Acessibilidade / Reportar erro

Contribuições da história da matemática para a construção dos saberes do professor de matemática

Contributions of the history of mathematics to the construction of mathematic teacher's knowledge

Resumos

Este artigo apresenta os resultados de uma investigação a respeito da relevância dos conhecimentos advindos de estudos da história da matemática para o processo de formação dos saberes docentes. As investigações evidenciam que os conhecimentos teóricos e metodológicos da história da matemática são importantes para a formação do professor. Tivemos como objetivo analisar e evidenciar como tais conhecimentos colaboram para a estruturação dos saberes do professor de matemática. Para isso, entrevistamos professores que vivenciaram o processo de construção e aplicação de uma proposta pedagógica, apoiada na história da matemática, em sala de aula. Por meio da análise de conteúdo, estruturamos seis categorias que evidenciam alguns saberes docentes, que fazem parte ou vão além daqueles saberes já explicitados pela literatura.

História da Matemática; Formação de Professores de Matemática; Saberes Docentes; Saberes Interdisciplinares


This paper presents findings of an investigation into the relevance of knowledge acquired from studies of the history of mathematics to the process of formation of mathematics teacher's knowledge. The investigation shows that the theoretical and methodological knowledge of the history of mathematics is important for teacher education. Our objective was to analyze and put in evidence how such knowledge contributes to structuring the knowledge of mathematics teachers. To this end, we interviewed teachers who had experienced the process of research, construction and application in the classroom of a pedagogical proposal, based on the history of mathematics. From these data, by means of content analysis, we structured six categories that show forms of teachers' knowledge, within or beyond those already present in the scientific literature of Mathematics Education.

History of Mathematics; Mathematics Teacher's Education; Teacher Knowledge; Interdisciplinary Knowledge


ARTIGOS

Contribuições da história da matemática para a construção dos saberes do professor de matemática

Contributions of the history of mathematics to the construction of mathematic teacher's knowledge

Eliane Maria de Oliveira AramanI; Irinéa de Lourdes BatistaII

IDoutora em Ensino de Ciências e Educação Matemática pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Docente do curso de Licenciatura em Matemática na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), Cornélio Procópio, PR, Brasil

IIDoutora em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP). Professora Associada C do Departamento de Física e do Programa PECEM na Universidade Estadual de Londrina (UEL), Londrina, PR, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Eliane Maria de Oliveira Araman Avenida Alberto Carazzai, 1640 CEP: 86300-000, Cornélio Procópio PR, Brasil E-mail: eliane.araman@gmail.com

RESUMO

Este artigo apresenta os resultados de uma investigação a respeito da relevância dos conhecimentos advindos de estudos da história da matemática para o processo de formação dos saberes docentes. As investigações evidenciam que os conhecimentos teóricos e metodológicos da história da matemática são importantes para a formação do professor. Tivemos como objetivo analisar e evidenciar como tais conhecimentos colaboram para a estruturação dos saberes do professor de matemática. Para isso, entrevistamos professores que vivenciaram o processo de construção e aplicação de uma proposta pedagógica, apoiada na história da matemática, em sala de aula. Por meio da análise de conteúdo, estruturamos seis categorias que evidenciam alguns saberes docentes, que fazem parte ou vão além daqueles saberes já explicitados pela literatura.

Palavras-chave: História da Matemática. Formação de Professores de Matemática. Saberes Docentes. Saberes Interdisciplinares.

ABSTRACT

This paper presents findings of an investigation into the relevance of knowledge acquired from studies of the history of mathematics to the process of formation of mathematics teacher's knowledge. The investigation shows that the theoretical and methodological knowledge of the history of mathematics is important for teacher education. Our objective was to analyze and put in evidence how such knowledge contributes to structuring the knowledge of mathematics teachers. To this end, we interviewed teachers who had experienced the process of research, construction and application in the classroom of a pedagogical proposal, based on the history of mathematics. From these data, by means of content analysis, we structured six categories that show forms of teachers' knowledge, within or beyond those already present in the scientific literature of Mathematics Education.

Keywords: History of Mathematics. Mathematics Teacher's Education. Teacher Knowledge. Interdisciplinary Knowledge.

1 Introdução

As pesquisas que procuram compreender o processo de formação docente vêm atraindo, cada vez mais, a atenção e a preocupação da comunidade acadêmica. Muitas dessas investigações visam compreender a complexidade de conhecimentos e saberes que os professores mobilizam no exercício de suas funções.

É nesta perspectiva que a presente investigação se insere. Nosso objetivo foi compreender e explicitar algumas relações entre os conhecimentos teóricos e metodológicos advindos da história da matemática e a construção dos saberes de professores de matemática.

Inseridos nessa temática, a pesquisa que realizamos apresenta novos elementos para essa discussão, uma vez que analisa a construção dos saberes de professores que, além de terem contato com a história da matemática e com os estudos que evidenciam as suas potencialidades na educação matemática, construíram e aplicaram propostas para o uso da história da matemática em sala de aula.

Para alcançar esse objetivo, investigamos professores que vivenciaram a pesquisa, construção e aplicação de uma abordagem pedagógica, fundamentada na história da matemática. Por meio dos discursos desses professores e embasados nos referenciais teóricos que subsidiam a pesquisa, procuramos estabelecer elementos que demonstram a presença dos conhecimentos da história da matemática na estruturação dos saberes docentes dos professores pesquisados, assim como analisar de que forma o processo de construção de abordagens históricas traz implicações para a construção dos saberes dos mesmos. As compreensões alcançadas no estudo evidenciam elementos relevantes, que contemplam e enriquecem a discussão do papel da história da matemática na formação de saberes docentes já apresentadas pela literatura.

2 Relevância da história da matemática para a construção dos saberes docentes

São muitas as pesquisas que discutem os saberes docentes e a importância de investigações que estudem e explicitem os saberes construídos e mobilizados pelos professores no exercício profissional (ALMEIDA; BIAJONE, 2007; BRITO; ALVES, 2008; FIORENTINI; SOUZA JUNIOR; MELO, 2003; GAUTHIER et al. , 1998; SHULMAN, 1986; TARDIF, 2002). De acordo com Brito e Alves (2008), a profissionalização do ofício do ensino pressupõe a compreensão e descrição da natureza dos saberes que fundamentam a prática profissional do professor, que deve enfrentar o desafio de identificar os saberes e as tomadas de decisão próprios ao ensino, considerando o contexto real, variável e complexo.

Em alguns estudos fundamentadores como os realizados por Shulman (1986), por Gauthier et al. (1998) e por Tardif (2002) que, além de apresentarem alguns tipos de saberes necessários para a ação docentes, evidenciam a importância de um estudo sistematizado dos saberes mobilizados pelos professores durante a sua prática, de forma que os mesmos não fiquem restritos às experiências particulares de cada professor, mas que possam ser analisados à luz das pesquisas científicas. É com essa proposta que desenvolvemos este trabalho, procurando relacionar os conhecimentos da história da matemática com os saberes do professor de matemática.

As pesquisas recentes da área apresentam um vasto campo de argumentos favoráveis à implementação de abordagens históricas nas aulas de matemática, mas o que buscamos discutir é a formação do professor para uma implementação de qualidade. Autores como Furinguetti (2007), Brito e Carvalho (2009), Bursal (2010), entre outros, consideram que os estudos históricos a respeito dos diversos tópicos de matemática podem enriquecer o conhecimento do professor e, em consequência disso, sua atuação em sala de aula.

A partir de uma revisão nas pesquisas realizadas com esse enfoque, a inserção de elementos históricos traz potencial benefício para a formação do professor de matemática, em diversos aspectos, como destacamos a seguir:

• Compreensão da natureza do conhecimento matemático1 1 Estamos entendendo natureza do conhecimento matemático como a compreensão de algumas características que permeiam o seu desenvolvimento, como seus valores epistêmicos subjacentes, seus métodos e suas práticas institucionais (DASS, 2005). :

A partir dos estudos de Charalambous, Panaoura e Philippou (2009), Barbin (2000), Bursal (2010) e Dass (2005), percebemos que muitos professores não apresentam uma compreensão adequada da sua ciência, no caso, a matemática. Apresentam a noção de um corpo de conhecimentos pronto, acabado, no qual não há revisões a serem feitas, como também a noção de uma ciência de caráter empírico, em que as interpretações são feitas apoiadas nas observações. Em adição, os professores têm a concepção de que os conteúdos, teorias, leis, entre outros, são descobertos por pessoas geniais, com pouca colaboração entre os pares. Além disso, concebem uma ciência livre de influências sociais, culturais e políticas.

• Compreensão dos conteúdos matemáticos:

Ao estudar um determinado conceito, a partir de uma abordagem histórica, o professor pode caminhar para uma compreensão de como aquele conceito foi sendo desenvolvido, quais os elementos conceituais necessários para a sua compreensão, quais são os pontos de maior dificuldade, por que eles foram importantes naquela época, por que são importante hoje, quais eram as necessidades para o desenvolvimento daquele dado conceito, entre outros - Batista e Luccas (2004), Bursal (2010), Brito e Carvalho (2009), Furinguetti (2007). Essa compreensão, que vai além daquela recebida durante a sua formação, tem o potencial de promover um entendimento mais amplo e significativo do conteúdo matemático, o que trará benefícios para suas aulas.

• Formação metodológica do professor:

Ao elaborar uma abordagem histórica para ensinar algum conteúdo matemático, o professor precisa ter cuidados metodológicos, como os de caráter pedagógico, para adequar o material histórico ao estágio de desenvolvimento dos seus alunos, ao tempo disponível para tal, certificar-se de que a proposta colabore efetivamente para a aprendizagem, entre outros - Dass (2005), Fried (2008). Ao se propor a desenvolver abordagens históricas com seus alunos, o professor utiliza conhecimentos que vão além dos históricos ou dos conceituais relacionados ao conteúdo. Ele utiliza conhecimentos pedagógicos vindos de estudos teóricos, e, também, de sua prática, a fim de tornar factível o uso daquelas informações históricas em sala de aula.

• Visão interdisciplinar do professor:

A questão da interdisciplinaridade2 2 Segundo Lavaqui e Batista (2007), a conceituação de interdisciplinaridade não apresenta uma definição estável, associada a diferentes concepções epistemológicas. Salientamos que, nesta pesquisa, a compreensão que temos de interdisciplinaridade refere-se às interações possíveis e existentes entre duas ou mais disciplinas, cuja interação pode ir desde a simples comunicação de ideias até a integração de conceitos, promovendo enriquecimentos mútuos. 3 De acordo com Brito e Carvalho (2009, p. 15-16), o entender profundamente vai além "de o professor demonstrar com exatidão teoremas, lidar com linguagem matemática de um modo mecânico", mas que "além de conhecer teoremas, consegue relacionar diferentes campos desse conhecimento, refletir sobre os fundamentos da Matemática, perceber seu dinamismo interno e suas relações com outros campos do saber", entre outros. vem sendo muito debatida na comunidade acadêmica, que ressalta a necessidade da superação daquela visão compartimentada das áreas do conhecimento. A história da matemática já guarda em si esse caráter interdisciplinar. Temos, num eixo, o estudo histórico e suas especificidades; em outro encontramos as questões filosóficas; e ainda temos o eixo relativo ao conhecimento matemático e suas características, que são diferentes de outras ciências. Então, trabalhar com história da matemática já pressupõe uma postura interdisciplinar.

Além disso, os estudos históricos proporcionam uma visão mais ampla do conhecimento matemático, em contraste com a visão especializada - e, por vezes, compartimentada - da formação inicial. Essa visão permite que o professor, por meio dos estudos históricos, observe as relações existentes entre as várias áreas do conhecimento científico e como os conhecimentos de uma área podem contribuir para o desenvolvimento de outras - Batista (2009), Grugnetti e Rogers (2000). Salientamos, ainda, a interface com os conhecimentos pedagógicos do professor. Ao estudar e desenvolver uma abordagem histórica para o ensino, o professor aprende a necessidade da aproximação de todas essas áreas, como já nos referimos nas questões metodológicas.

3 Desenvolvimento metodológico da pesquisa

Este estudo está inserido no âmbito de pesquisa qualitativa em educação matemática. Esse tipo de investigação apresenta uma natureza descritiva, na qual os pesquisadores têm um interesse maior no processo e nos seus significados do que nos resultados ou produtos (BOGDAN; BIKLEN, 1994; LÜDKE; ANDRÉ, 1986).

A partir dos estudos teóricos, conseguimos definir alguns aspectos que evidenciam a relevância da história da matemática para a formação dos saberes do professor de matemática. Esses aspectos foram considerados tanto para a estruturação das questões de entrevistas quanto para a análise dos dados.

Para a coleta dos dados empíricos, utilizamos entrevistas semiestruturadas com seis professores que vivenciaram as experiências de construir e aplicar uma abordagem pedagógica, fundamentada na história da matemática, em sala de aula. No entendimento de Fiorentini e Lorenzato (2007, p. 120), as entrevistas são vantajosas "pois permitem ao entrevistado fazer emergir aspectos que não são normalmente contemplados por um simples questionário". As questões versaram a respeito da formação dos professores, da atuação profissional dos mesmos, do interesse pela história da matemática e sua utilização na educação matemática, do processo de pesquisa, construção e aplicação da abordagem histórica em sala de aula, conforme a configuração a seguir:

1) Há quanto tempo você é professor? Com quais turmas trabalha? Que disciplinas ministra? Em quais escolas?

2) Por que você resolveu fazer um curso de mestrado?

3) Você já tinha interesse por pesquisa?

4) Como, ou por que, você decidiu fazer pesquisa em história da matemática?

5) A construção da abordagem histórica contribuiu de alguma forma para a sua compreensão de ciência/matemática? De que forma isso ocorreu?

6) O que você estava procurando ao construir uma abordagem histórica?

7) Como foi o processo de construção da abordagem?

8) Ao realizar a sua pesquisa, você conseguiu perceber as relações entre esse determinado conhecimento matemático e outros conhecimentos? Como? Isso foi contemplado na abordagem? De que forma?

9) Os cuidados metodológicos observados em uma pesquisa como essa que você desenvolveu, trouxeram alguma contribuição para sua atuação em sala de aula? Como?

10) Você encontrou dificuldades nesse percurso? Quais? Como fez para superá-las?

Elegemos como metodologia de análise de dados a análise de conteúdo, pois esta possibilita uma interpretação dos dados que "oscila entre os dois pólos do rigor da objetividade e da fecundidade da subjetividade" (BARDIN, 2004, p. 7). A análise de conteúdo busca a interpretação dos discursos por meio de uma análise sistematizada das comunicações.

Segundo Bardin (2004), a categorização é um processo estruturado que comporta duas dimensões: isolar os elementos (construção das unidades de registro) e classificá-los com a finalidade de organizar o material analisado (agrupar os elementos por analogia). Os temas são muito utilizados nas análises e podem ser compreendidos como afirmações acerca de um assunto, ou as ideias, enunciados, proposições, que sejam portadores de significações. Os temas são utilizados como unidades de registro "para estudar motivações de opiniões, de atitudes, de valores, de crenças, de tendências, etc." (BARDIN, 2004, p. 99). Dessa forma, optamos por um processo de análise categorial temático.

A partir da transcrição das entrevistas, iniciamos o processo de análise, identificando unidades de registros e, a partir das similitudes dos discursos dos professores, organizamos seis categorias temáticas que possibilitam a compreensão da relevância dos conhecimentos teóricos e metodológicos advindos do trabalho com a história da matemática na construção dos saberes dos sujeitos envolvidos nesta investigação.

O processo de seleção dos sujeitos da pesquisa se deu pela adequação do perfil do professor que procurávamos com os objetivos da pesquisa. Os professores sujeitos do estudo deveriam ter vivenciado a experiência de desenvolver e aplicar abordagens direcionadas à aprendizagem, fundamentadas na história da matemática. Por meio de um levantamento realizado em programas de Pós-graduação na área de ensino de ciências e educação matemática conseguimos localizar, nos bancos de teses e dissertações, 18 trabalhos com tais características, conforme Araman e Batista (2010).

Estabelecemos contato com vários autores das referidas pesquisas e conseguimos realizar entrevistas com seis deles, os quais concordaram, esclarecidamente, em participar de nossa pesquisa. Os professores que participaram da coleta de dados para a pesquisa e nos concederam entrevista foram designados por P1 (professor 1), P2 (professor 2) e assim sucessivamente, com a finalidade de preservar a identidade dos mesmos. O quadro a seguir apresenta uma síntese do perfil dos sujeitos participantes:

4 Apresentação e análise dos dados

A análise se desenvolveu por meio da unitarização do corpus e do processo de classificação e aproximação das unidades por similitude, que resultou na estruturação de seis categorias temáticas. Ressaltamos que o processo de categorização tem por base os conhecimentos teóricos dos pesquisadores em conformidade com os objetivos da pesquisa. As categorias temáticas são apresentadas e identificadas no processo de análise a seguir.

• Categoria 1: Lacunas da formação inicial recebida

Essa categoria apresenta os dados que evidenciam a presença de lacunas na formação recebida pelos professores. As pesquisas indicam que os mesmos, muitas vezes, recebem uma formação que não é suficiente para contemplar toda a complexidade de uma situação real de ensino e de aprendizagem - Brito e Alves (2008); Paiva (2008). Observamos no corpus da pesquisa discursos dos professores participantes que apresentavam elementos indicadores de que a formação recebida por eles não foi suficiente para o seu exercício profissional, conforme os exemplos a seguir:

Acredito que apenas a formação recebida no curso superior não é suficiente para o atual cenário do mercado de trabalho em educação. Quando estamos diante de uma sala de aula é que vamos perceber isso. Tem muitas coisas que não aprendemos durante a licenciatura, muitas coisas que nossos alunos questionam em relação à matemática e que não damos conta de responder. P3

Aí, quando os alunos me perguntavam, aquelas perguntas com as quais todo professor de matemática se depara: Para que estudar isso? Para que serve isso? Onde eu vou usar isso? Eu não sabia responder. Então respondia como me responderam quando era aluno: para passar no vestibular, é assim e pronto, mais para frente se você for um engenheiro vai saber, etc. P6 (Destaques das pesquisadoras)

Por meio da análise dessa categoria, observamos que os conhecimentos da formação inicial recebida por estes sujeitos não eram suficientes e tal percepção ocorreu no exercício profissional, diante dos questionamentos dos alunos. Os professores não conseguiam responder a muitas perguntas dos seus alunos, perguntas que extrapolavam a aplicação de fórmulas, a parte mecânica, mas que procuravam um sentido, uma justificativa para a aprendizagem dos conteúdos matemáticos.

• Categoria 2: Compreensão prévia à pesquisa a respeito da natureza do conhecimento matemático pelo professor

Essa categoria contempla alguns aspectos que evidenciam a compreensão dos mesmos em relação à natureza do conhecimento matemático, antes de realizarem a pesquisa em história da matemática. A literatura salienta que os professores não apresentam uma visão adequada de como se dá o desenvolvimento da matemática, e que essa visão influencia a sua atuação pedagógica - Charalambous, Panaoura e Philippou (2009); Barbin (2000); Bursal (2010). Os dados analisados nos permitiram organizar as duas subcategorias a seguir:

- Subcategoria: Visão a-histórica do conhecimento matemático

Procuramos observar se os professores entrevistados apresentavam a visão do conhecimento matemático destituído de seu desenvolvimento histórico. Para investigar, consideramos as unidades de análise que explicitavam uma visão a-histórica do conhecimento matemático, por parte dos professores. Vejam alguns fragmentos que representam a subcategoria:

[...] a maneira que eu havia aprendido na graduação, você tinha um conceito, era aquele conceito estático, tinha uma noção muito grande de uma matemática estática quando estudei na minha graduação. P1

Olha, eu acho que quando eu entrei na faculdade para fazer licenciatura eu também achava isso, que a matemática era um corpo de conhecimento pronto e acabado, mas não de um modo tão rígido. P5

Antes da pesquisa eu tinha uma noção meio equivocada do que era o conhecimento matemático. Ele sempre foi apresentado para mim, em toda a minha vida de aluno, como um conhecimento pronto e acabado, aquela fórmula já apareceu pronta, cabia a nós apenas aplicar. P6 (Destaques das pesquisadoras)

Por meio das falas, podemos perceber que os professores alegaram ter uma compreensão do conhecimento matemático estático, sem evoluções, e que essa compreensão foi desenvolvida ao longo da vida como estudante, alguns deles apresentando a graduação como o momento no qual essa noção foi desenvolvida.

- Subcategoria: Compreensão mitificada do conhecimento matemático

Como indica a literatura (BARBIN, 2000; BURSAL, 2010), os professores apresentam uma visão pouco adequada do conhecimento matemático, com a criação de mitos e heróis sendo uma componente dessa inadequação, uma vez que não apresenta a visão de coletividade na construção do conhecimento. Os trechos a seguir exemplificam a subcategoria:

[...] aquela visão que eu também tinha de uma matemática pronta e acabada, de uma matemática na qual quem fez foram pessoas muito diferentes, especiais. Essa visão de mito acaba sendo passada para nós durante muito tempo, os livros de matemática também apresentam essa visão, aí o aluno acaba também tendo essa compreensão, assim como eu tinha. P2

[...] aquela visão passada nos livros de supergênios que em um estalo mental inventam coisas mirabolantes as quais jamais seremos capazes de aprender. Eu também tinha essa visão, também via a matemática dessa forma, quando meus professores apresentavam, por exemplo, Teorema de Tales, achava que aquele teorema já tinha sido criado prontinho daquele jeito por Tales e ninguém explicava que não era assim. P3 (Destaques das pesquisadoras)

Os professores consideram que a formação inicial, bem como a formação recebida ao longo de suas vidas acadêmicas, não disseminam a ideia de coletividade no desenvolvimento científico e matemático, auxiliando a compor um quadro de mitos, sem um contexto histórico de construção do conhecimento. Como aponta a literatura, a compreensão que o professor tem de como se desenvolve o conhecimento científico é relevante, pois traz implicações em sua atuação pedagógica (LIANG et al. , 2009; DASS, 2005).

• Categoria 3: Contribuições da história da matemática para a compreensão docente da natureza do conhecimento matemático

Uma vez que os sujeitos desta pesquisa tiveram a oportunidade de estudar o desenvolvimento histórico de um conteúdo matemático, nossa intenção nessa categoria foi analisar se os mesmos explicitam, de alguma forma, a contribuição da história da matemática para a compreensão da natureza do conhecimento matemático (BATISTA, 2009; LIU, 2009). Durante a análise do corpus, encontramos elementos que foram organizados em três subcategorias:

- Subcategoria: Visão dinâmica do conhecimento matemático

Nessa subcategoria, buscamos elementos que evidenciassem se os professores, após o contato com a história da matemática, apresentaram uma compreensão diferente daquela que foi desenvolvida no decorrer da formação acadêmica, ou seja, uma compreensão da natureza dinâmica do conhecimento matemático. Identificamos que todos os professores mostraram uma compreensão dinâmica após o contato com os conhecimentos de história da matemática, conforme os relatos abaixo:

[...] a pesquisa histórica me auxiliou nessa compreensão, quer dizer, pude viajar até o ano 600 a.C. e vir pouco a pouco montando uma história que, especificamente, desconhecia. Essa pesquisa contribui para que eu compreendesse o desenvolvimento da matemática de uma outra forma, de um modo dinâmico, com acertos, erros, avanços, etc. P4

A matemática não é pronta e acabada pelo seguinte: se fosse, os matemáticos não estariam mais produzindo mais matemática. Agora, essa consciência a gente só vai adquirindo na medida em que a gente lê, a gente discute com outras pessoas, a gente ouve e a história me ajudou muito nessa compreensão. P5 (Destaques das pesquisadoras)

- Subcategoria: Compreensão desmistificada do conhecimento matemático

As falas evidenciam que todos os professores pesquisados conseguiram atingir um novo patamar de compreensão a respeito do desenvolvimento do conhecimento matemático. Segundo eles, a pesquisa histórica contribuiu para disseminar a ideia de coletividade na construção do conhecimento, em oposição à ideia de mito, como indicam os exemplos das falas a seguir:

E a história faz com que a gente perceba isso, que para um conceito chegar aonde ele chegou foi necessário muito trabalho, muita dedicação, colaboração entre muitas pessoas, pessoas reais, que erram, que acertam. Foi bem interessante, para mim foi muito interessante [...]. P1

Tinha aquela noção de mito que é passada para nós durante toda a nossa vida escolar, lei de fulano, teorema de sicrano, essa visão vai mudando quando estudamos a história. E isso foi importante para a minha compreensão e também para não dar uma compreensão errada para meus alunos. P4 (Destaques das pesquisadoras)

- Subcategoria: Explicitação da relação história e filosofia

A análise evidenciou a presença de elementos que indicam a relação entre os estudos históricos e reflexões filosóficas e o uso de termos usados na filosofia da ciência pelos professores. Podemos perceber que os estudos históricos lhes proporcionaram algumas reflexões filosóficas, ou, pelo menos, uma aproximação com a filosofia da ciência ao usarem a terminologia própria da área. Observem alguns exemplos:

[...] eu me interessei muito pelo assunto que são os valores cognitivos que constituem a ciência, como por exemplo, a adequação empírica, a simplicidade, poder explicativo [...]. P2

Essas inquietações vão surgindo e uma coisa boa também que a pesquisa histórica me possibilitou é a compreensão de questões filosóficas. Quer dizer, os impasses que surgiram no desenvolvimento dos conceitos matemáticos podem ser analisados pela filosofia e isso ajuda o professor a compreender melhor esse conhecimento. P5

A pesquisa histórica possibilita algumas reflexões filosóficas sobre o que é o conhecimento matemático que eu não tinha antes. Essa parte filosófica é pouco explorada na graduação, eu não tinha isso, uma visão crítica de conhecimento, aí quando eu fiz a pesquisa histórica eu pude perceber. P6 (Destaques das pesquisadoras)

A análise dessa categoria nos leva a observar que a pesquisa em história da matemática colaborou no sentido de proporcionar uma compreensão do conhecimento matemático como um processo dinâmico e em constante evolução. Todos os professores ouvidos afirmaram que essa visão de conhecimento matemático foi possível após os estudos históricos realizados por eles. Para Liu (2009), a compreensão da natureza da matemática pode ser impulsionada por meio de estudos históricos. Os componentes históricos são relevantes para a formação docente, uma vez que podem colaborar para uma visão mais adequada do conhecimento científico, como evidenciamos na análise.

Conforme Charalambous, Panaoura e Philippou (2009) e Dass (2005), a forma de o professor conceber a matemática influencia a maneira como ele compreende o processo de ensino e de aprendizagem e, consequentemente, a sua ação pedagógica. Para Barbin (2000), a história potencialmente colabora para alterar a compreensão do próprio professor a respeito da matemática. Esse fato pode influenciar no modo como ele ensina matemática e no modo como o aluno a compreende. Nesse sentido, nossos dados nos permitem inferir que os estudos históricos trouxeram novos e relevantes conhecimentos acerca da natureza do conhecimento matemático.

• Categoria 4: História da matemática na compreensão dos conteúdos matemáticos e na ação docente

Nessa categoria procuramos analisar duas perspectivas que se complementam: uma se refere à compreensão dos conteúdos matemáticos estudados pelos professores no decorrer da realização da pesquisa histórica, e a outra diz respeito a uma abordagem histórica desse conteúdo junto aos alunos. Encontramos na literatura discussões a respeito da formação conceitual do professor, que, muitas vezes, não é suficiente ou adequada para responder às demandas de uma sala de aula - Bursal (2010); Brito e Carvalho (2009); Furinguetti (2007). Essa categoria apresenta duas subcategorias, mostradas a seguir.

- Subcategoria: Contribuições da história da matemática na compreensão dos conteúdos matemáticos

Consideramos as evidências apresentadas pelos professores de que a investigação histórica de um conteúdo matemático proporcionou um entendimento mais profundo5 do mesmo. Todos os professores ouvidos alegaram que o contato que tiveram com o desenvolvimento histórico do conteúdo matemático pesquisado proporcionou um tipo de compreensão diferente daquele que tinham até então. A compreensão a que se referem é aquela que extrapola a axiomatização e a aplicação mecânica dos conteúdos, como indicam Brito e Carvalho (2009). Seguem alguns trechos que exemplificam:

Então, na pesquisa histórica eu percebi que primeiro foi necessário a compreensão das relações qualitativas de dependência, depois o uso de tabelas e da observação de regularidades, as variáveis, somente depois disso veio a representação gráfica, a introdução da linguagem algébrica e a representação analítica. P3

A história me possibilitou entender e explicar isso muito bem para o aluno, da ideia de cosseno como seno reverso, da ideia de complementaridade entre seno e cosseno para corresponder exatamente ao triângulo retângulo, explicar para o aluno que quando o seno aumenta, o cosseno diminui e vice-versa. P5 (Destaques das pesquisadoras)

- Subcategoria: O papel da história da matemática refletido na ação docente

Buscamos aspectos nos discursos que evidenciam possíveis contribuições da história da matemática no processo de ensino dos conteúdos matemáticos estudados. Procuramos unidades de registro que explicitassem a noção dos sujeitos entrevistados a respeito das contribuições da história no processo de ensino dos conteúdos matemáticos, ou seja, em sua ação docente, conforme os exemplos a seguir:

Então, na reconstrução, havia determinadas situações em que você percebe que historicamente os matemáticos ficaram enroscados vinte anos em determinado assunto. Se os matemáticos ficaram enroscados vinte anos, é possível que no momento em que você estiver ensinando aquele conteúdo, os alunos apresentem dificuldades nele. P1

[...] usar alguns aspectos de como foi descoberto um conceito matemático, pode facilitar o entendimento do aluno, visto que, apresentar um conceito já formalizado, pronto e acabado, pode dificultar a aprendizagem e tornar a matemática algo dogmático. P3 (Destaques das pesquisadoras)

Ao analisar essa categoria, percebemos que a pesquisa histórica proporcionou aos professores uma compreensão mais profunda dos conteúdos pesquisados. Compreensão que, além de referir-se aos conteúdos matemáticos propriamente ditos, como a trigonometria, as secções cônicas, números complexos, entre outros, possibilitou o entendimento dos porquês, dos fatos marcantes, dos impasses, e o encontro de alguns novos conhecimentos e respostas que antes não tinham, como apontou a categoria Lacunas da formação inicial recebida.

A compreensão do processo de construção do conhecimento, e não apenas do produto final, foi evidenciada nas falas dos sujeitos, que acrescentam que o estudo do processo pode minimizar a mera aplicação mecânica da matemática. A perspectiva histórica permitiu que os professores percebessem que a maneira como um conceito é apresentado hoje é consequência das ideias anteriores, possibilitando observar a matemática atual e a do passado, as diferenças nos usos das notações, terminologias, entre outros, e proporcionando ao professor uma compreensão conceitual de forma relacional e integradora (BATISTA, 2009).

• Categoria 5: Aspectos metodológicos na construção de abordagens históricas

Consideramos, na categoria 5, as questões que envolvem e evidenciam os aspectos metodológicos na formação do professor ao construir uma abordagem histórica de conteúdos matemáticos para ser aplicada em sala de aula. Realizar tal empreendimento exige alguns cuidados e escolhas metodológicas que possuem potencial de influenciar as ações docentes. O desenvolvimento de uma abordagem histórica pressupõe a articulação, por parte dos professores, de muitos conhecimentos que ultrapassam os oriundos da história e de conteúdo, e exigem adequações didáticas entre diferentes perspectivas metodológicas e conceituais, conforme Dass (2005) e Fried (2008).

Apresentamos a organização da categoria em três subcategorias, na sequência do texto.

- Subcategoria: Adequação da abordagem histórica com as diretrizes curriculares

Aqui, identificamos trechos das falas que evidenciam que os professores tiveram alguns cuidados, como atender a uma sequência de conteúdos mínimos previstos para aquela série, naquele período, de acordo com os currículos oficiais, conforme os exemplos a seguir:

[...] eu precisei olhar nos livros didáticos o que estava sendo ensinado, qual era a sequência dos tópicos, para eu ter pelo menos um contato inicial com o que estava sendo pedido, para que essa reconstrução histórica não fugisse totalmente, ou que não perdesse o foco em relação ao conteúdo que é considerado básico pela secretaria de educação do Paraná. P2

Também os conteúdos trabalhados na sequência de atividades devem estar de acordo com o que traz os currículos básicos, quer dizer, não posso chegar em sala de aula com uma proposta diferente, afirmando trazer contribuições para o ensino de matemática, mas que não contemple os conteúdos mínimos necessários. P6 (Destaques das pesquisadoras)

- Subcategoria: Adequação da abordagem histórica com o tempo disponível

O tempo disponível para a aplicação de uma proposta diferenciada, como a desenvolvida pelos professores investigados, também foi um aspecto indicado como importante, uma vez que, ao trabalharem em turmas regulares, eles dispunham do mesmo tempo de que disporiam para trabalhar aquele conteúdo em situações convencionais de ensino. Na análise de todas as entrevistas encontramos explicitada essa preocupação, conforme os relatos que seguem:

Assim, a proposta tinha que aliar muitos fatores, como a integração da história com as questões da Aprendizagem Significativa, com o tempo de aplicação da proposta, que não podia ser muito maior do que as atividades normais, os conteúdos previstos no programa. P3

Então eu planejei a abordagem para dois meses de aula, de trabalho, e consegui desenvolver até ciclos trigonométricos, como eu tinha blocos de atividades, então eu desenvolvia exatamente aquilo que eu tinha previsto para os dois meses, porque não podia passar de dois meses. P5 (Destaques das pesquisadoras)

- Subcategoria: História da matemática como facilitadora da contextualização do conhecimento matemático

Subcategoria que se refere à percepção dos professores de que a história da matemática pode configurar-se como um elemento contributivo no processo de contextualização do conhecimento matemático. Observem alguns exemplos:

[...] eu procurei inicialmente identificar o que era cada palavra daquelas, seno, cosseno, dentro do contexto histórico porque a gente sabe que na matemática principalmente vem do latim, vem do árabe, vem de outras civilizações. Então eu queria entender e mostrar para o aluno o que significava cada palavra daquela referente às funções trigonométricas, mas de forma contextualizada e não apenas só a memorização dos nomes. P2

[...] eu usei apenas algumas atividades históricas, mas me chamou a atenção o fato de que essas atividades históricas conseguiram contextualizar um pouco esse conhecimento matemático e o aluno entendeu um pouco disso. Quer dizer, o contexto histórico traz algumas compreensões que não são possíveis apenas por meio de atividades experimentais. P4 (Destaques das pesquisadoras)

Por meio da análise da categoria 5 e suas subcategorias, foi possível observar que a proposição de uma abordagem de ensino diferenciada, como a pautada na história da matemática, requer alguns cuidados metodológicos que foram observados pelos professores. Como o objetivo de qualquer abordagem de ensino é proporcionar situações de aprendizagem, os professores mostraram a preocupação de que a proposta que desenvolveram colabore com elementos contextualizadores para a aprendizagem matemática.

Encontramos essa discussão feita por muitos pesquisadores que evidenciam as potencialidades pedagógicas do uso da história da matemática em sala de aula, conforme Araman e Batista (2009), Fauvel e Maanen (2000); Miguel e Miorim (2008), entre outros. Segundo eles, a abordagem dos conteúdos matemáticos via história tem potencialidades pedagógicas que devem ser aproveitadas pelos professores e a capacidade de contextualizar os conteúdos é uma delas.

Outro ponto levantado pelos sujeitos investigados refere-se ao tempo de aplicação da proposta em sala de aula. Eles revelaram a preocupação de que a proposta pudesse ser desenvolvida em um tempo próximo ao gasto normalmente para o desenvolvimento daqueles conteúdos. Segundo Fried (2008), a preocupação com o tempo é apontada por muitos professores como um empecilho para a abordagem histórica. Isso ocorre pelo fato de eles compreenderam a história da matemática pela estratégia da adição, na qual ela figura como um elemento curricular a mais a ser trabalhado pelo professor em sala de aula. Entretanto, esse não é o caso dos sujeitos, que desenvolveram uma abordagem na qual os conceitos são trabalhados via abordagem histórica, como uma alternativa metodológica para a educação matemática. Tal maneira de conceber a inclusão da história da matemática nos processos de ensino e de aprendizagem é apontada por Fried (2008) como a estratégia da acomodação.

Miguel e Miorim (2008), Brito e Carvalho (2009), entre outros, consideram que a formação inicial recebida pelos professores muitas vezes não favorece a capacidade de justificar e contextualizar os conteúdos matemáticos em sala de aula. Os estudos históricos podem contribuir para minimizar essa dificuldade dos professores. Esse fato foi evidenciado também pelos sujeitos, que perceberam que a história da matemática colabora para a compreensão contextualizada dos conteúdos trabalhados. Pelos resultados obtidos consideramos que os professores envolvidos tiveram a oportunidade de desenvolver o entendimento das potencialidades contextualizadoras que ela pode ter no processo de ensino e de aprendizagem, que vão além da abordagem da história como curiosidade ou motivação.

• Categoria 6: Perspectiva interdisciplinar das abordagens históricas

A presente categoria procura evidenciar os aspectos interdisciplinares que envolvem as abordagens históricas em duas perspectivas. Na primeira, procuramos assinalar a visão interdisciplinar do professor em relação ao conteúdo por ele estudado via história da matemática (BATISTA, 2009). Os estudos históricos possibilitam ao professor observar as relações entre as áreas do conhecimento científico, as contribuições do conhecimento matemático para o desenvolvimento de outras áreas, superando aquela visão compartimentada que muitos professores receberam na formação inicial (BATISTA, 2009; GRUGNETTI; ROGERS, 2000).

Na segunda perspectiva, procuramos elementos que evidenciam a capacidade do professor de selecionar, relacionar, articular diferentes áreas do conhecimento para a elaboração de uma abordagem histórica aplicável em sala de aula (BATISTA, 2009). É a presença da interface entre elementos, oriundos de diversas áreas, na formação do professor que procuramos analisar na presente categoria, que se apresenta organizada em duas subcategorias.

- Subcategoria: Relações entre o conhecimento matemático e outras áreas do conhecimento

Subcategoria com a qual buscamos observar se o contato com a pesquisa histórica possibilitou aos professores perceber as relações entre os conteúdos matemáticos e outras áreas de conhecimento. Todos os professores entrevistados indicaram essa percepção. Evidenciamos alguns trechos dos discursos que exemplificam a análise:

A sequência didática elaborada se baseou nesses conceitos matemáticos estudados e propôs uma aproximação com outras áreas como ciências/biologia, química e física. A primeira situação problema envolvia uma situação diretamente ligada com ciência/biologia ao explorar as relações de dependências qualitativas existentes em uma cadeia alimentar. P3

[...] já em torno de 534 d.C. inicia uma aplicação desses conhecimentos nos estudos de espelho, por exemplo. Então é possível perceber que, historicamente, houve essa relação entre a matemática, a geometria e outras áreas, como a astronomia, com os estudos das trajetórias elípticas dos planetas ao redor do Sol, feitos por Kepler, e com a física, no estudo de lançamentos de projéteis, feito por Galileu. P4 (Destaques das pesquisadoras)

- Subcategoria: Adequações e seleções entre os elementos históricos e os componentes pedagógicos para a construção da abordagem

Essa subcategoria tem como objetivo analisar a necessidade de adequações pedagógicas aos estudos históricos realizados, com o intuito de possibilitar o uso da história da matemática em sala de aula. O que analisamos foi a necessidade dos professores em concatenar os vários aspectos oriundos da pesquisa histórica desenvolvida com elementos advindos da pedagogia, de acordo com os exemplos a seguir:

Mas uma coisa é a pesquisa histórica, é você fazer aquela pesquisa teórica, outra coisa é fazer a transposição, a adequação didática dessa pesquisa possível de ser colocada em sala de aula. P1

[...] a maior dificuldade é selecionar, entre todos esses materiais históricos disponíveis, aqueles que se adequam melhor aos objetivos da pesquisa. Quer dizer, o que usar? Como usar essa parte histórica de forma pedagógica? Como relacionar a história com as atividades de investigação em sala de aula? P4

[...] foi difícil articular tudo isso, a parte histórica com a organização das atividades. Você tem que aproveitar a história, mas também tem que levar em consideração outros aspectos pedagógicos para ter aprendizagem. Tivemos que fazer várias adequações na sequência de atividades. Não é algo trivial de ser feito, nem pode ser feito de qualquer jeito, é preciso estudar muito. P6 (Destaques das pesquisadoras)

Ao analisarmos essa categoria percebemos que o viés interdisciplinar proporcionado pela abordagem histórica foi evidenciado pelos professores nos dois aspectos analisados. Num primeiro momento, os estudos históricos mostraram-se relevantes para promover a percepção da relação existente entre os conhecimentos matemático e as outras áreas de conhecimento.

De acordo com as pesquisas, os estudos históricos permitem que os professores observem as relações que existem entre as diversas áreas do conhecimento científico e de como o conhecimento de uma área colabora para o desenvolvimento científico de outra (BATISTA, 2009). Os professores analisados conseguiram ter essa percepção, pelo menos em relação aos conteúdos matemáticos que estudaram historicamente. Grugnetti e Rogers (2000) consideram que o caráter abstrato do conhecimento matemático pode dificultar o entendimento da presença da matemática em outras áreas e que a perspectiva histórica pode contribuir para melhorar essa noção.

Fica evidente, por meio da análise realizada, que os professores tiveram que articular elementos relativos à área da pesquisa em história da matemática com os relacionados aos aportes didáticos. As escolhas e articulações vão desde a seleção, nos estudos históricos, dos elementos relevantes e adequados para cada conteúdo, cada nível de ensino. Além disso, esses elementos devem ser adaptados, didaticamente, para atender ao objetivo de proporcionar aprendizagem.

São muitos conhecimentos e saberes que os professores articulam nesse processo rico e complexo, e que colaboram para a sua formação profissional. Vemos esse processo numa perspectiva holística, pois abrange reflexões e tomadas de decisão sob vários aspectos. Como os próprios sujeitos evidenciaram, o processo de construção de uma abordagem pautada na história da matemática para ser aplicada em sala de aula não é um processo trivial. Ele se dá pela interface entre vários elementos e só se viabiliza por meio de estudos teóricos e metodológicos sistematizados, como os vivenciados pelos sujeitos de nossa investigação.

5 Contribuições da história da matemática para a construção dos saberes do professor de matemática

A partir de nossas investigações a respeito de saberes docentes mobilizados, foi-nos possível deduzir que a vivência de realizar uma pesquisa em história da matemática, na qual o objetivo seja o de elaborar uma abordagem pedagógica aplicável em sala de aula, proporciona ao docente uma formação que envolve muitos elementos, como conceituais, metodológicos e experienciais.

Trata-se de um processo criativo, que contribui para a construção de vários saberes, da autonomia do professor e da sua identidade profissional, uma vez que supera a perspectiva da racionalidade técnica, como descrita por Schön (1995), situando o professor como sujeito produtor de saberes e conhecimentos. A literatura assinala como necessária a identificação dos saberes próprios do ensino, considerados em contextos reais, complexos, em que as variáveis não podem ser controladas. Gauthier et al. (1998) propõem que os saberes docentes devem ser estudados, explicitados e legitimados pelas pesquisas, mas que tenham como base as situações reais de ensino.

Como evidenciamos na análise dos dados empíricos da pesquisa, o contato com os aportes teóricos e metodológicos da área de história da matemática, assim como a elaboração de uma abordagem histórico-pedagógica, contribuíram para a construção de vários saberes. Assim, discutimos nesse momento, como contribuição de nossa investigação, uma articulação dos resultados obtidos com os referenciais de saberes docentes.

• Saberes relacionados à compreensão dos conteúdos matemáticos:

Por meio da análise realizada podemos evidenciar que os estudos realizados por esses professores contribuíram na compreensão dos conteúdos matemáticos e que essa nova compreensão teve reflexos no processo de ensino dos mesmos. Na perspectiva de Shulman (1986), o conhecimento do conteúdo vai além dos fatos e conceitos intrínsecos à disciplina, abrange, também, o entendimento dos seus processos de construção e validação. É necessário que o professor compreenda os aspectos conceituais, as regras e os processos relativos ao conteúdo, mas é fundamental que ele tenha uma compreensão substantiva e epistemológica dos mesmos, que pode ser favorecida pelos estudos da história da matemática, conforme indicam as pesquisas na área (BURSAL, 2010; FURINGUETTI, 2007).

Esse aspecto foi evidenciado em nossa análise, na categoria Lacunas da formação inicial recebida, em que os professores investigados relataram seu domínio apenas aos aspectos sintáticos dos conteúdos, não conseguindo atingir o patamar de compreensão proporcionado pela pesquisa histórica.

A análise indica, por meio das falas dos professores, que a compreensão dos conteúdos matemáticos via história contribuiu para o processo de ensino dos mesmos, mostrando elementos importantes para outro conhecimento indicado por Shulman (1986), que é o conhecimento pedagógico do conteúdo. Ele pressupõe as formas pelas quais os professores relacionam o conteúdo com as diversas maneiras de abordá-lo no seu ensino, na tentativa de torná-lo compreensível para os alunos.

Vimos que os estudos do desenvolvimento histórico dos conteúdos proporcionaram aos professores a capacidade de dar respostas fundamentadas aos seus alunos, e, também, de contextualizar o conhecimento matemático, proporcionando o uso de elementos históricos, como problemas, experimentos, técnicas que vão colaborar para a justificativa de relevância dos mesmos no contexto histórico original e também no contexto atual.

• Saberes relacionados à compreensão da natureza do conhecimento matemático:

Conforme as análises expostas, podemos dizer que a construção de conhecimento vivenciada pelos docentes participantes desta pesquisa oportunizou aos mesmos um entendimento a respeito da natureza do conhecimento matemático. O processo de elaborar uma reconstrução histórica e os estudos dos referenciais de história da matemática proporcionaram uma compreensão dinâmica e desmistificada desse conhecimento. Essa compreensão apresenta implicações no processo de ensino, uma vez que os professores, diante desses novos saberes, podem abordar o conhecimento matemático de acordo com o entendimento possibilitado pela pesquisa histórica.

Como já vimos, tanto na compreensão de Shulman (1986), quanto de Gauthier et al. (1998) e Tardif (2002), conhecer o conteúdo, a matéria a ser ensinada envolve muitas questões de natureza histórica, epistemológica, que ultrapassam a compreensão dos conceitos fundamentais e o método de cada disciplina. Assinalam, ainda, que o conhecimento que o professor tem a respeito da matéria influencia a maneira pela qual ele vai ensiná-la.

Conforme demonstramos na categorização, o contato que os professores tiveram com os conhecimentos históricos contribuiu para essa compreensão dos conteúdos e da natureza do conhecimento matemático, o que os subsidiam de explicações e argumentos fundamentados e consistentes, evitando as explicações de senso comum, com frases do tipo é assim e pronto, ou mais para frente você vai entender, como ressaltaram os entrevistados.

Essa fundamentação pode proporcionar ao professor segurança frente aos seus alunos, trazendo elementos importantes para a sua prática e, em decorrência, para a constituição de seus saberes experienciais. Assim, ao compreender melhor o seu domínio de conhecimento e os conteúdos que ensina, o professor poderá lançar mão de conhecimentos que podem, por meio da reflexão e da conscientização, ser mobilizados no decorrer da ação docente. Esse processo lhe traz a compreensão da importância de desenvolver os seus saberes e não apenas depender de técnicas desenvolvidas por outros.

• Saberes relacionados à capacidade de contextualizar o conhecimento matemático

Segundo Shulman (1986), o conhecimento pedagógico do conteúdo se refere às maneiras pelas quais o professor formula e apresenta os conteúdos aos alunos e a capacidade de realizar uma contextualização do conhecimento matemático pode ser compreendida como uma efetivação desse conhecimento. Os professores, de um modo geral, apresentam dificuldades em contextualizar os conteúdos matemáticos, de justificar a relevância deles junto aos alunos e a história da matemática, ao mostrar o contexto histórico de desenvolvimento dos conceitos, pode colaborar com o professor na superação dessa dificuldade.

Na análise, observamos vários discursos que sinalizam que os estudos históricos realizados pelos professores contribuíram para sua capacidade de contextualizar os conteúdos trabalhados. Na opinião dos sujeitos pesquisados, a contextualização dos conteúdos favorece a compreensão dos alunos e auxilia os professores na justificativa da relevância de tais conteúdos perante os aprendizes. Nesse sentido, a história da matemática se constituiu como um elemento relevante para esse processo, uma vez que o contexto histórico apresenta elementos significativos que podem ser compreendidos pelo professor e, consequentemente, aproveitados em sala de aula.

• Saberes relacionados à formação metodológica do professor:

A categoria Aspectosmetodológicos na construção da abordagem histórica remete aos aspectos referentes à construção de uma abordagem histórica. Encontramos, nas falas dos sujeitos investigados, algumas preocupações inerentes a sua experiência prática, como a de atender às exigências dos currículos oficiais, de conseguir cumprir um determinado conteúdo no tempo disponível, de contextualizar o conteúdo ministrado. Essas questões metodológicas evidenciam a reflexão do professor e a necessidade de cumprir algumas determinações institucionais presentes nas situações reais de ensino.

Além disso, os mesmos evidenciaram a necessidade de articular essas obrigações com a proposta inovadora por eles elaborada, que também pressupõe a reflexão em concatenar seu conhecimento prático com o conhecimento teórico recebido da pesquisa em história da matemática.

Essa formação metodológica contribui para a estruturação de muitos saberes, entre eles os curriculares. O conhecimento curricular, segundo Shulman (1986), é o conhecimento que abrange a compreensão do programa, dos materiais disponíveis para ensinar um conteúdo, dos tópicos específicos para cada nível, entre outros. Para ele, existem diferentes modos de abordar os conteúdos nos diferentes níveis e séries, que precisam de uma adequação da linguagem, da profundidade, da complexidade que cada situação exige.

Para Gauthier et al. (1998) embora os professores recebam os currículos prontos, produzidos por especialistas, esse saber é reconstruído pelo professor que, em sua prática, seleciona e reorganiza os programas e materiais disponíveis de acordo com critérios próprios. A construção da abordagem histórica proporcionou aos professores oportunidade de reconstrução dos saberes curriculares, uma vez que selecionaram o conteúdo a ser abordado de acordo com os programas oficiais, a série com a qual pretendiam trabalhar e o tempo disponível para tal.

Os resultados mostram a contribuição significativa que o processo de estudo, construção e aplicação de uma abordagem histórica teve na estruturação dos saberes profissionais dos professores envolvidos, uma vez que, a todo o momento, foi necessária a articulação entre os aportes teóricos e metodológicos das diversas áreas e a experiência do professor.

• Saberes relacionados à percepção das relações entre o conhecimento matemático e outras áreas do conhecimento:

Assim como a reconstrução histórica colabora para a contextualização do conhecimento matemático, contribui também para a percepção das relações existentes entre a matemática e outras áreas. Os estudos do desenvolvimento histórico de um conteúdo podem evidenciar tais relações, mostrando que o conhecimento matemático foi importante para o desenvolvimento de outras áreas, para a resolução de problemas diversos, entre outros. Esses saberes auxiliam o professor a contextualizar e a justificar a matemática perante seus alunos.

Essa visão multidisciplinar pode auxiliar os professores na reconstrução dos saberes disciplinares, curriculares e pedagógicos, pois possibilita o entendimento das relações entre as várias disciplinas presentes nos currículos, da relevância do conhecimento matemático para outras áreas, com reflexos na sua atuação pedagógica, ressignificando esses saberes, como aconteceu com os sujeitos dessa pesquisa.

• Saberes relacionados à formação interdisciplinar do professor - capacidade de articular diversos elementos na construção de abordagens históricas:

O processo de pesquisa, construção e aplicação de uma abordagem histórica requer do professor a articulação entre diversos conhecimentos, como as fontes históricas, as reflexões filosóficas, os cuidados metodológicos, as opções pedagógicas e o conteúdo a ser ensinado (BATISTA, 2009). É um empreendimento que exige do professor constante reflexão e tomada de decisão, colaborando para a construção de sua autonomia intelectual e de sua identidade profissional, com o professor tornando-se um produtor de saberes, em uma concepção que ultrapassa a racionalidade técnica. O viés interdisciplinar presente na construção de abordagens pedagógicas fundamentadas na história da matemática enriquece a base de conhecimentos do professor. Esse processo é reflexivo e conduz o professor na capacidade de análise e síntese, buscando adequar os elementos teóricos e metodológicos disponíveis com a realidade da sala de aula.

Para Shulman (1986), o conhecimento pedagógico do conteúdo é de fundamental importância para ação docente, pois é dele que depende o processo de ensino e de aprendizagem. Dessa forma, afirmamos, com base em nossos dados empíricos, que a realização da construção de abordagens históricas capacita o professor com conhecimentos teóricos, metodológicos e de interfaces pedagógicas que contribuem para fundamentar as suas escolhas, refletindo em suas ações em sala de aula, com uma atuação profissional fundamentada em aportes validados pelas pesquisas da área de educação matemática.

Destarte, consideramos que o processo de construção de abordagens históricas para o ensino de matemática tem, como contribuição para a prática profissional, a capacidade de proporcionar a articulação e a síntese entre vários componentes necessários para o ensino de matemática. Construir uma abordagem não é apenas pegar elementos da história e levar para a sala de aula. Esse processo exige do professor uma capacidade de relacionar diversos componentes, de forma coerente e sistematizada, que atenda ao objetivo de proporcionar situações de aprendizagem matemática.

6 Considerações à guisa de conclusão

O professor, no decorrer de sua ação docente, mobiliza e articula muitos saberes. Como colocado por Gauthier et al. (1998) e Tardif (2002), as pesquisas em educação precisam estudar, de forma científica e sistematizada, os saberes docentes para que estes deixem de ser particulares, individuais e possam ser compartilhados com outros professores e disseminados nos programas de formação, seja inicial ou em serviço. Brito e Alves (2008) salientam, também, a necessidade da profissionalização do ofício de ensino a partir de uma definição dos diversos saberes que sustentam a prática do professor.

Assim, consideramos que os resultados apresentados em nossa investigação estão de acordo com as preocupações das pesquisas em saberes docentes, uma vez que visam compreender e evidenciar alguns saberes construídos a partir da integração entre os conhecimentos teóricos e a experiência prática do professor, como evidenciam Rocha e Fiorentini (2006), Cochran-Smith (2008), entre outros.

A experiência vivenciada pelos professores de nossa investigação permitiu que eles participassem, de forma efetiva, de todo o processo de pesquisa, construção e aplicação de uma abordagem histórica. Não foi um conhecimento recebido de fora, feito por outros, o qual eles apenas aplicaram. Ao contrário, o processo de pesquisa e construção da abordagem foi um trabalho oriundo da interação entre as vivências práticas e os estudos referenciados realizados, que, sistematizados, ultrapassam os saberes intuitivos do professor.

Os saberes da experiência são desenvolvidos a partir da própria ação do professor, por isso são pessoais, particulares (TARDIF, 2002). Mas esses saberes da experiência podem, e devem, ser conhecidos e estudados pelas pesquisas científicas, para que possam ser compartilhados com outros professores. Segundo Gauthier et al. (1998), os saberes da experiência, quando estudados e compartilhados por meio das pesquisas, dão origem a um outro tipo de saber, denominados saberes da ação pedagógica.

Entendemos que os resultados que alcançamos com a presente pesquisa contribuem para os saberes da ação pedagógica, uma vez que a análise sistematizada que realizamos apresenta alguns elementos que evidenciam a relação profícua entre os conhecimentos da história da matemática e os desenvolvidos durante o processo de construção de abordagens históricas e a estruturação dos saberes docentes na formação do professor. Os resultados que apresentamos podem ser disseminados nas ações formadoras que visam colaborar para que a história da matemática seja utilizada em sala de aula.

Finalmente, destacamos que nossos resultados auxiliam na percepção da relevância dos conhecimentos teóricos na formação do professor, contribuindo para a perspectiva do ofício feito de saberes, como defendida por Gauthier et al. (1998). Não basta ter vontade de trabalhar com a história da matemática, pois somente com a boa vontade esse trabalhar se conduz a uma prática de senso comum. É necessário que o professor receba formação profissional para isso, e essa formação pressupõe a relação entre os aportes teóricos e metodológicos e uma experiência docente que relacione e integre esses aportes, como evidenciamos nesta investigação.

Agradecimentos

Agradecemos ao grupo IFHIECEM - Investigações em Filosofia e História da Ciência, e Educação em Ciências e Matemática - (http://www.uel.br/grupo-pesquisa/ifhiecem/publicacoes.html) pela disponibilidade, interdecodificação e discussão crítica das categorias elaboradas.

Irinéa de Lourdes Batista

Rod. Celso Garcia Cid - PR 445 - Km 380, Campus Universitário

Caixa Postal 10011

CEP: 86057-970, Londrina, PR, Brasil

E-mail: irinea@uel.br

Submetido em Maio de 2012.

Aprovado em Setembro de 2012.

  • ALMEIDA, P. C. A.; BIAJONE, J. Saberes docentes e formação inicial de professores: implicações e desafios para as propostas de formação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 2, p. 281-295, maio/ago. 2007.
  • ARAMAN, E. M. de O.; BATISTA, I. de L. A história da matemática como fonte de conhecimentos para a construção de saberes docentes de professores de matemática. In: ENCONTRO BRASILEIRO DE ESTUDANTES DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 8., 2009, Goiânia. Anais... Goiânia: Editora UFG, 2009. p. 1-17. CDROM.
  • ARAMAN, E. M. de O.; BATISTA, I. de L. O uso da história da matemática com finalidades didáticas: o que está sendo investigado pela área 46 da Capes. In: ENCONTRO BRASILEIRO DE ESTUDANTES DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 9., 2010, Campo Grande. Anais... Campo Grande: Editora UFMS, 2010. p. 1-18. CDROM.
  • BARBIN, E. Integranting history: research perspectives. In: FAUVEL, J.; MAANEN, J. (Org.). History in mathematics education: the ICMI study. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 2000. p. 63-70.
  • BARDIN, L. Análise de conteúdo 3. ed. Lisboa: Ed. 70, 2004.
  • BATISTA, I. de L. Reconstruções histórico-filosóficas e a pesquisa interdisciplinar em educação científica e matemática. In: BATISTA, I. de L.; SALVI, R. F. (Orgs.). Pós-graduação em ensino de ciências e educação matemática: um perfil de pesquisas. Londrina: EDUEL, 2009. p. 35-50.
  • BATISTA, I. L.; LUCCAS, S. Abordagem histórica-filosófica e Educação Matemática - uma proposta de interação entre domínios de conhecimento. Educação Matemática Pesquisa São Paulo, v. 6, n. 1, p. 101-133, 2004.
  • BOGDAN, R.; BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Portugal: Porto, 1994.
  • BRITO, A. J.; ALVES, F. T. O. Profissionalização e saberes docentes: análise de uma experiência em formação inicial de professores de matemática. In: NACARATO, A. M.; PAIVA, M. A. V. (Orgs.). A formação do professor que ensina matemática: perspectivas e pesquisas. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. p. 27-42.
  • BRITO, A. J.; CARVALHO, D. L. Utilizando a história no ensino de geometria. In: MIGUEL, A.; BRITO, A. de J.; CARVALHO, D. L.; MENDES, I. A. (Orgs.). História da matemática em atividades didáticas São Paulo: Livraria da Física, 2009. p. 13-104.
  • BURSAL, M. Turkish preservice elementary teachers' self-efficacy beliefs regarding mathematics and science teaching. International Journal of Science and Mathematics Education, Penang, v. 8, n. 4, p. 649-666, 2010.
  • CHARALAMBOUS, C. Y.; PANAOURA, A.; PHILIPPOU, G. Using the history of mathematics to induce changes in preservice teachers' beliefs and attitudes: insights from evaluating a teacher education program. Educational Studies in Mathematics, New York, v. 71, n. 2, p.161-180, 2009.
  • COCHRAN-SMITH, M. The new teacher education in the United States: directions forward. Teachers and teaching: theory and practice, London, v. 14, n. 4, p. 271-282, Aug. 2008.
  • DASS, P. M. Understanding the nature of scientific enterprise (nose) through a discourse with its history: the influence of an undergraduate 'history of science' course. International Journal of Science and Mathematics Education, Penang, n. 3, p. 87-115, 2005.
  • FAUVEL, J.; MAANEN, J. Introduction. In: FAUVEL, J.; MAANEN, J. (Orgs.). History in mathematics education: the ICMI study. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 2000. p. xi-xviii.
  • FIORENTINI, D.; LORENZATTO, S. Investigação em educação matemática: percursos teóricos e metodológicos. 2. ed. Campinas: Autores Associados, 2007. (Coleção Formação de Professores).
  • FIORENTINI, D.; SOUSA JUNIOR, A. J.; MELO, A. G. F. Saberes docentes: um desafio para acadêmicos e práticos. In: GERALDI, C. M. G.; FIORENTINI, D.; PEREIRA, E. M. de A. (Orgs.). Cartografia do trabalho docente: professor (a) pesquisador (a). 3. ed. Campinas: Mercado de Letras, 2003. p.307-335.
  • FRIED, M. N. History of mathematics in mathematics education: a saussurean perspective. The Montana Mathematics Enthusiast, Missoula, v. 5, n. 2/3, p. 185-198, 2008.
  • FURINGUETTI, F. Teacher education through the history of mathematics. Educational Studies in Mathematics, Dordrecht, n. 66, p. 131-143, 2007.
  • GAUTHIER, C.; MARTINEAU, S.; DESBIENS, J. F.; SIMARD, D. Por uma teoria da pedagogia: pesquisas contemporâneas sobre o saber docente. Ijuí: UNIJUÍ, 1998.
  • GRUGNETTI, L.; ROGERS, L. Philosophical, multicultural and interdisciplinary issues. In: FAUVEL, J.; MAANEN, J. (Orgs.). History in mathematics education: the ICMI study. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 2000. p.38-62.
  • LAVAQUI, V.; BATISTA, I. de L. Interdisciplinaridade em ensino de ciências e de matemática no ensino médio. Ciência & Educação, v. 13, n. 3, p. 399-420, set/dez, 2007.
  • LIANG, L. L.; CHEN, S.; CHEN, X.; KAYA, O. N.; ADAMS, A. D.; MACKLIN, M.; EBENEZER, J. Preservice teachers' views about nature of scientific knowledge development: an international collaborative study. International Journal of Science and Mathematics Education, Penang, v. 7, n. 5, p. 987-1012, 2009.
  • LIU, P. H. History as a platform for developing college students' epistemological beliefs of mathematics. International Journal of Science and Mathematics Education, Penang, v. 7, n. 3, p. 473-499, 2009.
  • LÜDKE, M.; ANDRÉ, M.E.D. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: E.P.U., 1986.
  • MIGUEL, A.; MIORIM, M.A. História na educação matemática: propostas e desafios. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
  • PAIVA, M. A. V. O professor de matemática e sua formação: a busca da identidade profissional. In: NACARATO, A. M.; PAIVA, M. A. V. (Orgs.). A formação do professor que ensina matemática: perspectivas e pesquisas. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. p.89-111.
  • ROCHA, L. P.; FIORENTINI, D. Desenvolvimento profissional do professor de matemática no início de carreira no Brasil. Quadrante: Revista teórica e de investigação, Lisboa, v. 15, n. 1/2, p. 145-168, 2006.
  • SCHÖN, D. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, A. (Org.). Os professores e sua formação Lisboa: Dom Quixote, 1995. p.77-91.
  • SHULMAN, Lee S. Those who understand: knowledge growth in teaching. Educational Researcher, Washington, v. 15, n. 2, p. 4-14, fev, 1986.
  • TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional Petrópolis: Vozes, 2002.
  • Endereço para correspondência:

    Eliane Maria de Oliveira Araman
    Avenida Alberto Carazzai, 1640
    CEP: 86300-000, Cornélio Procópio
    PR, Brasil
    E-mail:
  • 1
    Estamos entendendo natureza do conhecimento matemático como a compreensão de algumas características que permeiam o seu desenvolvimento, como seus valores epistêmicos subjacentes, seus métodos e suas práticas institucionais (DASS, 2005).
  • 2
    Segundo Lavaqui e Batista (2007), a conceituação de interdisciplinaridade não apresenta uma definição estável, associada a diferentes concepções epistemológicas. Salientamos que, nesta pesquisa, a compreensão que temos de interdisciplinaridade refere-se às interações possíveis e existentes entre duas ou mais disciplinas, cuja interação pode ir desde a simples comunicação de ideias até a integração de conceitos, promovendo enriquecimentos mútuos.
    3 De acordo com Brito e Carvalho (2009, p. 15-16), o entender profundamente vai além "de o professor demonstrar com exatidão teoremas, lidar com linguagem matemática de um modo mecânico", mas que "além de conhecer teoremas, consegue relacionar diferentes campos desse conhecimento, refletir sobre os fundamentos da Matemática, perceber seu dinamismo interno e suas relações com outros campos do saber", entre outros.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 2013

    Histórico

    • Recebido
      Maio 2012
    • Aceito
      Set 2012
    UNESP - Universidade Estadual Paulista, Pró-Reitoria de Pesquisa, Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática Avenida 24-A, 1515, Caixa Postal 178, 13506-900 Rio Claro - SP Brasil - Rio Claro - SP - Brazil
    E-mail: bolema.contato@gmail.com