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“Indispensáveis em todas as escolas”: uma incursão no mundo dos objetos escolares1 1 Este artigo apresenta resultados de pesquisa financiada com recursos do CNPq (Bolsa de Produtividade em Pesquisa). Uma versão das questões aqui examinadas foi apresentada na III International Conference on School Material Culture: production, use and circulation of school furnishings and teaching aids between Europe and Latin America in XIX and XX centuries, evento realizado na Università di Macerata em setembro de 2017. Agradeço aos colegas italianos, em especial a Juri Meda, e a Gizele de Souza e Vera Gaspar, pelas importantes contribuições para o avanço da investigação.

“Essential in every school”: an incursion in the world of school objects

RESUMO

Este artigo toma como fontes catálogos comerciais da Companhia Melhoramentos de São Paulo, empresa editorial que teve importante atuação na produção e comercialização de uma ampla gama de objetos escolares, buscando examinar a atuação da indústria na configuração da cultura material da escola primária, nas primeiras décadas do século XX. Criada em 1890, a Companhia Melhoramentos deslocou os seus investimentos, a partir de 1915, da impressão e encadernação para a edição de livros, a produção e a venda de materiais escolares os mais diversos, com vistas a dar suporte às práticas escolares, ao mesmo tempo em que buscava suscitar novas necessidades de consumo e ampliar os seus negócios, num contexto marcado pela difusão da escola primária em São Paulo. Com base no exame dos catálogos da editora e na problematização do seu potencial como fontes para o estudo da cultura material escolar, procura-se levantar os artefatos destinados ao trabalho no âmbito das disciplinas que compunham o currículo e às práticas que tinham lugar na escola e, por essa via, capturar indícios da dimensão material da escolarização da infância.

Palavras-chave:
Cultura material; Editora Melhoramentos; Objetos escolares; Catálogos

ABSTRACT

This paper analyses sales catalogues of the Companhia Melhoramentos de São Paulo, a publishing house with relevant operation regarding the production and trading of a wide range of school objects. We aimed at examining the action of this company in the configuration of the material culture related to primary school in the first decades of the 20th century. Companhia Melhoramentos was created in 1890 and from 1915 it relocated its investments, from the initial focus on printing and binding books to the production and sales of various school materials, in order to support school practices, and, at the same time, trying to generate new needs for consumption, thus expanding its business in a context marked by the dissemination of primary school in São Paulo, Brazil. Based on the analysis of the publishing house’s catalogue and on the problematization of the potential of such material as sources for the research of school material culture, we intent at raising the artifacts destined to be used in the many disciplines of the school curriculum and to the practices that happened in school, hence capturing traces of the material dimension of childhood schooling.

Keywords:
Material culture; Editora Melhoramentos; School objects; Catalogues

Vocês precisam conhecer os objetos com os quais trabalham...

Um fragmento de modelo de lição, publicado na edição de setembro de 1925 da Revista Escolar, órgão oficial da Diretoria Geral da Instrução Pública do Estado de São Paulo, pode oferecer elementos para a reflexão acerca da importância que assumiu a dimensão material do ensino no processo de difusão da escolarização. O tema escolhido são os objetos materiais utilizados nos fazeres cotidianos da classe. Indagando sobre os artefatos com os quais as crianças trabalhavam, as coisas das quais se ocupavam nas práticas que tinham lugar na escola primária, o diálogo põe em cena um significativo conjunto de objetos escolares, que vai dos livros e cadernos aos instrumentos de escrita, como o lápis e a pena. Indício das formas como se difundiu entre os professores paulistas um método de ensino centrado na observação minuciosa e organizada dos objetos, da natureza, dos fenômenos ou da sua representação por meio do recurso às imagens (FARIA FILHO, 2000FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Instrução elementar no século XIX. In: LOPES, Eliane Marta T.; FARIA FILHO, Luciano M.; VEIGA, Cynthia G. 500 anos de educação no Brasil. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p. 35-53.), a lição incide sobre a materialidade da cultura da escola. A voz do mestre adverte que não bastava conhecer a utilidade dos objetos; mostrava-se fundamental ir além, interrogando a matéria de que eram feitos, os modos como eram fabricados.

A PENNA

(Sobre a mesa varias especies de pennas)

Professor. - Attenção, todos. Assim como um bom operário precisa conhecer os instrumentos de seu officio, vocês, que estão na escola, precisam tambem conhecer os objetos com os quaes trabalham. Quaes são as coisas que vocês occupam diariamente na escola? Quem sabe?

A. - Os livros.

A. - O lapis.

A. - O caderno.

A. - A caneta.

A. - O tinteiro.

A. - A régua.

A. - O giz.

A. - O compasso.

A. - O mappa.

A. - O esquadro.

A. - A penna.

P. - É bastante. Muito bem... Não basta, porém, que vocês saibam para que serve tudo isso. Precisam saber de que são feitos taes objectos, como são fabricados etc. Hoje iremos conhecer bem a penna, nossa companheira de trabalho (REVISTA ESCOLAR, 1925Revista Escolar. São Paulo, ano 1, n. 9, set. 1925, p. 45-46., p. 45-46).

O modelo de lição, por meio do qual se procurava orientar o professor em seu ofício, permite uma aproximação da incursão proposta neste artigo no mundo dos objetos materiais, com os quais se procurou dotar a escola primária no contexto da implantação e difusão da escola graduada em São Paulo. Incursão essa que, para além de inventariar alguns desses objetos, pretende interrogar acerca dos sentidos de que são portadores. Tomando como fontes catálogos comerciais da Companhia Melhoramentos de São Paulo, empresa editorial que teve um importante papel na produção e comercialização de uma ampla gama de objetos escolares, procura-se examinar a atuação da indústria na configuração da cultura material da escola primária paulista na primeira metade do século XX. Com base no exame dos catálogos da editora e na problematização do seu potencial como fontes para o estudo da cultura material escolar, busca levantar os artefatos destinados ao trabalho no âmbito das disciplinas que compunham o currículo e às práticas que tinham lugar na escola e, por essa via, levantar indícios da dimensão material da escolarização da infância.

A Melhoramentos e o mercado escolar

As iniciativas voltadas para a implantação da escola graduada em São Paulo foram acompanhadas de um interesse crescente pela produção de materiais escolares, dentre os quais livros destinados às crianças e aos seus mestres, cadernos, globos terrestres, mapas, quadros murais, entre outros. Não é demais lembrar que o desenvolvimento da indústria escolar acompanhou “a proclamação da obrigatoriedade escolar em vários países e a disseminação internacional do método intuitivo e o ensino simultâneo e graduado como princípios de uma escola de massas economicamente viável”, como assinala Vidal (2017)VIDAL. Diana G. História da educação como arqueologia: cultura material escolar e escolarização. Revista Linhas, v. 18, n. 36, p. 251-272, jan./abr. 2017. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723818362017251. Acesso em: 2 abr. 2019.
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. Nessa direção, Escolano Benito, referindo-se às tecnologias educativas que emergem entre os séculos XIX e XX, no contexto de consolidação dos sistemas educativos nacionais, sublinha que: “tales materialidades abrían el mundo de la escuela a los procesos de industrialización que se estaban operando en otros órdenes de la vida, y hasta generaban interacciones entre los administradores, los creadores de los medios y las empresas que los producían” (2010, p. 16).

É nesse sentido que os estudos de Lawn (2013)LAWN, Martin. Uma pedagogia para o público: o lugar de objetos, observação, produção mecânica e armários-museus. Revista Linhas, v. 14, n. 26, p. 222-243, jan./jun. 2013. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723814262013222. Acesso em: 2 abr. 2019.
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advogam a importância de considerar a dimensão material nos estudos histórico-educativos, destacando a necessidade de atentar, entre outros aspectos, para a relação entre a institucionalização da escolarização em massa e o recurso a tecnologias de ensino; os vínculos entre as rotinas escolares, os objetos e as ações; a economia e as formas como se produzem os artefatos escolares. O autor propõe, ademais, que “para os historiadores, a questão de como os objetos e rotinas chegam à escola, como existem neste espaço e o que acontece com eles poderia descortinar os aspectos menos visíveis da história da escola” (LAWN, 2013LAWN, Martin. Uma pedagogia para o público: o lugar de objetos, observação, produção mecânica e armários-museus. Revista Linhas, v. 14, n. 26, p. 222-243, jan./jun. 2013. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723814262013222. Acesso em: 2 abr. 2019.
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, p. 224).

Em São Paulo, o período compreendido entre o fim do século XIX e o início do XX se caracterizou por um “clima de valorização da instrução e da escola” (LAJOLO; ZILBERMAN, 1985LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. Literatura infantil brasileira: história e histórias. São Paulo: Ática, 1985., p. 28), acompanhado de uma preocupação com a falta de materiais específicos para o ensino. As iniciavas voltadas para dotar a escola de materiais para o ensino de leitura redundariam, conforme assinalam Lajolo e Zilberman (1985)LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. Literatura infantil brasileira: história e histórias. São Paulo: Ática, 1985., no aumento da produção de obras nacionais destinadas à infância. Nesse empreendimento, “intelectuais, jornalistas e professores arregaçaram as mangas e puseram mãos à obra; começaram a produzir livros infantis que tinham um endereço certo: o corpo discente das escolas igualmente reivindicadas como necessárias à consolidação do projeto de um Brasil moderno” (LAJOLO; ZILBERMAN, 1985LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. Literatura infantil brasileira: história e histórias. São Paulo: Ática, 1985., p. 28).

Embora desde o século XIX já se adaptassem e traduzissem obras para crianças no Brasil, as iniciativas a que se assiste, nas décadas iniciais do século XX, vão caminhar no sentido de uma nacionalização da literatura para a infância. As reflexões de Razzini (2004)RAZZINI, Márcia P. G. A Livraria Francisco Alves e a expansão da escola pública em São Paulo. In: I SEMINÁRIO BRASILEIRO SOBRE O LIVRO E HISTÓRIA EDITORIAL, 2004, Rio de Janeiro. Anais (...). Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 2004. sublinham os vínculos entre a expansão da escola pública primária em São Paulo; a difusão do método intuitivo; a adoção do ensino simultâneo e graduado, com seus impactos sobre a organização das classes2 2 Referindo-se à institucionalização da escola no Brasil, como principal lócus de educação, entre o século XIX e as primeiras décadas do século XX, Batista, Galvão e Klinke (2002, p. 27-28) assinalam que “o método simultâneo e a seriação nele implicada se caracterizariam pela classificação dos alunos em grupos do mesmo grau de adiantamento; pela realização conjunta dos mesmos estudos, por meio dos mesmos livros e deveres; pela preleção a todos em lugar de a um só; pela realização de atividades em todas as classes de uma escola”. A implementação do método simultâneo exigiu, conforme destacam os autores, a produção de materiais destinados a essa forma de organização do ensino, a exemplo dos quadros-negros, cartazes e livros didáticos. ; e, por outro lado, o desenvolvimento do mercado editorial, associado ao aprimoramento das técnicas de impressão e fabricação de papéis, assim como à ampliação de um mercado de trabalho, que envolvia professores, artistas, editores, técnicos da escrita e ilustradores, na produção dos livros didáticos. Como aponta a autora:

Tal ponto de inflexão da escola primária exigia não só prédios e móveis específicos, mas também o uso de novos materiais didático-pedagógicos como livros, cadernos e impressos iconográficos (mapas e cartazes). Além disso, a nova organização do espaço e do tempo imposta pelo modelo dos Grupos Escolares contribuiu para a afirmação do ensino simultâneo e para a uniformização e seriação dos conteúdos, o que passou a exigir uma variedade muito maior de livros e de outros materiais adaptados ao ensino graduado de todas as matérias do currículo (RAZZINI, 2004RAZZINI, Márcia P. G. A Livraria Francisco Alves e a expansão da escola pública em São Paulo. In: I SEMINÁRIO BRASILEIRO SOBRE O LIVRO E HISTÓRIA EDITORIAL, 2004, Rio de Janeiro. Anais (...). Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 2004., p. 5).

A expansão do mercado livreiro, como um dos fenômenos que acompanhou a difusão da escolarização, transformando a escola em “uma poderosa instância de aquisição de materiais escolares produzidos em série” (VIDAL; GASPAR DA SILVA, 2010VIDAL, Diana G.; GASPAR da SILVA, Vera Lucia. Por uma história sensorial da escola e da escolarização. Revista Linhas, v. 11, n. 02, p. 29-45, jul./dez. 2010. Disponível em: http://www.periodicos.udesc.br/index.php/linhas/article/view/2127. Acesso em: 2 abr. 2019.
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, p. 32) e o Estado em um importante comprador, pode ser observada, por exemplo, por meio do exame da trajetória de editoras como a Francisco Alves, a Monteiro Lobato & Cia., a Tipografia Siqueira e a Melhoramentos, conforme assinalam os estudos de Razzini (2004RAZZINI, Márcia P. G. A Livraria Francisco Alves e a expansão da escola pública em São Paulo. In: I SEMINÁRIO BRASILEIRO SOBRE O LIVRO E HISTÓRIA EDITORIAL, 2004, Rio de Janeiro. Anais (...). Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 2004., 2007)RAZZINI, Márcia P. G. A Livraria Francisco Alves e a expansão da escola pública em São Paulo. In: I SEMINÁRIO BRASILEIRO SOBRE O LIVRO E HISTÓRIA EDITORIAL, 2004, Rio de Janeiro. Anais (...). Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 2004.. Só para se ter uma ideia, vale a pena ter em conta os dados registrados pela autora (2004, p. 9) em relação à atuação da Francisco Alves, principal editora de livros escolares nas primeiras décadas do século XX, que começa a investir nesse filão no final do século XIX, registrando um salto em sua produção de 75 títulos (62 deles dirigidos ao ensino), entre 1854 e 1884, para a casa dos 550 títulos (dos quais 307, didáticos), entre 1890 e 1919. Fundada em 1854, no Rio de Janeiro, a Francisco Alves, que tinha na produção de livros escolares o seu nicho mais importante, expandiu sua atuação, abrindo uma filial em São Paulo, já em 1894.

A Companhia Melhoramentos de São Paulo, fundada em 1890, tem suas origens ligadas à urbanização da região de Caieiras, projeto que incluía a inserção dessa região no circuito ferroviário e a exploração de recursos naturais, entre eles a cal. A produção do papel constituiu-se em uma das frentes desse empreendimento, capitaneado inicialmente por Antonio Proost Rodovalho, que mais tarde se associaria a Bühnaeds, resultando da sociedade o desdobramento do negócio em oficina de encadernação e confecção de cadernos (SOARES, 2010SOARES, Gabriela P. Os irmãos Weiszflog em busca dos mercados escolares: identidades das Edições Melhoramentos dos primórdios à década de 1960. In: BRAGANCA, Aníbal; ABREU, Márcia (Orgs.). Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. São Paulo: Editora Unesp, 2010, p. 157-169.). O empreendimento tomaria um novo impulso, a partir do final da década de 1890, com a associação de Bühnaeds aos irmãos Otto, Alfried e Walther Weiszflog, imigrados da Alemanha, o último deles com formação em artes gráficas. Tal sociedade marcaria uma nova fase na vida da empresa, caracterizada pelo aumento dos investimentos e pela abertura de uma tipografia, que se utilizava do papel produzido pela Melhoramentos (SOARES, 2010SOARES, Gabriela P. Os irmãos Weiszflog em busca dos mercados escolares: identidades das Edições Melhoramentos dos primórdios à década de 1960. In: BRAGANCA, Aníbal; ABREU, Márcia (Orgs.). Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. São Paulo: Editora Unesp, 2010, p. 157-169.). Os rumos da empresa, que aos poucos vai passando ao comando dos irmãos Weiszflog3 3 Segundo Soares (2010), a crise no abastecimento de papel, resultante da Primeira Guerra, redundou na incorporação da Weiszflog Irmãos pela Companhia Melhoramentos, em 1920. Além de minimizar os efeitos da crise sobre a Weiszflog, a medida visava injetar capital na Companhia Melhoramentos, para recuperar seu maquinário e retomar a qualidade da sua produção. , se definirão por uma presença marcante na produção de livros e materiais escolares, com a incorporação de novas tecnologias e a criação de modernos parques industriais, seguidos de aumento do seu prestígio, conforme destaca Soares (2010)SOARES, Gabriela P. Os irmãos Weiszflog em busca dos mercados escolares: identidades das Edições Melhoramentos dos primórdios à década de 1960. In: BRAGANCA, Aníbal; ABREU, Márcia (Orgs.). Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. São Paulo: Editora Unesp, 2010, p. 157-169.:

Em ambos os empreendimentos - a Companhia Melhoramentos e a Weiszflog Irmãos -, os anos que abriam o novo século foram marcados pelo afã de incorporar novas soluções tecnológicas e investir na criação de parques industriais modernizados. A fabricação de papel e a impressão de mapas, álbuns, blocos, baralhos e cadernos de caligrafia passavam a contar com um maquinário de alto padrão, o que ajudava a agregar prestígio e credibilidade às empresas. Preparando as vendas de 1912, os prelos da Weiszflog Irmãos estrearam a produção de livros escolares, que haviam sido encomendados por Francisco Alves. O negócio suscitou o contato dos editores com professores da Escola Normal Caetano de Campos, base do sistema educacional público que vinha sendo estabelecido no estado de São Paulo. Pouco tempo depois, a Weiszflog Irmãos enveredava pelo caminho da edição dos seus próprios livros, voltados ao mundo escolar e infantil (p. 158).

O ano de 1915 dá início a um importante capítulo na vida desse empreendimento, com o deslocamento dos investimentos em impressão e encadernação para iniciativas relacionadas à edição. O crescimento nessa área, que alçaria nomes já consagrados no campo educacional ao posto de editores, como Arnaldo de Oliveira Barreto e Lourenço Filho (a partir de 1926), responderia por uma presença expressiva da Melhoramentos na produção de livros para o público infantil, entre eles os livros didáticos. Soares destaca que o mercado escolar foi o carro-chefe da editora em seus primeiros tempos. Registra, ainda, que, “entre 1938 e 1943, a Melhoramentos já figurava como uma das seis maiores editoras brasileiras e como aquela com o maior índice individual de publicação de livros voltados ao público infantil” (SOARES, 2010SOARES, Gabriela P. Os irmãos Weiszflog em busca dos mercados escolares: identidades das Edições Melhoramentos dos primórdios à década de 1960. In: BRAGANCA, Aníbal; ABREU, Márcia (Orgs.). Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. São Paulo: Editora Unesp, 2010, p. 157-169., p. 159).

As análises de Razzini (2007)RAZZINI, Márcia P. G. A produção de livros escolares da Editora Melhoramentos na Primeira República. In: XXX CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, INTERCOM, Santos, 2007., com base em dados correspondentes ao período compreendido entre 1900 e 1959, evidenciam o investimento da editora na produção de uma ampla gama de materiais escolares, que incluía “não só livros, mas também álbuns, cartazes, quadros, cadernos, mapas, globos, jogos, brinquedos e aparelhos educativos” (p. 6). A par do exame dos títulos publicados pela editora, a autora conclui que a grande expansão editorial da Melhoramentos ocorreu após o ano de 1931, tornando-se bastante significativa nas décadas de 1940 e 1950. Em termos quantitativos, dos 852 livros que vieram a lume entre 1907 e 1940, 282 eram obras didáticas, 173 de literatura infanto-juvenil (fortemente articulada com as práticas de ensino de leitura), aos quais se somavam 116 títulos publicados na seção “Brinquedos”, totalizando 67% da produção voltada para a faixa etária escolar (RAZZINI, 2007RAZZINI, Márcia P. G. A produção de livros escolares da Editora Melhoramentos na Primeira República. In: XXX CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, INTERCOM, Santos, 2007., p. 7).

Os catálogos comerciais e a cultura material escolar

O estudo da cultura material escolar, dimensão significativa da cultura escolar, vem merecendo, nos últimos 20 anos, uma atenção cada vez mais ampla da comunidade ibero-americana de historiadores da educação, como adverte Vidal (2017)VIDAL. Diana G. História da educação como arqueologia: cultura material escolar e escolarização. Revista Linhas, v. 18, n. 36, p. 251-272, jan./abr. 2017. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723818362017251. Acesso em: 2 abr. 2019.
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. As indagações levantadas pelos pesquisadores instigam a interrogar o passado educacional por meio do exame dos artefatos e dos modos de fabricação inventados por diferentes sujeitos e grupos, de modo a responder às demandas da escolarização. Numa outra dimensão, convocam a refletir sobre os vínculos entre os artefatos, as práticas escolares e a memória educativa. O percurso que se propõe neste artigo parte das contribuições de alguns desses estudos, voltando-se para o exame não da própria materialidade, dos artefatos em si próprios, mas do discurso sobre esses artefatos, posto em circulação em um tipo de impresso produzido pela indústria, com fins de propaganda, o qual se dirigia aos professores, às autoridades de ensino e, em última instância, ao Estado. O questionário proposto guarda aproximação com as reflexões de Meda (2015)MEDA, Juri. A história material da escola como fator de desenvolvimento da pesquisa histórico-educativa na Itália. Revista Linhas, v. 16, n. 30, p. 7-28, 2015. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723816302015007. Acesso em: 2 abr. 2019.
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acerca da cultura material da escola, pensada em termos de uma “história da indústria escolar” e da constituição de um mercado escolar, no âmbito do qual os artefatos podem ser pensados como produto material e como objetos de consumo.

Referindo-se ao potencial dos catálogos das editoras como fontes de investigação sobre os livros escolares, Razzini (2007)RAZZINI, Márcia P. G. A produção de livros escolares da Editora Melhoramentos na Primeira República. In: XXX CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, INTERCOM, Santos, 2007. chama atenção para a sua configuração como instrumentos de marketing:

O uso dos catálogos como fonte é importante porque, sendo o catálogo de venda de uma editora um instrumento de marketing, que visa convencer possíveis compradores a adquirir os produtos ali oferecidos, ele se converte [...] em documento privilegiado para a pesquisa, porque mostra as preocupações dos fabricantes com seus potenciais consumidores, seja na organização das várias seções, seja nos comentários mais ou menos extensos após cada título, muitos com abonações, alguns com ilustrações da obra (p. 6-7).

Os catálogos comerciais da Melhoramentos podem, nesse sentido, nos aproximar de aspectos ligados à produção e comercialização de todo um conjunto de artefatos fabricados em massa para dar suporte às práticas escolares, informando sobre suas características físicas, os materiais de que eram feitos, os preços, as recomendações de usos e, em outra dimensão, as representações da indústria sobre a escola e o lugar desses objetos nas práticas escolares. O exame dos catálogos pode, ademais, dar conta de algumas das dimensões envolvidas na cadeia de produção e circulação dos artefatos escolares, recobertas pelas categorias “indústria escolar”, “escola como mercado” e “história material da escola” (MEDA, 2015MEDA, Juri. A história material da escola como fator de desenvolvimento da pesquisa histórico-educativa na Itália. Revista Linhas, v. 16, n. 30, p. 7-28, 2015. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723816302015007. Acesso em: 2 abr. 2019.
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; VIDAL; GASPAR DA SILVA, 2010VIDAL, Diana G.; GASPAR da SILVA, Vera Lucia. Por uma história sensorial da escola e da escolarização. Revista Linhas, v. 11, n. 02, p. 29-45, jul./dez. 2010. Disponível em: http://www.periodicos.udesc.br/index.php/linhas/article/view/2127. Acesso em: 2 abr. 2019.
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)4 4 A par do estudo histórico da escola italiana, Meda (2015) propõe a utilização do termo “história material da escola” para se referir à “história dos meios e métodos empregados na produção e no consumo de objetos didáticos e instrumentos educativos” (p. 10). . É possível pensar tais catálogos como uma faceta visível desse empreendimento comercial que toma a escola como mercado consumidor (VIDAL, 2009VIDAL, Diana G. A invenção da modernidade educativa: circulação internacional de modelos pedagógicos, sujeitos e objetos no Oitocentos. In: CURY, Cláudia E.; MARIANO, Serioja C. (Org.). Múltiplas visões: cultura histórica no Oitocentos. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2009, p. 39-58.; VIDAL; GASPAR DA SILVA, 2010VIDAL, Diana G.; GASPAR da SILVA, Vera Lucia. Por uma história sensorial da escola e da escolarização. Revista Linhas, v. 11, n. 02, p. 29-45, jul./dez. 2010. Disponível em: http://www.periodicos.udesc.br/index.php/linhas/article/view/2127. Acesso em: 2 abr. 2019.
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), constituindo-se, por essa via, em uma espécie de vitrine dos objetos oferecidos aos professores e às autoridades de ensino, para responder às necessidades de organização das suas práticas cotidianas ou para suscitar novas demandas de consumo. O exame desses impressos convoca a uma reflexão sobre a “dimensão econômica dos processos de escolarização de massa”, a que alude Meda ao postular o estudo da cultura material da escola, no âmbito de uma “história da indústria escolar”, pensada como “epílogo de um processo de produção originado precisamente pela crescente demanda educativa”. Perspectiva de análise que toma os objetos escolares como produtos industriais, objetos de consumo e, ao mesmo tempo, como expressão da expansão do mercado escolar (MEDA, 2015MEDA, Juri. A história material da escola como fator de desenvolvimento da pesquisa histórico-educativa na Itália. Revista Linhas, v. 16, n. 30, p. 7-28, 2015. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723816302015007. Acesso em: 2 abr. 2019.
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, p. 9-10).

Os catálogos comerciais inscrevem-se, assim, no âmbito da produção industrial e das estratégias de comercialização, aproximando-nos do discurso da propaganda dos objetos, no qual é possível apreender também indicações de formas de uso. Nesse sentido é que se pode dizer que os catálogos comerciais permitem o acesso à imbricação entre o processo de expansão da escolarização e a constituição de uma indústria escolar inserida em uma lógica econômica e, ao mesmo tempo, pedagógica, contribuindo para recompor, em alguma medida, os processos de fabricação e comercialização dos objetos escolares.

Examinando a chegada às salas de aula inglesas, no final do período vitoriano, de um amplo leque de objetos escolares ou de suas representações, no contexto da difusão da escola elementar, da introdução de novas disciplinas no currículo - dentre elas as ciências naturais - e do surgimento das lições de coisas, em seus vínculos com os imperativos de observação a que convocavam, Lawn (2013)LAWN, Martin. Uma pedagogia para o público: o lugar de objetos, observação, produção mecânica e armários-museus. Revista Linhas, v. 14, n. 26, p. 222-243, jan./jun. 2013. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723814262013222. Acesso em: 2 abr. 2019.
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destaca as relações que se estabeleceram entre a escola e as empresas comerciais. As reflexões do autor podem ser inspiradoras para o exame dos catálogos da Editora Melhoramentos, já que, como assinala Lawn (2013)LAWN, Martin. Uma pedagogia para o público: o lugar de objetos, observação, produção mecânica e armários-museus. Revista Linhas, v. 14, n. 26, p. 222-243, jan./jun. 2013. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723814262013222. Acesso em: 2 abr. 2019.
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, “as empresas comerciais viram a escolarização como um lugar de publicidade e de obtenção de novos clientes” (p. 225), o que implica em pensar não apenas o fornecimento de materiais necessários ao trabalho nas novas disciplinas, mas também o papel da concorrência econômica na definição do currículo.

As reflexões de Meda (2015)MEDA, Juri. A história material da escola como fator de desenvolvimento da pesquisa histórico-educativa na Itália. Revista Linhas, v. 16, n. 30, p. 7-28, 2015. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723816302015007. Acesso em: 2 abr. 2019.
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sobre a indústria escolar e, de modo mais específico, sobre a indústria editorial, em seus processos de produção e em suas dinâmicas mercantis, que tomam a escola como mercado de consumo de artefatos - entre os quais os livros de distintas disciplinas para os diferentes níveis de ensino -, mostram-se extremamente instigantes. Como fontes para esse estudo, o pesquisador italiano se refere a todo um conjunto de documentos ligados à dimensão propriamente industrial da produção editorial, que inclui os catálogos, mas não se limita a eles, contemplando “os estatutos e os balanços corporativos, os catálogos comerciais, os anuários industriais ou as listas das empresas inscritas na Câmara de Comércio” (MEDA, 2015MEDA, Juri. A história material da escola como fator de desenvolvimento da pesquisa histórico-educativa na Itália. Revista Linhas, v. 16, n. 30, p. 7-28, 2015. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723816302015007. Acesso em: 2 abr. 2019.
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, p. 12).

O exercício aqui experimentado, com base no exame dos catálogos comerciais não tem a ambição de abarcar as várias dimensões envolvidas no estudo da “indústria editorial escolar”. Recorta uma dimensão mais específica, procurando examinar alguns elementos que permitam ampliar a compreensão acerca da atuação da Melhoramentos na produção e comercialização de materiais escolares em grande escala. Experimenta, nesse sentido, aproximar-se da dimensão comercial dessa empresa, considerando, como sugere Meda (2015)MEDA, Juri. A história material da escola como fator de desenvolvimento da pesquisa histórico-educativa na Itália. Revista Linhas, v. 16, n. 30, p. 7-28, 2015. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723816302015007. Acesso em: 2 abr. 2019.
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, a par do estudo da dimensão material da escolarização das massas, que as empresas de produção de materiais escolares e didáticos “veem na expansão do mercado escolar uma oportunidade extraordinária para o lucro e [...] tratam não somente de satisfazer as necessidades tecnológicas das escolas, mas também de criar sempre novas necessidades” (p. 19).

Artefatos escolares, objetos de consumo

A série de catálogos comerciais localizada no arquivo da Editora Melhoramentos reúne um total de 22 volumes, recobrindo o período de 1924 a 19415 5 Agradeço imensamente aos diretores da Melhoramentos pela autorização para a pesquisa no arquivo histórico da editora. Sou especialmente grata ao funcionário Gilmar Augusto da Silva, que ofereceu todas as condições para o desenvolvimento do levantamento. . Entre esses, estão os catálogos que reúnem as obras e materiais escolares produzidos pela editora; os que anunciam as obras em consignação e as estrangeiras; e os catálogos gerais, em que figuram as obras da editora, as estrangeiras e as consignadas. Várias possibilidades de investigação se desenham a par do exame dessa série de catálogos, que pode oferecer indícios, por exemplo, do lugar das editoras na constituição de um mercado escolar.

Lidos em conjunto com os catálogos de obras da editora, os catálogos de obras estrangeiras e consignadas podem dar uma dimensão das estratégias comerciais desenvolvidas com vistas a pôr em circulação um conjunto de títulos de distintas procedências, que procuravam encontrar no Estado o seu principal consumidor, ampliando, assim, os lucros da editora. Por meio do exame dos dados oferecidos por esses catálogos de títulos estrangeiros, talvez seja possível compor um mapa da circulação de títulos publicados em outros países, em paralelo com os investimentos voltados para a nacionalização da literatura escolar. Nesta primeira aproximação com a fonte, no entanto, a análise incidirá sobre a produção da própria editora, por meio do exame dos catálogos referentes aos anos de 1924, 1929 e 1941, de modo a explorar os objetos com os quais a nascente indústria escolar intentou dotar a escola primária e o discurso por meio do qual procurou construir uma representação da utilidade e necessidade desses objetos no cotidiano das práticas escolares6 6 O Catalogo de obras de nossa edição, publicado em agosto de 1924, tem 54 páginas; o Catalogo de livros e material didactico de nossa edição (junho de 1929), 90 páginas; o Catalogo geral: livros, material didactico, brinquedos educativos; obras em deposito e em consignação, publicado em 1940, 202 páginas. . Os dois primeiros catálogos permitem ter acesso aos livros e materiais didáticos produzidos pela editora, já o catálogo geral de 1941, além dos livros e materiais didáticos, anuncia brinquedos e jogos educativos, dando divulgação também às obras em depósito e em consignação.

O exame da série de catálogos permite observar um incremento da produção de livros, materiais didáticos e outros objetos, como os brinquedos e jogos, postos à disposição dos professores e autoridades de ensino7 7 Um primeiro esforço de contagem pode dar uma dimensão do incremento da produção da editora: a lista de obras, que inclui os livros e os materiais didáticos, apresentada no catálogo de 1924, soma 185 itens; em 1929, esse número chega a 315, descontados nos dois casos os vários volumes das obras organizadas em séries. . Ademais, é possível notar o investimento nas formas de apresentação desses objetos, por meio da inclusão de recursos como as ilustrações e fotografias, além de comentários, que parecem se articular aos propósitos de convencimento dos consumidores visados. O exame do Catalogo de obras de nossa edição, publicado em agosto de 1924, pode oferecer uma ideia dos investimentos da Melhoramentos na produção de materiais escolares. Dirigindo-se aos professores e autoridades de ensino, o discurso veiculado na contracapa do catálogo procura dar divulgação aos livros e materiais, enfatizando aspectos como a sua qualidade editorial, a sua aprovação pelos órgãos competentes e a sua adoção em escolas não apenas do estado de São Paulo, mas de outros estados brasileiros:

Aos Snrs. Professores

Os Srs. Professores que tiverem necessidade de

Livros Escolares

devem dirigir-se á nossa casa ou procurar as nossas edições.

Os livros que publicamos são solidamente encadernados, nitidamente impressos, e ornados de artisticas ilustrações, muitas delas constituindo encantadoras trichromias.

Todos se acham aprovados e officialmente adoptados na maioria dos Estados do Brasil, e são usados em milhares de escolas publicas e collegios particulares.

Temos, também, á disposição dos Srs. Directores de estabelecimentos de ensino e do professorado, em geral, um escolhido sortimento de

Material Didactico

a saber:

Mappas e globos geographicos, quadros para o ensino de linguagem e arithmetica, mappas Parker, quadros do systema metrico decimal, contadores, solidos geometricos, quadros de historia patria, iniciação geographica, cadernos em geral, etc. (CATALOGO, 1924Catalogo de obras de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1924., contracapa).

O anúncio traz, ainda, informações sobre a forma de aquisição dos livros ou materiais, a qual poderia ser feita em livrarias ou diretamente na empresa, com matriz em São Paulo e duas filiais, no Rio de Janeiro e em Recife. Uma advertência publicada nas páginas iniciais dá conta da possibilidade de envio das compras pelos correios, para qualquer parte do País. O exame do anúncio de mesma natureza, publicado na contracapa do catálogo de 1929, sugere possíveis mudanças nas técnicas de produção, expressas em uma alteração na forma de apresentação dos livros: em lugar de “solidamente encadernados, nitidamente impressos, e ornados de artisticas ilustrações” (CATALOGO, 1924Catalogo de obras de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1924., contracapa), o novo texto parece dar destaque à técnica da costura e ao acabamento, que resultava em livros “solidamente costurados, cartonados ou encadernados, nitidamente impressos, e ornados de artísticas ilustrações” (CATALOGO, 1929Catalogo de livros e material didactico de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1929., contracapa, grifos nossos).

Três índices antecedem a apresentação das obras, no catálogo de 1924: um índice das matérias, uma das obras, um terceiro, de autores. O índice de matérias constitui-se em uma listagem, organizada em ordem alfabética, das áreas em que se inseriam os livros e materiais produzidos pela editora, numa mescla que reúne as disciplinas que compunham o currículo das escolas primárias, dos ginásios e das Escolas Normais. Mais complexo, o índice geral das obras publicadas pela editora referente ao ano de 1929 separa os livros dos materiais didáticos, organizando os primeiros em cinco grandes categorias: obras literárias, obras de História, livros para as escolas primárias, livros para o curso complementar e secundário (Escolas Normais, complementares, liceus e ginásios) e obras diversas, entre as quais figuram dicionários, livros de direito, educação física, engenharia, medicina, pedagogia, religião, etc. Na seção de material didático, são apresentados os cadernos escolares, quadros murais, mapas e globos, materiais para trabalhos manuais e para fins diversos.

O discurso da qualidade e da fabricação primorosa dos artefatos oferecidos ao público consumidor e do seu alinhamento com as diretrizes oficiais - que justificava a sua aprovação e adoção em vários estados - presente na contracapa desses dois catálogos, se replica na apresentação de cada um dos livros e materiais escolares. Resenhas das obras, acompanhadas das credenciais dos autores e de comentários publicados na imprensa articulam-se a essas informações, afirmando a qualidade dos produtos oferecidos aos consumidores. Alguns exemplos, extraídos da seção de literatura do catálogo de 1924, permitem uma aproximação do discurso por meio do qual os produtos eram apresentados:

Bibliotheca Infantil, por Arnaldo de Oliveira Barreto. Cada volume: 1$500. [...] Destinadas á infancia, poucas obras têm preenchido os inúmeros requisitos para a perfeição, como esta serie de contos populares, organizada pelo prof. Arnaldo Barreto. [...]

Escriptos em elegante e simplíssimo vernaculo, os contos são farta e primorosamente illustrados, em trichromia. (CATALOGO, 1924Catalogo de obras de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1924., p. 1-2, grifos no original).

Galeria de Grandes Homens, por Alvaro Guerra. Cada volume: 1$500.

[...] Esta série de pequenos livros é organizada a capricho e de feição a tornar suave, aos moços, o estudo da literatura brasileira. (CATALOGO, 1924Catalogo de obras de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1924., p. 4, grifos no original).

Homens e Cousas do Imperio, pelo Visconde de Taunay. 5$000.

É este o volume que continua as “Reminiscencias”. Prefacio interessantíssimo do Dr. A. d’E. Taunay, estudando o autor da “Innocencia” e da “Retirada da Laguna”.

O autor é um dos mais altos representantes da nossa literatura; um narrador exímio, que conseguiu escrever elegante, simples e interessante como nenhum outro dos nossos homens de letras. (CATALOGO, 1924Catalogo de obras de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1924., p. 5, grifos no original)

Lusiadas (Os) (Edição comentada), por Othoniel Motta. 8$000.

[...]

O ESTADO DE S. PAULO: É um trabalho notavel por diversas razões [...]

[...] O volume está muito bem impresso e ornado de interessantes e lindas ilustrações [...] Entre ellas destacam-se algumas em trichromia, tão bem acabadas como as melhores do extrangeiro...

Esta obra tem uma capa com o retrato de Camões e contem uma trichromia linda, além de 19 gravuras e um mapa da India. (CATALOGO, 1924Catalogo de obras de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1924., p. 5, grifos no original).

Prosa Leve (contos), por Gustavo Penna. 5$000.

Deste admiravel livro do velho escriptor mineiro, diz a critica:

NOVIDADES: [...] Na parte gráfica, o livro é tambem primoroso, e tem uma linda capa artistica (CATALOGO, 1924Catalogo de obras de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1924., p. 7, grifos no original).

Elegância, simplicidade e clareza da linguagem aliavam-se à autoridade dos autores na matéria e às qualidades da impressão, ilustração e encadernação, resultando em “admiráveis”, “primorosos” e “bem acabados” livros, alguns deles à altura das melhores obras estrangeiras, segundo destacava o discurso da propaganda. O exame do catálogo publicado em 1929 dá conta da significativa ampliação do número de obras e da complexidade do seu arranjo, em articulação com o currículo escolar, o que responde pela migração de alguns dos títulos dessa heterogênea seção de “literatura” (1924) para subseções como “leitura escolhida para meninos e moços” da seção de obras literárias, com ou sem alterações no texto de apresentação. Assim, no caso da Bibliotheca Infantil de Arnaldo Barreto, apenas são acrescidos os novos títulos publicados (em 1924 eram 28; em 1929, chegavam a 36). Já na apresentação da Galeria dos grandes homens, por exemplo, observa-se a supressão da informação de que a obra fora “organizada a capricho”, procedimento semelhante ao que se observa na eliminação dos comentários que circularam no jornal O Estado de São Paulo sobre Os Lusíadas, obra em relação à qual restou apenas um pequeno trecho da resenha do Correio Paulistano, que afirmava tratar-se de uma das edições da obra mais interessantes e úteis aos estudantes. Tais recursos talvez possam ser lidos como indicativos de que a qualidade editorial dos livros da Melhoramentos e a autoridade de alguns autores já não careciam de reiteração, operando-se a disputa pelo mercado editorial em outros campos.

Para além dos livros, a editora oferecia aos seus clientes quadros murais, como a coleção de 20 quadros de Renato Fleury, Nossa lavoura, e os 21 Quadros de Historia Patria, anunciados como “a maior, a mais completa e a mais nitidamente impressa coleção de quadros historicos nacionaes” - coleção que, segundo se anunciava, “impressiona o discipulo, favorece o professor e facilita o ensino” (1924, p. 27). Publicava, ainda, os quadros para o ensino de Linguagem e Arithmetica de Barreto, Oliveira e Dordal; os mapas de Parker, coleção de 24 folhas para o ensino da aritmética; os mapas geográficos, impressos sobre tela, com ou sem verniz, comercializados com ou sem moldura. A produção crescente e a importância que ganham na grade de produtos da editora os quadros murais e os artigos de papelaria podem ser observadas na ampliação do item “material didático”, dividido, na edição de 1929, em: cadernos escolares, quadros murais, mapas e globos, material para diversos fins, trabalhos manuais.

Em número mais expressivo que em 1924, os quadros murais passam a ser divulgados em anúncios acompanhados de ilustrações, o que pode ser observado, por exemplo, na apresentação dos Quadros para o ensino de Linguagem e Arithmetica, assinados por três professores paulistas, Arnaldo de Oliveira Barreto, Mariano de Oliveira e Ramon Roca Dordal, anunciados no catálogo anterior, nos seguintes termos:

Linguagem e Arithmetica (Quadros para o ensino de), por A. Barreto, M. de Oliveira e Roca Dordal. 40$000.

A collaboração destes tres nomes illustres é bastante para recomendar estes quadros de uma utilidade incontestável. Quem deseja ensinar de accordo com todos os requisitos da intuição, não poderá prescindir do auxilio inestimável desses quadros.

Illustrações lindissimas e texto explicativo de como se deve applical-as no ensino, fazem o conteudo delles.

O ensino da Arithmetica e, principalmente, da linguagem, preliminarmente, já não se resente da falta desses auxiliares valiosíssimos, aprovados pela Directoria da Instrucção Publica de S. Paulo, Santa Catharina e Minas Gerais (CATALOGO, 1929Catalogo de livros e material didactico de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1929., p. 70-71, grifos no original).

Excluído o último parágrafo, que faz menção à aprovação dos quadros em distintos estados brasileiros, o texto do anúncio figura, no catálogo de 1929, precedido da imagem do quadro XXII da coleção. O procedimento suscita algumas indagações: tratava-se de uma mera supressão, com o intento de dar mais centralidade à imagem? Os quadros já não faziam parte da lista de materiais aprovados nesses estados? Ou, ao contrário, já se haviam tornado um item obrigatório no enxoval das escolas, dispensando a informação?

FIGURA1
QUADRO MURAL

Outras coleções de quadros murais também figuram nesse catálogo acompanhadas de imagens, algumas delas ausentes no catálogo anterior, como é o caso dos Quadros da Historia Patria e das coleções A Fauna Brasileira, Quadros da Historia do Estado de Minas Geraes e Quadros para o Ensino Intuitivo, este último um claro indício das estratégias de que lançava mão a empresa, no sentido de responder às demandas da escolarização, neste caso, aquelas ligadas ao método intuitivo. Cabe notar que, na organização dessas coleções, não era incomum a participação de reconhecidos professores públicos, como Arnaldo Barreto, Roca Dordal, Renato Seneca Fleury e outros, o que evidencia os vínculos entre o mercado e o Estado, não apenas na produção dos livros e materiais escolares, como provavelmente na sua aprovação e adoção nas escolas públicas:

Fauna brasileira (A). Interessante collecção de 20 quadros formato 89 x 115 ctm, em tela, envernizados e com moldura, de que estão já prontos e á venda os 3 primeiros, sendo 4 sobre aves, 1 sobre edentados, tapirus, etc., e 1 sobre cobras - preço de cada quadro - M - 16$800.

Organisados pelo naturalista Conrado Günther, da Universidade de Friburgo, em Br., e que esteve longo tempo no Brasil, estes quadros vêm preencher uma lacuna muito sensivel no ensino da historia natural. Admiravelmente desenhados e impressos a côres, impressionam de modo indelével o espirito dos alumnos. (CATALOGO, 1929, p. 74, grifos no original).

Quadros para o Ensino Intuitivo, collecção de 20 quadros lithographados, formato 58 x 89 ctm, trabalho artistico, sobre todos os productos da lavoura do paiz, taes como o café, a canna, o algodão, o fumo, o cacau, a borracha, etc., com explicações muito claras e intuitivas e obedecendo a um methodo especial e attrahente. Organisada pelo prof. Renato Seneca Fleury, e approvada pela Directoria Geral da Instrucção Publica, para uso das escolas paulistas. [...] 50$000 (CATALOGO, 1929Catalogo de livros e material didactico de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1929., p. 72, grifos no original).

Ainda no que diz respeito aos artefatos destinados ao ensino das disciplinas que compunham o currículo da escola elementar, o catálogo de 1924 anunciava o Contador Brasil, aparelho para o ensino de aritmética, que se destacava por suas vantagens técnicas, higiênicas e pedagógicas, simplificando a explicação acerca da contagem; o jogo de oito sólidos geométricos, “util, tanto para o ensino elementar - Jardins de Infancia e curso primario, como nos cursos secundario e gymnasial”; o quadro do sistema métrico decimal (115 x 74 cm), “em papel com tira de panno e moldura” ou “forrado com papel resistente e com moldura”. Para o ensino de geografia, além dos mapas, um objeto emblemático era apresentado como uma espécie de estrela da editora, na contracapa dos catálogos: o “novo globo geográfico”, caracterizado como “artigo muito solido”, com suporte de madeira e meridiano em metal. Dois aspectos se somavam na afirmação das vantagens do artefato, do ponto de vista pedagógico: o globo era “feito de accordo com as modificações resultantes da grande guerra e contendo indicações das vias de navegação” (CATALOGO, 1924Catalogo de obras de nossa edição. São Paulo: Melhoramentos, 1924., p. 10).

FIGURA 2
GLOBO TERRESTRE

Produtos de papelaria também povoavam os catálogos, passando a ocupar um espaço cada vez mais amplo, como se pode observar no exame da edição de 1929, que põe à disposição da sua clientela cadernos de caligrafia, cartografia, além de cadernos de escrituração mercantil. Merece destaque, entre esses artefatos, o Classificador Kosmos, apresentado, na face interna da quarta capa dos catálogos, como objeto “útil”, “simples”, “cômodo”, “prático” e, enfim, “indispensável a todos”. Procurando atingir um público consumidor que não se limitava ao âmbito da escola, a caixa para guarda de documentos era apresentada como um objeto que deveria fazer parte de qualquer escritório “bem organizado”, sendo o preferido, além dos professores, de vários profissionais, como juízes, médicos lavradores, bem como de qualquer particular que zelava pelos seus negócios. Organização, simplicidade, praticidade e economia de tempo eram alguns dos diferenciais de um produto que evidencia a amplitude da atuação da Melhoramentos, empresa editorial que não se limitava à publicação dos livros escolares ou à fabricação de objetos de papelaria destinados aos fazeres da classe, abarcando a sua produção artefatos mais voltados para a rotina administrativa da escola.

FIGURA 3
CLASSIFICADOR KOSMOS

Reunindo livros publicados pela Melhoramentos, obras em depósito e em consignação, materiais didáticos e brinquedos educativos, o Catalogo Geral da editora publicado em 1940 inicia com um conjunto de orientações sobre os procedimentos a adotar com vistas à aquisição dos itens apresentados, os quais poderiam ser encomendados de qualquer lugar do País. Visando à comodidade do consumidor, a nota divide os materiais escolares em quatro segmentos:

  • I - Obras e Certamens de nossa edição ou que temos em deposito;

  • II - Material Didactico de nossa edição;

  • III - Brochuras, Cadernos em branco e Material de expediente para estabelecimentos de ensino em geral;

  • IV - Obras e certamens de outros editores, que temos em consignação. (CATALOGO GERAL, 1940Catalogo Geral: livros, material didactico, brinquedos educativos; obras em deposito e em consignação. São Paulo: Melhoramentos, 1940.).

O primeiro segmento contemplava obras literárias; brinquedos; obras de história e biografias; livros para as escolas primárias (cartilhas, séries de livros de leitura graduada, livros de leitura intermediária e leitura corrente, compêndios e livros auxiliares do aluno e do mestre); livros para os cursos secundário e complementar; além de obras diversas. Sob o título “material didactico em geral”, a segunda seção apresentava materiais para os jardins de infância, cadernos escolares, quadros murais, material para trabalhos manuais, mapas e globos geográficos; material para finalidades diversas. Inserido na página que antecede a apresentação dos livros para as escolas primárias, o anúncio da produção da editora, antes publicado na contracapa do catálogo, agora convida os consumidores a adquirirem não somente os livros escolares e materiais didáticos, chamando atenção também para o seu sortimento de “materiais para expediente”, terminologia que oferece indícios sobre a ampliação e segmentação dos negócios da editora.

Nesse segmento, além de livros e cadernos para a escrituração escolar, o catálogo de 1940 oferecia aos consumidores brochuras em diversos formatos, pautadas, pautadas e riscadas, com capas em cartão de cor, capas em papel onça, capas em papel couro; cadernos de caligrafia, cartografia, linguagem, aritmética, música, desenho com ou sem papel seda, apontamentos; livros especiais para música em papel Holanda ou papel linho Bütten; blocos de papel milimetrado, blocos de desenho, lápis, variados estojos de lápis de cor com 6 ou 12 cores (estojos de lápis Futebol, Arco Íris, Multicolor, Índio), penas, canetas, borrachas, giz.

Entre os itens que constam nesse catálogo, mais amplamente ilustrado que as outras edições examinadas, estão os brinquedos indicados para as crianças do jardim de infância ou da escola primária, alguns deles recomendados tanto para a escola como para o lar, conforme se pode observar por meio de alguns exemplos:

Pequeno Typographo (O) consiste numa caixa contendo 200 pedaços de cartão impressos com letras, numeros, signaes ou espaços. É uma perfeita caixa de typographo em miniatura, que permitte á criança exercitar-se na construcção de phrases curtas. É, pois, o primeiro incentivo para o aprendizado da cartilha. 5$000 (CATALOGO GERAL, 1940Catalogo Geral: livros, material didactico, brinquedos educativos; obras em deposito e em consignação. São Paulo: Melhoramentos, 1940., p. 48, grifos no original).

FIGURA 4
PEQUENO TYPOGRAPHO

Certamens Educativos, em formato de cartas de baralho, essa collecção se destina ao ensino intuitivo da literatura.

1ª serie - Os Nomes dos Grandes Brasileiros nas Artes, nas Sciencias e nas Letras. - 5$000

O fim principal desse certamen consiste na formação de quartetos. Cada carta traz o retrato, a bibliographia e as datas de nascimento e falecimento de um dos vultos de nossa literatura, bem como o nome de outros tres, com os quaes deverá ser completado o quarteto. Impresso em cartão especial, a cores (CATALOGO GERAL, 1940, p. 43-44, grifos no original).

A Pequena Modista

6 modelos differentes - 5$000

Cada modelo - 1$000

Lindos bonecos com seus vestidinhos que a criança recorta com satisfação e alegria. Suggestivos modelos em lindas côres. Um certamen educativo apreciado e sempre reclamado na escola e no lar (CATALOGO GERAL, 1940Catalogo Geral: livros, material didactico, brinquedos educativos; obras em deposito e em consignação. São Paulo: Melhoramentos, 1940., p. 43, grifos no original).

O exercício de exame dos catálogos da Editora Melhoramentos experimentado neste artigo oferece elementos para se pensar no potencial desse tipo de fonte para avançar na compreensão dos modos como foi se constituindo a escola em sua materialidade. Evidentemente, não se pode extrair dessa fonte dados que possam responder à indagação sobre a aquisição desses materiais pelas escolas, tampouco ela pode dizer sobre os usos efetivos e inventivos que, em seu fazer cotidiano, os professores das escolas paulistas fizeram dos objetos que porventura chegaram a suas salas de aula. A resposta a essas e outras indagações exigiria, certamente, um investimento mais amplo para o qual seria necessário lançar mão de outras fontes, que permitissem vislumbrar indícios dos processos de compra, do investimento público em materiais dessa natureza, da sua presença nos inventários de bens escolares, do registro das práticas encenadas em sala de aula. Trata-se, nesse sentido, de uma ampla agenda de investigação para a qual este artigo pretendeu aportar uma contribuição, indagando sobre algumas possibilidades oferecidas pelos catálogos comerciais para uma “imersão no mundo dos objetos” produzidos para a escolarização da infância, bem como dos sentidos de modernidade pedagógica de que foram investidos.

  • 1
    Este artigo apresenta resultados de pesquisa financiada com recursos do CNPq (Bolsa de Produtividade em Pesquisa). Uma versão das questões aqui examinadas foi apresentada na III International Conference on School Material Culture: production, use and circulation of school furnishings and teaching aids between Europe and Latin America in XIX and XX centuries, evento realizado na Università di Macerata em setembro de 2017. Agradeço aos colegas italianos, em especial a Juri Meda, e a Gizele de Souza e Vera Gaspar, pelas importantes contribuições para o avanço da investigação.
  • 2
    Referindo-se à institucionalização da escola no Brasil, como principal lócus de educação, entre o século XIX e as primeiras décadas do século XX, Batista, Galvão e Klinke (2002, p. 27-28)BATISTA, Antônio Augusto G.; GALVÃO, Ana Maria O.; KLINKE, Karina. Livros escolares de leitura: uma morfologia (1966-1956). Revista Brasileira de Educação, p. 27-47, maio-ago. 2002. assinalam que “o método simultâneo e a seriação nele implicada se caracterizariam pela classificação dos alunos em grupos do mesmo grau de adiantamento; pela realização conjunta dos mesmos estudos, por meio dos mesmos livros e deveres; pela preleção a todos em lugar de a um só; pela realização de atividades em todas as classes de uma escola”. A implementação do método simultâneo exigiu, conforme destacam os autores, a produção de materiais destinados a essa forma de organização do ensino, a exemplo dos quadros-negros, cartazes e livros didáticos.
  • 3
    Segundo Soares (2010)SOARES, Gabriela P. Os irmãos Weiszflog em busca dos mercados escolares: identidades das Edições Melhoramentos dos primórdios à década de 1960. In: BRAGANCA, Aníbal; ABREU, Márcia (Orgs.). Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. São Paulo: Editora Unesp, 2010, p. 157-169., a crise no abastecimento de papel, resultante da Primeira Guerra, redundou na incorporação da Weiszflog Irmãos pela Companhia Melhoramentos, em 1920. Além de minimizar os efeitos da crise sobre a Weiszflog, a medida visava injetar capital na Companhia Melhoramentos, para recuperar seu maquinário e retomar a qualidade da sua produção.
  • 4
    A par do estudo histórico da escola italiana, Meda (2015)MEDA, Juri. A história material da escola como fator de desenvolvimento da pesquisa histórico-educativa na Itália. Revista Linhas, v. 16, n. 30, p. 7-28, 2015. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/view/1984723816302015007. Acesso em: 2 abr. 2019.
    http://www.revistas.udesc.br/index.php/l...
    propõe a utilização do termo “história material da escola” para se referir à “história dos meios e métodos empregados na produção e no consumo de objetos didáticos e instrumentos educativos” (p. 10).
  • 5
    Agradeço imensamente aos diretores da Melhoramentos pela autorização para a pesquisa no arquivo histórico da editora. Sou especialmente grata ao funcionário Gilmar Augusto da Silva, que ofereceu todas as condições para o desenvolvimento do levantamento.
  • 6
    O Catalogo de obras de nossa edição, publicado em agosto de 1924, tem 54 páginas; o Catalogo de livros e material didactico de nossa edição (junho de 1929), 90 páginas; o Catalogo geral: livros, material didactico, brinquedos educativos; obras em deposito e em consignação, publicado em 1940, 202 páginas.
  • 7
    Um primeiro esforço de contagem pode dar uma dimensão do incremento da produção da editora: a lista de obras, que inclui os livros e os materiais didáticos, apresentada no catálogo de 1924, soma 185 itens; em 1929, esse número chega a 315, descontados nos dois casos os vários volumes das obras organizadas em séries.

FONTES

  • Catalogo de obras de nossa edição São Paulo: Melhoramentos, 1924.
  • Catalogo de livros e material didactico de nossa edição São Paulo: Melhoramentos, 1929.
  • Catalogo Geral: livros, material didactico, brinquedos educativos; obras em deposito e em consignação São Paulo: Melhoramentos, 1940.
  • Revista Escolar São Paulo, ano 1, n. 9, set. 1925, p. 45-46.

REFERÊNCIAS

  • BATISTA, Antônio Augusto G.; GALVÃO, Ana Maria O.; KLINKE, Karina. Livros escolares de leitura: uma morfologia (1966-1956). Revista Brasileira de Educação, p. 27-47, maio-ago. 2002.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Set 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2019
  • Aceito
    19 Jun 2019
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