também parece viável uma descentralização do processo através de comitês regionais, sempre com a participação de profissionais de outra região - de forma a que se permita maior conhecimento das diferentes realidades e da adequação (ou não) dos programas a elas.

A flexibilidade também pode ocorrer no momento de elaboração dos pareceres finais da avaliação: cursos consolidados devem ser analisados num bloco, programas com mestrado e doutorado em outro. Esse olhar aos subconjuntos, sem perder a visão do todo, permitirá relativizar eventuais discrepâncias nas análises individuais dos programas e corrigir possíveis injustiças.

Além disso, cursos consolidados, cursos em reestruturação e cursos novos não podem ter o mesmo tratamento. Os cursos consolidados devem ter seus pontos fortes reforçados e ser estimulados a oferecer apoio e assessoria aos cursos em reestruturação, tendo como contrapartida institucional espaço formal para contabilizar esse apoio no ColetaCAPES. Os cursos em reestruturação devem receber atenção especial e indicações muito claras sobre seus avanços e dificuldades, para que possam tomar as medidas necessárias. Os cursos novos, por sua vez, devem ser analisados dentro da política de expansão da área, supondo-se debatidos com a comunidade os critérios a serem utilizados na recomendação de sua proposta. A transparência de critérios evitará situações de constrangimentos para esses programas e comparações com outros programas, às vezes totalmente improcedentes.

Ainda com relação à flexibilização do modelo e buscando reforçar o caráter diagnóstico da avaliação, poder-se-ia pensar na possibilidade de organizar a sistemática de avaliação em ciclos. Não há justificativa para que todas as áreas do conhecimento e todos os cursos de uma mesma área sejam avaliados no mesmo período. Pode-se planejar ciclos específicos de avaliação, por área. E, dentro de uma área, programas que tenham evidenciado problemas ou que tenham desenvolvido projetos de recuperação poderiam requerer uma avaliação no intervalo de um ciclo, visando alterar seu "conceito" ou "nota". Essa seria uma forma concreta de se evitar manter situações de injustiça – por exemplo, no caso de um programa, quando avaliado, já ter superado uma situação de crise vivida no período anterior e ser obrigado a carregar por vários anos um "conceito" ou "nota" que retrata um passado. Seria também a forma mais fácil de superar a indevida exploração feita pela imprensa – cursos "aprovados" e cursos "reprovados".

Sobre os componentes da avaliação

O modelo atual está baseado fundamentalmente na avaliação externa e centrado nos produtos. No caso dos programas de pós-graduação, é preciso ter presente que se está avaliando um processo educacional, formativo, e não medindo e pesando produtos produzidos por técnicos e cientistas, estes sim objeto de ponderação das agências de fomento científico e tecnológico. No caso dos mestrados e doutorados, trata-se de cursos, de atividades de formação de pessoas que poderão vir a ser, ou não, cientistas e pesquisadores, mas, com certeza, serão ou continuarão a ser profissionais atuantes no ensino superior e em outras instituições sociais ou empresariais.

Como se trata de avaliar um processo educativo, o que se deve agregar ou valorizar no modelo atual para que isso possa vir a ser efetivamente levado em conta? A auto-avaliação do programa ou do curso tem sido um elemento significativamente considerado pelas Comissões de Avaliação. Partindo-se do conceito de avaliação diagnóstica e caminhando na direção de uma avaliação emancipatória, deveria ser mais trabalhada a contextualização da proposta do programa, sua historicidade e a representação de seus autores e atores perante os desafios imediatos postos pela realidade, assim como as perspectivas de sua atuação, em futuro próximo, para modificá-la. Os próprios programas devem ser alertados para essas dimensões, a serem assumidas como fundamentais em sua auto-avaliação.

Na mesma perspectiva, a contribuição social de um programa deve ser elemento importante para a avaliação. É preciso definir os indicadores dessa contribuição, no caso da educação: formação de quadros para o ensino superior; formação de quadros para a gestão de instituições públicas e movimentos sociais; vinculação com a rede pública de ensino fundamental e médio; outras atuações significativas de extensão universitária etc. Também devem ser considerados: participação em conselhos de educação e cultura nacionais, estaduais e municipais; participação em comitês e associações científicas; assessoria a escolas, redes de ensino e movimentos sociais e sindicais. Em particular, se o programa colaborou na organização de outros programas de pós-graduação e se se constituiu em referência para outros centros de pesquisa, nacionais e internacionais. Informações precisas sobre o destino dos egressos também são fundamentais.

Sobre a escala adotada

A escala de notas utilizada pela CAPES é, certamente, outro ponto delicado do modelo. Em primeiro lugar, porque os conceitos ou as notas são o que vem a público, adquirindo uma vida própria, mitificada; resumem-se todos os frutos e todas as dificuldades, superadas ou não, de um curso ou programa a uma letra ou a um número. Os apoios são concedidos ou negados em função desses "abstratos". Qual o efetivo papel dos "laudos" elaborados pelas Comissões de Avaliação? Em geral, são utilizados apenas internamente pelo programa, às vezes pela universidade.

A escala atualmente utilizada pela CAPES merece uma reflexão. A pontuação proposta, de 1 a 7, realmente pode ser considerada uma escala, no sentido em que esta é conceituada teoricamente em avaliação? Os conceitos relativos ao que cada ponto significa estão claramente formulados? A distância entre os pontos atende ao critério de "distância igual" ou "proporcional", necessário à definição de uma escala consistente? Foram definidos critérios explícitos de compatibilização entre as áreas e, dentro dessas, entre as subáreas? Se isso não foi feito, as comparações e a classificação dela decorrente não são problemáticas, escondendo vieses graves e encobrindo subjetividades e preconceitos nunca totalmente evitados?

Se o domínio de validade de uma escala e os critérios de sua correta utilização merecem maior atenção e ainda não parecem ter passado por uma discussão aprofundada, por que não trabalhar com categorias de classificação melhor definidas e esclarecidas em conjunto com representantes de cada área, tentando obter um escalonamento válido para cada uma delas? Esse procedimento evitaria distorções mais sérias e garantiria maior validade da escala dentro das áreas.

A comissão considerou interessante a proposta de ser criada uma escala complexa que procuraria superar alguns dos problemas acima apontados. Essa escala, mesmo mantendo o intervalo de 1 a 7, compreenderia descrições em cada posição, possibilitando uma visão clara de cada ponto. Dessa forma, o resultado de avaliação dos programas seria uma síntese do diagnóstico realizado – mesmo que descrita numericamente – e traçaria um perfil do desempenho em cada quesito.

O desenvolvimento desse tipo de escala, no entanto, exigiria modificações na especificação dos indicadores e ampliação do processo de análise dos mesmos. Considerando que a descrição de um indicador deve sempre contemplar os critérios de abrangência, as fontes onde ele deve ser coletado ou mesmo os procedimentos de coleta a serem empregados, a apresentação do modelo de avaliação com a descrição de sua matriz de indicadores poderia apresentar os seguintes elementos: a) identificação do indicador; b) descrição do que é, o que pretende refletir, os limites e possibilidades da medida; c) associações previstas com os indicadores; d) critérios ou perspectivas em termos do alcance esperado; e) fontes de coleta a serem privilegiadas ou os procedimentos de cálculo; f) pontos de variabilidade possíveis de serem atribuídos.

Relação mestrado e doutorado

Para a área de educação, o modo de conceber o mestrado e o doutorado e a relação entre ambos merece ampla discussão. A intenção da CAPES e do CNPq é privilegiar o doutorado de caráter acadêmico e evoluir para mestrados "temáticos" e de caráter profissionalizante, assim como romper com a relação seqüencial entre eles. Como a própria Comissão de Avaliação sinalizou, essa perspectiva não é a mais adequada para a área, nesse momento. Primeiro, porque a área considera que os mestrados em educação ainda têm uma função importante. Podemos inclusive afirmar serem eles, por natureza, acadêmico-profissionalizantes. Por outro lado, nos últimos anos temos alterado a estrutura dos nossos mestrados; precisamos pensar quais outras mudanças ainda precisam ser introduzidas, talvez urgentemente, para adequar o nível das dissertações e diminuir o tempo de certificação. Segundo, outra questão que ainda requer maior discussão na área é a diferença entre "mestrados temáticos" e cursos de especializações. E, em decorrência disso, o que se espera de uma monografia e de uma dissertação. Por sua vez, a área tem sido muito tímida em aceitar a passagem direta do mestrado para o doutorado; no caso de bons alunos com bons projetos de pesquisa, essa passagem poderia ser assumida como mais freqüente. Dever-se-ia pensar também na definição de requisitos básicos para uma entrada direta em um doutorado.

Relação pós-graduação/graduação

Para a área de educação, a pós-graduação está inserida no sistema de ensino. Não é mais um nível, mas deve articular-se intimamente com a graduação. A rigor, nesse momento, essa articulação é um elemento de especial relevância e admite múltiplas configurações e estratégias. Além do simples registro da carga horária dos professores dedicada a aulas na graduação e na pós, além da orientação de monografias de alunos da graduação e de dissertações e teses na pós, há outras ações que não estão sendo captadas pelo ColetaCAPES. Por exemplo: a monitoria de alunos da pós em aulas da graduação, como parte de sua formação docente ou co-orientando projetos de alunos de graduação; o envolvimento de professores, pós-graduandos e graduandos em projetos de pesquisa e de extensão, assim como em disciplinas específicas que enfatizam teorias e métodos de pesquisa; a incorporação de professores da graduação, ao lado de monitores, bolsistas de apoio técnico ou do PET, em núcleos e centros de pesquisa. É preciso que haja a efetiva ponderação dessas ações na avaliação dos programas.

Condições de infra-estrutura

A Comissão Internacional convocada em meados de 1996 para rever a sistemática de avaliação da CAPES destacou que as condições de infra-estrutura - bibliotecas, equipamentos (como vídeos, filmadoras, computadores, impressoras, redes) e salas de pesquisa para os alunos - devem ter peso na avaliação de um programa. Os relatórios de visita deveriam dar atenção especial às condições ambientais para o desenvolvimento da pesquisa e à infra-estrutura de apoio ao desenvolvimento do programa ou curso. Esse suporte deve ser também levado em conta para avaliar o potencial de um programa estabelecido e a visibilidade de um novo programa.

Poderiam constituir indicadores positivos e relevantes na construção da representatividade do curso ou programa e de sua contribuição social, além da acadêmica, o grau/freqüência de utilização desse suporte por alunos e professores e, em escala mais ampla, a disponibilização do mesmo (biblioteca, especialmente) a alunos e professores de outras unidades e à comunidade regional e nacional.

Indicadores da produção científica

Aceita-se a necessidade de um instrumento que viabilize a análise da produção técnica, acadêmica e científica. Mas esse instrumento tem de ser amplamente discutido pelas áreas. No caso da área de educação, é preciso explicitar, em primeiro lugar, em que consiste a produção de um programa de pós-graduação, inclusive lembrando o papel do livro didático e a cada vez mais freqüente preparação de vídeos instrucionais; da divulgação das publicações por via eletrônica; e o lugar dos pareceres solicitados pelas agências de financiamento e dos relatórios das visitas realizadas por indicação da CAPES; da promoção de eventos científicos; da participação em comitês e associações científicas. É preciso que haja uma melhor especificação e diferenciação entre os diversos tipos de produção de um programa, em especial entre produção científica, acadêmica, técnica e artística.

Em segundo lugar, se a publicação em periódicos internacionais não tem, na área de educação, o mesmo significado que tem para outras áreas, quais veículos vamos priorizar: se livros ou capítulos de livros (valerá o conhecimento e prestígio das editoras?); se ensaios e artigos publicados em periódicos com corpo editorial de ampla composição, com colaboração de articulistas de todo o país e mesmo internacionais, periodicidade regular, circulação nacional, peso significativo na divulgação dos resultados de pesquisa.

Considerando o grande volume de periódicos regionais e locais, alguns com tradição, e considerando que a rigor não dispomos de nenhuma informação sobre sua circulação e utilização, é necessária uma pesquisa para listá-los e classificá-los de acordo com critérios claramente estabelecidos, inclusive quanto à sua circulação e efetiva utilização. É necessário também, nesse esforço, definir o peso das revistas de divulgação, algumas de bom nível e grande circulação, principalmente entre os profissionais que atuam na educação básica.

Quanto aos programas e cursos interdisciplinares - psicologia da educação, história da educação, filosofia da educação, educação ambiental, assim como o ensino de matemática, biologia, química, física e outros -, deve ser levado em conta que é fundamental para professores e pós-graduandos que neles atuam, assim como para a visibilidade da própria área de educação, divulgar sua produção em periódicos de sua área de origem. Na avaliação da produção assim divulgada, parece mais acertado considerar a importância desses periódicos de acordo com os critérios daquelas áreas de origem. Isso se tornará possível na medida em que for efetivamente implantada a decisão da própria CAPES para os cursos interdisciplinares das áreas neles envolvidas.

E a produção discente, para além das teses e dissertações, como pode ser avaliada? Tratando-se de um pesquisador em formação, certamente o nível de exigência não pode ser o mesmo da produção docente. Além das publicações individuais ou em parceria com o orientador em periódicos ou em livros e da apresentação de trabalhos em congressos nacionais e internacionais, devem ser consideradas outras formas de produção discente, como participação em seminários e encontros científicos, envolvimento em projetos integrados de pesquisa, experiência em docência supervisionada. O esforço de um programa em viabilizar essa participação também dever ser ponderado positivamente. Certamente pode-se observar que a área de educação precisa não só incentivar como registrar mais cuidadosamente a produção dos pós-graduandos.

Por outro lado, sabemos que o tempo de maturação de um trabalho acadêmico e, principalmente, científico, na área de filosofia, ciências sociais e humanas é maior que em outras áreas. Conhecemos também a dificuldade de publicar artigos e ensaios em revistas de peso - o que de certa forma explica a emergência das revistas locais. Como ponderar tais fatos? Por que a área não toma em suas mãos, através da ANPEd e com o apoio do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), a tarefa de realizar um levantamento e manter um cadastro atualizado dos periódicos da área e uma análise séria de suas condições de produção, circulação e utilização? Proposta nesse sentido foi feita na Avaliação e Perspectivas na Área de Educação 1982-1991.

Sobre o nível internacional dos programas

Segundo a CAPES, na escala recém-introduzida, os programas com notas 6 e 7 devem ter "nível internacional". Embora essa postulação mereça ser discutida - primeiro, por não poder ser uniforme para todas as áreas; segundo, por estar sendo introduzida exatamente no momento em que foram feitas reduções fundamentais nas bolsas de estudos e de pesquisa e quando se anunciam cortes profundos nas verbas destinadas à ciência e tecnologia -, é possível definir o que significa, para a área, um programa de nível internacional.

Basicamente, devem ser considerados os convênios e programas de intercâmbio com universidades e grupos de pesquisa de universidades norte-americanas, latino-americanas e européias, com permuta sistemática de docentes, encaminhamento de doutorandos para o "sandwich", realização de pós-doutoramento, com produção conjunta etc. Devem também ser valorizadas as visitas de professores estrangeiros e o tipo de atividades por eles realizadas no programa; a participação de docentes e pós-graduandos em eventos e publicações internacionais; e a participação de docentes em comissões e projetos de pesquisa internacionais.

Especificidades da área de educação

Além do ponto indicado acima, da área não ter periódicos internacionais de ponta que venham a servir de referência para a análise da produção nacional, e além do peso relativo, a ser considerado, das revistas locais, regionais e de divulgação, a área apresenta outras especificidades que deveriam ser levadas em conta na avaliação.

Duas delas, freqüentes nas universidades oficiais, têm tido grande peso negativo na avaliação. A primeira é o grande número de aposentadorias de professores e o decorrente vínculo desses aposentados, em suas próprias instituições, como pesquisadores credenciados pelos órgãos superiores ou pelo menos reconhecidos pelos colegiados dos programas; como professores visitantes em outras instituições públicas; ou como pesquisadores, através de bolsas concedidas pelas fundações de amparo à pesquisa estaduais. Por questões específicas do serviço público, principalmente nos últimos anos, essas formas de vinculação são diversas e nem sempre imediatamente resolvidas - ou seja, o professor pode continuar trabalhando ou iniciar o trabalho acadêmico, aguardando durante meses a vinculação ou a bolsa. Essa situação é muito diferente nas instituições privadas, que podem contratar sem delongas, mesmo que por tempo determinado, e incorporar esses docentes aposentados em seus quadros, carregando, inclusive, toda a experiência e a produção gerada na instituição a que ele se vinculava anteriormente. Embora ressalvada nas instruções da CAPES, essa situação das universidades públicas não parece ter sido corretamente considerada na última avaliação, pelo menos na área de educação. É preciso atenção especial, por parte das Comissões de Avaliação, para que isso não volte a ocorrer, principalmente levando em conta a opção da CAPES de avaliar os programas segundo um único núcleo de referência docente. É preciso introduzir mudanças, desde a coleta de dados, para que essa situação seja visível, e introduzir ponderações diferenciadas na análise, visando contemplar os diferentes casos.

Por sua vez, nos últimos anos a área vem recebendo número significativo de recém-doutores, formados em universidades nacionais ou do exterior. Sua incorporação na pós-graduação tem sido acelerada, de um lado, pelo afastamento dos quadros mais antigos, pela aposentadoria; de outro, pela efetiva contribuição que podem vir a dar, principalmente quando não são "jovens doutores", mas docentes com larga experiência. É preciso destacar essas incorporações e considerá-las mais pela experiência anterior que pela recente titulação.

Em segundo lugar, muitos docentes têm assumido, com freqüência, funções na administração superior das respectivas universidades - inclusive como reitores, vice-reitores e pró-reitores. Outros assumem posições de destaque nos conselhos nacional e estaduais de educação, associação científica da área e em comissões das agências de fomento à pesquisa e de coordenação da pós-graduação. Isso tem provocado, muitas vezes, um afastamento relativo das tarefas docentes, pelo menos da carga horária destinada a aulas na graduação e na pós. Mas, por outro lado, é um indicador de impacto social da universidade e da pós-graduação e representa contribuição significativa às instituições, agências e redes de ensino. Esse ponto também deve ser considerado positivamente nas avaliações.

Para outro modelo de avaliação

Ressaltando-se o papel desempenhado pela avaliação da CAPES e aceitando-se que é necessário alterá-lo, tendo em vista a necessidade de um novo modelo de cursos e programas para atender às necessidades atuais, não teriam as últimas mudanças na sistemática caminhado na "contramão", perigando engessar os programas em um modelo único, homogêneo, projetado com base em experiências muito específicas? Se acreditamos válido ter-se um modelo de avaliação e credenciamento, se reconhecemos o papel positivo que a avaliação vinha desempenhando na implantação de mestrados e doutorados no país e se pensamos que esse papel positivo pode continuar a se consolidar (mas não cristalizar!), é preciso refletir com maior profundidade sobre os fundamentos políticos do modelo atualmente vigente, seus objetivos e impacto à luz das variadas e variáveis necessidades nacionais, verificando se seus contornos são os mais adequados para esse momento que o país atravessa, ou se é necessário alterar pressupostos e processos. Essa é uma discussão de fundo que deve prosseguir com a participação de todos. Esse é, sem dúvida, um empreendimento coletivo, de longo prazo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2006
  • Data do Fascículo
    Abr 2003
ANPEd - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação Rua Visconde de Santa Isabel, 20 - Conjunto 206-208 Vila Isabel - 20560-120, Rio de Janeiro RJ - Brasil, Tel.: (21) 2576 1447, (21) 2265 5521, Fax: (21) 3879 5511 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rbe@anped.org.br