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Reflexões sobre a inserção da disciplina de nutrição na formação do enfermeiro

Resumos

Este estudo visa caracterizar a disciplina de Nutrição ministrada em seis cursos de graduação em enfermagem quanto à formação do docente, carga horária, conteúdos, estratégias de ensino e avaliação a partir da ótica do professor que a ministra. Trata-se de uma pesquisa descritiva, realizada por entrevistas semi-estruturadas, analisadas por meio da Análise Temática. Verifica-se que o conteúdo das disciplinas abrange tanto o aspecto da Nutrição no ciclo vital e na prevenção de doenças quanto no aspecto curativo. Salienta-se a importância do professor estar atento quanto à complexidade dos conteúdos necessários para a formação do enfermeiro. Os conhecimentos da Nutrição favorecem a atuação do enfermeiro na equipe multiprofissional em saúde. Sugere-se formação de grupos de estudo de professores das disciplinas de Nutrição em Cursos da área da saúde.

educação em enfermagem; ensino superior


This study aimed to characterize the Nutrition discipline in six undergraduate courses in nursing regarding to the professor background, workload, content, strategies of education and evaluation from the perspective of the professor who teaches it. This is a descriptive research, carried out through semi-structured interviews, analyzed through the Thematic Analysis. It was verified that the discipline content approaches Nutrition in the vital cycle in the prevention of illnesses, as well as, in the healing aspect. The importance of the professor to be attentive to the content complexity necessary to the Nursing Education is highlighted. Nutrition knowledge favors the performance of the Nurse in a multifunctional health team. The formation of study groups with professors from Nutrition disciplines in the health area of undergraduate programs is suggested.

education, nursing; education, higher


El objetivo de este estudio fue caracterizar la disciplina de Nutrición en seis cursos de la graduación en cuanto a la formación docente, carga horaria, contenidos, estrategias y evaluación a partir de la óptica del profesor que la ministra. Trátase de una investigación descriptiva, realizada a través de entrevistas semiestructuradas, analizadas por medio del Análisis de Contenido Temático. Se pudo observar que el contenido de las disciplinas abarca tanto el aspecto de la Nutrición en el ciclo vital como la prevención de la enfermedad en cuanto al aspecto curativo. La importancia del profesor estar atento a la complejidad de los contenidos necesarios para la formación del enfermero fue enfatizada. Los conocimientos de la Nutrición favorecen la actuación del enfermero en el equipo multiprofesional en salud. La evaluación del aprendizaje de los alumnos es predominantemente somativa, dificultando la posibilidad de retomar sus errores. Sugiérese la formación de grupos de estudio de profesores de las disciplinas de Nutrición en Cursos del área de la salud.

educación en enfermería; enseñanza superior


ARTIGOS ORIGINAIS

Reflexões sobre a inserção da disciplina de nutrição na formação do enfermeiro

Cátia FeresinI; Maria Cecília SonzognoII

IMestre em Ciências, Docente da Faculdade Santa Marcelina, Brasil, Docente do Centro Universitário Uni-FMU, Brasil, e-mail: catiant@bol.com.br

IIDocente da Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo, Brasil, e-mail: mcsonzogno@uol.com.br

RESUMO

Este estudo visa caracterizar a disciplina de Nutrição ministrada em seis cursos de graduação em enfermagem quanto à formação do docente, carga horária, conteúdos, estratégias de ensino e avaliação a partir da ótica do professor que a ministra. Trata-se de uma pesquisa descritiva, realizada por entrevistas semi-estruturadas, analisadas por meio da Análise Temática. Verifica-se que o conteúdo das disciplinas abrange tanto o aspecto da Nutrição no ciclo vital e na prevenção de doenças quanto no aspecto curativo. Salienta-se a importância do professor estar atento quanto à complexidade dos conteúdos necessários para a formação do enfermeiro. Os conhecimentos da Nutrição favorecem a atuação do enfermeiro na equipe multiprofissional em saúde. Sugere-se formação de grupos de estudo de professores das disciplinas de Nutrição em Cursos da área da saúde.

Descritores: educação em enfermagem; ensino superior

INTRODUÇÃO

Este artigo resume parte dos resultados obtidos na dissertação de mestrado apresentada ao Programa Ensino em Ciências da Saúde, oferecido pelo Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde, CEDESS, da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina.

O exercício da docência na disciplina Nutrição, em Cursos de Graduação em Enfermagem, apresenta desafios como o de estimular o pensamento crítico do aluno, pela discussão de temas relevantes para o campo de conhecimento na enfermagem. O enfermeiro deve apropriar-se dos conhecimentos da Nutrição, uma vez que a utiliza em vários cenários de sua prática, tanto no âmbito da promoção da saúde como no aspecto curativo. Ao considerar que a Nutrição é condição básica para a manutenção da vida, e que o enfermeiro, profissional da saúde que possui atribuições frente ao cuidado geral do paciente, o conhecimento sobre Nutrição revela-se primordial.

O enfermeiro, membro da equipe de saúde, deve estar empenhado em auxiliar na prevenção da desnutrição, assessorando os nutricionistas e médicos na identificação precoce de sinais físicos da desnutrição, na colaboração com o nutricionista, fornecendo dados sobre a aceitação das refeições, bem como auxiliar no tratamento da desnutrição, estando atento e transmitindo informações importantes à sua equipe de enfermagem quanto à importância da nutrição na recuperação do paciente desnutrido. Enfim, deve cooperar como membro da equipe de saúde em relação à nutrição do paciente(1).

O docente da disciplina Nutrição no Curso de Graduação em Enfermagem, deve estar atento em relação às áreas de atuação do enfermeiro e suas atribuições, para poder verificar em quais momentos de sua prática profissional os conhecimentos da ciência da Nutrição serão úteis, e quais devem ser contemplados no âmbito da disciplina.

Existe a necessidade da realização de pesquisas visando o aprimoramento do ensino em Nutrição, a fim de que o aluno adquira competência para sua futura atuação profissional, aonde possa conciliar a técnica com a visão crítica e que consiga aplicar os conhecimentos no contexto de sua prática(2).

A disciplina Nutrição esteve, em vários momentos, inserida nos currículos do Curso de Graduação em Enfermagem e, a partir do Currículo Mínimo de 1994, a disciplina deixou de faxer parte(1).

Em 1996, a publicação das Leis de Diretrizes e Bases da Educação - LDB, Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996, trouxe a liberdade para as instituições de ensino superior definirem seus currículos. Permitiu também maior autonomia para a elaboração do Projeto Político-Pedagógico, numa perspectiva de construção coletiva, de interdisciplinaridade e de integração. Os currículos mínimos, então, foram extintos(3).

O Ministério da Educação e Cultura (MEC) convocou as instituições de ensino e as associações profissionalizantes para a discussão das Diretrizes Curriculares no âmbito dos cursos superiores e, um pouco antes dessa demanda, a Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) já realizava, desde 1994, os Seminários Nacionais de Diretrizes para a Educação em Enfermagem no Brasil (SENADEn´s) sendo que, nessa esfera, tem se discutindo a educação para a enfermagem.

As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) do Curso de Graduação em Enfermagem foram criadas em 2001, por meio da Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) nº 3, de 7 de novembro de 2001(4).

O texto das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Enfermagem contém, no decorrer de seus artigos, passagens em que foi verificada a pertinência da Nutrição para a formação do enfermeiro.

O artigo 4º das DCN´s refere-se às competências e habilidades gerais do profissional e, em seu inciso III, versa sobre a comunicação com os demais profissionais da saúde incluindo aí os profissionais da Nutrição. Fica clara a importância do aluno de Graduação em Enfermagem entrar em contato, desde a graduação, com professores de formação diversificada, para que o aluno inicie o contato com os demais profissionais da área da saúde. O artigo 5º aborda a questão das habilidades e competências específicas e, em seu inciso VII, diz: "atuar nos programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente, da mulher, do adulto e do idoso". Nesse inciso, verifica-se a pertinência de conteúdos da Ciência da Nutrição no ciclo de vida, para tornar a assistência de Enfermagem mais eficiente(4).

Do inciso XXXII consta: "cuidar da própria saúde física..." cabendo aí também conhecimentos sobre alimentação equilibrada, até para o próprio enfermeiro, pois a Nutrição permite esse contexto, os temas são importantes tanto no âmbito pessoal quanto no profissional(4).

O Artigo 6º trata dos conteúdos essenciais para o curso. Pode-se considerar que a disciplina de Nutrição permeia as ciências biológicas e da saúde e também a enfermagem, ao considerar que os conteúdos dessa ciência fornecerão subsídios para a atuação quanto à assistência de enfermagem(4).

O sistema de avaliação do ensino superior, atualmente, proposto pelo MEC, denominado Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) compõe o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE). O referido exame, que foi aplicado para a enfermagem em 2004, contém questões que envolvem Nutrição, tanto no aspecto curativo, no ambiente hospitalar, quanto no aspecto da promoção à saúde, quando traz duas questões, relacionando crescimento infantil com alimentação(5).

Esse tipo de avaliação reforça a necessidade do enfermeiro ter conhecimentos básicos tanto da nutrição no ciclo vital quanto da nutrição frente às doenças.

Diante do exposto, este estudo visa caracterizar a disciplina Nutrição, ministrada em cursos de graduação em enfermagem, quanto à formação do docente, carga horária, conteúdos, estratégias de ensino e avaliação, a partir da ótica do professor que a ministra.

METODOLOGIA

Realizou-se estudo descritivo, definido como "estudos caracterizados pela necessidade de se explorar uma situação não conhecida, da qual se tem necessidade de maiores informações"(6).

A população alvo deste estudo foi constituída por seis professores que ministram a disciplina Nutrição em cursos de graduação em enfermagem em seis instituições de ensino superior localizadas na cidade de São Paulo. Para melhor identificar o perfil dos colaboradores desta pesquisa, as informações estão condensadas no Tabela 1.

Tendo como contexto a discussão sobre as concepções a respeito da disciplina Nutrição nos cursos de graduação em enfermagem, o instrumento escolhido para a coleta de dados foi a entrevista semi-estruturada.

As entrevistas foram gravadas na íntegra, transcritas e posteriormente analisadas através da análise temática ou análise categorial, onde as categorias foram obtidas a partir de leituras dos conteúdos, havendo desmembramento do texto em unidades, transversalmente, e posteriormente realizou-se a análise dessas categorias elencadas. As categorias dessa pesquisa não foram escolhidas a priori, mas emergiram de leituras incessantes das entrevistas e tomaram forma no curso da própria pesquisa(6-7).

Com autorização do Comitê de Ética envolvido, as entrevistas foram realizadas nas instituições de ensino superior pelo pesquisador principal, garantindo a preservação do anonimato dos sujeitos da pesquisa, através da aplicação do termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A inserção da disciplina Nutrição nos cursos de graduação em enfermagem.

A Tabela 2 demonstra variação grande em relação à carga horária e percebe-se essa disciplina como estritamente teórica. Verifica-se a necessidade de haver, além da disciplina de Nutrição, a inserção de conteúdos sobre a Ciência da Nutrição no decorrer do Curso em outras Disciplinas, a fim de proporcionar a integração entre elas.

Conteúdos

Quanto à questão referente aos principais conteúdos abordados pelos docentes na disciplina, observou-se que houve grande diversidade, mas todos aqueles referidos estavam relacionados a conceitos básicos da nutrição, nutrição no ciclo vital e nas doenças. Esses relatos selecionados mostram os conteúdos que os professores abordam no âmbito da disciplina.

Nós abordamos a parte básica, agregamos também a parte de alimentação normal de gestantes, lactantes, e a Dietoterapia (P3).

O enfermeiro realmente utiliza os conhecimentos da Nutrição tanto para saber quais as características da alimentação para manutenção da saúde quanto para o aspecto curativo. Essa lógica de abordar em primeiro lugar a Nutrição na prevenção de doenças e, posteriormente, a Nutrição na recuperação do paciente, que apresenta alguma doença, é pertinente, pois a ênfase na prevenção de doenças é importante.

Ao selecionar conteúdos para um curso, deve-se ter muito claro qual será sua utilidade, e quais são as áreas de atuação do profissional e, portanto, qual o local em que ele vai utilizar tais conteúdos.

Ao retomar as DCN´s para os cursos de graduação em enfermagem, quando os conteúdos abordados referem-se à nutrição, no aspecto preventivo e curativo, contempla-se as competências gerais e específicas no que se refere ao aspecto aquisição de conhecimentos em mutrição. No entanto, para a aplicação desses conhecimentos na prática profissional, o aluno terá que desenvolver outras competências como, por exemplo, habilidades no trabalhar em equipe multiprofissional(4).

Algumas doenças têm relação íntima com a Nutrição, e dentre os profissionais da área da saúde, o nutricionista é o principal profissional envolvido no cuidado nutricional de pacientes, clientes, mas também observa-se a importância da atuação conjunta com o enfermeiro, no sentido se envidarem esforços para satisfazer melhor as necessidades nutricionais daqueles que estão sob seus cuidados.

Nos currículos de graduação em enfermagem, assim como nos demais da área da saúde, há a recomendação de conteúdos sobre a situação nutricional da população brasileira(8).

O planejamento de um curso ou disciplina é de suma importância. Dentre os critérios utilizados para a escolha dos conteúdos, há a necessidade de se analisar a seqüência de conteúdos e a contextualização dos mesmos e que os alunos percebam a sua aplicação(9).

O professor deve saber selecionar o que é importante sobre conteúdos de Nutrição para o enfermeiro e não simplesmente abordar conteúdos muito complexos pelo simples motivo de ter estudado muito mais e se especializado em determinado assunto. Nota-se isso pela afirmação a seguir:

...eu falo sobre dietas hospitalares, para eles reconhecerem; eu só falo a fisiopatologia e o que deve ser restrito. Não falo sobre números também, por exemplo, ácidos graxos saturados têm que ter 7% da porcentagem de gordura total, porque eles não vão usar isso (P1).

É importante salientar que os conteúdos acima citados pelo professor estão contemplados nas competências e habilidades gerais e específicas presentes no texto das DCN´s do curso de graduação em enfermagem, no Artigo 5º, quando se refe à participação do enfermeiro nos programas de assistência integral à mulher, à criança, ao adulto e ao idoso. Conteúdos de Nutrição no ciclo vital contemplam a recomendação das Diretrizes(4).

...a gente tem que saber disso, porque quem vai estar mais em contato com o paciente é a enfermagem, e você tem que verificar, você tem que avisar a Nutricionista que aquele paciente não está se alimentando...(P5).

O relato acima citado reflete a prática da atuação em equipe multiprofissional, em que dois profissionais, nutricionista e enfermeiro atuam juntos com o objetivo comum de recuperar ou manter o estado nutricional do paciente.

Estratégias de ensino

As falas dos professores quanto às estratégias de ensino demonstraram o envolvimento com o processo ensino-aprendizagem de seus alunos quando mencionam a preocupação com a diversificação das técnicas.

Disse um professor:

...as alunas costumam fazer bons seminários, porque eles acontecem ao longo do ano, então eu paro a aula uns vinte minutinhos e são apresentados em cada aula um ou dois... (P2).

O planejamento do aluno para o preparo do seminário é muito pertinente, pois enquanto ele pesquisa, vai adquirindo autonomia para a construção do conhecimento. Os conhecimentos hoje ficam logo obsoletos, deve haver estratégias de ensino na graduação que estimulem sua busca constante.

Outro ponto que merece ser analisado nesses depoimentos é o estudo de caso como outra estratégia muito adequada para o ensino da ciência da Nutrição à enfermagem, e é utilizado por esse professor:

Eu utilizo o estudo de caso de uma gestante, ...então eu quero que a aluna avalie ...o peso...a alimentação...então é assim que eu trabalho ( P3).

Os professores utilizam a auto-avaliação da alimentação para expor as recomendações de uma alimentação equilibrada para a população brasileira, no sentido de prevenir doenças e manter a saúde. Realizando uma avaliação da própria alimentação, o aluno tem a possibilidade de dar mais atenção, mais significado para a alimentação das pessoas que estarão sob seus cuidados.

Veja o que eles dizem sobre essa estratégia.

...eu trabalho com uma avaliação da própria alimentação dos alunos e então a gente faz uma avaliação; e aí em cima daquilo a gente trabalha, porque senão fica muito teórico e muito difícil para lidar (P3).

Torna-se importante dizer que os relatos acima vão ao encontro do texto da DCN´s do curso de graduação em enfermagem, quanto ao Inciso XXXII referente ao cuidado que o enfermeiro deve ter com a própria saúde. A análise que o aluno realiza com a estratégia acima citada por esses professores é eficiente, pois lhe dá retorno sobre sua própria saúde no que diz respeito à alimentação(4).

As estratégias de ensino exigem reflexão por parte do professor ao escolhê-las: "Ao aprender um conteúdo, aprende-se também determinada forma de pensá-lo e de elaborá-lo, motivo pelo qual cada área exige formas de ensinar e de aprender específicas, que explicitem as respectivas lógicas"(10).

Avaliação da aprendizagem

Percebe-se que a avaliação está pautada na verificação, constituída basicamente por provas teóricas, contendo testes de múltipla escolha.

Nota-se que os professores quase não mencionaram a possibilidade da avaliação extrapolar a prova escrita e mostraram a composição da avaliação:

É prova, prova teste...ou é sim ou é não, tanto que quem for mal em teste é porque não estudou mesmo, então é um ponto de corte (P1).

A avaliação ainda é aquele método antigo, as provas... que você realmente precisa ter essa avaliação como documentação (P4).

Considera-se a avaliação da aprendizagem um campo complexo; é importante que o professor tenha clareza sobre o que ele deseja que o aluno aprenda e aí, sim, planejar instrumentos de avaliação que farão parte de todo o processo de aprendizagem. Os dados obtidos nos depoimentos dos professores permitem afirmar que a avaliação nessas instituições ainda ocorre somente para a verificação da retenção das informações, não há avaliação do processo todo de aprendizagem.

De maneira diversa, um outro professor elabora a prova escrita e consegue incorporar a análise do aluno, através dos casos práticos.

... quando a gente tem uma turma pequena dá para ver bem o desenvolvimento do aluno, turma maior é mais difícil, mas não tem outra forma a não ser provas e trabalhos mesmo, não é..? e na prova geralmente eu coloco os casos ...para eles raciocinarem, para eles verem na prática o que acontece (P4).

Percebe-se que os docentes não têm muitas alternativas ao planejarem a prova escrita, quando ministram disciplinas nas salas compostas por um número grande de alunos, mas, mesmo assim, eles devem procurar, com criatividade, dar significado ao aprendizado. Mesmo na prova, o docente pode direcionar questões que contextualizem a prática profissional como, por exemplo, as questões contidas no ENADE(5).

Na fala de um docente emergiu a preocupação em discutir a avaliação com os alunos, dar um retorno sobre o alcance dos objetivos e quais aspectos retomar para aperfeiçoar-se. Esse professor demonstra preocupação quanto ao aprendizado dos alunos: "Ao ser produzido, o conhecimento novo supera outro que antes foi novo e se fez velho e se 'dispõe' a ser ultrapassado por outro, amanhã"(11).

Há que se destacar a questão da integração com a equipe multidisciplinar, principalmente com o nutricionista, a conscientização de que a alimentação é condição essencial para a recuperação do paciente; portanto, o enfermeiro deve orientar sua equipe para estar presente, observando e supervisionando o momento das refeições. Deve também reforçar as informações fornecidas pelo nutricionista, fazer o elo entre o paciente e esse profissional(12).

Fica mais fácil para o enfermeiro se ele tiver conhecimentos de nutrição, discutir com a nutricionista a dieta, discutir com o médico a dieta, entender porquê a nutricionista está orientando aquela dieta (P2).

A integração da Nutrição com as demais disciplinas do curso

Em uma questão direcionada aos docentes quanto à existência de integração entre as disciplinas, pois essa é uma exigência da LDB, das Diretrizes Curriculares Nacionais e das discussões dos SENADEN´s, eles responderam que a efetivação ocorre em pequena escala.

As disciplinas não entram em diálogo, fragmentam o currículo ,e dentre os desafios propostos ao professor, está justamente "...articulação dos conteúdos trabalhados com outras disciplinas..."(13).

A disciplina é isolada ( P1).

Não conseguimos até hoje. É difícil, a gente tenta amarrar tudo, dizendo pro aluno: - Está vendo, se você não souber não vai funcionar mais tarde, quando vocês estudarem Saúde da Mulher... (P5).

Com tantos avanços no conhecimento, com tantas possibilidades de divulgação das informações, a prática da ação educativa nas instituições de ensino superior parece não caminhar no mesmo ritmo de mudanças, de adequação às necessidades da sociedade atual. Sabe-se que a maneira de enxergar, de cuidar do ser humano deve incluir uma abordagem holística, porém, na prática, as instituições pesquisadas ainda não estão conseguindo viabilizar a comunicação entre as disciplinas, para que o aluno entenda que ele deve enxergar o ser humano como um todo e não simplesmente a nutrição e depois a saúde da criança em separado; pois a saúde da criança engloba a sua nutrição também.

Proporcionar momentos de integração entre as disciplinas torna-se essencial para que o aluno perceba o ser humano de maneira integral, e não por partes.

Para que a integração ocorra, deve haver conscientização dos dirigentes das instituições, pois, para possibilitar que o professor entre na sala de aula com outro professor e os dois ministrem uma aula através de uma abordagem, primeiramente é necessário que os professores entendam a necessidade e as vantagens que existem para a aprendizagem do aluno nesse tipo de proposta. É necessária também a capacitação pedagógica dos professores. E, por fim, a instituição deve propiciar momentos de planejamento para que esses professores reflitam sobre a prática na sala de aula, redirecionando-a sempre que necessário.

Confirmando as constatações sobre o isolamento das disciplinas, enfatiza-se:

"Como prática curricular, há muitas formas de viabilização; reunir disciplinas cujos conteúdos permitem tratamento pedagógico-didático interdisciplinar (por exemplo, em projetos específicos ligados a problemas sociais, às grandes questões atuais, a temas unificadores etc)"(14).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse estudo, é perceptível, pelo relato dos professores, a inexistência de integração entre as disciplinas. Isso dificulta que o aluno estabeleça a relação entre os conteúdos das disciplinas para sua atuação profissional. Sugere-se que, formalmente, a instituição proporcione oportunidades de discussões entre professores. O ensino fragmentado não satisfaz mais às necessidades atuais do ensino superior, porém, entre a proposta e a efetiva mudança há um percurso que precisa ser trilhado.

Não é viável o engajamento do docente nas propostas curriculares dos cursos se ele permanece em tempo integral na sala de aula. A atividade docente não deve restringir-se somente à sala de aula. Há necessidade de se repensar sua prática em sala de aula, de conhecer melhor e discutir sobre o Projeto Político-Pedagógico do Curso, saber com detalhes qual a contribuição da sua disciplina na formação do aluno.

Salienta-se a importância da existência da prática logo no primeiro ano do curso para que o aluno entre em contato com sua futura prática profissional já nos primeiros momentos do curso e é essencial que ele vivencie questões com graus de complexidade cada vez maiores e traga para a sala de aula, nas aulas teóricas, discussões, inclusive para enriquecer a teoria e para dar sentido ao conteúdo.

Há de se levar em conta que a disciplina Nutrição não precisa estar antes da prática, porque, inclusive, a prática enriquece a teoria. O importante é que a disciplina Nutrição esteja no momento posterior às disciplinas Fisiologia e Bioquímica, mas também é necessário que conteúdos da disciplina Nutrição estejam planejados em momentos pontuais em outras disciplinas, promovendo integração das mesmas, como nas disciplinas Saúde da Mulher, Saúde da Criança, Saúde do Adulto e do Idoso e na Psiquiatria.

Constata-se que é um ponto de vista predominante dentre os professores entrevistados que os conteúdos necessários à disciplina Nutrição no curso de graduação em enfermagem devam abranger: Conceitos Gerais sobre Nutrição, Nutrição no Ciclo Vital e Nutrição frente às Doenças, incluindo Nutrição Enteral e Parenteral. Mas também vale enfatizar que o professor deve planejar a disciplina, de forma que contemple os conteúdos sobre a Situação Nutricional da População Brasileira, um cenário com o qual o aluno vai se deparar futuramente em sua prática profissional. Revela-se essencial a inclusão de conteúdos referentes ao aspecto cultural e religioso das pessoas, pois o enfermeiro deve conhecer a influência da cultura e da religião na alimentação dos pacientes que estarão sob seus cuidados.

Além da necessidade de tais conteúdos, é primordial que a disciplina Nutrição, embora seja disciplina teórica nesses cursos analisados, esteja inserida, em momentos de prática, com objetivos específicos como, por exemplo, ao se fazer levantamento das condições de saúde de determinada população, incluir aspectos sobre a nutrição dessa população. Nos estágios em hospitais, verificar a integração da equipe multiprofissional, como funciona e quais as atribuições de cada profissional no cuidado nutricional dos pacientes. Nos estágios em Unidade Básica de Saúde (UBS), ao acompanhar as consultas de enfermagem, estar atento quanto aos erros alimentares para futuras discussões em sala de aula.

Esta pesquisa contribui para a afirmação do quanto é importante a disciplina Nutrição na formação do enfermeiro, no aspecto da promoção da saúde, na doença, tanto no aspecto individual quanto coletivo.

Acredita-se que, salas de aula com grande quantidade de alunos, constituem desafio para o professor hoje, visto que determinadas dinâmicas tornam-se inviáveis. Contudo, o professor deve utilizar a criatividade para tornar a aula menos cansativa, mesmo que opte pela aula expositiva, que seja uma aula expositiva dialogada, na qual o professor estimule a participação do aluno, realizando questionamentos, solicitando exemplos da vivência dos alunos. A utilização de qualquer estratégia de ensino está vinculada à sua real pertinência em relação ao conteúdo, requer que o docente se sinta preparado para utilizá-la e, por isso, requer planejamento para que a estratégia auxilie o professor a cumprir o objetivo da aula.

Esta pesquisa demonstrou que a avaliação da aprendizagem dos alunos ainda é realizada de maneira classificatória, com a utilização de provas escritas, contendo questões de múltipla escolha. Faz-se necessário que, no âmbito da disciplina Nutrição, seja contemplada, além da verificação da retenção das informações, a análise do desenvolvimento de habilidades e atitudes do aluno de graduação em enfermagem na questão da Nutrição. A Nutrição é ciência que, pelas suas características, envolve a atuação de vários profissionais da área da saúde, suscita abordagem que envolve também atitudes esperadas do enfermeiro em relação ao cuidado nutricional dos pacientes.

Como a ciência da Nutrição é utilizada por vários profissionais de saúde, ela demanda para o aluno de enfermagem uma abordagem diferente, uma forma de ensinar e de aprender peculiar. Há necessidade de que o docente verifique a pertinência de cada conteúdo, sua complexidade. Ao mesmo tempo, o enfermeiro deve ter subsídios sobre Nutrição para poder perceber algum erro alimentar de um cliente, e encaminhá-lo ao nutricionista. Essa peculiaridade da Nutrição demanda uma forma de ensinar também peculiar. Em todos os momentos, o docente da disciplina Nutrição deve pontuar o papel de cada profissional da saúde no assunto em que está sendo trabalhado.

Sugere-se a troca de experiências entre os docentes que ministram a disciplina Nutrição em cursos de graduação em enfermagem, com discussões sobre estratégias que mais satisfaçam o ensino e a aprendizagem dos alunos. Embora já existam encaminhamentos para discussões proporcionados pelo Conselho Regional de Nutricionistas 3ª região - CRN-3, quanto ao ensino da nutrição na graduação, há necessidade de reflexões entre os docentes que ministram a disciplina Nutrição nos demais cursos da área da saúde.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • Reflections on the insertion of the nutrition discipline in nursing education

    Cátia FeresinI; Maria Cecília SonzognoII
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jan 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2007

    Histórico

    • Aceito
      12 Set 2007
    • Recebido
      18 Abr 2006
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