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Avaliação da estabilidade in vitro de uma protease comercial

Evaluation of in vitro stability of a commercial protease

Resumos

Este trabalho foi realizado com o objetivo de avaliar a atividade in vitro de uma protease comercial componente de um complexo enzimático (VEGPRO<FONT FACE=Symbol>â</FONT>) com atividades de protease e celulase. Para avaliar a estabilidade térmica a enzima foi incubada a 80ºC por seis tempos (0; 0,5; 1,0; 5; 10 e 15 minutos). Para estimar o efeito do pH os tratamentos foram: pH 5,0; pH 2,3 sem pepsina e pH 2,3 com pepsina. Para avaliar o efeito dos íons metálicos incubou-se a enzima em soluções contendo cálcio, cobre, cobalto, manganês, magnésio e ferro. Os resultados mostraram que a enzima conservou pelo menos parte de sua atividade nas diferentes condições testadas.

Enzima; estabilidade; pH; íons; temperatura


This work aimed to evaluate the in vitro activity of a commercial protease (VEGPRO<FONT FACE=Symbol>â</FONT> ). The enzyme was incubated at 80ºC during 0, 0.5, 1, 5, 10 and 15 minutes. The gastric acidity effect was evaluated in the following treatments: pH 5.0 and pH 2.3 without pepsin and pH 2.3 with pepsin. The enzyme was incubated in calcium, copper, cobalt, manganese, magnesium and iron solutions to evaluate the effects of metalic ions. The activity of the commercial protease was maintained in all in vitro conditions tested.

Enzyme; ion; pH; estability; temperature


Avaliação da estabilidade in vitro de uma protease comercial

[Evaluation of in vitro stability of a commercial protease]

J.C.C.A DiasI, G.S. SantiagoII, W.M. FerreiraIII, E.O.S. SalibaIII, A.P. NaranjoIII

IMinistério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

IIFaculdade de Veterinária da UECE

IIIEscola de Veterinária da UFMG

Endereço para correspondência Endereço para correspondência J.C.C.A Dias Avenida Raja Gabaglia, 245 - Bairro Cidade Jardim 30380 090 - Belo Horizonte, MG E-mail: joaocarlos@agricultura.gov.br

RESUMO

Este trabalho foi realizado com o objetivo de avaliar a atividade in vitro de uma protease comercial componente de um complexo enzimático (VEGPROâ) com atividades de protease e celulase. Para avaliar a estabilidade térmica a enzima foi incubada a 80ºC por seis tempos (0; 0,5; 1,0; 5; 10 e 15 minutos). Para estimar o efeito do pH os tratamentos foram: pH 5,0; pH 2,3 sem pepsina e pH 2,3 com pepsina. Para avaliar o efeito dos íons metálicos incubou-se a enzima em soluções contendo cálcio, cobre, cobalto, manganês, magnésio e ferro. Os resultados mostraram que a enzima conservou pelo menos parte de sua atividade nas diferentes condições testadas.

Palavras-chave: Enzima, estabilidade, pH, íons, temperatura.

ABSTRACT

This work aimed to evaluate the in vitro activity of a commercial protease (VEGPROâ ). The enzyme was incubated at 80ºC during 0, 0.5, 1, 5, 10 and 15 minutes. The gastric acidity effect was evaluated in the following treatments: pH 5.0 and pH 2.3 without pepsin and pH 2.3 with pepsin. The enzyme was incubated in calcium, copper, cobalt, manganese, magnesium and iron solutions to evaluate the effects of metalic ions. The activity of the commercial protease was maintained in all in vitro conditions tested.

Keywords: Enzyme, ion, pH, estability, temperature

INTRODUÇÃO

As enzimas utilizadas na alimentação de não ruminantes devem resistir e conservar atividade considerável depois dos processos de fabricação e digestão. Os fatores que podem influenciar sua estabilidade, entre outros, são: a origem (microrganismo), o tipo de atividade, a composição da dieta, a condição de peletização (temperatura), o armazenamento, as condições durante o processo digestivo e a ação de enzimas endógenas (Francesch, 1996). A estrutura molecular da enzima é bastante frágil e, conseqüentemente, pode ser desnaturada por calor, álcalis, metais pesados e outros agentes oxidantes (Graham & Inborr, 1991, citados por Borges, 1997; Classem, 1996). Quanto à origem, as polissacaridases fúngicas possuem atividade ótima em pH mais baixo (4,0 a 5,5), enquanto as bacterianas atuam em pH próximo da neutralidade, de modo que a mistura de enzimas bacterianas e fúngicas pode ser mais efetiva do que uma fonte simples (Kernkamp & Duran, 1991, citados por Borges, 1997).

A maioria das enzimas utilizada na alimentação animal é de origem fúngica, são estáveis à temperatura ambiente, porém inativam-se rapidamente à temperaturas superiores a 60oC, ainda que a estabilidade da enzima seja superior quando se incorpora ao alimento (Francesch, 1996). Segundo Graham & Inborr (1991), citados por Borges (1997), o calor e a peletização podem inativar permanentemente as enzimas. Assim, uma enzima ideal deve ser capaz de suportar temperaturas entre 70 e 90oC, normalmente alcançadas durante o processo de peletização (Enzimes... 1991). Colier & Hardy (1986) mostraram que depois do processo de peletização, a atividade residual para a-amilase e proteases fúngicas e bacterianas foi de 52-77% e 34-65% da atividade original, respectivamente. O objetivo deste trabalho foi testar a enzima sob diferentes condições (condições simuladas de temperatura de peletização, condições simuladas de acidez gástrica e estabilidade em presença de íons metálicos) e verificar sua atividade catalítica.

MATERIAL E MÉTODOS

Neste experimento utilizou-se o produto comercial VEGPROâ (complexo enzimático) (Alltech do Brasil Agroindustrial Ltda.) com atividades de protease e celulase. Foram realizados três experimentos nas dependências do laboratório de nutrição animal do Departamento de Zootecnia da Escola de Veterinária da UFMG para determinar a atividade da protease frente a diferentes condições.

A atividade da enzima (protease) foi quantificada como mmoles de tirosina liberados por minuto de um substrato de caseína, segundo técnicas descritas por Yu & Tsen (1993), com as seguintes modificações: acrescentaram-se em cada tubo de reação 5ml de um substrato contendo 2% de caseína em tampão fosfato 0,05 M pH 7,5; incubou-se por 10 minutos a 37oC; adicionaram-se 5ml de ácido tricloroacético a 5%; centrifugou-se a 10.000 rpm por 15 minutos; pipetaram-se 150ml do sobrenadante e juntaram-se a 850ml de água destilada; acrescentou-se 1ml do reagente de Folin (3:1) em água; incubou-se a 37oC por 30 minutos e fez-se leitura em espectrofotômetro a 660nm.

Para se avaliar a estabilidade da enzima em condições simuladas de temperatura de peletização colocou-se 0,01g do complexo enzimático em tubos de vidro com tampa de baquelite e, em seguida, incubou-se em banho-maria a 80oC por seis tempos (tratamentos): 0; 0,5; 1,0; 5,0; 10,0 e 15,0 minutos, fazendo-se três repetições por tratamento. O tratamento sem calor (0 minutos) foi usado como controle e sua atividade relativa foi medida como 100%.

Para se avaliar a estabilidade em condições simuladas de acidez gástrica adicionaram-se 5ml de glicina-HCl 0,1 N pH 2,3 com ou sem pepsina 1:10.000 (2mg/ml) a 0,2g do complexo enzimático (CE) em acetato de sódio 0,1 M pH 5,0. A atividade enzimática obtida da mesma experiência, quando 0,2g do CE foram adicionados a 5ml do tampão acetato de sódio 0,1 M pH 5,0 foi usada como controle, sendo sua atividade relativa considerada 100%. Cada mistura assim obtida foi incubada a 40oC, por 30 minutos. Os tratamentos foram: 1) controle (0,2g CE + 5 ml tampão acetato de sódio 0,1 M pH 5,0), 2) controle + 5 ml tampão glicina - HCl 0,1 N pH 2,3 sem pepsina e 3) controle + 5 ml tampão glicina - HCl 0,1 N pH 2,3 com pepsina. Após a incubação, os pHs foram restaurados a 5,0 com diluição em tampão acetato de sódio 0,1 M. Foram feitas cinco repetições por tratamentos.

Para se avaliar a estabilidade em presença de íons metálicos à 0,3 ml de uma solução contendo o CE em água (7 a 15 unidades de CE / ml) foi adicionado 0,1 ml de soluções concentradas de vários íons metálicos (MnSO4, FeSO4, CuSO4, MgSO4. CoSO4 e Cl2Ca) apresentando, cada uma delas, concentração final de 5 mM. O grupo controle foi a solução do CE sem adição de minerais, sendo sua atividade relativa tomada como 100%. Essas misturas foram incubadas a 25oC por 30 minutos e tomados 0,2ml da solução para realizar o teste de atividade enzimática para protease. Foram cinco repetições por tratamento assim definidos: 1) controle (soluções de enzima sem mineral), 2) controle + solução de CaCl2, 3) controle + solução de CuSO4, 4) controle + solução de CoSO4, 5) controle + solução de MnSO4, 6) controle + solução de MgSO4 e 7) controle + solução de FeSO4.

Para avaliação da estabilidade térmica da enzima foram usados seis tratamentos, com três repetições por tratamento, num total de 18 unidades experimentais. Para o experimento de estabilidade em condições simuladas de acidez gástrica, foram usados três tratamentos com cinco repetições por tratamento, totalizando 15 unidades experimentais, e para o experimento de estabilidade frente a íons metálicos, usaram-se sete tratamentos com cinco repetições por tratamento tendo, portanto, 35 unidades experimentais. Para todos os experimentos de estabilidade enzimática o delineamento foi inteiramente ao acaso e os dados experimentais submetidos à análise de variância pelo pacote SAS (SAS, 1996) e as médias comparadas pelo teste Student-Newman-Keuls, ao nível de 5% de significância. O modelo estatístico geral para estudo dessa estabilidade é o que se segue:

¡ = m + Ti + Ei, em que:

¡ = observação relativa ao tratamento i

m = média geral

Ti = Efeito do tratamento i, i = temperatura, acidez e presença de íons metálicos

Ei = Erro aleatório associado a cada observação

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Tab. 1 mostra o efeito da temperatura sobre a atividade de uma protease componente de um complexo enzimático com atividades de protease e celulase. Não houve efeito do tempo de incubação (P>0,05), demonstrando que a enzima manteve atividade mesmo para um tempo longo de incubação, sugerindo que não houve desnaturação pelo calor. Yu & Tsen (1993), ao avaliarem a estabilidade térmica da bromelaína, papaína, protease do B. licheniformis e celulase de T. reesei, sob temperatura e tempos semelhantes, observaram que no tratamento pelo calor à 80ºC por 30 segundos a atividade relativa foi maior que 60% para todas as enzimas testadas. No entanto, o prolongamento do tempo de tratamento com calor para cinco minutos não afetou as atividades da papaína e da celulase, mas diminuiu significativamente as atividades da bromelaína e da protease do B. licheniformis, diferindo dos resultados deste trabalho.

Os resultados sugerem que essa enzima pode ser capaz de suportar as temperaturas normalmente alcançadas durante o processo de peletização, que segundo Enzimes¼(1991) oscilam entre 70 e 90oC, revestindo-se, pois, de importância prática, especialmente na cunicultura, cujas rações são, na sua maioria, na forma peletizada.

Perda de atividade pode, de fato, ocorrer graças ao processo de peletização para algumas enzimas. Graham & Inborr (1993) realizaram um experimento em que foram empregadas diferentes temperaturas de peletização (75, 85 e 95ºC) em dietas suplementadas ou não com enzimas. Os autores observaram que com aumento da temperatura, houve piora da conversão alimentar e do ganho de peso.

É consenso entre os bioquímicos que a velocidade de uma reação aumenta com a temperatura até se atingir um pico de velocidade. Esse aumento é função do maior número de moléculas com energia suficiente para ultrapassar a barreira de energia e formar produtos da reação. Em geral, quando o pico é atingido, ocorre redução da velocidade de reação, resultado da desnaturação da enzima induzida pela temperatura. O fato de a exposição prolongada à temperatura elevada (80oC) não ter provocado desnaturação completa, uma vez que a enzima manteve atividade, indica que o processo de fabricação do complexo enzimático em estudo confere proteção contra o efeito desnaturante do calor, pelo menos nas condições testadas.

A Tab. 2 mostra a influência da simulação das condições gástricas sobre a atividade da protease. Houve efeito significativo (P<0,05) dos tratamentos sobre esta variável. Somente o abaixamento do pH foi suficiente para inativar parcialmente a enzima, uma vez nessas condições manteve-se apenas 64,7% da atividade original. O alto valor obtido no tratamento 3 não pode ser explicado apenas pela ação da pepsina, sugerindo efeito aditivo (ação proteolítica da enzima-teste e da pepsina), de modo que nessas condições a enzima-teste provavelmente conservou parte de sua atividade. Pode-se também supor que a presença da pepsina não exacerbou o efeito negativo promovido pelo baixo pH. Os resultados sugerem também que essa enzima pode manter sua atividade pelo menos até sua passagem pelo estômago dos coelhos. Resultados semelhantes foram obtidos por Almirall & Esteve-Garcia (1995) ao observarem que a b-glucanase, submetida a pH baixo (3,2) e pepsina, conservou 96% de sua atividade.

A Tab. 3 mostra efeito da presença de íons metálicos sobre a atividade de uma protease. Apenas o Cu e o Fe foram diferentes (P<0,05) do grupo-controle (sem adição de minerais), o primeiro apresentando efeito inibitório. Resultados semelhantes, em parte, foram obtidos por Yu & Tsen (1993), os quais observaram efeito inibitório do Zn, Fe e Cu sobre a atividade da papaína e efeito parcialmente inibitório sobre a bromelaína. Parte das diferenças observadas para as soluções de CuSO4 e FeSO4 em relação ao grupo-controle pode ser atribuída à metodologia utilizada. As colorações dos sais de Fe e Cu podem ter interferido no resultado final da atividade da enzima. Pode ter ocorrido interações entre as radiações no espectro visível, pois a solução de CuSO4 absorve no azul e isto, combinado à radiação amarela emitida pela solução de leitura no espectrofotômetro (solução de Folin), pode ter conduzido à absorção no verde, subestimando a da amostra. Para a solução de FeSO4, provavelmente ocorreu intensificação da radiação emitida pela solução de leitura, o que pode ter superestimado os dados da amostra.

CONCLUSÕES

Não foi observada significância estatística do tempo de incubação quanto à temperatura, sugerindo que essa enzima pode permanecer ativa após o processo de peletização. Quanto ao pH, mesmo que tenha havido perda de atividade, parte da atividade relativa obtida no tratamento-controle ainda foi mantida, indicando que, possivelmente, nas condições normais do trato gastrintestinal a enzima pode exercer sua atividade catalítica. Em relação aos íons metálicos, os resultados não são conclusivos para os elementos Cu e Fe, provavelmente atribuídos à metodologia utilizada. Os demais íons testados praticamente não afetaram a estabilidade enzimática.

Recebido para publicação em 19 de março de 2001

Após modificações, em 12 de setembro de 2002

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  • Endereço para correspondência
    J.C.C.A Dias
    Avenida Raja Gabaglia, 245 - Bairro Cidade Jardim
    30380 090 - Belo Horizonte, MG
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Mar 2003
    • Data do Fascículo
      Dez 2002

    Histórico

    • Revisado
      12 Set 2002
    • Recebido
      19 Mar 2001
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