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Pronunciamento do professor Alcy Joaquim Ramalho na solenidade de transmissão do cargo de reitor da Universidade Federal do Paraná, realizada no dia 23-4-82

ARTIGOS DE DEMANDA CONTÍNUA

Pronunciamento do professor Alcy Joaquim Ramalho na solenidade de transmissão do cargo de reitor da Universidade Federal do Paraná, realizada no dia 23-4-82

Magnífico Reitor OCYRON CUNHA, que dirigiu a vida universitária, nos últimos quatro anos, com dignidade e honradez exemplares. Esteja certo Vossa Magnificência deque pertence ao estrito rol de pessoas que se tornaram credoras da admiração e amizade de todos nos, pela capacidade que demonstrou ao enfrentar desafios e assumir responsabilidades em nome do engradecimento da Universidade Federal do Paraná. Seu trabalho, seu sacrifício, o denodo com que se dedicou por inteiro à causa comum não serão esquecidos pela comunidade universitária agradecida.

Senhores,

Certa vez, o poeta Drumond compadeceu-se dos homens que são "prisioneiros de cidades estreitas e sem ventanas"

Esta estreiteza e este ar parado eram, provavelmente, lamentados na Curitiba do início deste século. Deploravam-nos homens como Pamphilo de Assumção, Victor do Amaral, Chichorro Júnior, Ernesto Canac, Fernando Moreira, Manoel Miranda Rosa, Daltro Filho, Nilo Cairo, Hugo Simas, Euclides Bevilacqua e todos os que, desde Rocha Pombo, contribuíram para sedimentar a idéia da Universidade do Paraná.

Na verdade, o nascimento, há 70 anos, de nossa alma máter assinala um ponto de inflexão na tímida curva do desenvolvimento cultural do Paraná de então. E o mais importante é que a evolução ocorreu de maneira uniforme a sociedade, os professores e alunos somando-se para erguer as instalações onde agora nos encontramos. Em abril de 1914, a cidade assistiu à mudança, feita pelos prõprios alunos, que desfilaram pela Rua 15 de Novembro com os moveis, aparelhos e utensílios as costas.

Retornamos, neste instante, ao ventre desta Instituição para um reencontro com nossas origens. Estamos conscientes de que nossa geração tem indescartável missão a cumprir: a de corrigir desvios de trajetória e incorreções de entendimento que distanciaram a Universidade de seu grande, sólido e permanente objetivo, que é servir a sociedade em sua busca de prosperidade, justiça e paz.

O momento não é oportuno para um detalhado diagnóstico das deformações do ensino no Brasil. Mas cabe constatar que elas fizeram do curso superior, em muitos casos, um fim e não um meio de aperfeiçoamento do homem.

A Universidade dedicou cota muito grande de tempo e dinheiro á produção de graduados e pós-graduados. Muitas vezes, esta prioridade implicou em prejuízo da pesquisa e da investigação.

Temos, repito, um compromisso com a comunidade que nos mantêm - e este compromisso é tanto maior quanto reconhecemos no Brasil indícios de subdesenvolvimento. A Universidade esta obrigada a participar do processo de desenvolvimento tecnológico porque não temos superempresas como aquelas que, nos países com alto nível de industrialização, financiam a pesquisa.

Por outro lado, frequentemente exageramos nossa responsabilidade em formar graduados. Exagero tão grande que alguns deles saem da solenidade de formatura diretamente para a fila de desempregados.

Nossa contribuição a uma sociedade equilibrada ha de ser outra: a de repensar o ensino, de maneira crítica e criativa. A de propor o aumento do numero de terminalidades ao longo da pirâmide escolar. A de, quando necessário, limitar o acesso ao mundo universitário: paradoxalmente, a democratização do ensino passa pela seleção de aptidões, sob pena de, em vez de democratizar, deteriorar a qualidade do aprendizado.

Mais ainda: nossa contribuição a essa sociedade melhor depende de assumirmos o papel que o professor Miguel Reale definiu como Universidade-Matriz - aquela que, por preservar sua alta qualidade de ensino, conserva a capacidade de fornecer corpo docente ao sistema universitário.

Acredito que, em prazo relativamente curto, tais metas serão alcançadas. Entretanto, dependem elas de condições de ensino absolutamente adequadas. Isto significa, entre outra coisas, bons salários, boas instalações, bons vest ibulares.

Significa ainda permanente diálogo, debate, troca de idéias, tanto horizontal como verticalmente. Implica em incentivar um melhor relacionamento aluno-professor durante e após as aulas. Quer dizer uma volta muito positiva a antigos hábitos, como o espírito de turma que existia nas faculdades, a difusão de atividades extra-curriculares pelo campus - esporte, arte, religião, lazer e, necessariamente, política. Digo necessariamente porque professores e alunos estão todo o dia a agir politicamente, qualquer que seja a posição da Universidade. Trata-se de saudável sinal de vitalidade democrática, que não deve ser confundido coma tentativa de politizar a Universidade, isto é, desviá-la de seu papel de líder de toda a comunidade em troca da condição de guia de uma parcela.

Imagino que a Universidade deva viver - como quer Gilberto Freire - em estado de expressão. E que permanentemente pense nossa cidade, nosso Estado. nosso Brasil. Uma Universidade flexível, que se adapte ao tempo e à latitude. Capaz de oferecer currículos caboclos quando necessário, em vez de tentar traduzir para o português realidades até opostas à nossa.

Esta Universidade deve formar bons profissionais, em cursos mais breves. Deve preparar cientistas e pesquisadores em cursos de cinco ou seis anos e na pôs-graduação. E deve oferecer oportunidades de aprendizado a todos, através de cursos abertos.

Acima de tudo, há que tornar enriquecedora a troca de experiências entre a instituição de ensino e a comunidade que nela deposita a esperança de um amanhã melhor.

É fundamental que, em todo o processo, leve-se em conta a realidade básica do homem. O homem que ensina, o homem que aprende, o homem que questiona, descobre, ousa, conquista e se enternece pela beleza da invenção.

A este homem devemos a liberdade - liberdade para propor, indagar, discordar e criar.

Por este homem, o homem novo que receberá nosso legado e, com sua geração, prosseguirá nossa caminhada ao longo do terceiro milênio, peço a união de todos - professores, alunos e funcionários de nossa Universidade Federal do Paraná. Nosso trabalho terá sucesso na medida em que formos capazes de renovar, com o mesmo calor, o pacto generoso dos homens que fundaram esta casa e ergueram este prédio lançando mão até mesmo de recursos pessoais.

O êxito de nossa tarefa, com a ajuda de Deus, virá de uma certeza -a certeza de que, a cada momento, pela nossa união e pela soma das capacidades dos que aqui trabalham, avançamos outro passo na direção da sociedade mais bela e justa com que sonhamos.

Pois é no rumo de um mundo melhor que viaja sempre a Universidade - este barco, este canto, esta palavra de fé. Obrigado.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1982
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