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Dinâmica de regeneração de Merostachys skvortzovii Send. em remanescente de Floresta com Araucaria

Merostachys skvortzovii Send. regeneration dynamics in a Araucarian forest remnant

Resumos

Apresentam-se resultados de monitoramento da dinâmica de regeneração de Merostachys skvortzovii Send. (taquara-lixa), englobando dados de recrutamento, crescimento e mortalidade de plântulas (Floresta Ombrófila Mista, General Carneiro, Paraná, 26˚ 25′ S e 51˚ 18′ W). Foram avaliadas duas clareiras de tamanhos (aprox. 40mx40m) e situações de abertura do dossel similares, resultantes da morte de touceiras de taquara-lixa entre 2003-2005, utilizando-se 80 parcelas (1mx1m) em cada clareira (2007). Mensalmente, registrou-se a inclusão, permanência e mortalidade de plântulas de M. skvortzovii nessas parcelas. Evidenciou-se densidade média de plântulas diferenciada, mas similar padrão de distribuição espacial dessas plântulas nas clareiras avaliadas. As médias mensais de recrutamento, crescimento em altura e mortalidade foram significativamente diferentes em ambas as clareiras. Não se detectou correlação significativa entre as variáveis biológicas observadas (crescimento, recrutamento e mortalidade) e a variabilidade de pluviosidade e temperatura registradas no período de monitoramento. Em termos gerais, pode-se inferir que a taquara-lixa apresentava a capacidade de recolonizar as áreas abertas após o evento sincrônico de mortalidade, sendo que as características ambientais de cada clareira podem influenciar essa ocupação. A concentração das plântulas nas bordas das clareiras pode determinar a ampliação da área de ocupação da espécie no local de estudo. Entretanto, somente o monitoramento a médio e longo prazo das clareiras geradas pela morte da taquara-lixa permitirá compreender melhor o ciclo de vida dessa espécie e seu efetivo papel no fechamento dessas clareiras e dinâmica da floresta que a abriga


The results of monitoring the Merostachys skvortzovii Send. regeneration dynamics, including seedling recruitment, growth and mortality (Araucarian Forest, General Carneiro, Paraná, 26˚ 25′ S e 51˚ 18′ W, 1000m a.s.l.) are presented. Two gaps with similar size (40mx40m) and opening situation, resulting from M. skvortzovii dye-off s in 2003-2005, on which 80 small plots (1mx1m) were evaluated (2007). Monthly, it were registered the inclusion, permanence and mortality of seedlings of M. skvortzovii in these plots. It was evidenced different seedling average density among gaps, but similar seedlings spatial distribution pattern in both gaps. The monthly averages of recruitment, growth in height and mortality were significantly different in both gaps. Significant correlation was not detected between the biological observed variables (growth, recruitment and mortality) and the variability of pluviosity and temperature registered in during the monitoring. In general terms, it is possible to infer that the M. skvortzovii representative were capable of re-colonizing the areas opened after the synchronous dye-off event, but the environmental characteristics of each gap can influence this occupation. The concentration of the seedlings in the edges of the gaps can determine the enlargement of the species occupation area. Meantime, only middle to long term monitoring of the clearings produced by the M. skvortzovii dye-off will allow the understanding of the this species life cycle and its effective paper in the closure of these gaps as well as in the dynamic of the forest that shelters it

Bambusoideae; floresta ombrófila mista; Poaceae; recolonização de taquara-lixa

bamboo re-colonization; Bambusoideae; Mixt Ombrophilous Forest; Poaceae


INTRODUÇÃO:

Os bambus e taquaras compreendem o maior e mais bem sucedido grupo de gramíneas encontrado nas florestas tropicais (SENDULSKY, 1997SENDULSKY, T. Twelve new species of Merostachys (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae) from Brasil. Novon, Saint Louis, v.7, p.285-307, 1997. Disponível em: <http://www.jstor.org/discover/10.2307/3391946?uid=7751112&uid=3737664&uid=2129&uid=5909624&uid=2&uid=70&uid=3&uid=67&uid=62&uid=47157&sid=21101968559601>. Acesso em: 5 nov 2011. doi: 10.2307/3391946
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). São vegetais semelparos, isto é, apresentam florescimento que varia de três a 120 anos, com floração e frutificação maciças entre todos os indivíduos da espécie (JANZEN, 1976JANZEN, D.H. Why bamboos wait so long to flower? Annual Review of Ecology and Systematics, Palo Alto, v.7, p.347-391, 1976. Disponível em: <http://www.annualreviews.org/doi/pdf/10.1146/annurev.es.07.110176.002023>. Acesso em: 2 nov. 2011. doi: 10.1146/annurev.es.07.110176.002023.
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; WIDMER, 1998WIDMER, Y. Flowering phenology of Chusquea bamboo with special to Chusquea talamancensis in Costa Rica. Journal of the American Bamboo Society, Lousiania, v.1, n.2, p.1-20, 1998.). Produzem grandes quantidades de sementes até a morte sincronizada de todos os indivíduos (JANZEN, 1976JANZEN, D.H. Why bamboos wait so long to flower? Annual Review of Ecology and Systematics, Palo Alto, v.7, p.347-391, 1976. Disponível em: <http://www.annualreviews.org/doi/pdf/10.1146/annurev.es.07.110176.002023>. Acesso em: 2 nov. 2011. doi: 10.1146/annurev.es.07.110176.002023.
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). Após a floração simultânea, a regeneração das touceiras dependerá totalmente do estabelecimento e crescimento das plântulas de bambu que emergem no ano seguinte (LI et al., 2006KREBS, C.J. Ecological methodology. New York: Library of Congress, 1999. 620p.). A resposta integrada de ecossistemas florestais a esses eventos reprodutivos de bambus ainda não está bem entendida, devido, em parte, ao seu ciclo de vida longevo e particular e a sua complexa interação com múltiplos processos ecossistêmicos (MONTTI et al., 2011MONTTI, L. et al. Flowering, died-back and recovery of semelparous woody bamboo in the Atlantic Forest. Acta Oecologica, Paris, v.37, n.4, p.361-368, 2011a. Disponível em: <http://ac.els-cdn.com/S1146609X1100066X/1-s2.0-S1146609X1100066X-main.pdf?_tid=ac4600da-9b99-11e2-b859-00000aab0f6c&acdnat=1364909689_ae441f93f74c253fc24bbe74c0bea50e>. Acesso em: 18 nov. 2011. doi: 10.1016/j.actao.2011.04.004.
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a). Entretanto, é reconhecido que o tempo necessário à recuperação das populações de bambus, após a sua mortalidade sincrônica, é um importante determinante da dinâmica das florestas onde esses bambus estão presentes (JUDZIEWICZ et al., 1999JUDZIEWICZ, E.J. et al. American bamboos. Brittonia, New York, v.51, n.2, p.158, 1999. Disponível em: <http://link.springer.com/content/pdf/10.2307%2F2666622>. Acesso em: 23 nov. 2011. doi: 10.2307/2666622.
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).

No Brasil, há registros de diversas espécies de bambus, tanto nativos quanto exóticas. Dentre as espécies nativas, dispersas ao longo de todas as regiões brasileiras, destacam-se as popularmente conhecidas por taquara, taboca, jativoca, taquaruçu ou taboca-açu, conforme sua região de ocorrência. No sul do Brasil, os gêneros mais representativos são Merostachys, Guadua e Chusquea. O gênero Merostachys, conhecido vulgarmente como taquara, distribui-se desde a América Central até a Argentina, com o centro de diversidade no Brasil (SENDULSKY, 1992SENDULSKY, T. Merostachys burmani (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae), a new species from Brazil. Novon, Saint Louis, v.2 p.111-113, 1992.; SODERSTROM et al., 1998SODERSTROM, T.R. et al. Distribution patterns of neotropical bamboos. In: VANZOLINI, P.E.; HEYER, W.R. (Eds.). Proceedings of a workshop on neotropical distribution patterns. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 1998. p.121-157.; WATSON & DALLWITZ, 2011WATSON, L.; DALLWITZ, M.J. The grass genera of the world: descriptions, illustrations, identification. Disponível em: <http://delta-intkey.com>. Acesso em: out. 2011.
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). Das espécies brasileiras, 87% encontram-se distribuídas nas florestas montanas do leste e sudeste brasileiro e desempenham um papel ecológico importante nos ecossistemas em que se encontram, devido à sua influência sob a regeneração de espécies arbóreas (FARRELLY, 1984FARRELLY, D. The book of bamboo. San Francisco: Sierra Club Books, 1984. 352p.; SENDULSKY, 1995SENDULSKY, T. Merostachys multiramea (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae) and similar species from Brazil. Novon, Saint Louis, v.5 p.76-96, 1995.; LONDOÑO, 2001LONDOÑO, X. Evaluation of bamboo resource in Latin America. Beijing: INBAR, 2001. 30p.; QUATTROCCHI, 2006QUATTROCCHI, U. CRC world dictionary of grasses: common names, scientific names, eponyms, synonyms and etymology. Boca Raton: CRC, 2006. 640p.).

Dentre essas espécies de Merostachys que ocorrem no Brasil, em 2003, registrou-se o início de massivo florescimento e consequente mortalidade de touceiras de M. skvortzovii Send. em diversas localidades do sul do estado do Paraná e norte de Santa Catarina em região de Floresta Ombrófila Mista. Coleções conhecidas dessa espécie, de 1941, 1972-1974, sugeriam um ciclo de florescimento de 31-33 anos (SENDULSKY, 1995SENDULSKY, T. Merostachys multiramea (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae) and similar species from Brazil. Novon, Saint Louis, v.5 p.76-96, 1995.; SCHWARZBACH et al., 2008SCHWARZBACH, L.L.C. et al. Merostachys skvortzovii Sendulsky: aspectos botânicos e ecológicos - uma revisão. Visão Acadêmica, Curitiba, v.9, n.2, p.7-12, 2008. Disponível em: <http://www.visaoacademica.ufpr.br/v9n2/ARTIGO01.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2011.
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). Devido a esse longo intervalo de tempo, há poucos registros sobre comportamento dessa espécie após a floração sincrônica. De acordo com legislação do Estado de São Paulo, essa espécie está incluída na lista de espécies da flora ameaçadas de extinção (SÃO PAULO, 2004SÃO PAULO. Secretaria de Meio Ambiente. Resolução SMA 48: lista oficial das espécies da flora do Estado de São Paulo ameaçadas de extinção. 22 de setembro de 2004. 24p.).

Dessa forma, organizou-se o trabalho aqui apresentado de maneira a aproveitar o fenômeno biológico raro, de floração e frutificação maciças de M. skvortzovii em área de Floresta Ombrófila Mista. Especificamente, objetivou-se monitorar e avaliar a dinâmica de regeneração de M. skvortzovii a partir da quantificação da densidade de suas sementes no solo, associado ao recrutamento, padrão de distribuição, crescimento e mortalidade de plântulas. Avaliou-se também a possibilidade de influência das condições ambientais (pluviosidade e temperatura) sobre a dinâmica de regeneração de plântulas. Os resultados obtidos foram confrontados ao já reportado para a espécie e grupo taxonômico na literatura.

MATERIAL E MÉTODOS:

O estudo foi desenvolvido em remanescente de Floresta Ombrófila Mista (Indústrias Pedro N. Pizzatto, General Carneiro, Paraná; 26˚ 25′ S e 51˚ 18′ W; 1000m s.n.m.). Essa área engloba três tipos de solos: Cambissolo Álico, Associação solos Litólicos Álicos + Terra Rocha Estruturada Álica e Associação Terra Bruna Estruturada Álica + Cambissolo Álico (EMBRAPA, 1984EMBRAPA (EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA). Levantamento de reconhecimento dos solos do Estado do Paraná. Curitiba: EMBRAPA-SNLCS/SUDESUL/IAPAR, 1984. 414p.). O clima dessa região, segundo a classificação de Köppen, é caracterizado como Subtropical Úmido Mesotérmico (Cfb), cuja temperatura média é inferior a 22oC durante o mês mais quente, com verões frescos, invernos com ocorrência de geadas e sem estação seca (PARANÁ, 1987PARANÁ. Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento. Instituto de Terras, Cartografia e Florestas. Atlas do Estado do Paraná. Curitiba, 1987. 73p.). A cobertura vegetal original dessa área é classificada como Floresta Ombrófila Mista, também conhecida como Floresta com Araucária. Devido às diversas atividades antrópicas, essa cobertura vegetal encontra-se bastante reduzida, apresentando fragmentos em diferentes estádios sucessionais, intercalados por áreas de reflorestamento, principalmente de pinus, araucária e erva-mate (IBGE, 1992IBGE (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA). Manual técnico da vegetação brasileira. Rio de Janeiro: DEDIT/CDDI, 1992. 91p.).

Para a realização desta pesquisa, selecionaram-se duas clareiras que apresentavam tamanhos (aprox. 40mx40m) e situações de abertura do dossel similares, resultantes da morte de touceiras de taquara-lixa entre 2003-2005. O monitoramento da dinâmica de regeneração das plântulas ocorreu entre março e setembro de 2007. Para tanto, em cada clareira foi escolhido um ponto central de onde foram lançados dois transectos nos sentidos norte-sul e leste-oeste. Sobre esses transectos, foram alocadas 40 parcelas de 1mx1m, totalizando 80 parcelas em cada área. No censo inicial, registrou-se a presença, localização e mensurou-se a altura de todos os colmos vivos (plântulas) que haviam se desenvolvido na clareira após o evento de morte da touceira original. Na sequência, mensalmente, registrou-se o recrutamento (inserção de novos indivíduos), crescimento em altura e mortalidade de plântulas de M. skvortzovii nas parcelas. A altura foi medida com régua graduada a partir do ponto de inserção do colmo no solo. A homogeneidade das amostras foi avaliada a partir da comparação entre as variâncias das médias mensais obtidas para as variáveis consideradas, utilizando-se o Teste F em nível de 2,5%, conforme detalhado em BEIGUELMANBEIGUELMAN, B. Curso prático de bioestatística. Natal: FUNPEC, 2002. 254p. (202). O padrão espacial dos indivíduos amostrados foi avaliado pelo índice de dispersão de Morisita (Id), como proposto por KREBS (1999KREBS, C.J. Ecological methodology. New York: Library of Congress, 1999. 620p.), em associação à frequência de ocorrência da espécie nas parcelas amostradas.

De modo a não interferir na dinâmica de estabelecimento de plântulas, a análise do banco de sementes no solo foi realizada em outra clareira próxima e similar às avaliadas para dinâmica de regeneração de plântulas. Nesta, foram amostrados 12 pontos equidistantes em cada um dos eixos similares aos estabelecidos nas parcelas anteriormente descritas (n=24). Para a coleta de solo, utilizou-se anel de metal (0,5mx0,5m), englobando-se a serapilheira e a camada do solo imediatamente inferior até a profundidade de 0,5m (outubro/2006). As amostras coletadas foram acondicionadas em sacos de papel e transportadas para a estufa do laboratório OIKOS na Universidade Federal do Paraná, onde foram pesadas antes e depois da secagem. O material seco foi destorroado em peneira (malha 6mm), para quantificação das sementes de M. skvortzovii, com auxílio de lupa e pinça. A quantidade média de sementes obtida, considerando os 24 pontos amostrais (6m2), foi extrapolada para número de sementes por hectare.

Mensalmente, obteve-se, junto ao SIMEPAR, a média pluviométrica e de temperatura registradas pela estação meteorológica mais próxima da área de estudo, localizada no município de União da Vitória. A influência das médias climáticas sobre o crescimento, recrutamento e mortalidade de plântulas, foi avaliada pelo coeficiente de correlação de Spearman. Nessa análise, sabendo que algumas plantas apresentam respostas fenológicas atrasadas a determinado estímulo ambiental (MARQUES & OLIVEIRA, 2004MARQUES, M.C.M.; OLIVEIRA, P.E.A.M. Fenologia de espécies do dossel e do sub-dossel de duas Florestas de Restinga na Ilha do Mel, sul do Brasil. Revista Brasileira de Botânica, São Paulo, v.27, n.4, p.713-723, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-84042004000400011>. Acesso em: 16 nov. 2011. doi: 10.1590/S0100-84042004000400011.
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), utilizaram-se dados retroativos em até três meses do início do monitoramento.

RESULTADOS E DISCUSSÃO:

Registrou-se um total de 124 sementes de M. skvortzovii em 6m2 (n=24x0,25m2), o que representaria um total de 207 mil sementes ha-1. Em média, evidenciaram-se 5,17±4,50 sementes por unidade amostral. Observou-se grande variabilidade na quantidade de sementes por unidade amostral, evidenciando-se densidade crescente do centro em direção ao limite externo (borda) da clareira. No total, foram registradas 544 plântulas de M. skvortzovii (NA=144; NB=400; 80m2), o que corresponde a 34 mil plântulas ha-1 (NA=18 mil ha-1; NB=50 mil ha-1) (Figura 1). A densidade média de plântulas por parcelas foi distinta entre as clareiras avaliadas (DMA=1,86±2,71 plântulas m-2; s2=7,36; DMB=5,00±4,93 plântulas m-2; s2=24,35) (Teste F2,5%). A frequência absoluta de plântulas nas parcelas também foi distinta entre essas (FAA= 50%; FAB=92,5%; n=80 parcelas). Em ambas as clareiras, observou-se distribuição agrupada dos indivíduos amostrados (IdA=2,55; IdB=1,77), com padrão crescente do centro em relação à borda da clareira.

Figura 1:
Densidade total, recrutamento, mortalidade e crescimento de plântulas registradas no monitoramento de regeneração de M. skvortzovii, em duas áreas amostrais (General Carneiro, Paraná, março-setembro/07).

As médias mensais de recrutamento (xA=10,71±8,24 plântulas; s2=67,90; xB=11,67±3,20; s2=10,27), assim como de crescimento em altura (xA=0,72±0,18cm; s2=0,03; xB=0,74±0,13cm; s2=0,02) e mortalidade (xA=4,14±1,21 plântulas; s2=1,48; xB=20±6,87; s2=47,20), foram também significativamente diferentes em ambas as clareiras (Teste F2,5%) (Figura 1). Registrou-se crescimento populacional diferenciado em ambas as clareiras. Na clareira A, evidenciou-se, ao longo do monitoramento, taxa decrescente de inclusão de plântulas, com taxa de mortalidade mensal razoavelmente homogênea. Na clareira B, evidenciou-se taxa crescente de inclusão de plântulas e taxas mensais de mortalidade mais altas e heterogêneas, comparativamente à clareira A (Figura 1). Não se detectou correlação significativa entre as variáveis biológicas observadas (crescimento, recrutamento e mortalidade) e a variabilidade de pluviosidade e temperatura registradas no período de monitoramento ou mesmo retroativa em até três meses antes deste.

O arranjo das densas touceiras com colmos pendentes, com inflorescências terminais e arqueados em direção oposta ao centro da touceira parece ser o principal determinante do padrão de distribuição de sementes no solo, registrado para M. skvortzovii. Esse padrão, com densidade crescente em direção à borda da clareira, também foi descrito para outras espécies de bambus (OLMOS, 1990OLMOS, F. Frutificação de Chusquea meyeriana Rupr. (Poaceae, Bambusoideae) e dinâmica populacional de aves granívoras e roedores em área de Mata Atlântica. Campinas: UNICAMP, 1990. 71p. ; GUILHERME & RESSEL, 2001GUILHERME, F.A.G.; RESSEL, K. Biologia floral e sistema de reprodução de Merostachys riedeliana (Poaceae: Bambusoideae). Revista Brasileira de Botânica, São Paulo, v.24, n.2, p.205-211, 2001.). No entanto, a quantidade de sementes registrada nos bancos de sementes das duas clareiras avaliadas foi bastante inferior à potencial produção de sementes descrita para bambus e taquaras. GUILHERME & RESSEL (2001GUILHERME, F.A.G.; RESSEL, K. Biologia floral e sistema de reprodução de Merostachys riedeliana (Poaceae: Bambusoideae). Revista Brasileira de Botânica, São Paulo, v.24, n.2, p.205-211, 2001.) estimaram produção para Merostachys riedeliana em mais de 30 milhões de sementes/ha-1 e GONZÁLEZ & DONOSO (1999GONZÁLEZ, M.E.; DONOSO, C. Producción de semillas y hojarasca en Chusquea quila (Poaceae: Bambusoideae), posterior a su floración sincrónica en la zona centro-sur de Chile. Revista Chilena de Historia Natural, Santiago, v.72, n.2, p.169-180, 1999.) estimaram produção para Chusquea quila em mais de 195 milhões de sementes ha-1. Há também registros de Merostachys spp., produzindo camadas de sementes com 12 a 15cm de espessura (OLMOS, 1990OLMOS, F. Frutificação de Chusquea meyeriana Rupr. (Poaceae, Bambusoideae) e dinâmica populacional de aves granívoras e roedores em área de Mata Atlântica. Campinas: UNICAMP, 1990. 71p. ).

Um dos motivos que pode ter determinado a baixa densidade registrada na área estudada pode ter sido a alta mortalidade devido às baixas temperaturas do inverno, após a floração, dado que as sementes de espécies gregárias de bambus tropicais e subtropicais não apresentam dormência (BELLAIRS et al., 2008BELLAIRS. A tropical, gregariously semelparous bamboo shows no seed dormancy. Biotropica, Malden, v.40, n.1, p.28-31, 2008. Disponível em: <http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.1744-7429.2007.00336.x/pdf>. Acesso em: 5 dez. 2012. doi: 10.1111/j.1744-7429.2007.00336.x.
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). LI et al. (2006LI, D.Z. et al. Simultaneous flowering of umbrella bamboo (Fargesia murieliae) at its native home in Central China. Journal of Forestry Research, Beijing, v.17, n.4, p.293-297, 2006. Disponível em: <http://www.paper.edu.cn/.../1007-662X(2006)04-0293>. Acesso em: 18 nov. 2011. doi: 10.1007/s11676-006-0067-4.
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) observou uma mortalidade de até 85% nas sementes do bambu Fargesia murieliae, entre um inverno e outro. Outro fator que pode ter determinado essa baixa densidade é a predação das sementes, principalmente devido ao fenômeno das "ratadas". Após a frutificação sincrônica, as touceiras de Merostachys spp. produzem grandes quantidades de sementes (OLMOS, 1996OLMOS, F. Satiation or deception? Mast-seeding Chusquea bamboos, birds and rats in the Atlantic Forest. Revista Brasileira de Biologia, São Carlos, v.56, p.391-401, 1996.; OLMOS et al., 1993OLMOS, F. et al. Habits of the southern bamboo rat Kannabateomys amblyonyx (Rodentia, Echimyidae) in Southeastern Brazil. Mammalia, Paris, v.57, p.325-333, 1993. Disponível em: <http://www.degruyter.com/dg/viewarticle/j$002fmamm.1993.57.issue-3$002fmamm.1993.57.3.325$002fmamm.1993.57.3.325.xml;jsessionid=6C89A00CF9592DC89AA00E736F5C7D21>. Acesso em: 5 nov. 2011. doi: 10.1515/mamm.1993.57.3.325.
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), aumentando a disponibilidade de alimento. Esse processo não foi diretamente verificado na área estudada. Entretanto, registrou-se, durante 2005, aumento no número de ratos silvestres (Oligoryzomys spp. e Akodon spp.) em outras regiões do Paraná, com alta incidência de M. skvortzovii (LIEBSCH & REGINATO, 2009LIEBSCH, D.; REGINATO, M. Florescimento e frutificação de Merostachys skvortzovii Sendulsky (taquara-lixa) no estado do Paraná. Iheringia, Série Botânica, Porto Alegre, v.64, n.1, p.53-56, 2009. Disponível em: <http://www.fzb.rs.gov.br/publicacoes/iheringia-botanica/Ih64-1-p053-056.pdf>. Acesso em: 26 set. 2011.
http://www.fzb.rs.gov.br/publicacoes/ihe...
). Esse crescimento na população de roedores após o evento de floração já havia sido também documentado por PEREIRA (1941PEREIRA, C. Sobre as "ratadas" no sul do Brasil e o ciclo vegetativo das taquaras. Arquivos do Instituto de Biologia de São Paulo, São Paulo, n.12, p.175-195, 1941.) e GIOVANNONI et al. (1946GIOVANNONI, M. et al. Sobre as "ratadas" do primeiro planalto paranaense. Arquivos de Biologia e Tecnologia, Curitiba, n.1, p.185-195, 1946.), em regiões próximas à área estudada. CESTARI & BERNARDI (2011CESTARI, C.; BERNARDI, C.J. Predation of the buffy-fronted seedeater Sporophila frontalis (Aves: Emberizidae) on Merostachys neesii (Poaceae: Babusoideae) seeds during a masting event in the Atlantic forest. Biota Neotroprica, Campinas, v.11, n.3, n.p., 2011. Disponível em: <http://www.biotaneotropica.org.br/v11n3/pt/fullpaper?bn00711032011+en>. Acesso em: 22 nov. 2011. doi: 10.1590/S1676-06032011000300033.
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) também relatam que a intensa atividade predatória de aves, concomitante à dispersão de sementes afeta incisivamente e negativamente sobre a dinâmica de regeneração M. neesii na Floresta Atlântica.

Esperava-se que a dinâmica de regeneração das plântulas tivesse alguma correlação com a variação regional de pluviosidade e temperatura, uma vez que, tanto a germinação quanto o crescimento, são geralmente afetados pelas condições ambientais (CATOVSKY & BAZZAZ, 2000CATOVSKY, S.; BAZZAZ, F.A. The role of resource interactions and seedling regeneration in maintaining a positive feedback in hemlock stands. Journal of Ecology, London, n.88, p.100-112, 2000. Disponível em: <http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1046/j.1365-2745.2000.00428.x/pdf>. Acesso em: 25 nov. 2011. doi: 10.1046/j.1365-2745.2000.00428.x.
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). Contrariamente ao esperado, essa relação não foi evidenciada na área estudada. Entretanto, a diferença observada no que concerne ao recrutamento, crescimento e mortalidade de plântulas em ambas as clareiras explicita que fatores microambientais (luz, umidade do solo, p.ex.) podem ser preponderantes para determinar o sucesso ou não do recrutamento e estabelecimento das plântulas de M. skvortzovii. As clareiras geradas pela morte de bambus e taquaras são espaços de alta complexidade físico-estrutural, configurados por grande amplitude de formas, tamanhos e orientação da entrada de luz, que resultam em elevada complexidade microambiental (BUDKE et al., 2010BUDKE, J.C. et al. Bamboo dieback and tree regeneration responses in a subtropical forest of South America. Forest Ecology and Management, Fort Collins, v.260, n.1-3, p.1345-1349, 2010. Disponível em: <http://ac.els-cdn.com/S0378112710004123/1-s2.0-S0378112710004123-main.pdf?_tid=b062b3ae-9b92-11e2-86fb-00000aab0f27&acdnat=1364906690_ac73edd8abb6ec218c1201b56482ee47>. Acesso em: 2 dez. 2011. doi: 10.1016/j.foreco.2010.07.028.
http://ac.els-cdn.com/S0378112710004123/...
). Para muitas espécies, o recrutamento e estabelecimento de plântulas são diretamente dependentes dessas condições microambientais específicas (BROWN, 1993BROWN, N. The implications of climate and gap microclimate for seedling growth conditions in a Bornean lowland rain forest. Journal of Tropical Ecology, Cambridge, v.9, n.2, p.153-168, 1993. Disponível em: <http://journals.cambridge.org/action/displayIssue?decade=1990&jid=TRO&volumeId=9&issueId=02&iid=5247684>. Acesso em: 5 dez. 2011. doi: 10.1017/S0266467400007136.
http://journals.cambridge.org/action/dis...
).

Por outro lado, a maior densidade de plântulas, devido ao microambiente favorável, parece determinar valores mais altos de mortalidade, resultada de controle populacional denso-dependente, como o observado para na clareira B (GUNTON & KUNIN, 2009GUNTON, R.M.; KUNIN, W.E. Density-dependence at multiple scales in experimental and natural plant populations. Journal of Ecology, Londres, v.97, n.3, p.567-580, 2009. Disponível em: <http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.1365-2745.2007.01226.x/full>. Acesso em: 2 dez. 2011. doi: 10.1111/j.1365-2745.2009.01492.x.
http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.11...
). No entanto, apesar do crescimento populacional diferenciado, em ambas as clareiras estudadas, registrou-se efetiva capacidade de produção e manutenção de estoque de plântulas de M. skvortzovii, promovendo a sua permanência na área. Como esperado, identificou-se, para as plântulas padrão, similar ao detectado para as sementes, com maior densidade destas na borda das clareiras. Esse grupo de plantas se espalha rapidamente através de rizomas paquimorfos, formando densas touceiras com profusão de colmos pendentes (CAMPANELLO et al., 2007CAMPANELLO, P.I. et al. Tree regeneration and microclimate in a liana and bamboo-dominated semideciduous Atlantic Forest. Forest Ecology and Management, Fort Collins, v.252, n.1-3, p.108-117, 2007. Disponível em: <http://ac.els-cdn.com/S0378112707004744/1-s2.0-S0378112707004744-main.pdf?_tid=034d4624-9b93-11e2-ba39-00000aab0f6b&acdnat=1364906829_b9e6e5b56951a0f0509a443e724e58bf>. Acesso em: 5 dez. 2011. doi: 10.1016/j.foreco.2007.06.032.
http://ac.els-cdn.com/S0378112707004744/...
). Dada a sua localização mais densa nos limites externos da clareira, uma das implicações possíveis desse padrão de recolonização e crescimento seria o aumento da área de ocupação atual da espécie, resultado em um ciclo de distúrbio autoperpetuado. Como consequência possível dessa dinâmica, cita-se a não facilitação do estabelecimento de plântulas de espécies arbóreas (MONTTI, 2011MONTTI, L. et al. Understory bamboo flowering provides a very narrow light window of opportunity for canopy-tree recruitment in a neotropical forest of Misiones, Argentina. Forest Ecology and Management, Fort Collins, v.262, n.8, p.1350-1369, 2011b. Disponível em: <http://ac.els-cdn.com/S0378112711003914/1-s2.0-S0378112711003914-main.pdf?_tid=f27f87b0-9b99-11e2-aaf7-00000aab0f01&acdnat=1364909807_5f74d926d0389e66d641190bdd43d072>. Acesso em: 02 dez, 2011. doi: 10.1016/j.foreco.2011.06.029.
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b) e consequente redução na densidade e área basal de espécies arbóreas que coexistem com a taquara (GRISCOM & ASHTON, 2006GRISCOM, B.W.; ASHTON, P.MS. A self-perpetuating bamboo disturbance cycle in a neotropical forest. Journal of Tropical Ecology, Cambridge, v.22, n.5, p.587-597, 2006. Disponível em: <http://journals.cambridge.org/download.php?file=%2F1222_57703FBB9102813FCB04E4161B314297_journals__TRO_TRO22_05_S0266467406003361a.pdf&cover=Y&code=93e94fb2382b393d4579326df0a7aa58>. Acesso em: 22 nov. 2011. doi:10.1017/S0266467406003361.
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), determinando efeitos em longo prazo sobre a estrutura e funcionamento do ecossistema florestal.

CONCLUSÃO:

Em termos gerais, pode-se inferir que a taquara-lixa apresentava a capacidade de recolonizar as áreas abertas após o evento sincrônico de mortalidade, sendo que as características de cada clareira podem influenciar essa ocupação. A concentração das plântulas nas bordas das clareiras pode determinar a ampliação da área de ocupação da espécie no local de estudo. Entretanto, somente o monitoramento a médio e longo prazo das clareiras geradas pela morte da taquara-lixa permitirá compreender melhor o ciclo de vida dessa espécie e seu efetivo papel no fechamento dessas clareiras e dinâmica da floresta que a abriga.

AGRADECIMENTOS

Às Indústrias Pedro N. Pizzatto, General Carneiro, Paraná, pela disponibilidade da área para a pesquisa e apoio logístico.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul 2015

Histórico

  • Recebido
    02 Dez 2011
  • Aceito
    02 Abr 2013
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