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O Conceito de Constante na Representação Gráfica: uma análise das projeções de preço de ações realizadas por estudantes de Engenharia

The Constant Concept in Graphical Representation: an analysis of stock price projections by engineering students

Resumo

O presente artigo resulta de uma iniciativa exploratória de identificação dos conhecimentos prévios, da compreensão e das intuições de 47 estudantes de Engenharia acerca do comportamento dos preços de ações de empresas de diferentes setores econômicos. A proposta, realizada no início do semestre da disciplina de Economia para um curso de Engenharia, tinha como finalidade pedagógica identificar de que forma os estudantes projetam e, sobretudo, justificam o comportamento dos preços de ações utilizando (ou não) elementos de micro ou macroeconomia. Mais precisamente, à luz da teoria dos registros de representação semiótica, este trabalho dedica-se à interpretação de um fenômeno particularmente curioso identificado entre as descrições apresentadas pelos estudantes: o emprego da palavra constante (e suas derivações) para qualificar o comportamento de gráficos que, de fato, não são constantes na acepção literal e matemática do termo. Os resultados obtidos, quando comparados com a literatura anterior que identificou a tendência de estudantes de produzirem gráficos lineares, divergem por indicarem algo oposto, inclusive em função da natureza da atividade proposta. Os alunos não produziram gráficos lineares que aderissem às suas descrições textuais, indicando dificuldades de conceitualização e de coordenação de registros de representação semiótica distintos. Em contrapartida, quando os resultados são confrontados com estudos que identificaram uma tendência a simplificar ou suavizar gráficos, pôde-se constatar no presente estudo uma tendência à simplificação, flexibilização ou suavização conceitual e semântica da palavra constante.

Palavras-chave:
Registros de Representação Semiótica; Registros Gráficos; Registros Textuais

Abstract

This paper is the result of an exploratory initiative to identify previous knowledge, understanding, and intuitions of 47 engineering students about the stock price behavior of companies from different economic sectors. The activity, implemented at the beginning of the semester of Economics for an Engineering course, aimed to identify how students project and, above all, justify the behavior of stock prices using (or not) micro or macroeconomic elements. More precisely, using the theory of semiotic representation registers, this work is dedicated to the interpretation of a particularly curious phenomenon identified among the descriptions presented by students: the use of the word constant (and its derivations) to qualify the behavior of graphs that are in fact not constant in the literal and mathematical sense of the term. The results, when compared with the previous literature that identified the tendency of students to produce linear graphs, differ because they indicate something opposite, even due to the nature of the proposed activity. Students did not produce linear graphs that adhered to their textual descriptions, indicating difficulties in conceptualizing and coordinating distinct semiotic representation records. On the other hand, when the results are compared with studies that identified a tendency to simplify or smooth graphs, it was observed in the present study a tendency to simplify, flex or conceptual and semantic smoothing of the word constant.

Keywords:
Registers of Semiotic Representation; Graphic Registers; Textual Registers

1 Introdução

Representar graficamente relações entre variáveis é prática compartilhada por diversas áreas do conhecimento. Seja a título de ilustração, seja para representar funções, gráficos são recursos informativos e pedagógicos relevantes em várias disciplinas. No âmbito das discussões acerca do ensino e da aprendizagem de Matemática o conceito de função é reconhecidamente complexo, uma vez que requer a familiaridade com noções como pares ordenados, diagramas de setas, gráficos, regras algébricas, domínio, imagem e zero, por exemplo (DREYSFUS; EISENBERG, 1982DREYFUS, T.; EISENBERG, T. Intuitive functional concepts: a baseline study on intuitions. Journal for Research in mathematics Education, [S.l.], v. 13, n. 5, p. 360-380, nov. 1982.). A construção e a compreensão de gráficos, nesse mesmo sentido, não é um processo trivial, motivo pelo qual há literatura abundante sobre o tema em diferentes áreas (KOSSLYN, 1985KOSSLYN, S. Graphics and human information processing: a review of five books. Journal of the American Statistical Association, [S.l.], v. 80, n. 391, p. 499-512, 1985.; SOFO, 1985SOFO, F. Graphic literacy: Part I. A review of the literature. The Vocational Aspect of Education, [S.l.], v. 37, n. 98, p. 107-113, 1985.; CARSWELL; EMERY; LONON, 1993CARSWELL, C. M.; EMERY, C.; LONON, A. M. Stimulus complexity and information integration in the spontaneous interpretation of line graphs. Applied Cognitive Psychology, [S.l.], v. 4, n. 7, p. 341-357, aug. 1993.; BERG; SMITH, 1994BERG, C. A.; SMITH, P. Assessing students’ abilities to construct and interpret line graphs: Disparities between multiple choice and free response instruments. Science Education, [S.l.], v. 78, n. 6, p. 527–554, 1994. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1002/sce.3730780602. Acesso em: 12 dez. 2018.
https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/...
; GATTIS; HOLYOAK, 1996GATTIS, M.; HOLYOAK, K. Mapping conceptual to spatial relations in visual reasoning. Journal of Experimental Psychology: Learning, Memory, and Cognition, [S.l.], v. 22, n. 1, p. 231-239, 1996.; ZACKS; TVERSKY; SCHIANO, 1998ZACKS, J.; TVERSKY, B.; SCHIANO, D. J. Reading bar graphs: effects of depth cues and graphical context. Journal of Experimental Psychology Applied, [S.l.], v. 4, p. 119-138, 1998.; ZACKS; TVERSKY, 1999ZACKS, J.; TVERSKY, B. Bars and lines: a study of graphic communication. Memory & Cognition, [S.l.], v. 27, p. 1073-1079, 1999.; POSTIGO; POZO, 2000POSTIGO, Y.; POZO, J. I. Cuando una gráfica vale más que 1.000 datos: la interpretación de gráficas por alumnos adolescentes. Infancia y Aprendizaje, [S.l.], v. 23, n. 90, p. 89-110, 2000.; SHAH; HOEFFNER, 2002SHAH, P.; HOEFFNER, J. Review of graph comprehension research: implications for instructions. Educational Psychology Review, [S.l.], v. 14, n. 1, p. 47-69, mar. 2002.; KRAMARSKI, 2004KRAMARSKI, B. Making sense of graphs: does metacognitive instruction make a difference on students’ mathematical conceptions and alternative conceptions? Learning and Instruction, [S.l.], v. 14, n. 6, p. 593-619. dec. 2004.; READENCE; BEAN; BALDWIN, 2004READENCE, J.; BEAN, T.; BALDWIN, S. Content area literacy: an integrated approach, eighth edition. Dubuque: Kendall-Hunt, 2004.; GALESIC; GARCIA-RETAMERO, 2011GALESIC, M.; GARCIA-RETAMERO, R. Graph literacy: a cross-cultural comparison. Medical Decision Making, [S.l.], v. 31, p. 444-457, 2011.; FRANZBLAU; CHUNG, 2012FRANZBLAU, L. E.; CHUNG, K. C. Graphs, tables, and figures in scientific publications: the good, the bad, and how not to be the latter. The Journal of Hand Surgery, [S.l.], v. 37, n. 3, p. 591-596, 2012.; KIM et al. 2014KIM, S. et al. Investigating graph comprehension in students with dyslexia: an eye tracking study. Research in Developmental Disabilities, [S.l.], v. 35, n. 7, p. 1609-1622. jul. 2014.; PETERMAN et al. 2015PETERMAN, K. et al. Measuring primary students’ graph interpretation skills via a performance assessment: a case study in instrument development. International Journal of Science Education. [S.l.], v. 37, n. 17, p. 2787-2808, 2015.; VITALE; LAI, LINN, 2015VITALE, J. M.; LAI, K.; LINN, M. C. Taking advantage of automated assessment of student: constructed graphs in science. Journal of Research in Science Teaching, [S.l.], v. 52, n. 10, p. 1426-1450, 2015.; BOLLEN et al., 2016BOLLEN, L. et al. Generalizing a categorization of students’ interpretations of linear kinematics graphs. Physical Review Physics Education Research, [S.l.], v. 12, n. 1, p. 010108-1-010108-10, 2016.; BOOTE, 2017BOOTE, S. K. Assessing and understanding line graph interpretations using a scoring rubric of organized cited factors. Journal of Science Teacher Education, [S.l.], v. 8, n. 25, p. 333-354, 2017.; BOOTE; BOOTE, 2017BOOTE, S. K. Assessing and understanding line graph interpretations using a scoring rubric of organized cited factors. Journal of Science Teacher Education, [S.l.], v. 8, n. 25, p. 333-354, 2017.).

Nos termos de Leinhardt, Zaslavsky e Stein (1990LEINHARDT, G.; ZASLAVSKY, O.; STEIN, M. K. Functions, graphs, and graphing: tasks, learning, and teaching. Review of Educational Research, [S.l.], v. 60, n. 1, p. 1-64, 1990., p. 12, tradução livre): “construção se refere a construir um gráfico ou plotar pontos de dados (ou de uma função ou tabela) ou construir uma relação algébrica para um gráfico”. A construção pode ser quantitativa ou qualitativa, pode envolver ou não a predição (ação de conjecturar a partir de uma parte dada do gráfico). Especificamente no que se refere às tarefas de construção de gráficos que incluem predição, Leinhardt, Zaslavsky e Stein (1990LEINHARDT, G.; ZASLAVSKY, O.; STEIN, M. K. Functions, graphs, and graphing: tasks, learning, and teaching. Review of Educational Research, [S.l.], v. 60, n. 1, p. 1-64, 1990.) destacam a necessidade de se mobilizar conjuntos diferentes de habilidades: enquanto algumas tarefas mobilizam estimativas e mensuração, outras exigem a detecção de padrões.

Dreyfus e Eisenberg (1982DREYFUS, T.; EISENBERG, T. Intuitive functional concepts: a baseline study on intuitions. Journal for Research in mathematics Education, [S.l.], v. 13, n. 5, p. 360-380, nov. 1982.) identificaram propriedades preferidas por estudantes universitários no processo de construção de gráficos de predição, com destaque para a preferência pela linearidade e para a tendência à suavização do gráfico. Trata-se de um resultado dos conceitos prévios que os estudantes detêm, sobretudo como pensam que o gráfico deve parecer.

Além dos conceitos prévios que os estudantes utilizam, deve-se ressaltar que o contexto exerce papel importante na construção de gráficos em geral e na construção de gráficos de previsão em particular. A maior ou menor familiaridade com as situações a que se referem as tarefas de construção de gráficos pode afetar as previsões realizadas (LEINHARDT; ZASLAVSKY; STEIN, 1990LEINHARDT, G.; ZASLAVSKY, O.; STEIN, M. K. Functions, graphs, and graphing: tasks, learning, and teaching. Review of Educational Research, [S.l.], v. 60, n. 1, p. 1-64, 1990.).

As intuições devem ser igualmente consideradas para efeito de interpretação dos construtos gráficos dos estudantes. Entende-se por intuição as características do conhecimento dos estudantes que emergem de experiências cotidianas, podendo envolver, em maior ou menor grau, conhecimento formal. Um tipo específico de conhecimento prévio pode afetar ainda mais a construção de gráficos: as ideias ou conceitos errados (misconceptions). Algumas das noções equivocadas que os estudantes podem empregar na construção de gráficos incluem a linearidade (LEINHARDT; ZASLAVSKY; STEIN, 1990LEINHARDT, G.; ZASLAVSKY, O.; STEIN, M. K. Functions, graphs, and graphing: tasks, learning, and teaching. Review of Educational Research, [S.l.], v. 60, n. 1, p. 1-64, 1990.).

Lovell (1971)LOVELL, K. Some aspects of growth of the concept of a function. In: ROSSKOPF, M. F.; STEFFE, L. P.; TABACK, S. (ed.). Piagetian cognitive development research and mathematical education. Washington: National Council of Teachers of Mathematics, 1971. p. 12-33., Dreyfus e Eisenberg (1982DREYFUS, T.; EISENBERG, T. Intuitive functional concepts: a baseline study on intuitions. Journal for Research in mathematics Education, [S.l.], v. 13, n. 5, p. 360-380, nov. 1982.), Markovits et al. (1983)MARKOVITS, Z. et al. Functions: linearity unconstrained. In: HERSHKOWITZ, R. (ed.). Proceedings of the seventh international conference of the International Group for the Psychology of Mathematics Education. [S.l.], 1983. p. 271-277. há tempos identificaram, em diferentes situações, a tendência de estudantes construírem gráficos lineares, ainda que tal representação divergisse dos dados ou da proposta de atividade que lhes fosse apresentada. Mevarech e Kramarsky (1997MEVARECH, Z. R.; KRAMARSKY, B. From verbal descriptions to graphic representations: Stability and change in students’ alternative conceptions. Educational Studies in Mathematics, [S.l.], v. 32, n. 3, p. 229-263, mar. 1997.) destacam que os estudantes não ignoram completamente as regras de construção de gráficos, mas que eventualmente seus conceitos equivocados podem induzir a erros. Dentre os erros específicos cometidos por estudantes na construção de gráficos, Mevarech e Kramarsky (1997MEVARECH, Z. R.; KRAMARSKY, B. From verbal descriptions to graphic representations: Stability and change in students’ alternative conceptions. Educational Studies in Mathematics, [S.l.], v. 32, n. 3, p. 229-263, mar. 1997.) citam a existência de uma ideia generalizada e estereotipada de um gráfico, a utilização de setas e de “escadas” para indicar direção ou covariação, por exemplo.

A linearidade pode ser considerada, em certa medida, uma forma de simplificação no processo de construção de gráficos. A tendência que os alunos apresentam em simplificar ou suavizar gráficos foi identificada por Tversky e Schiano (1989TVERSKY, B.; SCHIANO, D. J. Perceptual and conceptual factors in distortions in memory for graphs and maps. Journal of Experimental Psychology, [S.l.], n. 118, v. 4, p. 387-398, 1989.) e por Shah e Carpenter (1995SHAH, P.; CARPENTER, P. A. Conceptual limitations in comprehending line graphs. Journal of Experimental Psychology, [S.l.], v. 124, n. 1, p. 43-61, 1995.).

Além da simplificação da linearidade, outras tendências e fenômenos podem ser apreendidos na análise dos gráficos construídos por estudantes em tarefas realizadas em sala de aula. O presente artigo analisa os resultados de uma iniciativa exploratória de identificação dos conhecimentos prévios, da compreensão e das intuições de estudantes de Engenharia acerca do comportamento dos preços de ações de empresas de diferentes setores econômicos. A proposta, realizada no início do semestre da disciplina de Economia para um curso de Engenharia, pretendia identificar como os estudantes projetam e, sobretudo, como justificam o comportamento dos preços de ações utilizando elementos de micro ou macroeconomia. O objetivo deste trabalho é, à luz da teoria dos registros de representação semiótica, interpretar um fenômeno particularmente curioso identificado entre as descrições apresentadas pelos estudantes: o emprego da palavra constante (e suas derivações) para qualificar o comportamento de gráficos que, de fato, não são constantes na acepção literal e matemática do termo.

O artigo está estruturado em quatro seções além da presente introdução. A seção 2 dedica-se à apresentação da teoria dos registros de representação semiótica tal como proposta por Duval (1993)DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.. A seção 3 descreve os procedimentos metodológicos empregados. A seção 4 expõe resultados e promove discussões à luz da teoria dos registros de representação semiótica, bem como estabalece comparações com resultados de pesquisas anteriores sobre construção e interpretação de gráficos. À seção 5 cabem as considerações finais do artigo.

2 A teoria dos registros de representação semiótica

O reconhecimento da importância dos registros de representação semiótica para a melhoria do ensino de Mtemática tem resultado numa profusão de artigos científicos respaldados nas obras de Duval (1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.; 1995DUVAL, R. Sémiosis et pensée humaine. Bern: Peter Lang, 1995.; 1998DUVAL, R. Signe et objet: trois grandes étapes dans la problématique des rapports entre représentation et objet. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 6, p. 139-163, 1998.). A título de exemplo pode-se citar Kaleff (2007)KALEFF, A. M. M. R. Registros semióticos e obstáculos cognitivos na resolução de problemas introdutórios às geometrias não-euclidianas no âmbito da formação de professores de matemática. Bolema, Rio Claro, v. 20, n. 28, p. 69-94, 2007., Flores (2008)FLORES, C. R. Registros de representação semiótica em matemática: história, epistemologia, aprendizagem. Bolema, Rio Claro, v. 21, n. 21, p. 77-102, 2008., Coutinho, Silva e Almouloud (2011COUTINHO, C. Q. S.; SILVA, M. J. F.; ALMOULOUD, S. A. Desenvolvimento do pensamento estatístico e sua articulação com a mobilização de registros de representação semiótica. Bolema, Rio Claro, v. 24, n. 39, p. 495-514, ago. 2011.), Silva, Santiago e Santos (2014SILVA, F. A. F.; SANTIAGO, M. M. L.; SANTOS, M. C. dos. Significados e representações dos números racionais abordados no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM. Bolema, Rio Claro, v. 28, n. 50, p. 1485-1504, dez. 2014.), Salgueiro e Savioli (2014SALGUEIRO, N. C. G.; SAVIOLI, A. M. P. D. Registros de representação semiótica de funções: análise de produções escritas de estudantes de ensino médio. Vidya, Santa Maria, v. 34, n. 2, p. 47-60, jul./dez. 2014.), Costa et al. (2015)COSTA, L. M.; ALMEIDA, L. M. W.; SILVA, K. A. P.; PASSOS, M. M. A conversão entre diferentes registros de representação semiótica em uma atividade de modelagem matemática. Vidya, Santa Maria, v. 35, n. 1, p. 71-90, jan./jun. 2015..

Duval (1993)DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993. parte da discussão sobre o papel ambíguo do termo representação na Matemática. Sob conotações verbais específicas (representar), a representação é termo concomitantemente essencial e marginal em Matemática. Sua essencialidade decorre de sua quase onipresença: a escrita em língua natural, os símbolos e as notações representam objetos matemáticos como números, funções e vetores, por exemplo. Contudo, a representação e o objeto representado não podem ser confundidos. Trata-se de entidades distintas.

Duval (1993)DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993. distingue as representações mentais e as representações semióticas. Enquanto as representações mentais incluem as imagens e conceitualizações de um indivíduo sobre um objeto ou situação, as representações semióticas são construídas mediante emprego de signos que pertencem a um sistema de representações específico. Cada sistema de representação traz consigo seus inconvenientes de significação e de funcionamento. Enunciados em língua natural, figuras geométricas, gráficos e equações algébricas são exemplos de representações semióticas que mobilizam sistemas semióticos distintos. Duval (1993)DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993. ressalta que as representações semióticas não são, em absoluto, mera exteriorização de representações mentais.

A complexidade cognitiva subjacente à construção de representações semióticas não permite reduzir as representações semióticas à exteriorização das representações mentais. A diversidade de registros de representação semiótica é indissociável do funcionamento cognitivo humano. Essa indissociabilidade pode se expressar, inclusive, na relação entre semiose e noesis. A semiose pode ser definia como apreensão ou mesmo produção de uma representação semiótica, enquanto a noesis consiste na apreensão conceitual de um objeto. Ambas são essencialmente interdependentes. Coordenar diversos registros de representação semiótica é fundamental para apreender conceitualmente os objetos. Reconhecer e não confundir o objeto com suas possíveis representações é uma condição para representação semiótica que expressa a estreita ligação entre semiose e noesis no funcionamento cognitivo humano (DUVAL, 1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.).

Os sistemas semióticos somente podem ser considerados como registros de representação quando permitem três atividades cognitivas fundamentais ligadas à semiose. A primeira é a formação de uma representação identificável (enunciação de uma frase em língua materna, construção de um desenho geométrico, equação ou gráfico, por exemplo). Trata-se de uma atividade que implica a seleção da relação de dados subjacentes ao conteúdo a ser representado. A formação da representação deve seguir as regras de conformidade do sistema semiótico a que reporta (regras gramaticais, por exemplo), não se tratando de regras de produção efetiva (DUVAL, 1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.).

A segunda atividade ligada à semiose é o tratamento que as representações devem possibilitar. Trata-se de uma transformação da representação no mesmo registro em que ela foi formada inicialmente, sendo, em essência, uma transformação interna a um registro. A transformação pode ser exemplificada pela paráfrase na língua natural, pelo cálculo (numérico, algébrico, proposicional), no âmbito das expressões simbólicas, pela reconfiguração, no caso das figuras geométricas e pela anamorfose, no caso de todas as representações figurais (DUVAL, 1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.).

A terceira e última atividade é a conversão de uma representação, ou seja, a transformação de uma função em uma interpretação em outro registro, preservando-se a totalidade ou parte do conteúdo inicialmente representado. São exemplos de conversão a ilustração, que converte uma representação linguística em uma representação figural, a tradução e a descrição, que converte uma representação não verbal (figura, gráfico ou esquema) em uma função de caráter linguístico (DUVAL, 1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.).

Utilizar diversos registros de representação caracteriza o funcionamento do pensamento humano, distinguindo-o da inteligência animal e da artificial. O progresso cognitivo se faz acompanhar do desenvolvimento de novos sistemas semióticos que coexistem com sistemas previamente estabelecidos (GRANGER, 1979GRANGER, G. G. Langage et epistémologie. Paris: Klinksieck, 1979.).

Deve-se considerar que os diferentes registros de representação semiótica podem ser complementares entre si. Cada registro escolhido para representar um objeto, conceito ou situação implica na seleção de elementos significativos ou informacionais do conteúdo que se propõe representar. A seleção do tipo de registro se dá em razão dos limites (inconvenientes) e das possibilidades semióticas do registro selecionado. Toda representação é parcial, cognitivamente, em relação ao que representa. Transitar de um registro para outro implica representar aspectos distintos do mesmo conteúdo ou situação (DUVAL, 1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.).

Outro aspecto essencial a ser considerado é o fato de que o representante de um registro pode também ser considerado representante de outro registro, a exemplo da relação entre texto e imagem. Cada registro conta com tratamentos que lhe são próprios e coordená-los não é algo essencialmente natural. Tampouco se trata de algo facilmente lecionável. Entre a maioria dos alunos nota-se, ao contrário, uma tendência de isolar os registros de representação, tendência que se reflete na incapacidade de reconhecer o mesmo objeto em representações apresentadas em sistemas semióticos diferentes, a exemplo da expressão algébrica de uma relação e sua representação gráfica, o enunciado de uma equação em língua natural e a expressão desta equação na forma literal etc. (DUVAL, 1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.).

Ainda que a ausência de coordenação não impeça de todo a compreensão, acaba por limitar a transferência para aprendizagens posteriores, uma vez que impede ou restringe a utilização de conhecimentos previamente adquiridos em situações nas quais deveriam efetivamente ser utilizados. Não basta coordenar imagens mentais e língua natural para que se promova a coordenação dos diversos sistemas de representação semiótica mobilizados em disciplinas como a Matemática. O isolamento dos registros pode ser causado, em parte, pela ausência de congruência.

A congruência depende de três critérios: a possibilidade de uma correspondência semântica entre os elementos significantes, a univocidade semântica terminal e a organização das unidades significantes. A possibilidade de correspondência semântica entre os elementos significantes se define pelo fato de que a cada unidade significante simples de uma representação pode-se associar uma unidade significante elementar. A univocidade semântica terminal define-se pelo fato de que para cada unidade significante elementar da representação inicial deve corresponder apenas uma unidade significante no registro da representação de chegada. A organização de unidades significantes, por sua vez, define-se pelo fato de que as organizações das unidades significativas das duas representações comparadas levam a apreender as unidades com correspondência semântica respectivamente na mesma ordem nas duas representações. Quando os três critérios são atendidos pode-se identificar o caráter congruente ou não congruente de uma conversão entre duas representações semióticas distintas que representam, ainda que parcialmente, o mesmo conteúdo. Além disso, os critérios permitem que se identifique o grau de congruência entre elas (DUVAL, 1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.).

Os desafios relativos à ausência de congruência podem ser dificuldades conceituais. A conceitualização, por sua vez, implica a coordenação de registros de representação semiótica. Coordenar registros de representação semiótica é condição essencial para a aprendizagem, sobretudo nas disciplinas em que os dados utilizados são as representações semióticas (DUVAL, 1993DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.).

Especificamente no que se refere ao papel da língua natural como registro inicial para o raciocínio, Duval (1993)DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993. destaca que ela deve ser considerada concomitantemente um registro de partida e de chegada, cabendo destacar que não se trata de uma conversão interna realizada diretamente. Transitar entre os registros, partindo e chegando à língua natural, é um processo que passa por representações intermediárias não discursivas, inclusive. A língua natural é um registro tão fundamental quanto outros registros, e seu papel no ensino de Matemática não pode ser negligenciado.

No presente trabalho, a língua natural desempenha papel essencial enquanto objeto de análise, sobretudo na condição de registro de representação semiótica confrontado com os registros gráficos produzidos pelos alunos a partir da atividade descrita na seção seguinte.

3 Procedimentos metodológicos

O artigo se caracteriza como pesquisa exploratória por ter sido norteada pela identificação dos conhecimentos prévios, da compreensão e das intuições de estudantes de Engenharia acerca do comportamento dos preços de ações de empresas de diferentes setores econômicos. Trata-se, portanto, de uma pesquisa qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1991BOGDAN, R.; BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação. Porto: Editora Porto, 1991.) cujo objeto de análise consiste em registros gráficos e textuais, a exemplo do que fazem os trabalhos sobre registros de representação semiótica (COLOMBO; FLORES; MORETTI, 2008COLOMBO, J. A. A.; FLORES, C. R.; MORETTI, M. T. Registros de representação semiótica nas pesquisas brasileiras em Educação Matemática: pontuando tendências. Zetetiké, Campinas, v. 16, n. 29, p. 41-72, jan./jun. 2008.; COUTINHO; SILVA; ALMOULOUD, 2011COUTINHO, C. Q. S.; SILVA, M. J. F.; ALMOULOUD, S. A. Desenvolvimento do pensamento estatístico e sua articulação com a mobilização de registros de representação semiótica. Bolema, Rio Claro, v. 24, n. 39, p. 495-514, ago. 2011.; SILVA; SANTIAGO; SANTOS, 2014SILVA, F. A. F.; SANTIAGO, M. M. L.; SANTOS, M. C. dos. Significados e representações dos números racionais abordados no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM. Bolema, Rio Claro, v. 28, n. 50, p. 1485-1504, dez. 2014.; SALGUEIRO; SAVIOLI, 2014SALGUEIRO, N. C. G.; SAVIOLI, A. M. P. D. Registros de representação semiótica de funções: análise de produções escritas de estudantes de ensino médio. Vidya, Santa Maria, v. 34, n. 2, p. 47-60, jul./dez. 2014.). Ademais, os procedimentos adotados também guardam correspondência com os procedimentos adotados em estudos sobre os desafios da construção de gráficos (LEINHARDT; ZASLAVSKY; STEIN, 1990LEINHARDT, G.; ZASLAVSKY, O.; STEIN, M. K. Functions, graphs, and graphing: tasks, learning, and teaching. Review of Educational Research, [S.l.], v. 60, n. 1, p. 1-64, 1990.).

A atividade aqui descrita foi realizada no início do semestre da disciplina de Economia para um curso de Engenharia de uma universidade pública do sul do Brasil, e tinha como finalidade pedagógica básica identificar como os estudantes projetam e, sobretudo, como justificam o comportamento dos preços de ações utilizando (ou não) elementos de micro ou macroeconomia. Cada um dos estudantes que participou da atividade recebeu material impresso contendo as instruções da atividade que constam no Quadro 1.

Quadro 1
Instruções para a atividade de comportamento do preço das ações de empresas de capital aberto instruções

O material impresso continha, além das instruções, gráficos de linha representando a evolução do preço das ações de diferentes empresas. Os gráficos foram apresentados nos moldes do exemplo da Figura 1.

Figura 1
Exemplo de gráfico utilizado na atividade

A representação da evolução do preço das ações pode se dar utilizando diferentes tipos e formatos de gráficos e normalmente se faz acompanhar de um conjunto de indicadores financeiros. Os tipos mais comuns de gráficos de preços de ações incluem gráficos de linha (como o da Figura 1), gráficos de candlesticks ou “velas”, gráficos de barras e gráficos de área. Para a atividade proposta, optou-se pelos gráficos de linha (com leve sombreado) supondo serem mais simples do que as demais versões. Gráficos de “velas” e gráficos de barras contêm informações mais complexas que seriam menos acessíveis para estudantes sem familiaridade com a temática e poderiam prejudicar a proposta inicial da atividade: identificar conhecimentos prévios dos estudantes.

A atividade incluiu gráficos de 8 empresas: Alpargatas S.A., Banco Bradesco S.A., Eztec Empreendimentos e Participações S.A., Magazine Luiza S.A., Petrobras S.A., Marcopolo S.A., Suzano Papel e Celulose S.A. e Vale S. A. Os gráficos contemplaram períodos distintos de 2017 a 2018, cabendo aos estudantes realizarem projeções para os meses do trecho encoberto.

Cabe ressaltar que, não obstante a representação gráfica dos preços num plano cartesiano contenha o tempo como rótulo do eixo das abscissas e o preço no eixo nas ordenadas, não é plausível supor uma relação de causalidade. O preço varia no tempo, mas não é o tempo a causa da variação dos preços, como poderia sugerir uma interpretação da notação funcional entre as variáveis preço e tempo. As variações do preço das ações decorrem de diversas causas que incluem desde eventos micro ou macroeconômicos que possam promover aumento ou redução dos lucros da empresa até expectativas de investidores e especuladores acerca da variação do próprio preço das ações.

As projeções realizadas pelos estudantes foram digitalizadas para que então seus registros gráficos e textuais fossem analisados. Uma leitura preliminar do material permitiu a identificação de determinados padrões – gráficos e textuais – passíveis de discussão no contexto da teoria dos registros de representação semiótica, o que inspirou o aprofundamento das análises.

Nesse contexto, por um lado as projeções e as respostas serviram de base para o encaminhamento da disciplina de Economia, permitindo abordar temas e conceitos de modo específico para desenvolver conhecimentos econômicos relevantes na formação em Engenharia. Por outro lado, as respostas e projeções dos estudantes apresentaram diversos elementos interessantes da perspectiva dos processos cognitivos subjacentes à conceitualização. Diante dos limites inerentes ao artigo, este trabalho – essencialmente qualitativo – se restringe apenas a um dos fenômenos instigantes identificados: o uso do termo constante e suas variantes lexicais.

4 Resultados e discussão

Do total de 47 estudantes que participaram da atividade, 9 (19%) utilizaram a palavra constante, com variantes lexicais, para descrever as projeções realizadas. O significado atribuído ao termo, contudo, não representou, em nenhum dos casos, a definição de constante matemática na acepção de um valor fixo, uma vez que nenhum dos gráficos projetados pelos estudantes representou uma reta horizontal. Em casos específicos, a exemplo da Figura 1, a palavra constante ocorre como qualificador de uma variação direcional, como crescimento constante.

À luz da teoria das representações semióticas de Duval (1993)DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993., para efeito de análise, dois aspectos parecem particularmente relevantes no emprego do termo constante pelos alunos. O primeiro remete à relação entre semiose e noesis, em especial no que concerne à coordenação de diferentes registros de representação semiótica. O segundo remete à congruência – ou ausência de congruência – entre as representações, em especial no que se refere à – falta de – correspondência semântica entre os elementos significantes (texto e gráfico).

A produção da representação semiótica na condição de registro gráfico – semiose – não parece ter encontrado contrapartida de apreensão conceitual – noesis – quando o registro gráfico é confrontado com o registro em língua portuguesa apresentado pelos estudantes que utilizaram a palavra constante em suas justificativas textuais.

O emprego semântico de constante e suas variantes lexicais parece remeter ao uso não matemático do termo, sobretudo quando se qualifica uma função constante cuja representação gráfica supõe uma reta horizontal. A ausência de congruência, nesse sentido, se expressa pela falta de correspondência semântica (na acepção matemática do termo) entre a palavra constante registrada em língua natural e a produção gráfica a que faz alusão. Para os casos analisados neste artigo, o confronto entre gráfico e texto sugere que o uso da palavra constante reflete certa dificuldade (ou ausência de rigor conceitual) por parte dos estudantes no que se refere à conceitualização.

Deve-se ponderar, contudo, que, no caso dos exemplos apresentados no Quadro 2, o uso da palavra constante em composição com crescimento (crescimento constante) opera como qualificador de uma tendência projetada e descrita, à exceção do gráfico 4, cujo texto indica o termo negativo em sua descrição (“a Alpargatas não teve um constante crescimento” Registro dos alunos, 2019). Contudo, soa curioso que, nesse mesmo caso (gráfico 4, quadro 2), o resultado gráfico da projeção é, de fato, uma tendência de alta. O estudante parece negar a “constância do crescimento” possivelmente em razão do movimento oscilatório do gráfico cujo trecho havia sido apresentado (especificamente na queda seguida de aumento do preço da ação em setembro de 2018). Nos demais exemplos do quadro 2 os estudantes parecem utilizar constante como forma de assinalar, verbalmente, a continuidade de uma trajetória ascendente, ainda que o gráfico desenhado contenha oscilações e não se configure como uma reta ascendente de taxa efetivamente constante. Nessa perspectiva, o emprego semântico adotado pelos alunos parece vincular-se à tendência projetada para o preço da ação, e não ao comportamento do preço considerando-se os sucessivos movimentos de alta e baixa representados graficamente (ainda que sejam aumentos ou reduções “pequenas”).

Quadro 2
Exemplos de gráfico com projeção de “crescimento constante” do preço de ações

Outra composição lexical digna de discussão é a expressão “manter constante”, exemplificada nos gráficos 2, 3 e 4 do quadro 3. Ao contrário do verificado nas representações gráficas do quadro 2, os gráficos 1, 3 e 4 do quadro 3 assumem trajetórias mais próximas à horizontalidade, fato que potencializa o reconhecimento de maior congruência semântica entre registros de representação gráfica e textual. Ainda que não se constate a representação de retas horizontais (constantes matemáticas efetivas), nota-se menor ausência de congruência entre texto e gráfico, à exceção do gráfico 2. Especificamente no caso dessa representação (gráfico 2, quadro 3), pode-se aventar a hipótese da subjetividade do emprego de expressões quantificadoras como “sem muitas variações”. Ademais, pode-se cogitar também que a relativa proximidade entre o preço inicial e o preço final tenha sido elemento representado como “constância”, de modo que o notório movimento de alta seguido de queda tenha sido interpretado como “pouco significativo” para análise global da tendência. Note-se, contudo, que novamente não se trata da representação de uma constante na acepção matemática do termo, ainda que tenham sido empregados atenuantes lexicais (“sem muitas variações”). Em termos semânticos e em termos de conceitualização, a definição de constante subjacente às representações textuais dos estudantes parece assumir uma conotação que admite variações (constante é o que varia pouco, e não o que não varia).

Quadro 3
Exemplos de gráfico com projeção de manutenção de “constante” de preços de ações

Os gráficos do quadro 4 também apresentam atenuantes lexicais. A variabilidade representada graficamente tem como contrapartida textual a descrição de “mais constante”, o que, novamente, parece remeter a um conceito de constante não congruente semanticamente com a acepção matemática estrita. Especificamente no que se refere ao registro de representação no gráfico 2 do quadro 3, nota-se que a projeção desenhada apresenta variações visualmente significativas, sendo a redução textualmente descrita como “depois fica mais constante”.

Quadro 4
Exemplo de gráfico com projeção de valores “mais constantes” para preço de ações

Em termos gerais, percebe-se, a partir da análise e da interpretação dos registros de representação gráfica e textual construídos pelos estudantes, que a especificidade do emprego da palavra constante pode ser indício de dificuldades de conceitualização entre os estudantes, nos termos da teoria dos registros de representação semiótica de Duval (1993)DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993..

Comparando-se os resultados aqui descritos com os precedentes na literatura, pode-se destacar que, tal como constatado por Mevarech e Kramarsky (1997MEVARECH, Z. R.; KRAMARSKY, B. From verbal descriptions to graphic representations: Stability and change in students’ alternative conceptions. Educational Studies in Mathematics, [S.l.], v. 32, n. 3, p. 229-263, mar. 1997.), conceitos equivocados podem afetar a construção e a interpretação de gráficos por estudantes. Se Lovell (1971)LOVELL, K. Some aspects of growth of the concept of a function. In: ROSSKOPF, M. F.; STEFFE, L. P.; TABACK, S. (ed.). Piagetian cognitive development research and mathematical education. Washington: National Council of Teachers of Mathematics, 1971. p. 12-33., Dreyfus e Eisenberg (1982DREYFUS, T.; EISENBERG, T. Intuitive functional concepts: a baseline study on intuitions. Journal for Research in mathematics Education, [S.l.], v. 13, n. 5, p. 360-380, nov. 1982.), Markovits et al. (1983)MARKOVITS, Z. et al. Functions: linearity unconstrained. In: HERSHKOWITZ, R. (ed.). Proceedings of the seventh international conference of the International Group for the Psychology of Mathematics Education. [S.l.], 1983. p. 271-277. constataram a tendência dos estudantes em produzirem gráficos lineares, encontrou-se, no presente estudo, algo relativamente “oposto”, inclusive em função da natureza da atividade: gráficos que, para corresponder ao texto, deveriam ser lineares (e horizontais). Ainda que os registros textuais dos estudantes dessem a entender que se trataria de um gráfico linear (constante), os registros gráficos não convergiram com as descrições. Por outro lado, se uma tendência a simplificar ou suavizar gráficos foi identificada por Tversky e Schiano (1989TVERSKY, B.; SCHIANO, D. J. Perceptual and conceptual factors in distortions in memory for graphs and maps. Journal of Experimental Psychology, [S.l.], n. 118, v. 4, p. 387-398, 1989.) e por Shah e Carpenter (1995SHAH, P.; CARPENTER, P. A. Conceptual limitations in comprehending line graphs. Journal of Experimental Psychology, [S.l.], v. 124, n. 1, p. 43-61, 1995.), no presente trabalho pôde-se constatar uma simplificação, flexibilização ou suavização conceitual da palavra constante, tal como empregado pelos estudantes.

5 Considerações finais

Sendo resultado de uma iniciativa exploratória de identificação dos conhecimentos prévios, da compreensão e das intuições de estudantes de Engenharia acerca do comportamento dos preços de ações de empresas de diferentes setores econômicos, o presente artigo realizou a análise de registros de representação semiótica resultantes de uma atividade realizada durante uma aula de Economia.

O trabalho se restringiu à análise de apenas um dos fenômenos curiosos1 1 A título de exemplo, particularmente no caso dos gráficos de preço das ações da empresa Vale S.A. verificou-se que parte dos estudantes apresentou dois tipos de vieses cognitivos quando projetaram os gráficos. Vieses cognitivos são “equívocos” cometidos em decisões, julgamentos e avaliações individuais. Os vieses identificados foram denominados de “efeito Mariana” e “efeito Brumadinho”. O “efeito Mariana” consistiu em um tipo de viés cognitivo que se manifestou na crença de prolongamento da duração de eventos negativos (amplamente veiculados na imprensa) sobre o preço das ações da empresa. Estudantes afetados pelo efeito Mariana assumiram que a duração da queda do preço das ações da empresa foi substancialmente maior do que de fato foi. Os registros textuais dos estudantes faziam alusão ao colapso da barragem em Mariana para justificar tendências de queda. O “efeito Brumadinho”, por sua vez, seria um viés cognitivo limitante da atenção e da percepção que pode afetar projeções e estimativas, sendo resultado da confluência de diferentes vieses cognitivos (efeito foco, viés de negatividade, efeito nivelamento entre outros). Alunos afetados pelo efeito Brumadinho parecem não ter atentado para as datas constantes nos gráficos e projetaram queda de preço em 2018, sendo que o colapso da barragem de Brumadinho somente ocorrera em 2019. Seus registros textuais mencionavam Brumadinho como causa da queda, tendência que efetivamente não caracterizava o comportamento do preço para o período solicitado. identificados a partir da atividade realizada: o emprego peculiar da palavra constante pelos estudantes. Dos 47 estudantes que realizaram a atividade, 19% utilizaram a expressão “constante” com algumas variações lexicais. Nenhum dos estudantes empregou a expressão na acepção matemática do termo (como valor fixo, cuja representação gráfica esperada seria uma reta horizontal no plano cartesiano).

Os resultados foram discutidos em torno de dois aspectos contemplados pela teoria dos registros de representação de Duval (1993)DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnement cognitif de la pensée. Annales de Didactiques et de Sciences Cognitives, [S.l.], v. 5, p. 35-65, 1993.: (a) a relação entre semiose e noesis e (b) a ausência de congruência semântica entre os registros de representação semiótica produzidos pelos estudantes. A produção da representação semiótica gráfica – semiose – não parece ter encontrado correspondência de apreensão conceitual – noesis – quando o registro gráfico foi confrontado com o registro textual apresentado pelos estudantes que utilizaram o termo “constante” em suas explicações escritas.

Os resultados aqui descritos, quando comparados com a literatura anterior que constatou tendência dos estudantes de outras amostras de produzirem gráficos lineares, divergem por indicar algo relativamente oposto, inclusive em função da natureza da atividade proposta. Os alunos não produziram gráficos lineares que aderissem às suas descrições textuais, indicando dificuldades de conceitualização e de coordenação de registros de representação semiótica distintos. Em contrapartida, quando os resultados são confrontados com estudos que identificaram uma tendência a simplificar ou suavizar registros de representação gráfica, pôde-se constatar no presente estudo uma tendência à simplificação, flexibilização ou suavização conceitual e semântica da palavra constante, não necessariamente dos gráficos em si.

Em termos de implicações pedagógicas, pode-se afirmar que o trabalho incita reflexões acerca do desenvolvimento de atividades que possam promover a coordenação dos diferentes registros de representação semiótica. Em se tratando de um curso de Engenharia, pode-se cogitar a inclusão de atividades de práticas textuais que estimulem o reconhecimento da importância da conceitualização adequada, da relevância da congruência semântica e dos benefícios cognitivos decorrentes da coordenação de diferentes tipos de registros de representação semiótica.

  • 1
    A título de exemplo, particularmente no caso dos gráficos de preço das ações da empresa Vale S.A. verificou-se que parte dos estudantes apresentou dois tipos de vieses cognitivos quando projetaram os gráficos. Vieses cognitivos são “equívocos” cometidos em decisões, julgamentos e avaliações individuais. Os vieses identificados foram denominados de “efeito Mariana” e “efeito Brumadinho”. O “efeito Mariana” consistiu em um tipo de viés cognitivo que se manifestou na crença de prolongamento da duração de eventos negativos (amplamente veiculados na imprensa) sobre o preço das ações da empresa. Estudantes afetados pelo efeito Mariana assumiram que a duração da queda do preço das ações da empresa foi substancialmente maior do que de fato foi. Os registros textuais dos estudantes faziam alusão ao colapso da barragem em Mariana para justificar tendências de queda. O “efeito Brumadinho”, por sua vez, seria um viés cognitivo limitante da atenção e da percepção que pode afetar projeções e estimativas, sendo resultado da confluência de diferentes vieses cognitivos (efeito foco, viés de negatividade, efeito nivelamento entre outros). Alunos afetados pelo efeito Brumadinho parecem não ter atentado para as datas constantes nos gráficos e projetaram queda de preço em 2018, sendo que o colapso da barragem de Brumadinho somente ocorrera em 2019. Seus registros textuais mencionavam Brumadinho como causa da queda, tendência que efetivamente não caracterizava o comportamento do preço para o período solicitado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    24 Set 2019
  • Aceito
    22 Abr 2020
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