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Projeto 500: desafios da inclusão de estudantes negros numa universidade pública de pesquisa nos Estados Unidos, 1968-20181 1 Essa pesquisa foi desenvolvida no ano acadêmico 2016-2017, ocasião em que a autora foi Visiting Scholar noLemann Institute for Brazilian Studies da University of Illinois Urbana-Champaign. Ela agradece ao então diretor,Professor Jerry Dávila, pela excelente acolhida e ao professor Glen Goodman por seus comentários enriquecedores. 2 2 Normalização, preparação e revisão textual: Mônica Silva (TIkinet) – revisao@tikinet.com.br

Resumo

O artigo analisa uma política de inclusão de estudantes negros em uma importante universidade pública de pesquisa nos Estados Unidos, desde o período em que foi implementada, através do Projeto 500, no final da década de 1960, até os dias atuais. Levam-se em conta relações raciais e peculiaridades do sistema de educação superior norte-americano na contextualização dessa política de ação afirmativa. Examina-se o modo como um grupo historicamente discriminado em instituições de educação superior que formam a elite branca do país questiona não apenas a organização interna da instituição, mas também a relação universidade e sociedade.

Palavras-chave
ação afirmativa; diversidade; Projeto 500; universidade; relações raciais

Abstract

This article analyses an inclusion policy of black students in an important public research university of the United States since its implementation, through the Project 500, at the end of the 1960's until today. It takes into account race relations and peculiarities of the North American higher education system in the contextualization of this affirmative action policy. It examines how a group historically discriminated in higher education institutions that train the white elite questions not only the internal organization of the institution, but also the relation between university and society.

Keywords
affirmative action; diversity; Project 500; university; race relations

Introdução

Uma política de inclusão de estudantes negros3 3 Enquanto no Brasil a palavra preto deu lugar a negro entre os militantes, por exemplo, do Movimento Negro Unificado (MNU), nos EUA deu-se o inverso: negro (negro) tornou-se um termo negativo enquanto black (preto) assumiu conotação positiva, devido ao Black Power. Neste artigo, black será traduzido como negro ou afro-americano. em universidade pública de pesquisa predominantemente branca nos Estados Unidos da América (EUA) é o objeto de análise deste artigo. Inclui-se um acompanhamento a partir do período em que foi implementada, no ano acadêmico de 1968-1969 até os dias atuais. Para contextualizar a implementação dessa política ao longo de meio século, levam-se em conta as relações raciais, o protagonismo dos estudantes negros nos campi universitários, bem como as peculiaridades do sistema de educação superior nos EUA.

Esta pesquisa, desenvolvida entre 2016 e 2017 na Universidade de Illinois em Urbana-Champaign (UIUC), baseia-se em diferentes estratégias metodológicas articuladas: análise de material bibliográfico; consulta ao site da universidade, a arquivos e registros fotográficos; elaboração de quadro a partir de dados levantados; participação em atividades que envolviam temas de interesse da comunidade afro-americana (conferências, fóruns, seminários, reuniões, espetáculos de arte bem como atividades abertas ao público do Bruce D. Nesbitt African American Cultural Center).

No final da década de 1960, a UIUC aumentou significativamente o número de alunos afro-americanos em seu campus, através de uma política de ação afirmativa conhecida como Projeto 500. Essa política foi uma das maiores entre as universidades norte-americanas em número de alunos inicialmente beneficiados. Com isso, alcançou importante visibilidade nacional, dividindo apoiadores e críticos. Sua trajetória de meio século, bem documentada, possibilita uma visão comparativa das políticas de inclusão de outros grupos que atualmente fazem parte de minorias étnicas e raciais nos EUA.

Essa histórica experiência, ao longo de cinco décadas, merece ser conhecida no Brasil, onde se procura democratizar a universidade através da inclusão de segmentos até então sub-representados, como é o caso de estudantes pobres e negros.

Universidade de Illinois: passado e presente

A Universidade de Illinois, universidade pública estadual, é uma das 37 instituições de educação superior que tiveram origem nos land-grant colleges4 4 Os land-grant colleges se originaram de doação de terras do governo federal para que cada estado usasse tal recurso na criação de uma universidade estadual voltada ao atendimento das necessidades mais práticas da região. . Criada em 1867, ela até hoje enaltece a influência de sua origem, que se faz presente na missão de solucionar problemas regionais e desenvolver a ciência e a tecnologia. Vinte e um laureados com o Prêmio Nobel passaram pela UIUC como professores ou estudantes. Sua biblioteca é a terceira maior do país.

Dos três campi sob sua administração, o de Urbana-Champaign é o mais antigo e o de maior relevância em termos de pesquisa. Em 2015, possuía 44.087 alunos (32.878 no bacharelado; 964 em cursos profissionais e 10.245 na pós-graduação).

Os alunos da UIUC dispõem de acomodações para morar no campus, esperando-se que tenham uma vivência de imersão profunda em sua Alma Mater5 5 Alma Mater, representada por uma figura feminina, traduz a atmosfera espiritual que marca, ao longo da vida, todos aqueles que passam pelo mesmo college ou universidade. . Para atingir tal objetivo, a universidade conta com 23 residências, que acomodam 8.550 discentes do bacharelado. Além disso, cerca de 6 mil graduandos moram em 16 casas privadas com certificação e 62 Greek Houses, fraternidades6 6 Fundadas a partir da segunda metade do século XIX, são grupos exclusivos de estudantes que residem em casas que podem ser identificadas por letras gregas em suas fachadas. Elas formam o Sistema Grego, que as une nacionalmente e funciona como uma rede importante de contatos. e sororidades, originalmente só para estudantes do sexo feminino (Oliven, 2005Oliven, A. (2005). A marca de origem: comparando Colleges norte-americanos e faculdades brasileiras. Cadernos de Pesquisa, 35(125), 111-135.). Calouros que desejam residir em outros espaços não certificados pela universidade devem solicitar dispensa dessa exigência. A UIUC possui também apartamentos e residências onde vivem pós-graduandos, inclusive alguns professores.

Grande parte dos estudantes não trabalha, dedicando-se integralmente aos estudos e atividades paralelas dentro da universidade. Existem mais de mil organizações de estudantes registradas, como coligações, sociedades honorárias e times esportivos. Para a instituição, viver no campus significa conviver com amigos, estar próximo das salas de aula, ter acesso aos recursos facilitadores e sentir-se conectado com a universidade.

Projeto 500

A UIUC concebeu um plano para incluir, a partir do início do ano letivo de 1968, 500 estudantes negros e com desvantagem social através do Special Education Oportunity Program (SEOP), cujo objetivo era recrutar e apoiar estudantes afro-americanos e de baixa renda. Esse programa veio a ser conhecido como Projeto 500, que surgiu respondendo a pressões para democratizar a educação superior num período de profunda tensão na sociedade norte-americana.

Ele se tornou um dos maiores programas nos EUA a beneficiar estudantes negros em uma universidade pública predominantemente branca. Para liderá-lo, foi contratado como diretor Clarence Shelley, afro-americano de fora do estado, com reconhecido trabalho em atrair e manter minorias em universidades (Williamson-Lott, 2017Williamson-Lott, J. A. (2017). The Campaign to Diversify the University. In F. Hoxie (Ed.), University of Illinois: engine of innovation. Urbana: University of Illinois Press.).

Além de ambicioso, o projeto era único na intensidade da participação estudantil. Nesse processo foi fundamental a atuação da Black Students Association (BSA), recentemente criada. Universitários, sobretudo os ligados à BSA, visitavam voluntariamente escolas altamente segregadas para divulgar a nova política da universidade. Dentro da definição de estudantes com desvantagens havia alunos brancos ou porto-riquenhos, mas a grande maioria era afro-americana.

Como a população do estado de Illinois tendia a ver estudantes negros como sujeitos menos qualificados que tiravam o lugar de brancos mais preparados, os administradores da UIUC procuravam ser cautelosos ao se referir ao projeto, visando não contrariar o governo estadual, mantenedor da universidade. Argumentavam que outras instituições de educação superior estavam se diversificando, o que enriquecia a experiência dos estudantes tradicionais; asseguravam que a universidade não podia comprometer seu alto padrão acadêmico; e salientavam questões ligadas à desigualdade social, em vez da discriminação racial.

Era grande a pressão por maiores oportunidades educacionais, acentuada pelo baby boom, elevação da taxa de natalidade após a II Guerra Mundial; jovens que nasceram naquele período estavam querendo entrar na universidade. Além disso, universitários geralmente eram poupados da convocação para a Guerra no Vietnã, na qual os EUA estavam envolvidos. As universidades, enquanto microcosmo da sociedade, refletiam o clima de tensões sociais e raciais no país.

Do ponto de vista dos jovens afro-americanos, a segregação era uma realidade, mesmo tendo perdido a chancela legal. Na UIUC, os poucos estudantes negros eram barrados em restaurantes, barbearias, times esportivos e associações de alunos brancos, entre outros lugares.

A vivência universitária dos negros em instituições predominantemente brancas nos EUA durante a segregação legal acarretava sofrimentos. Isto pode ser atestado em relatório encaminhado ao reitor Willard da UIUC, em 23 de fevereiro de 1938, baseado num levantamento sobre a situação dos universitários negros em 10 universidades7 7 Relação das universidades pesquisadas: Chicago, Indiana, Illinois, Iowa, Michigan, Minnesota, Northwestern, Ohio, Purdue, Wisconsin. .

No campus de Urbana-Champaign, a resposta à primeira questão, “Você tem um ‘problema negro’ (‘a negro problem’) entre os seus estudantes?”, foi “Sim”, sendo apontado principalmente alojamento. É interessante que o problema mencionado entre aspas era negro e não branco. O final do relatório resume a situação em Illinois:

Nossos negros estão numa situação difícil. Essa comunidade se situa suficientemente ao norte do país para dar a eles um sentimento de independência e igualdade, no entanto, suficientemente ao sul para nos dar muitos estudantes brancos que não pensam da mesma maneira. Eles não têm uma vida fácil. A Universidade geralmente lhes dá os mesmos privilégios dos estudantes brancos, mas a comunidade não lhes dá e provavelmente não dará [ênfase adicionada]8 8 Citação extraída do Arquivo 020901 (caixa 64, p. 6), disponível no acervo da UIUC. .

Três décadas depois, o assassinato de Martin Luther King Jr.9 9 Coube a Robert Kennedy, irmão do ex-presidente John Kennedy, assassinado em 1963, anunciar a uma multidão de negros em Indianapolis o assassinato de Martin Luther King. Dois meses depois, na campanha para ser indicado como candidato do Partido Democrata à presidência da república, Bobby Kennedy também foi assassinado. , em 4 de abril de 1968, só fez agravar as tensões raciais que já vinham de longa data. Em reação à morte do líder negro, Chicago, maior cidade do estado de Illinois, viveu nove dias de intensos protestos, com um saldo de nove mortos e 500 feridos. Prédios inteiros foram incendiados. Nesse contexto, o Projeto 500 ganha relevância ainda maior em um ano especialmente conturbado nos EUA.

A chegada ao campus de 565 novos estudantes10 10 Professores envolvidos no projeto imaginavam que seria difícil, no começo, atrair 500 novos estudantes, número que foi ultrapassado já no primeiro ano, em 1968. Para uma descrição minuciosa dos acontecimentos que precederam o Projeto 500 e os primeiros passos para sua implementação, ver Williamson (2003, pp. 56-80). ligados ao SEOP, no início do ano letivo de 1968, afetou também parte da comunidade negra existente no campus. Alguns estudantes mais antigos não queriam ser confundidos com os calouros, que possuíam menor capital cultural e dependiam de um programa de apoio especial para manter-se na universidade (Williamson, 2003Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press.).

Um período de adaptação, antes do início das aulas, foi oferecido aos novos estudantes ligados ao SEOP, convidados a passar uma semana na UIUC. Eles foram alojados em confortáveis residências estudantis dentro do campus que, durante o período de férias, estavam vazias. A universidade viveu então um clima de confraternização e tranquilidade, que mudou drasticamente com a chegada dos estudantes regulares brancos.

Episódio dramático e desdobramentos

No dia 7 de setembro, os novos estudantes do SEOP foram informados que deveriam deixar o lugar onde estavam provisoriamente acomodados e irem para residências precárias, fora do campus, cedendo lugar a estudantes regulares que estavam para chegar. A UIUC mantém a tradição dos antigos colleges criados no período colonial, onde os alunos residiam e os professores estavam in loco parentis, em lugar dos pais. Essa tradição de os alunos morarem em residências ligadas ao campus encarece as taxas pagas pelos estudantes, inclusive nas instituições públicas que costumam cobrar matrículas em seus cursos.

Provenientes de famílias pobres, em sua maioria, os recém-chegados foram informados que a ajuda financeira que esperavam não estava disponível. Eles possivelmente teriam que conseguir empréstimos ou trabalhar para custear seus estudos. Vinte alunas que estavam em residências femininas se recusaram a sair até que a situação de moradia fosse resolvida. Com base em negociações, foi-lhes dado mais um dia para permanecer na acomodação provisória.

As estudantes deixaram as residências na noite de 8 de setembro, permanecendo em frente ao prédio histórico da Illini Union, onde acontecia uma reunião entre as lideranças estudantis e a administração da universidade. Um grupo estimado em cerca de 100 pessoas, formado por estudantes e membros da comunidade negra da cidade, associou-se às universitárias e, ao começar a chover, entrou no prédio que fechava à meia-noite. O fato foi comunicado à administração, que procurou uma solução junto com representantes da BSA, mas não chegaram a um acordo.

Às duas horas da madrugada, algumas estudantes já tinham se retirado, porém a maioria permaneceu, por motivos variados: receio de sair tão tarde, solidariedade a colegas, pressão para que ficassem, cansaço e desinformação sobre as consequências que poderiam advir de tal atitude. Os administradores entraram em contato com o reitor e, receosos da repercussão no estado, deliberaram chamar a polícia para evacuar o prédio, ocasião em que foram presos os que tinham permanecido no local. O campus presenciou uma rebelião estudantil no dia 10 de setembro. O balanço desses acontecimentos foi um saldo de cerca de 250 detidos acusados de manifestações não autorizadas e incitação à desordem no campus. Entre eles, mais de 200 implicados eram calouros do SEOP. Devido ao grande número, os estudantes foram levados para o Memorial Stadium (Williamson, 2003Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press.).

O incidente na UIUC teve ampla repercussão nacional. A imprensa de Chicago publicou dados inflacionados com relação aos prejuízos da ocupação. Embora posteriormente corrigidas pela Universidade de Illinois, tais informações levaram muitos pais de estudantes, preocupados com o futuro de seus filhos, a se posicionar contra as manifestações. A universidade enviou carta procurando tranquilizá-los: seus filhos estavam matriculados, assistindo aulas e recebendo assistência legal.

O jornal da BSA apontou questões financeiras e burocráticas como principais causas do descontentamento dos estudantes. Relatório sobre a ocupação do prédio da universidade registrou a presença de pessoas externas ao campus, envolvidas na destruição de propriedade. A BSA no entanto, não quis “dividir sua lealdade” e “dedo-durar” membros da comunidade negra local. Ela assegurou aos administradores que todos os atos dos participantes no confronto, eram atos coletivos de uma frente unida contra o racismo da universidade (Williamson, 2003Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press., p. 91).

Tal episódio radicalizou a vida no campus. Estudantes brancos criticavam o ocorrido, alguns se referindo aos novos universitários como os 500 Privilegiados. Ao mesmo tempo, vários grupos locais e nacionais ofereceram apoio aos estudantes negros. Os universitários presos foram liberados, sob pagamento de fiança, com a ajuda da comunidade negra de Champaign, e em 1970 foram retiradas as queixas contra eles. O resultado desses dias tumultuados foi o aumento do número de membros da BSA, que redefiniu seu papel político na UIUC. Ela reafirmou sua conexão com o Black Power (Poder Negro) e com o Black Campus Movement (Movimento Negro do Campus) influenciados pelo marxismo e pelo pan-africanismo.

Metamorfose do negro em preto

Na UIUC, a BSA passa então a definir blackness (negritude) como expressão positiva em sintonia com o Poder Negro e o Movimento Negro do Campus. O Poder Negro promovia o reconhecimento e orgulho da herança da cultura africana, fortalecia um senso de comunidade, definia seus próprios objetivos e incentivava o controle de suas próprias instituições através do fortalecimento da união entre os negros (Williamson-Lott, 2006Williamson-Lott, J.A. (2006). Reform in the Black Power Era. In V. Burton, (Ed.). Remembering Brown at Fifty: the University of Illinois Commemorates Brown v. Board of Education. Urbana: University of Illinois Press., p. 309).

O Black Campus Movement foi uma organização de abrangência nacional que emergiu em 1965 e declinou em 1972, distinguindo-se de outros movimentos negros por centrar-se na reforma da educação superior. Um de seus objetivos principais era estabelecer uma experiência de educação relevante, baseada na valorização de uma literatura afro-americana e terceiro-mundista que lhes desse instrumentos para mudar a sociedade. Seriam necessárias alterações nos campi.

Inicialmente, demandavam mudança curricular. O currículo eurocêntrico das universidades predominantemente brancas era o único por elas considerado legítimo, o que o Movimento Negro do Campus via como Estudos Brancos ou máscara de branquidade.

Em segundo lugar, criticavam a tradicional ideia de que a mobilidade social de um afro-americano serviria de modelo e abriria as portas das instituições superiores para as novas gerações de estudantes negros, o que era referido como “altruísmo vertical”. Esse modelo de mobilidade individual afastava os estudantes negros de suas comunidades em termos econômicos, políticos e culturais. Os militantes do Movimento Negro do Campus se conectavam melhor com o altruísmo horizontal, de base, ligado à comunidade. Para isso seria necessário destruir a escada institucional que privilegiava a mobilidade individual.

Como terceiro tópico apontavam que, embora o número de estudantes negros em universidades brancas tenha aumentado após a II Guerra Mundial, estes alunos, além de serem exceção, permaneciam excluídos de várias atividades, e havia poucos professores negros. Por tais razões, eles desejavam mais do que ser exceção nas universidades que formam a elite; demandavam a padronização da inclusão (Rogers, 2012Rogers, I. (2012). The Black Campus Movement: black students and the racial reconstruction of higher education, 1965-1972. New York: Palgrave Macmillan.).

A BSA na UIUC era crítica à academia que encorajava o afastamento dos universitários negros das massas oprimidas. O Movimento pelos Direitos Civis passou a ser percebido como liderado por liberais burgueses, cujas conquistas mantinham a supremacia branca nas esferas de poder e prestígio, bem como nas universidades de elite, as quais continuavam hostis e indiferentes às necessidades da grande maioria da população negra dos EUA. Estes liberais representavam a geração mais velha, acomodada. A nova geração via-se como uma frente unida contra o sistema em que seus pais tinham procurado se ajustar. Negro passou a ser um termo negativo; era preciso matar o Negro com influência branca, para que o Black pudesse florescer. Os estudantes afro-americanos sentiam-se revolucionários, não reformistas.

Lideranças negras rejeitavam a aproximação dos estudantes negros com brancos. Durante o Movimento dos Direitos Civis, até o início dos anos 1960, era comum brancos filiados à Students for a Democratic Society (Estudantes para uma Sociedade Democrática) participarem de protestos favoráveis à integração racial. No final da década de 1960, estudantes brancos foram excluídos de atividades lideradas por afro-americanos. Os universitários cada vez mais se dividiam por cor. As fronteiras raciais se fortaleciam e se fechavam.

Na UIUC, o incidente de detenção dos estudantes em setembro de 1968, somado à influência de movimentos mais radicais fora do campus, que se fortaleceram após o assassinato de Martin Luther King Jr. e a revalorização da figura do líder negro Malcom X, levou a BSA a assumir uma definição de identidade negra cada vez mais restrita11 11 Martin Luther King Jr. e Malcom X, assassinado em 1965, lutaram contra o racismo e a supremacia branca. O primeiro defendia a integração entre brancos e negros através da política de não violência, ao passo que o segundo era a favor de um nacionalismo negro, baseado na separação das raças, para atingir uma verdadeira igualdade política. Apesar das diferenças, os dois líderes se aproximaram ideologicamente ao final de suas vidas (Marable, 2008). . Se por um lado a unidade da associação dava maior poder de negociação com a administração, por outro, ela era percebida por alguns estudantes negros da UIUC como forma de patrulhamento.

Negritude, conceito desenvolvido por Aimé Césaire12 12 Césaire, intelectual e político negro, nascido na Martinica, considerado pai fundador do conceito de negritude, estendeu sua crítica radical ao colonialismo europeu à sociedade norte-americana do pós-II Guerra Mundial, com suas leis segregacionista que imperaram do final do século XIX à década de 1950 (Césaire, 2010). , passou a ser traduzido como um estilo de vida que abrangia todos os aspectos do comportamento e consistia em uma adesão intransigente à liberação. A BSA exercia um controle ideológico sobre seus membros; o Negro era visto como alguém que pactua com o sistema opressor. Isto afastava alguns estudantes negros da UIUC, pois as exigências eram muito grandes: crescia a distância entre o que era esperado e o que alguns gostariam de ser. Os que não correspondiam ao ideal proposto sentiam-se desconfortáveis. Aqueles mais ortodoxos eram chamados de Super Blacks, acusados de usar uma retórica que dividia mais do que somava. Mas afinal, o que era ser verdadeiramente Black e quem definia os critérios? Isto era uma questão de poder (Williamson, 2003Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press.).

Pertencer a uma fraternidade de negros era ir contra o propósito da união da comunidade negra, ser elitista, imitar o estilo branco. A popularidade de que gozavam as fraternidades negras do início do século XX caiu no final da década de 1960. As fraternidades são locais importantes de sociabilidade nas universidades americanas, inclusive na UIUC. Elas servem de filtro social e possuem toda uma estética que identifica seus membros: camisetas, blusões, chaveiros, pastas com letras gregas, entre outros objetos de sinalização. Isto se contrapunha aos princípios do Poder Negro e do Movimento Negro no Campus, bem como da BSA, pois pertencer a uma fraternidade é um sinal diacrítico, uma marca de distinção (Bourdieu, 1979Bourdieu, P. (1979). La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Les Editions de Minuit.) que exalta a cultura eurocêntrica do campus.

Demandas, conquistas e impasses

Na lista com 35 demandas da BSA, apresentada em fevereiro de 1969 à universidade, figuravam a retirada das acusações contra estudantes negros detidos em setembro; cotas raciais na pós-graduação; contratação de 500 novos professores negros; apoio financeiro ao SEOP; e envolvimento da universidade com a comunidade negra de Champaign. Duas outras solicitações merecem destaque: a criação de um Centro Cultural Afro-Americano, administrado pela BSA, e o estabelecimento de um Departamento de Estudos Afro-Americanos e Africanos. Para analisar a viabilidade das reivindicações foi criada uma comissão de professores e estudantes negros, e estes últimos tiveram importante papel nas reformas introduzidas na UIUC.

Estudantes negros já contavam, na época, com coral e grupo de dança, além de uma sede provisória aberta a todos, embora apenas frequentada por negros, universitários e residentes de Champaign. O objetivo do Centro Cultural era desenvolver atividades que fortalecessem a identidade de grupo. Realizavam oficinas de literatura, discussão de gênero, atividades de fotografia e teatro. Tinham os próprios veículos de comunicação: jornal e rádio. O Centro fortaleceu o estabelecimento de uma nova ideologia para a BSA, que reforçou um movimento artístico com a celebração da estética negra baseada nas tradições culturais africanas. Um dos objetivos passou a ser a liberdade dos padrões de referência branca em termos de arte e estética. Os artistas, ao contribuírem para a liberação, construiriam as bases da Revolução Cultural Negra. Em 1970, o Centro conseguiu sede permanente (Williamson, 2003Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press.).

O Programa de Estudos Afro-americanos levou mais tempo para se institucionalizar. Em 1969, a UIUC organizou uma experiência de imenso sucesso com conferencistas nacionalmente renomados, em um curso sobre cultura afro-americana que valia um crédito. Trezentos estudantes se inscreveram, e, para receber certificação, precisavam redigir um ensaio sobre um tema abordado nas palestras. Mais de mil alunos assistiram às conferências entre inscritos e ouvintes. Em 1971, o número de inscritos cresceu para 875, atestando o interesse dos estudantes pela experiência implantada dois anos antes.

Entretanto, a institucionalização dos estudos afro-americanos enfrentava dificuldades para encontrar número suficiente de professores permanentes, qualificados com pós-graduação. Estudantes e professores divergiam na definição do que seria um professor qualificado.

O Programa de Estudos e Pesquisas Afro-Americanos foi institucionalizado em 1974, levando os estudantes a demandarem um major em estudos afro-americanos. No entanto, somente em 1987 a UIUC começou a oferecer um minor13 13 Ao final dos quatro anos de formação no college, que, ao contrário dos cursos de graduação no Brasil, não possui orientação profissional, o aluno deve concluir um major e um minor, ou seja, um elenco de matérias relacionadas com uma disciplina ou temática como antropologia, biologia, matemática, estudos latino-americanos, estudos sobre gênero. Majors e minors não precisam ter relação entre si; como o nome indica, o major exige mais créditos do que o minor. No sistema de educação superior norte-americano, a profissionalização se dá na pós-graduação, através do doutorado, e nas escolas profissionais de medicina, direito, engenharia etc. , e não um major, conforme fora solicitado.

O Centro Cultural, por não ser um empreendimento acadêmico, foi mais facilmente aceito, mas o mesmo não ocorreu com o Programa de Estudos Afro-Americanos, já que este mexia na estrutura de poder da universidade ao qualificar estudantes, através do oferecimento de créditos e de ênfases curriculares dos tipos minor e major.

Os ideais dos movimentos negros de liberação nos EUA no início da segunda metade do século XX orientaram os afro-americanos a aproximar a universidade de um modelo de instituição justa e representativa da comunidade. Na UIUC, embora a administração tenha tido um papel importante no incentivo à retenção e satisfação dos estudantes negros, ela tendeu a interpretar o atrito como uma questão de privação cultural e a inclusão, como forma de aumentar a diversidade no campus. As reformas introduzidas visavam mais melhorar as oportunidades individuais do que alterar a estrutura da instituição e a relação universidade-sociedade (Williamson, 2003Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press.).

No contexto nacional, Yuill (2006)Yuill, K. (2006). Richard Nixon and the rise of affirmative action: the pursuit of racial equality in an era of limits. New York: Rowman & Littlefield., analisando políticas de ação afirmativa no período Nixon (1969-1974), destaca o esforço deliberado do presidente da República para impedir que a questão racial pudesse ser usada como arma contra o “sistema”. Suas ações demonstravam incentivo à estabilidade de uma classe média negra, acompanhado de um abandono do gueto (p. 238).

Do apogeu ao declínio na década inicial

Até meados dos anos 1970, a BSA contabilizou entre suas conquistas: o aumento das matrículas de estudantes negros; o maior envolvimento da administração nos pleitos destes estudantes; a contratação de professores negros; o reexame da política de admissão de funcionários; a criação de programas de extensão para a comunidade negra de Urbana-Champaign; o Centro Cultural e o Programa de Estudos e Pesquisas Afro-Americanos. Referindo-se à UIUC, Williamson (2003)Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press. conclui: “A BSA forçou a universidade a rever a sua política, propiciando reformas mais profundas que a universidade não tinha previamente assumido … . A interação de iniciativas ajudou a mudar o campus para sempre” (p. 133).

Na UIUC do final dos anos 1960, a BSA e as fraternidades negras eram as principais organizações existentes entre os universitários afro-americanos. Em 1975 havia mais de 30 organizações de estudantes negros, algumas ligadas aos cursos de Direito, Engenharia, Psicologia e Programas de Pós-Graduação, outras a diferentes tipos de residências ou atividades esportivas. Muitas delas passaram a desempenhar atividades que incentivavam mais a sociabilidade do que a organização política. Esse novo contexto contribuiu para a dispersão dos estudantes negros. Alguns militantes se formaram e deixaram a universidade. Outros, estavam cansados do rigor da luta política. “Eles estavam desejando ser estudantes, mais do que agentes de mudança social” (Williamson, 2003Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press., p. 136).

Além do mais, após os quatro anos do college os estudantes negros enfrentavam uma imensa hostilidade racial nos ambientes mais competitivos e elitistas dos cursos profissionais e de pós-graduação. Tornava-se muito difícil atender ao rigor acadêmico da formação profissional e, ao mesmo tempo, se envolver com militância política.

Paralelamente, a BSA mudou seu nome para Coalition of Afrikan People (CAP), Coalisão dos Povos Afrikanos, ampliando o foco de objetivos da associação, que passou a incluir o apoio à libertação de colônias africanas. A nova orientação pan-africanista afastou parte dos estudantes negros da UIUC ligados à antiga BSA. A CAP passou a ser uma associação entre muitas na universidade, e se dissolveu em 1976.

Institucionalização da diversidade hifenizada

Até o início da década de 1960, a UIUC era um campus quase exclusivamente branco. A organização e participação política dos novos estudantes, a partir do Projeto 500, tiveram grande repercussão nas decisões administrativas da universidade.

O sucesso da política de inclusão resultou na diminuição da participação de universitários negros em comissões. No início do Projeto 500, representantes da BSA desempenhavam um papel comparável ao de lideranças carismáticas com as quais jovens negros, que aspiravam entrar na universidade, se identificavam. Na década de 1970 essas lideranças passaram a ser substituídas por funcionários burocráticos, encarregados do processo de seleção e acompanhamento de novos estudantes (Weber, 1963Weber, M. (1963). Ensaios de sociologia. Rio de Janeiro: Zahar.).

Uma vez institucionalizada a política de inclusão de afro-americanos, outros grupos sub-representados passam a fazer pressão por maiores oportunidades. A administração da universidade assumiu maior controle e passou a moldar os programas de acordo com seus interesses, que nem sempre coincidiam com os dos estudantes negros (Williamson, 2003Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press.).

Estes universitários negros podem ser vistos como o grupo pioneiro de americanos hifenizados (afro-americanos)14 14 Uma interessante análise que compara o uso do hífen por diferentes minorias na construção da identidade nacional nos EUA e no Brasil foi desenvolvida por Lesser (1999). a quebrar a exclusividade branca na UIUC. Outros grupos de estudantes, a partir de suas associações, passaram a pressionar a universidade para a criação de centros culturais e programas de estudos voltados aos seus interesses e que lhes dessem apoio e visibilidade no campus.

O Quadro 1 mapeia como se deu esse processo de inclusão de minorias sub-representadas na UIUC: quais grupos se beneficiaram; como se organizaram; quais objetivos conquistaram e quando. Abrange o período de 1967 a 2016, ou seja, meio século, e apresenta dados agrupados por décadas (Hughes & Hoxie, 2017Hughes, M., & Hoxie, F. (2017). Nevada Street: Center for the Study of Race and Ethnicity. In F. Hoxie (Ed.), University of Illinois: engine of innovation. Urbana-Champaign: University of Illinois Press.).

Quadro 1
Inclusão de minorias na UIUC, 1967 a 2016

Nada esperamos, tudo demandamos

Na primeira década, de 1967 a 1976, estudantes afro-americanos, seguindo o moto “Nada esperamos, tudo demandamos”, formam em 1967 a BSA, uma associação com a finalidade de “promover a solidariedade e união entre estudantes negros, celebrar e disseminar aspectos positivos da cultura negra e promover treinamento para a atuação política e liderança” (Williamson-Lott, 2017Williamson-Lott, J. A. (2017). The Campaign to Diversify the University. In F. Hoxie (Ed.), University of Illinois: engine of innovation. Urbana: University of Illinois Press., p. 79).

Ainda nessa década, conseguem o estabelecimento de um Centro Cultural, em 1969, e um Programa de Estudos e Pesquisas Afro-Americanos, em 1974. Isso só foi possível devido à organização e combatividade dos estudantes negros, bem como ao apoio de professores e administradores em um momento de grande ebulição nos campi do país. Seguindo o exemplo dos estudantes negros, os latinos, no início dos anos 1970, formam sua associação, La Coletiva, e conseguem, em 1976, o estabelecimento de um Centro Cultural, La Casa.

A década seguinte, de 1977 a 1986, apresenta um cenário pouco expressivo em termos de atuação e conquistas de minorias no campus. Surgem apenas duas associações de estudantes de origem asiática: Asian-American Association (Associação Asiático-Americana), em 1985, e Asian-Pacific Coalition to Combat Opression, Racism e Discrimination (Coalisão Asiática do Pacífico para Combater a Opressão, Racismo e Discriminação), em 1986.

No primeiro ano da terceira década, de 1987 a 1996, o Programa de Estudos Afro-Americanos passa a oferecer um minor. Por sua vez, estudantes latinos, após protestos, conseguem, em 1992, o estabelecimento de um programa acadêmico voltado à temática que oportunizasse maior visibilidade à sua cultura e realidade social.

No início da próxima década, de 1997 a 2006, o Programa Latina∕Latino oferece um minor. A partir dos anos 2000, duas demandas relacionadas a temáticas de interesse dos estudantes asiáticos se tornam realidade: o Programa de Estudos, em 2002, e o Centro Cultural, em 2006. Os indígenas também passam a contar com um Centro Cultural e um Programa de Estudos, com o primeiro professor permanente.

Mais recentemente, entre 2007 e 2016, começaram a ser oferecidos minors em estudos relacionados à realidade dos estudantes asiático-americanos e à dos indígenas. Três programas passam a se organizar em departamentos de: African-American Studies (Estudos Afro-Americanos), em 2008; Latina∕Latino Studies (Estudos Latinos), em 2010; Asian-American Studies (Estudos Asiático-Americanos), em 2012. Em 2014, a não contratação de um professor selecionado criou uma crise no Programa de Estudos Indígenas, do qual vários professores se desligaram.

Com relação aos recursos humanos, o Departamento de Estudos Afro-Americanos possui 12 professores permanentes; o de Latina/Latino, 11; e o de Estudos Asiático-Americanos, 10.

Além dos professores permanentes, esses departamentos têm professores afiliados de outros departamentos e institutos: o Departamento de Estudos Afro-Americanos conta com 30 docentes afiliados lotados na Antropologia, História, Linguística, Estudos sobre Mulher e Gênero, Sociologia, entre outros; o Departamento de Latina/Latino tem 12 professores afiliados lotados na Comunicação, Mídia e Cinema, Espanhol e Português, especialmente; e o Departamento Asiático-Americano integra seis professores dos departamentos de História, Serviço Social, Antropologia, Estudos sobre Mulher e Gênero.

Estudantes pertencentes a cada minoria apresentam necessidades específicas e diferentes formas de atuação e sociabilidade. Alunos afro-americanos, por exemplo, valorizam expressões culturais em busca de suas raízes (como danças e cantos corais), além de um forte compromisso com a comunidade negra fora do campus, na sociedade norte-americana e nas sociedades de países africanos. Cabe destacar a celebração da Congratulatory Cerimony, que reúne formandos negros do bacharelado, de pós-graduação e cursos profissionais. Ela teve origem no ano de 1972, quando da formatura dos primeiros egressos do Projeto 500, e tem lugar no campus da universidade após o Commencement, cerimônia geral de conclusão de cursos com todos os estudantes.

Entre os grupos referidos como minorias, no ano de 2016 os asiático-americanos estão sobrerrepresentados: eles são 14,7 dos ingressantes, mas apenas 4,6 dos habitantes do estado. O oposto ocorre com os afro-americanos: eles são somente 5% dos ingressantes, mas 14,5% da população estadual. Os latinos são 8,7% dos ingressantes, embora correspondam a 15,8% dos moradores de Illinois. Os indígenas são em número reduzido e pertencem a diferentes grupos, o que dificulta a comparação. O percentual de estudantes internacionais atingiu 24%.

A sobrerrepresentação de estudantes asiático-americanos tem sido uma realidade em universidades de elite nos EUA nos últimos anos. Essa tendência passou a ser contrabalançada com políticas preferencias que apontam a diversidade do alunato como um selo de qualidade da instituição. Harvard está sendo processada por discentes americanos de origem asiática, por relativizar a questão do mérito, traduzido por altos escores em testes acadêmicos, em favor da escolha de estudantes com diferentes trajetórias individuais, levando em conta o pertencimento a grupos étnico-raciais (Hartocollis, 2018Hartocollis, A. (2018, 14 de outubro). What’s at Stake in a Harvard Lawsuit: decades of debate over race. The New York Times. Recuperado de https://www.nytimes.com/2018/10/13/us/harvard-affirmative-action-asian-students.html
https://www.nytimes.com/2018/10/13/us/ha...
; Kristof, 2018Kristof, N. (2018, 28 de outubro). Liberal hypocrisy in college admission? The New York Times. Recuperado de https://www.nytimes.com/2018/10/27/opinion/sunday/legacy-college-admissions-harvard.html
https://www.nytimes.com/2018/10/27/opini...
).

A política de diversidade voltada às minorias na UIUC se reflete em opções curriculares oferecidas aos estudantes, bem como nos centros culturais que representam diferentes grupos organizados na universidade, como o Centro de Cultura Afro-Americana; a Casa de Cultura Latina; o Centro de Cultura Asiático-Americana e a Casa de Nativo-Americanos, localizados próximos uns dos outros.

Apresentados no site da universidade como oferecendo “… oportunidades para [a comunidade do campus] aprender sobre e vivenciar as ricas tradições históricas e as culturas vivas modernas que formam o nosso mundo”15 15 Recuperado de https://illinois.edu/ , esses espaços têm a marca do étnico, ou seja, diferem do padrão. É importante salientar que a cultura europeia não faz parte desse conjunto de centros culturais.

Em realidade, esses centros culturais são espaços de convivência e resgate de tradições e histórias de grupos que, durante muito tempo, foram subjugados pela cultura dominante da sociedade norte-americana. Convém referir que, além dos centros étnico-culturais, existem o Centro das Mulheres e o das comunidades LGBT.

O futuro da UIUC e o legado do Projeto 500

Passado meio século, que marcas ficaram do Projeto 500?

Existe atualmente uma presença qualificada de lideranças negras na alta administração da UIUC e mais de 80 professores negros com estabilidade, ou em vias de obtê-la. No entanto, o número de estudantes afro-americanos na universidade diminuiu nos últimos anos.

Como resultado da política de inclusão da universidade, mais de 500 estudantes negros ingressaram na UIUC em 1968; em 2014, o número de ingressantes afro-americanos caiu para 356. Em 2008, o total de alunos negros matriculados em cursos de bacharelado, pós-graduação e em escolas profissionais era de 2.524. Sete anos depois, o número diminuiu para 2.126, o que representa uma queda de 6,08% para 4,87% das matrículas da universidade. E estes estudantes continuam sendo alvo de múltiplas microagressões (Harwood et al., 2015Harwood, S., Choi, S., Orozco, M., Browne, Huntt, M., & Mendenhall, R. (2015). Racial microaggressions at the University of Illinois at Urbana-Champaign: Voices of students of color in the classroom. Champaign: UIUC.).

Uma das razões que afasta estudantes negros da UIUC é o preço das taxas cobradas. Há uma década, os discentes que moravam no estado pagavam cerca de US$ 15.000,00 por ano. Em 2014, o preço aumentou para US$ 25.000,00. Por outro lado, os estudantes estrangeiros pagam praticamente o dobro das taxas cobradas dos alunos locais. Estes estudantes têm alto poder aquisitivo e tendem a ocupar um número cada vez maior de vagas na universidade. A maior seletividade da UIUC nos últimos anos tem contribuído para diminuir as chances dos estudantes, principalmente dos afro-americanos, que frequentam escola segregada economicamente.

A Suprema Corte dos EUA, em 1954, ao julgar o princípio “separado mas igual” com base no caso Brown v. Board of Education, deliberou como inconstitucional a segregação e proibiu escolas exclusivas para brancos. Deixou explícito que “separado é, inerentemente, desigual” no que concerne a oportunidades educacionais para negros e brancos (Martin Jr., 1998Martin, W. E., Jr. (Ed.). (1998). Brown v. Board of Education: a brief history with documents. Boston: Bedford-St. Martin’s.).

A partir dessa histórica decisão, o país vivenciou um período de dessegregação das escolas, forçando, quando necessário, a integração e estimulando experiências que aumentassem o convívio de crianças de todas as cores durante a trajetória escolar. A partir da década de 1980, devido, entre outros fatores, a políticas de segregação residencial e a um processo de concentração de renda, o país tem vivenciado forte ressegregação escolar.

Em 2011, Illinois ocupava o segundo lugar entre os estados que apresentavam os mais altos índices escolares de segregação por raça e etnicidade no país: 61,3% dos estudantes negros frequentavam escolas cujo corpo discente era de 90% a 100% composto por minorias, que geralmente pertencem aos estratos mais pobres da população. Isso pode ser considerado uma dupla segregação: por raça e classe social (Orfield, Frankenberg, Jongyeon, & Kuscera, 2014Orfield, G., Frankenberg, E., Jongyeon, E., & Kuscera, J. (2014). Brown at 60: great progress, a long retreat and an uncertain future (The Civil Rights Project). Oakland: University of California.).

Nesse cenário, o programa Demandas para uma Universidade Transformada é apresentado pela Frente Negra Unificada e apoiado por várias associações. Na pauta estão novas exigências, como a divulgação de um relatório anual dos investimentos da universidade que ateste o desinvestimento em corporações sócio e politicamente negligentes e o reinvestimento em entidades ecológica e economicamente sustentáveis, bem como socialmente responsáveis.

Demandas antigas permanecem, principalmente as de fortalecer o vínculo com a população negra de Champaign e melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores da UIUC. Há uma grande preocupação com populações vulneráveis, como pessoas LGBT e egressos do sistema penal, para que tenham oportunidades e necessidades respeitadas.

Fraternidades que tendem a encobrir episódios de violência sexual de seus membros são duramente criticadas. Há também forte repúdio à política de empréstimos para custear os estudos, que tem deixado alunos endividados por longos períodos, apontando-se, por isso, a necessidade de estabilizar o preço das matrículas. Há demandas de longo prazo, entre as quais a de que, até 2032, o número de estudantes, professores e funcionários reflita a demografia de Illinois em termos econômicos e raciais. O grupo lançou o Projeto 1.000, que prevê a entrada de mil novos estudantes negros a partir do ano acadêmico de 2020.

É importante salientar que o número mil representa uma meta, pois cotas raciais são consideradas inconstitucionais nos EUA, a partir do caso Regents of the University of California v. Bakke, em 1978. Nesse julgamento a Suprema Corte, por cinco votos a quatro, assinalou, no entanto, a possibilidade de considerar raça como um dos critérios classificatórios na seleção de estudantes, tendo em vista a desigualdade entre as estruturas de oportunidade ao comparar brancos e negros. No voto de Minerva, foi apontada a diversidade na composição do alunato como fator importante na formação universitária (Chang, Witt, Jones, & Hakuta, 2003Chang, M., Witt, D., Jones, J., & Hakuta, K. (Eds.). (2003). Compelling interest: examining the evidence on racial dynamics in colleges and universities. Stanford: Stanford University Press.).

Comparadas às universidades públicas brasileiras, que estão adotando políticas de ação afirmativa, na forma de cotas sociais e raciais, desde o início do século 20, as universidades de elite norte-americanas, com suas residências estudantis e fraternidades que fazem parte do campus, são bem mais insulares. O debate sobre o uso de critérios étnico-raciais na seleção de alunos tende a centrar-se nos objetivos da instituição, com menor referência a um projeto de nação.

Considerando seu histórico protagonismo na UIUC e as profundas divisões na sociedade norte-americana atual, os estudantes afro-americanos constituem um grupo importante como inspiração aos novos rumos da universidade. Eles mostram que a UIUC tem desinvestido neles, em termos de representação quantitativa, e que é preciso voltar a fazê-lo.

Somado ao protagonismo dos estudantes negros, o Departamento de Estudos Afro-Americanos tem se beneficiado de parte da verba de um milhão de dólares concedida pela Fundação Andrew Mellon para o desenvolvimento, junto com a biblioteca da universidade, de programas inovadores de publicação digital e divulgação de material relacionados a temas de seu interesse, o que certamente ampliará seu raio de ação. Os professores do departamento, inspirados no histórico moto do Programa de Estudos Afro-Americanos “Excelência acadêmica e responsabilidade social”, assinaram uma carta de apoio ao Projeto 1.000, que, por sua vez, se inspira no Projeto 500.

Em 13 de maio de 2017, Robert J. Jones, professor afro-americano e reitor da UIUC, presidiu a cerimônia de formatura de cerca de 3 mil estudantes. Significativamente a festividade ocorreu no Memorial Stadium, justamente o local para onde foram levados os mais de 200 universitários detidos em 1968.

Robert Jones encontra-se numa posição privilegiada para nortear os novos rumos da UIUC. Ele nasceu no interior da Georgia, estado sulino, em 1950 – durante o período de segregação racial –, e fez uma brilhante carreira como pesquisador e administrador. Em sua mensagem ao assumir o cargo na UIUC, recordou sua trajetória e se referiu a possíveis novos rumos para a universidade nos próximos anos:

A missão dos land grant colleges está em meu sangue e eu me orgulho de ser um produto dela. Como reitor em Illinois, um dos históricos land grant colleges estabelecidos pelo Morris Act, eu tenho oportunidade de ajudar a garantir que a minha experiência seja uma que qualquer estudante possa ter nesse século de educação superior. (Heckel, 2015Heckel, J. $1 million Mellon grant to help humanities scholars explore digital publishing options. Illinois News Bureau. Recuperado de https://news.illinois.edu/view/6367/256174
https://news.illinois.edu/view/6367/2561...
, tradução minha)

Ao celebrar seu sesquicentenário em 2017, a Universidade de Illinois encontra-se em momento especial para um balanço de sua trajetória. O legado do Projeto 500 será, certamente, um fator significativo para pensar novos rumos da universidade.

  • 1
    Essa pesquisa foi desenvolvida no ano acadêmico 2016-2017, ocasião em que a autora foi Visiting Scholar noLemann Institute for Brazilian Studies da University of Illinois Urbana-Champaign. Ela agradece ao então diretor,Professor Jerry Dávila, pela excelente acolhida e ao professor Glen Goodman por seus comentários enriquecedores.
  • 2
    Normalização, preparação e revisão textual: Mônica Silva (TIkinet) – revisao@tikinet.com.br
  • 3
    Enquanto no Brasil a palavra preto deu lugar a negro entre os militantes, por exemplo, do Movimento Negro Unificado (MNU), nos EUA deu-se o inverso: negro (negro) tornou-se um termo negativo enquanto black (preto) assumiu conotação positiva, devido ao Black Power. Neste artigo, black será traduzido como negro ou afro-americano.
  • 4
    Os land-grant colleges se originaram de doação de terras do governo federal para que cada estado usasse tal recurso na criação de uma universidade estadual voltada ao atendimento das necessidades mais práticas da região.
  • 5
    Alma Mater, representada por uma figura feminina, traduz a atmosfera espiritual que marca, ao longo da vida, todos aqueles que passam pelo mesmo college ou universidade.
  • 6
    Fundadas a partir da segunda metade do século XIX, são grupos exclusivos de estudantes que residem em casas que podem ser identificadas por letras gregas em suas fachadas. Elas formam o Sistema Grego, que as une nacionalmente e funciona como uma rede importante de contatos.
  • 7
    Relação das universidades pesquisadas: Chicago, Indiana, Illinois, Iowa, Michigan, Minnesota, Northwestern, Ohio, Purdue, Wisconsin.
  • 8
    Citação extraída do Arquivo 020901 (caixa 64, p. 6), disponível no acervo da UIUC.
  • 9
    Coube a Robert Kennedy, irmão do ex-presidente John Kennedy, assassinado em 1963, anunciar a uma multidão de negros em Indianapolis o assassinato de Martin Luther King. Dois meses depois, na campanha para ser indicado como candidato do Partido Democrata à presidência da república, Bobby Kennedy também foi assassinado.
  • 10
    Professores envolvidos no projeto imaginavam que seria difícil, no começo, atrair 500 novos estudantes, número que foi ultrapassado já no primeiro ano, em 1968. Para uma descrição minuciosa dos acontecimentos que precederam o Projeto 500 e os primeiros passos para sua implementação, ver Williamson (2003, pp. 56-80)Williamson, J. A. (2003). Black Power on the Campus: the University of Illinois 1965-75. Urbana-Champaign: University of Illinois Press..
  • 11
    Martin Luther King Jr. e Malcom X, assassinado em 1965, lutaram contra o racismo e a supremacia branca. O primeiro defendia a integração entre brancos e negros através da política de não violência, ao passo que o segundo era a favor de um nacionalismo negro, baseado na separação das raças, para atingir uma verdadeira igualdade política. Apesar das diferenças, os dois líderes se aproximaram ideologicamente ao final de suas vidas (Marable, 2008Marable, M. (2008, dez.). Manning Marable: a história negra viva. Entrevista concedida a Mariluce Moura. Revista Fapesp, 154. Recuperado de http://revistapesquisa.fapesp.br/2008/12/01/a-historia-negra-viva/
    http://revistapesquisa.fapesp.br/2008/12...
    ).
  • 12
    Césaire, intelectual e político negro, nascido na Martinica, considerado pai fundador do conceito de negritude, estendeu sua crítica radical ao colonialismo europeu à sociedade norte-americana do pós-II Guerra Mundial, com suas leis segregacionista que imperaram do final do século XIX à década de 1950 (Césaire, 2010Césaire, A. (2010). Discurso sobre o colonialismo. Florianópolis: Letras Contemporâneas.).
  • 13
    Ao final dos quatro anos de formação no college, que, ao contrário dos cursos de graduação no Brasil, não possui orientação profissional, o aluno deve concluir um major e um minor, ou seja, um elenco de matérias relacionadas com uma disciplina ou temática como antropologia, biologia, matemática, estudos latino-americanos, estudos sobre gênero. Majors e minors não precisam ter relação entre si; como o nome indica, o major exige mais créditos do que o minor. No sistema de educação superior norte-americano, a profissionalização se dá na pós-graduação, através do doutorado, e nas escolas profissionais de medicina, direito, engenharia etc.
  • 14
    Uma interessante análise que compara o uso do hífen por diferentes minorias na construção da identidade nacional nos EUA e no Brasil foi desenvolvida por Lesser (1999)Lesser, J. (1999). Negotiating national identity: immigrants, minorities, and the struggle for ethnicity in Brazil. Durham: Duke University Press..
  • 15
    Recuperado de https://illinois.edu/

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    22 Maio 2018
  • Revisado
    15 Nov 2018
  • Aceito
    28 Dez 2018
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