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Análise espacial exploratória da relação entre crescimento do PIB e desempenho da agricultura no Rio Grande do Sul

Exploratory spatial analysis of the relationship between GDP growth and agricultural performance in Rio Grande do Sul

Resumo:

Apesar da importância do Valor da Produção Agrícola (VPA) para o PIB do Rio Grande do Sul, não se identificou na literatura especializada estudos quantitativos realizados em escala local para verificar como essa importância varia no espaço. O conhecimento de como o VPA é transferido para o PIB permanece agregado para todo o Estado e é somente tratado de forma especulativa em escalas locais. Nesse estudo o crescimento do PIB (cPIB) e o crescimento do Valor da Produção Agrícola (cVPA) foram verificados em uma Análise Espacial Exploratória (AEE) para avaliar a sensibilidade dos resultados ao particionamento do Estado e às relações de adjacência.

Palavras-chave:
PIB; desenvolvimento territorial; análise espacial; GWSS

Abstract:

Despite the importance of the Value of Agricultural Production (VAP) for the GDP of Rio Grande do Sul, no quantitative work has been carried out on local scale to assess how this importance may vary over the space. The knowledge about how the VAP is transferred to GDP remains aggregated for the entire state and speculative at local scales. In this study the growth of the GDP (cGDP) and Agricultural Production Value (cVAP) were verified in an Exploratory Spatial Analysis (ESA) to assess the sensitivity of the results to state partitioning and adjacency relationships. Evidences of spatial structuring of the association between cVAP and cGDP were verified in a Monte Carlo test to conclude that the association is non-stationary and heterogeneously defined by the local economy.

Palavras-chave:
GDP; territorial development; spatial analysis; GWSS

1. Introdução

O Estado do Rio Grande do Sul (RS) possui como principais setores da economia, em ordem de importância, o de serviços, o industrial e o agropecuário (Risco, 2016Risco, G. (2016). Distribuição dos setores da economia gaúcha por municípios. Carta de Conjuntura FEE, 25(1), 2.). Embora apresente menor participação que os demais na composição do Produto Interno Bruto (PIB), a geração de riqueza primária promovida pelo setor primário do RS impulsiona localmente os outros setores por meio das relações de interdependência (Lazzari, 2012Lazzari, M. (2012). Economia gaúcha dependente da agropecuária. Carta de Conjuntura FEE, 21(1), 1. ; Fochezatto & Ghinis, 2012Fochezatto, A., & Ghinis, C. P. (2012). Estrutura produtiva agropecuária e desempenho econômico regional: o caso do Rio Grande do Sul, 1996-2008. Revista de Economia e Sociologia Rural, 50(4), 743-762.; Schuh et al., 2018Schuh, A. B., Silva, M. L., Trevisan, L. V., & Coronel, D. A. (2018). Perfil industrial do Rio Grande do Sul e a hipótese de desindustrialização. Perspectiva Econômica, 13(2), 116-133.).

Em 2008, os setores de serviços e industrial no RS sofreram com 52% da perda na economia provocada por uma estiagem (Fochezatto & Grando, 2009Fochezatto, A., & Grando, M. Z. (2009). Efeitos da estiagem de 2008 na economia do Rio Grande do Sul: uma abordagem multissetorial. Ensaios FEE, 32(1), 137-160.). A economia do Estado depende do desempenho da agropecuária para o seu crescimento, especialmente do desempenho agrícola, visto que entre 2010 e 2014 o setor gerou cerca de dois terços (69%) do PIB Agropecuário (Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser, 2023aFundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser – FEE. (2023a). PIB – RS 2002 – 2016. Recuperado em 10 de janeiro de 2023, de https://arquivofee.rs.gov.br/indicadores/pib-rs/estadual/serie-historica
https://arquivofee.rs.gov.br/indicadores...
).

Apesar da importância da agropecuária para a economia do RS, pouco se sabe sobre como a dependência entre os setores varia no espaço e no tempo, especificamente em resposta ao desempenho da safra e como é afetada pelas características das economias locais. Em consequência disso, o crescimento econômico ocorre de maneira desuniforme no espaço, com polos de maior e menor expressão econômica, que interagem entre si com formas e intensidades distintas (Corrêa et al., 2019; Perroux, 1977).

Segundo Alonso (2006)Alonso, J. A. F. (2006). A persistência das desigualdades regionais no RS: velhos problemas, soluções convencionais e novas formulações. Indicadores Econômicos FEE, 33(4), 101-114., as diferenças entre as economias regionais têm se amplificado nas últimas seis décadas, especialmente com relação à concentração de indústrias. As regiões nordeste, norte e sul, em 2001, tiveram participação de 70,35%, 20,05% e 9,60%, respectivamente, na composição do PIB industrial. Com relação ao setor agropecuário, as regiões nordeste, norte e sul tiveram participação de 13,62%, 54,63% e 31,76%, respectivamente, no mesmo período.

Quando considerados os Conselhos Regionais de Desenvolvimento (COREDES), a amplitude do PIB per capita chega a aproximadamente R$ 19.500,00 (Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Regional, 2015Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Regional – SEPLAN-RS. (2015). Perfis - Regiões funcionais de planejamento. Recuperado em 11 de junho de 2019, de https://planejamento.rs.gov.br/upload/arquivos/201512/15134058-20150319163519perfis-todos.pdf
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). Isso revela que não somente a matriz econômica das regiões é diferente como também seu potencial de produzir riqueza por habitante. Logo, a relação entre o crescimento econômico e o desempenho da agricultura deve manifestar distinções locais no estado do RS.

A caracterização das relações locais entre o PIB e os seus formadores fica comprometida quando apenas a convergência global é analisada. Em oposição, modelos de ponderação espacial nos permitem avaliar métricas de heterogeneidade das relações (Fotheringham et al., 2002Fotheringham, A. S., Brunsdon, C., & Charlton, M. (2002). Geographically weighted regression: The analysis of spatially varying relationships. New York: John Wiley & Sons.) em cenários caracterizados por distinções locais na formação do PIB. Não menos importante é a possibilidade de verificar como as relações locais entre variáveis se modificam em diferentes escalas espaciais e temporais (Fotheringham et al., 2002Fotheringham, A. S., Brunsdon, C., & Charlton, M. (2002). Geographically weighted regression: The analysis of spatially varying relationships. New York: John Wiley & Sons.; Ma et al., 2018Ma, X., Zhang, J., Ding, C., & Wang, Y. (2018). A geographically and temporally weighted regression model to explore the spatiotemporal influence of built environment on transit ridership. Computers, Environment and Urban Systems, 70, 113-124.).

Aplicações em diversas pesquisas socioeconômicas (Clark, 2007Clark, S. D. (2007). Estimating local car ownership models. Journal of Transport Geography, 15(3), 184-197.; Du et al., 2018Du, Q., Wu, C., Ye, X., Ren, F., & Lin, Y. (2018). Evaluating the effects of landscape on housing prices in urban China. Tijdschrift voor Economische en Sociale Geografie, 109(4), 525-541.) apontam para um substancial aumento da compreensão de relações em múltiplas escalas por meio da Análise Espacial Exploratória (AEE). Lewandowska-Gwarda (2018)Lewandowska-Gwarda, K. (2018). Geographically weighted regression in the analysis of unemployment in Poland. ISPRS International Journal of Geo-Information, 7(1), 1-17., por exemplo, demonstra que determinantes do desemprego se diversificavam sobre um espaço geográfico dividido em 380 distritos na Polônia. Os modelos ponderados espacialmente apresentaram coeficiente de determinação (r2) ajustado à média de 0,698 contra um coeficiente global de 0,497 para uma relação positiva entre os gastos com assistência social e a taxa de desemprego.

A relação global entre o PIB e o PIB Agropecuário resulta de estruturações regionais até o momento pouco estudadas no RS, isso mesmo para dados não espaciais. Informações sobre a formação do PIB em contexto espacial permitem que agentes da cadeia tenham à disposição parâmetros para definir os limites de seus investimentos e o retorno da sua política de atuação em função da localidade. Com as relações localmente caracterizadas, torna-se possível prever como a economia do Estado será distintamente afetada em consequência do desempenho da safra. Além disso, estas relações possibilitam inferir sobre variações na eficiência da transferência do PIB Agropecuário para outros setores da sociedade.

Na AEE, a visualização cartográfica é imprescindível para que o analista observe o valor de cada atributo de forma relativa ao valor de outros atributos em contexto geográfico. Diferente da análise exploratória clássica de dados não espaciais, as técnicas de AEE podem ser aplicadas tanto nos estágios iniciais para formulação de hipóteses como nas fases finais para avaliação de modelos de estruturação espacial.

Uma perspectiva para a AEE do cPIB é a confrontação dos resultados com as teorias sobre os efeitos de concentração, de desconcentração e de heterogeneidade (Mack & Grubesic, 2009Mack, E. A., & Grubesic, T. H. (2009). Broadband provision and firm location in Ohio: an exploratory spatial analysis. Journal of Economic and Human Geography, 100(3), 298-315.) que estejam potencialmente sendo promovidos pelo cVPA e pelas especificidades locais. Essas teorias têm sido exploradas na relação espacial entre a formação de empresas e a oferta de infraestrutura de banda larga (Gibbs & Tanner, 1997Gibbs, D., & Tanner, K. (1997). Information and communication technologies and local economic development policies: the British case. Regional Studies, 31(8), 765-774.). As teorias são atribuídas a escolas com ideias distintas sobre como a infraestrutura define a criação de empresas no espaço. Na teoria de concentração, a formação de empresas se concentra nas posições em que a infraestrutura está disponível, nesse caso por se tratar de mais uma vantagem que se soma às oportunidades já existentes para as interações presenciais (Leamer & Storper, 2001Leamer, E. E., & Storper, M. (2001). The economic geography of the internet age. NBER Working Paper No. W8450. Recuperado em 30 maio de 2020, de http://ssrn.com/abstract=281081
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; Zook, 2005Zook, M. A. (2005). The Geography of the Internet Industry: Venture Capital, Dot-coms and Local Knowledge. New York: Blackwell.). Na teoria de desconcentração, a dispersão espacial das firmas passa a acontecer à medida que a infraestrutura de banda larga diminui a necessidade de interações presenciais (Kutay, 1986Kutay, A. (1986). Effects of telecommunications technology on office location. Urban Geography, 7, 243-257.; Moss, 1998Moss, M. L. (1998). Technology and cities. Cityscape, 3, 107-127.). Na teoria de heterogeneidade os efeitos de concentração e de desconcentração acontecem de forma heterogênea em função do nicho específico de atuação da firma (Atkinson, 1998Atkinson, R. D. (1998). Technological change and cities. Cityscape (Washington, D.C.), 3, 129-170.; Audirac, 2005Audirac, I. (2005). Information technology and urban form: challenges to smart growth. International Regional Science Review, 28, 119-145.).

No caso do cPIB, as condicionantes da estruturação espacial são diferentes das apontadas nas teorias sobre criação de firmas, porém, as evidências de concentração, de desconcentração e de heterogeneidade seguem úteis para a formulação teórica sobre associação entre o PIB e o valor da produção agrícola. Há um destaque ao esperado efeito heterogêneo, localmente causado pela especificidade da economia, da tecnologia e da aptidão agrícola.

O objetivo desse estudo é verificar a estruturação espacial da associação entre o crescimento do PIB e o desempenho da agricultura no RS entre 2004 e 2015. Métricas estatísticas espacialmente ponderadas foram obtidas e analisadas em diferentes escalas espaciais para a verificação da significância da estruturação espacial da associação. Trata-se de um estudo espacial exploratório conduzido com o intuito de produzir evidências para a modelagem espacial da economia do Rio Grande do Sul.

Tendo em vista o desenvolvimento desta pesquisa, o trabalho foi dividido em seis seções. Nas seções 2 e 3 são descritas a área de estudo e as variáveis utilizadas, respectivamente. Na seção 4 são apresentados os estimadores locais e os métodos não paramétricos empregados para caracterizar a estruturação espacial da relação entre o desempenho econômico e agrícola. Na seção 5 os resultados são apresentados e discutidos com ênfase nas evidências sobre a existência da variação espacial na força de associação entre o crescimento da economia e o desempenho da agricultura no território do RS. As regiões (e as transições) são destacadas e caracterizadas com foco na implicação do desempenho da agricultura para as economias locais. Na seção 6 a recorrência das relações na série analisada é tomada para a elaboração das conclusões sobre como o Rio Grande do Sul tem estado espacialmente desagregado para o grau da exposição do PIB ao desempenho da agricultura.

2. Área de Estudo

O estudo foi conduzido no estado do Rio Grande do Sul (Figura 1) e tem como unidade de análise seus municípios. O RS possui 497 municípios e uma população estimada em 11.329.605 habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2019Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2019). População. Recuperado em 30 de junho de 2019, de https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rs/panorama.
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). A economia do Estado foi composta entre 2004 e 2015, em média, por 64,9% proveniente do setor de serviços, 26,2% proveniente do setor industrial e 8,9% provenientes do setor agropecuário (SA) (Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser, 2023aFundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser – FEE. (2023a). PIB – RS 2002 – 2016. Recuperado em 10 de janeiro de 2023, de https://arquivofee.rs.gov.br/indicadores/pib-rs/estadual/serie-historica
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). Embora o SA possua menor participação percentual na economia se comparado aos demais setores, em 2013 ele foi o setor de maior importância para 30% dos municípios, e em metade dos que possuem o setor de serviços como majoritário (64%), o SA tem uma participação superior a 30% (Risco, 2016Risco, G. (2016). Distribuição dos setores da economia gaúcha por municípios. Carta de Conjuntura FEE, 25(1), 2.).

Figura 1
- Divisão territorial do Estado do Rio Grande do Sul e localização dos transectos analisados.

3. Base de Dados

O estudo foi realizado com dados de doze anos consecutivos, entre 2004 e 2015, levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foram utilizados dados de PIB municipal como métrica de crescimento econômico e de Valor da Produção Agrícola municipal (VPA) como métrica de desempenho agrícola. Apenas municípios com série de dados completa foram selecionados para a análise, que contou com 496 municípios.

O VPA resulta da multiplicação da produção agrícola das principais culturas de importância econômica e social do Brasil pelo valor de sua comercialização (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2017Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2017). Produção Agrícola Municipal - Culturas temporárias e permanentes. Rio de Janeiro: IBGE.). A conversão do PIB e do VPA nas respectivas taxas anuais de crescimento, cPIB e cVPA, foram obtidos com base na taxa relativa ao ano anterior (Equações 01 e 02).

cPIB t = PIB t PIB t 1 PIB t 1 1
cVPA t = VPA t VPA t 1 VPA t 1 2

Em que cPIBt e cVPAt são as taxas anuais de crescimento do PIB e do VPA para o ano t, respectivamente.

A estratégia de analisar taxas de crescimento minimiza problemas de discrepâncias decorrentes do tamanho da área e da produtividade agrícola. Além disso, possibilita analisar de forma direta a associação local entre a evolução do desempenho agrícola e a resposta do crescimento econômico.

4. Metodologia

As técnicas de AEE são aplicadas primeiro na visualização cartográfica e na explicitação das relações de adjacência por meio de kernels, e em seguida na verificação da significância da estruturação espacial da relação em uma simulação de Monte Carlo. A concentração, desconcentração ou heterogeneidade espacial no crescimento do PIB, em resposta ao crescimento do valor da produção, é adotada como perspectiva de análise.

A explicitação da função de ponderação espacial se deu por meio da aplicação dos kernels (Bidanset & Lombard, 2014Bidanset, P. E., & Lombard, J. R. (2014). The effect of kernel and bandwidth specification in geographically weighted regression models on the accuracy and uniformity of mass real estate appraisal. Journal of Property Tax Assessment & Administration, 10(3); Guo et al., 2008Guo, L., Ma, Z., & Zhang, L. (2008). Comparison of bandwidth selection in application of geographically weighted regression: a case study. Canadian Journal of Forest Research, 38(9), 2526-2534.) com função específica de ponderação e largura de banda.

O kernel atribui o peso da observação como função da distância da posição sxi,yi de estimação da estatística espacial (Tabela 1). No kernel Boxcar uma janela móvel toma as observações sem ponderação, e essas observações são utilizadas para a estimação na posição sxi,yi, que têm mesmo peso e estão espacialmente confinadas pela suposição de continuidade espacial finita dada pela largura de banda. Por conta dessa construção, as estimações locais podem ser comparadas de forma objetiva com estatísticas globais.

Tabela 1
Kernels utilizados no estudo.

No kernel Biquadrado o peso da observação varia de acordo com uma função bi-quadrática da distância entre a observação e a posição de estimação sxi,yi. As observações são definidas em um domínio espacial finito até o limite da largura de banda. O kernel Gaussiano pondera as observações como uma função gaussiana da distância, todas as observações do conjunto de dados são incluídas na ponderação, e a largura de banda e o decaimento gaussiano simulam a ponderação sob a hipótese do efeito de um campo aleatório gaussiano.

A largura de banda define a abrangência da janela móvel e consequentemente o peso atribuído às observações pela função de ponderação na posição de estimação sxi,yi. O domínio espacial da análise pode ser definido por meio da escolha de uma distância fixa ou por meio da escolha do número de observações. No RS os polígonos municipais são irregulares com grande variação de tamanho e de forma. Na região sudoeste predominam municípios grandes com maior distância entre os centroides. Na região metropolitana de Porto Alegre e nordeste do estado predominam municípios menores com menor distância entre centroides. Por essa razão a segunda abordagem foi adotada e o domínio foi definido por um raio adaptativo com um número fixo de observações. Essa opção evitou problemas relacionados à variabilidade do número de observações quando o raio é fixo (Harris & Brunsdon, 2010Harris, P., & Brunsdon, C. (2010). Exploring spatial variation and spatial relationships in a freshwater acidification critical load data set for Great Britain using geographically weighted summary statistics. Computers & Geosciences, 36(1), 54-70.).

Métodos para estimar a largura de banda ótima para um kernel na análise espacial são aplicados quando funções objetivas estão no contexto (Harris & Brunsdon, 2010Harris, P., & Brunsdon, C. (2010). Exploring spatial variation and spatial relationships in a freshwater acidification critical load data set for Great Britain using geographically weighted summary statistics. Computers & Geosciences, 36(1), 54-70.). Por exemplo, a validação cruzada pode ser utilizada em um processo computacional para determinar a largura de banda para a regressão espacialmente ponderada (Mirzaei et al., 2018Mirzaei, M.; Bertazzon, S.& Couloigner, I. (2018). OLS and GWR LUR models of wildfire smoke using remote sensing and spatiotemporal data in Alberta. Spatial Knowledge and Information Canada, 7(2), 3. ; Vinayaraj et al., 2016Vinayaraj, P., Raghavan, V., & Masumoto, S. (2016). Satellite-derived bathymetry using adaptive geographically weighted regression model. Marine Geodesy, 39(6), 458-478.). No caso da AEE aplicada nesse estudo, funções objetivas não estão no contexto, por isso a largura de banda foi definida de maneira subjetiva sem configurar um problema no cunho exploratório (Harris & Brunsdon, 2010Harris, P., & Brunsdon, C. (2010). Exploring spatial variation and spatial relationships in a freshwater acidification critical load data set for Great Britain using geographically weighted summary statistics. Computers & Geosciences, 36(1), 54-70.).

Na ausência de funções objetivas, as larguras de banda foram ajustadas para 5% e 15% do tamanho do conjunto de dados, respectivamente em 25 e 75 das observações. A escolha garantiu que as relações locais pudessem ser evidenciadas

Métricas locais foram geradas para inicialmente investigar indícios de não estacionariedade na relação entre cPIB e cVPA, bem como para verificar padrões locais do comportamento das variáveis de crescimento (Fotheringham et al., 2002Fotheringham, A. S., Brunsdon, C., & Charlton, M. (2002). Geographically weighted regression: The analysis of spatially varying relationships. New York: John Wiley & Sons.). Para relacionar as métricas locais com as globais de forma direta, a média local (Equação 03), o desvio padrão local (Equação 04) e z-score local (Equação 05) foram obtidos com o kernel Boxcar com largura de banda de 5%.

m x i = j = 1 n w i j x i / j = 1 n w i j 3

Em que mxi é a média local na posição i. wij é a matriz de ponderação espacial atribuída ao kernel (Tabela 1).

s x i = j = 1 n w i j x j m x i 2 / j = 1 n w i j 4

Em que sxi é o desvio padrão local.

z ( s i ) = m x i μ / σ j = 1 n ( w i j ) 2 5

Em que z(si) é o z-score local, μ é a média global estimada e σ é o desvio padrão global.

A estacionariedade da associação local entre o cPIB e o cVPA foi verificada por meio de correlações espaciais lineares e robustas. A adaptação para o cálculo do coeficiente de correlação de Pearson entre duas variáveis xi e yi no espaço é descrito nas equações 06 e 07. Para o cálculo da correlação robusta o processo espacial é o mesmo, porém aplicado ao rank da variável.

ρ x i , y i = c x i , y i / ( s ( x i ) s y i ) 6

ρxi,yi é o coeficiente de correlação de Pearson entre as variáveis xi e yi, e cxi,yi é a covariância local entre as variáveis xi e yi, como descrito na Equação 07.

c x i , y i = j = 1 n w i j x j m x i y j m y i / j = 1 n w i j 7

A significância do efeito da estruturação espacial na associação entre o cPIB e o cVPA foi verificada em um teste de Monte Carlo. No teste, as correlações espaciais são obtidas na estrutura espacial do dado e comparadas com correlações obtidas em estruturas espaciais propostas ao acaso em 999 permutações das observações no espaço. Resultados significativos (α=0,1) do teste levam à conclusão de que a associação entre cPIB e cVPA é não estacionária no espaço. O teste foi aplicado obedecendo as seguintes etapas: (i) obtenção das estatísticas locais com os pares de coordenadas e variáveis mantidas nas posições reais; (ii) aleatorização sucessiva da posição das observações das variáveis; (iii) cálculo das estatísticas espaciais de cada permutação aleatória; e (iv) ranqueamento do resultado das 999 permutações em cada posição no espaço. As correlações locais foram avaliadas como não ao acaso quando posicionadas no limite inferior (ou superior) das caldas da distribuição. No caso desse teste, com α=0,1, foram significativas as correlações abaixo do percentil cinco ou acima do percentil noventa e cinco.

As regiões Norte e Sul do RS são frequentemente comparadas com relação aos níveis de geração de riqueza por apresentarem uma distinta especialização econômica (Alonso, 2006Alonso, J. A. F. (2006). A persistência das desigualdades regionais no RS: velhos problemas, soluções convencionais e novas formulações. Indicadores Econômicos FEE, 33(4), 101-114.; Chelotti & Castanho, 2006Chelotti, M. C., & Castanho, R. B. (2006). Territórios da lavoura de arroz e de soja no Rio Grande do Sul: especificidades na produção do espaço agrário regional. Revista Sociedade & Natureza, 18(34), 114-132.). Considerando a delimitação regional utilizada por Alonso et al. (1994)Alonso, J. A. F., Benetti, M. D., & Bandeira, P. S. (1994). Crescimento econômico da Região Sul do Rio Grande do Sul: causas e perspectivas. Porto Alegre: FEE., entre 2004 e 2015 o PIB por Km2 da região norte foi, em média, 2,6 vezes superior ao PIB por Km2 da região Sul. Com base na heterogeneidade do espaço geográfico do Rio Grande do Sul, foram realizadas análises das estatísticas espaciais entre as regiões ao longo de transectos (Figura 1). O primeiro transecto foi denominado de Transecto Norte/Sul, tomado com o objetivo de analisar as regiões tradicionalmente comparadas na literatura. Adicionalmente, foi incorporado um segundo transecto, denominado de Transecto Oeste/Leste, com objetivo de explorar novas transições que porventura existam no Estado.

Na análise espacial exploratória das variáveis cPIB e cVPA, nenhuma transformação foi realizada, assim como também não houve direcionamento da análise para individualizar anos específicos. Os dados foram analisados na sua distribuição natural e tomados pontualmente por meio das estimações das métricas de centralidade e dispersão na série. A análise deve ser entendida como uma etapa ad hoc para proposição de modelos que incorporem componentes espaço-temporais em futuros estudos. As análises espaciais foram realizadas com os algoritmos implementados no pacote GWmodel (Gollini et al., 2015Gollini, I., Lu, B., Charlton, M., Brunsdon, C., & Harris, P. (2015). GWmodel: an R package for exploring spatial heterogeneity using geographically weighted models. Journal of Statistical Software, 63(17), 1-50.) do software estatístico R.

Com exceção do z-score local e do teste de Monte de Carlo, os resultados dos doze anos do estudo foram agrupados com as estatísticas de média temporal dos doze anos para posição e desvio padrão temporal (desvio padrão das estatísticas dos doze anos para uma dada posição). Dessa forma foi possível observar como, em média, as estatísticas locais variaram no território

5. Resultados

Nesse estudo investigamos os efeitos do cVPA sobre cPIB sob a perspectiva da ocorrência não concentrada, concentrada e heterogênea dos níveis de associação entre os crescimentos.

Entre 2004 e 2015, as maiores frequências de crescimento do PIB e do VPA estão entre -0,2 e +0,2 sugerindo que as margens de crescimento estão globalmente atreladas. As distribuições ano a ano (dados não apresentados) mostram variações na forma e na dispersão dos crescimentos do PIB e do VPA, uma evidência de que as condicionantes locais da associação espacial entre os crescimentos são dinâmicas e precisam ser entendidas mediante a incorporação do efeito aleatório do ano-safra e da matriz das economias locais.

A distribuição do cPIB apresenta menor volatilidade que a do cVPA (Tabela 2), provavelmente em resposta à importância da contribuição de outros setores, com destaque para a região metropolitana mais industrializada. As duas variáveis apresentam valores discrepantes com elevadas taxas de crescimento entre dois anos consecutivos, que ocorrem em municípios com baixa atividade econômica, onde o cenário é propício para elevados incrementos relativos ao PIB pequeno. Por conta dessas ocorrências, métodos que requerem ortogonalidade dos dados, tais como inferência sobre parâmetros de regressão e principais componentes, devem ser utilizados com parcimônia na análise do crescimento do PIB sob a dependência do desempenho agrícola no RS. A maior volatilidade do cVPA também pode ser explicada por eventos meteorológicos, adoção de tecnologia e alta de preços no mercado agrícola.

Tabela 2
– Estatísticas globais entre 2004 e 2015.

A associação entre as médias do cPIB e do cVPA varia no espaço em resposta ao perfil local da atividade econômica (Figura 33b). Na região noroeste ocorrem os maiores valores médios do cPIB e de cVPA, enquanto na região central ocorre a associação entre os menores níveis de crescimento. Fatores não inseridos nesta análise, tais como solo, clima e tecnologia, modulam o VPA e consequentemente a sua participação na formação do PIB. É esperado que grupos espaciais com diferentes níveis de crescimento sejam formados em resposta à eficiência da agricultura e à especificidade da economia.

Figura 3
– Métricas temporais espacialmente ponderadas. Médias do (a) cPIB e do (b) cVPA; desvio padrão do (c) cPIB e do (d) cVPA; e desvio padrão da média local do (e) cPIB e do (f) cVPA.

A região metropolitana de Porto Alegre mostra valores elevados de cPIB associados a valores intermediários de cVPA. A interferência da base econômica da região metropolitana na associação ocorre por meio da maior participação dos setores de serviços e industrial (Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser, 2023bFundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser – FEE. (2023b). Base de dados 2002 a 2015. Recuperado em 10 de janeiro de 2023, de https://arquivofee.rs.gov.br/indicadores/pib-rs/municipal/serie-historica
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) e a consequente redução da importância da atividade agrícola na composição do PIB.

Pelos resultados (Figura 2), não parece haver espaço para teoria de efeito de desconcentração do crescimento do PIB. Tanto a centralidade quanto a variabilidade dos crescimentos se mostram espacialmente estruturadas e correlacionadas.

Figura 2
– Distribuição dos crescimentos (a) do PIB (cPIB) e (b) do Valor da Produção Agrícola (cVPA).

A média temporal dos desvios padrões (Figura 33d) mostra que as maiores variações temporais do cPIB estão localizadas nas mesmas regiões onde estão as maiores médias de crescimento. Já para o desvio padrão local médio do cVPA (Figura 3d), a maior variação média de crescimento está localizada na extremidade leste do RS, onde ocorre a variabilidade temporal no desempenho da agricultura, talvez em decorrência da variabilidade anual da disponibilidade de água para irrigação do arroz, principal cultivo nessa região.

Os maiores desvios padrões da média local do cPIB e do cVPA (Figuras 33f) estão na região noroeste em um efeito claro de concentração dessas ocorrências. Essa aglomeração acompanha a distribuição das médias de crescimento do VPA, que mostra a região noroeste com uma evidente aglomeração das maiores variações dos crescimentos no período da análise. Isso consolida a região noroeste como um aglomerado de economia fortemente associada ao desempenho da agricultura.

Pela razão entre da variação espacial das médias de crescimento (Figura 4), a proporção de variação do cPIB relativa à variação do cVPA se apresenta heterogênea e com grupamentos evidentes, em que a variação do VPA é transferida em maior ou menor proporção para o PIB, dependendo da especialização econômica da região. Na região centro-oeste ocorre a maior razão (45%) da variação, em que aproximadamente metade da variação cVPA é incorporada pelo cPIB. Essa proporção se reduz a 39% na região metropolitana, 34% na região Sul e 20% na região centro-leste.

Figura 4
– Razão entre o desvio padrão da média local do cPIB e do cVPA.

O destaque da região centro-oeste na análise da proporção de variação dos crescimentos ocorre em parte pela matriz econômica pouco diversificada e pela elevação do preço das comodities no período da análise. É importante destacar que a teoria de formação heterogênea de clusters no espaço é adequada para entender a diversificação do grau assimilação da variação do VPA pelo PIB no Estado. Os promotores locais do efeito heterogêneo precisam ser incorporados em futuras análises.

A dinâmica anual da forma de associação espacial entre os crescimentos é modulada por diversos fatores, mas principalmente pela volatilidade do VPA atrelada às oscilações de produtividade e ao potencial de participação do VPA no PIB local. Essa dinâmica foi analisada pela ocorrência de mesmos quartis do z-score (Equação 5) dos crescimentos no espaço (Figura 5 e 6).

Figura 5
– Z-score local do cPIB e do cVPA para os anos: 2004, 2007, 2010 e 2013.
Figura 6
– Ocorrência de quartis (em preto) de cPIB e cVPA para os anos 2004, 2007, 2010 e 2013.

Locais onde o z-score do cPIB e do cVPA ocorrem no mesmo quartil foram destacados no mapa (Figura 6). Essa plotagem permitiu verificar que a formação de aglomerados espaciais de z-score em um mesmo quartil varia em função do ano. Em geral os crescimentos estão associados, porém em vários níveis de dispersão e com relação aparentemente heterocedástica em resposta à não estacionariedade espacial da associação entre os crescimentos.

Os anos de 2004 e 2007 mostram grau moderado de pulverização das ocorrências de mesmo quartis de crescimento. Destaque para os aglomerados que se consolidam nas regiões noroeste e leste.

Em 2004 acontece uma baixa dispersão do cVPA, causada por uma seca generalizada no Estado. Mesmo nessa condição, aglomerados de associação entre os quartis estão presentes nas regiões oeste, norte e central (Figura 6). Nos anos de 2004 e 2007 se percebe uma leve desconcentração do confinamento espacial dos quartis, mas em 2010 e 2013 o efeito das forças de adjacência espacial consolida aglomerados espaciais maiores nas regiões oeste, central e leste. A convergência linear (Figura 5), e o consequente crescimento dos aglomerados nessas regiões, sugere o aumento da participação do agronegócio na composição do PIB ao longo da série temporal analisada.

Dos inúmeros problemas que podem comprometer a interpretação estatística em econometria, a estruturação espacial dos dados é um deles. Neste trabalho, métodos de análise são aplicados para revelar a estruturação espacial com a finalidade de oferecer subsídios para que outras técnicas de análise possam futuramente ser aplicadas. Os resultados apresentados em seguida buscam dar uma base sólida de sustentação sobre como a força e a significância da estruturação espacial da relação entre o cVPA e o cPIB acontece no Rio Grande do Sul.

É possível perceber mudanças espacialmente abruptas na força de associação média entre 2004 e 2015, obtidas pelas correlações espacialmente ponderadas (Figura 7). A superioridade da correlação robusta sobre a linear indica tendência de não linearidade na associação espacial entre os crescimentos. Entre os kernels, o Gaussiano gerou a maior suavização na variação das correlações locais, indicando que as transições são mais evidentes sem a ponderação gaussiana no intervalo do raio adaptativo.

Figura 7
– Correlações lineares (Cor. Pearson.) e robustas (Cor. Sperman.) médias para os kernels Boxcar, Biquadrado e Gaussiano, com largura de banda adaptativa para 5% e 15% das observações.

A suavização espacial provocada pelo aumento da largura de banda de 5% para 15% possibilita avaliar a formação da concentração espacial de níveis de associação em função da escala de análise. Em 15% de raio adaptativo fica evidente que a maior mudança na força da associação acontece por conta da transição oeste-leste, onde estão os aglomerados com maior e menor força de associação. Isso se deve principalmente à variação nas matrizes econômicas municipais. A região leste do RS é a região industrialmente mais ativa do Estado (Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser, 2023bFundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser – FEE. (2023b). Base de dados 2002 a 2015. Recuperado em 10 de janeiro de 2023, de https://arquivofee.rs.gov.br/indicadores/pib-rs/municipal/serie-historica
https://arquivofee.rs.gov.br/indicadores...
), e por isso a relação entre cPIB e cVPA é menos evidente que nas outras regiões.

A correlação robusta com raio de 5% permite verificar a ocorrência de aglomerados menores dentro das regiões leste e oeste. Nessa escala, a estruturação espacial se mostra mais heterogênea, principalmente pela formação de um aglomerado de força de associação intermediária entre os aglomerados oeste e norte.

Na comparação com as correlações médias globais, 0,53 e 0,36 para robusta e linear, respectivamente, as correlações médias locais (Figura 7) são subestimadas na região oeste e superestimadas na região leste. As transições espaciais da força de associação visualizadas com o auxílio dos transectos (Figura 1) mostram que a maior variação da associação entre cPIB e cVPA não acontece no sentido norte-sul, como tem sido afirmado de forma especulativa, mas sim no sentido oeste-leste (Figura 8).

Figura 8
– Correlações lineares (linha contínua) e robustas (linha pontilhada) nos transectos norte-sul e oeste-leste para os kernels Boxcar, Biquadrado e Gaussiano, com largura de banda de 5%.

No transecto 2 oeste/leste, independente do kernel, ocorre uma queda no valor da correlação média por volta dos 380 km a partir da origem. Nesse ponto acontece a descontinuidade espacial do nível de associação espacial entre desempenho da agricultura e o crescimento econômico, provavelmente indicando a elevação do desempenho dos setores de serviços e industrial.

Com o aumento da largura de banda (Figura 9), as diferenças regionais continuam presentes entre os transectos e as diferenças entre as correlações robusta e de Pearson se acentuam. Quando a largura de banda foi menor (Figura 8), as correlações robusta e de Pearson se aproximam, significando que a linearidade da correlação entre os crescimentos se manifesta em escalas maiores, com o efeito de adjacência. A força e a forma da associação entre os crescimentos é, portanto, sensível à escala espacial.

Figura 9
– Correlações lineares (linha contínua) e robustas (linha pontilhada) nos transectos norte-sul e oeste/leste para os kernels Boxcar, Biquadrado e Gaussiano, com largura de banda de 15%.

Até aqui foram apresentadas evidências de que estruturação espacial da associação entre o crescimento da economia e o valor da produção agrícola é heterogênea, com formação de grupamentos espaciais para diferentes níveis de força de associação. O passo seguinte foi testar a força dessas evidências da estruturação espacial em uma simulação de Monte Carlo.

Entre 2004 e 2015 o número de vezes em que a correlação local (Figura 10) foi significativa pelo teste de Monte Carlo (α=0,1 e 999 permutações) revela que a imposição da estruturação espacial é significativa para a análise da associação entre os crescimentos do PIB e do VPA. Uma pequena variação nos resultados do teste ocorre em função da adoção do kernel e da largura de banda, mas os resultados foram semelhantes no que diz respeito ao número de municípios com resultado significativo para o teste de Monte Carlo (Tabela 3).

Figura 10
– Número de anos em que a relação entre o cPIB e o cVPA foi significativa (α = 0,1) no teste de Monte Carlo para as correlações lineares (Cor. Pe.) e robustas (Cor. Spe.) utilizando os kernels Boxcar, Biquadrado e Gaussiano, com largura de banda de 5% e 15%.
Tabela 3
– Número de correlações espaciais significativas (α=0,1) no teste de Monte Carlo.

Independente do kernel, a manifestação da estruturação espacial (Figura 10) acontece no sentido do Transecto 2 oeste/leste e, portanto, a variação das correlações (Figuras 8 e 9) não acontece ao acaso, mas sim por conta da imposição do espaço sobre essa relação. Em uma outra interpretação do teste de Monte Carlo pode ser afirmado que os níveis de correlação observados só puderam ser obtidos na estruturação espacial do dado. Portanto, a não estacionariedade da relação entre cPIB e cVPA está presente e precisa ser tratada com a aplicação de técnicas mais sofisticadas.

Além ser a região com a maior força de associação entre os crescimentos, a região oeste também apresenta o maior número de resultados positivos para o teste de Monte Carlo, principalmente na escala obtida com largura de banda proporcional a 15% de utilização dos dados. Em oposição, a região centro-sul apresentou as menores forças de associação entre os crescimentos e a menor de ocorrência de estruturação espacial significante entre os crescimentos (Figura 10). Até o meio da série temporal predominava na região sul a cultura do arroz e a pecuária, e apenas nos últimos anos a cultura da soja e milho tiveram aumento de área (IBGE) na região e consequente elevação do VPA. Isso pode explicar, em parte, a associação espacial pouco evidente entre os crescimentos na região sul.

6. Conclusões

No Estado do RS existem relações fortes e fracas entre o cPIB e o cVPA que são espacialmente estruturadas. Essa constatação implica na necessidade de utilização de modelos espaciais para prever impactos locais na economia sob a perspectiva do desempenho produção e da comercialização agrícola.

Existe uma clara relação entre o desempenho agrícola e o crescimento da economia na maior parte do RS, porém a magnitude da incorporação do VPA na economia global é espacialmente distinta e estruturada.

A região oeste do Estado apresentou a maior taxa de crescimento econômico atrelada ao desempenho da agricultura. Os resultados sugerem que o espaço é um componente dinâmico e relevante para políticas relacionadas à contribuição da agricultura para o PIB do Estado.

A região oeste apresentou crescimento mais fortemente associado à atividade agrícola que as demais. Em relação às regiões Sul, Metropolitana e Central, outros fatores devem ser estudados para compreensão das causas da modificação temporal da relação entre cPIB e cVPA.

Com relação à análise dos transectos, a região Oeste do RS apresenta correlações entre o cPIB e o cVPA mais fortes que na região Leste. Entre as regiões Norte e Sul não se observou variação na força de associação nem na significância da relação. Com isso é possível concluir que a variação regional do RS com relação à força de associação entre cPIB e cVPA ocorre no sentido Oeste-Leste, e não no sentido Norte-Sul.

A utilização de kernels diferentes provoca alterações tanto na força de associação quanto na comprovação da estruturação espacial, porém, mesmo com a variação de kernel e da largura de banda, as diferenças entre as regiões Oeste e Leste do RS continuam presentes.

Esse trabalho é um estudo exploratório sobre a relação entre economia do Estado do Rio Grande do Sul e o desempenho agricultura. Assim, mais trabalhos deverão ser realizados para melhor compreensão do tema, incorporando, por exemplo, as variações temporais da relação.

  • Como citar: Seger, F. M., Campos, R. C., Canever, M. D., & Horn, R. M. (2023). Análise espacial exploratória da relação entre crescimento do PIB e desempenho da agricultura no Rio Grande do Sul. Revista de Economia e Sociologia Rural, 61(4), e261837. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2022.261837
  • JEL Classification: O10; O47; R11.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    09 Mar 2022
  • Aceito
    27 Out 2022
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