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Edição, política e ditadura: dois livros de oposição da Editora Alfa-Omega

Edition, politics and dictatorship: Two opposition books by Editora Alfa-Omega* * Este artigo dá continuidade à pesquisa sobre a atuação editorial de Fernando Mangarielo e da editora Alfa-Omega, feita em coatoria com Sandra Reimão e João Elias Nery, que já resultou em outros dois artigos: REIMAO; MAUES; NERY, 2015; 2016.

RESUMO

Neste artigo, analisarei a edição, pela Editora Alfa-Omega, de São Paulo, de dois livros de oposição: A Ilha (um repórter brasileiro no país de Fidel Castro), de Fernando Morais (1976), e Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia, de Cristina Pinheiro Machado (1979). A partir da análise da história da editora, do processo de produção e edição dos livros enfocados e da sua repercussão, buscarei mostrar como e por que eles se caracterizaram como livros de oposição à ditadura então vigente no Brasil e o papel político que estas obras desempenharam no período estudado. Discutirei também a categoria “livros de oposição”, entendendo-a como relacionada a obras literárias que representavam uma manifestação política pública de oposição em um período de forte restrição às liberdades democráticas. Eram, portanto, formas de intervenção possíveis em um quadro ditatorial, que traziam em si as limitações inerentes ao veículo livro, limitações estas relacionadas ao público leitor, à distribuição e ao alcance efetivo dessas obras, e a seu impacto real na conjuntura política do país.

Palavras-chave:
livros de oposição; editoras de oposição; ditadura no Brasil

ABSTRACT

This article analyzes the edition by Editora Alfa-Omega of São Paulo of two opposition books: The Island (a Brazilian reporter in the country of Fidel Castro), by Fernando Morais (1976), and The Exiles: 5,000 Brazilians Awaiting Amnesty, by Cristina Pinheiro Machado (1979). From the analysis of the history of the publishing house and the process of production and edition of this two books and its repercussion, I will try to show how and why they were characterized as books of opposition to the dictatorship in force in Brazil at that time and the political role of these works during that period studied. I shall also discuss the category of “opposition books”, which I understand to be related to literary works which represented a public political manifestation of opposition in a period of strong restriction of democratic freedoms. They were therefore possible forms of intervention within a dictatorial framework, which brought in themthe limitations inherent in the vehicle book, limitations related to the readership, the distribution and effective reach of these works, and their real impact on the country’s political situation.

Keywords:
opposition books; opposition publishers; dictatorship in Brazil

A Editora Alfa-Omega foi uma das editoras políticas mais atuantes nos anos 1970 e 1980 no Brasil, caracterizando-se como editora de oposição. As editoras de oposição foram por mim definidas, em relação ao Brasil, em minha dissertação de mestrado (SILVA, 2006; MAUÉS, 2013). Elas ganham relevo, em nosso país, a partir de meados dos anos 19701 1 Mas é importante assinalar que na década de 1960 já havia algumas editoras isoladas que tinham um perfil oposicionista, como Civilização Brasileira, Brasiliense, Saga, Felman-Rego, José Álvaro Editor e Laemmert. , quando ocorre uma revitalização de editoras com perfil marcadamente político e de oposição ao governo militar iniciado em 1964.

Considero que as editoras de oposição são aquelas que “tinham perfil nitidamente político e ideológico de oposição ao governo militar, com reflexos diretos em sua linha editorial e nos títulos publicados” (MAUÉS, 2013, p. 27). Isso significa que:

[...] a marca distintiva de uma editora de oposição é o fato de ela ter perfil de oposição ao governo militar e ter publicado certo número de livros de oposição. Um número suficiente, na produção daquela editora, para que fique claro que tais livros representavam parcela importante da produção da empresa. Disso resulta que os referenciais básicos para saber se uma editora pode ser chamada de editora de oposição são o perfil político e ideológico da editora, determinado pelas simpatias e filiações políticas de seus proprietários e/ou editores, e o seu catálogo de livros publicados. (MAUÉS, 2013, p. 27)

Os livros de oposição publicados por essas editoras podem ser classificados como clássicos do pensamento socialista, obras de parlamentares de oposição, depoimentos de exilados e ex-presos políticos, livros-reportagem, memórias, romances políticos, romances-reportagem, livros de denúncias contra o governo.

Considero que algumas das características dos livros de oposição englobam questões relativas a: 1) o papel político que a obra desempenhou no período estudado; 2) o conteúdo do livro; 3) as condições em que a obra foi criada; 4) o percurso do original ao livro publicado; 5) o perfil do autor e da editora; 6) as ligações políticas do autor e da editora; 7) a difusão da obra; 8) a repercussão nos meios políticos e na imprensa; 9) a análise da obra como produto editorial e comercial2 2 No artigo “‘Ter simplesmente este livro nas mãos é já um desafio’: Livros de oposição no regime militar, um estudo de caso”, de minha autoria, apresento o estudo de um livro de oposição (Poemas do povo da noite, de Pedro Tierra) feito com base neste modelo de análise. Ver MAUES, 2005. Também em meu artigo “A tortura denunciada sem meias palavras: um livro expõe o aparelho repressivo da ditadura” utilizo este modelo de análise para estudar o livro Tortura: A história da repressão política no Brasil, do jornalista Antonio Calos Fon. Ver MAUES, 2009. .

A Editora Alfa-Omega se enquadra claramente na definição de editora de oposição, e editou muitos livros de oposição, como veremos. Ela surgiu no início de 1973, em São Paulo, fundada por Fernando Mangarielo em sociedade com sua esposa, Claudete Mangarielo. Tinha afinidade com o pensamento marxista, e politicamente se aproximava de algumas posturas do Partido Comunista Brasileiro (PCB), mas não era uma editora partidária. Tampouco era sectária, tendo editado também alguns títulos de inegável vinculação ao Partido Comunista do Brasil (PC do B) - o que mostra que a editora se colocava acima de certas disputas políticas que marcavam a esquerda brasileira naquele período.

Tinha entre seus colaboradores alguns professores da Universidade de São Paulo (USP), como Reynaldo Xavier Carneiro Pessoa e José Sebastião Witter3 3 Entrevistas com Fernando Mangarielo realizadas nos dias 15 de maio e 19 de junho de 2013 por Sandra Reimão, Flamarion Maués e João Elias Nery.. Todas as demais citações de falas de Mangarielo são destas entrevistas, a não ser que sejam identificadas de forma diferente. . Seu catálogo de obras de oposição é muito grande. Publicou um dos maiores best-sellers entre os livros de oposição, A Ilha (um repórter brasileiro no país de Fidel Castro), de Fernando Morais, lançado em 1976, que foi o primeiro livro de oposição a alcançar grande sucesso de vendas (ver item adiante). Lançou também, em 1977, um dos primeiros romances a falar da guerrilha urbana no Brasil, Em câmara lenta, de Renato Tapajós, que causou a prisão do autor4 4 Mais informações sobre o surgimento e o projeto da editora Alfa-Omega podem ser vistos em RIDENTI, 2000; MAUÉS, E. A., 2007; SILVA, 2008; REIMÃO, 2009; ARAGÃO, 2013. .

A editora surgiu nos anos do chamado “milagre econômico brasileiro”, época também caracteriza por forte repressão política - um período de ditadura férrea. A propaganda oficial reverberava o clima do Brasil “grande potência”, do “ame-o ou deixe-o”.

Uma das características da editora, principalmente em seus primeiros anos de atividade, foi a edição (ou reedição) de obras fundamentais sobre a história brasileira, de autores altamente conceituados. Algumas dessas obras estavam esgotadas havia anos. Foi o caso de História e teoria dos partidos políticos no Brasil, de Afonso Arinos de Melo Franco (sobrinho) (1974); A verdade sobre a Revolução de Outubro de 1930, de Barbosa Lima Sobrinho (1975); Universidade brasileira: Reforma ou revolução?, de Florestan Fernandes (1975); Sociologia e sociedade no Brasil, de Otavio Ianni (1975); Escravidão africana no Brasil, de Mauricio Goulart (1975); História sincera da República (seis volumes), de Leôncio Basbaum (1976, 1977); O sentido do tenentismo, de Virgínio Santa Rosa (1976); Monções, de Sergio Buarque de Holanda (1976); Mandonismo local na vida política brasileira e outros ensaios, de Maria Izaura Pereira de Queiroz (1976); Três industrialistas brasileiros: Mauá, Rui Barbosa, Roberto Simonsen, de Heitor Ferreira Lima (1976); Contribuição à históriadas lutas operárias no Brasil, de Hermínio Linhares (1977); Messianismo no Brasil e no mundo, de Maria Izaura Pereira de Queiroz (1977); e História das lutas sociais no Brasil, de Everardo Dias (1977).

Uma lembrança de Fernando Mangarielo sobre a edição do livro de Florestan Fernandes, Universidade Brasileira: Reforma ou Revolução (1975), mostra um pouco o espírito com que ele publicava esses livros. O editor recorda: “[...] eu tenho uma bela imagem do Florestan Fernandes. Fiz um livro dele, uma necessidade dele, ele me pediu porque ninguém tinha coragem de publicar o livro dele, Universidade Brasileira. E está lá no prefácio o que ele fala sobre nós”. Mangarielo se refere ao que Florestan Fernandes escreveu no “Prefácio à segunda edição” dessa obra, realizada também pela Alfa-Omega, em 1979 . Eis o texto de Florestan Fernandes: “O livro deveria ser publicado por uma editora famosa em 1969. Obviamente, a publicação foi impraticável [em virtude da ditadura] e ele só saiu em 1975, ainda assim em um ato de ousadia da Editora Alfa-Omega”.

Num segundo momento, a Alfa-Omega passou também a editar literatura nacional, livros-reportagem e clássicos do socialismo, como as obras escolhidas de Marx e Engels, Lenin e Mao Tsetung.

Desde a sua fundação, seu lema oficial foi “Autor nacional - Cultura brasileira”, geralmente estampado na contracapa de seus livros. Nas palavras do editor Fernando Mangarielo, seu objetivo central sempre foi publicar “o pensamento crítico brasileiro”.

A análise de seu catálogo mostra que os principais temas abordados são história, sociologia, política, filosofia, economia, clássicos do marxismo, pluralismo jurídico.

Mangarielo destacava, quando da fundação da editora, três pontos sobre a linha editorial. Primeiro, a ênfase no autor nacional. Depois, afirmava que a editora pretendia ser “uma janela aberta para os escritores preocupados com a nossa realidade, com o Brasil de agora, com nosso processo econômico-político”. E, por último, enfatizava que a editora “se voltará para as necessidades do ensino superior em nosso país” (Diário da Noite, São Paulo, 14 mar 1973).

O nome Alfa-Omega, segundo depoimento de Mangarielo, foi escolhido por representar “a primeira e a última letra do alfabeto grego, que significa a luta dos contrários: pensamento e ação, alto e baixo, magro e gordo, pobre e rico; no caso nosso, é [...] pensamento e ação”.

De acordo com Claudete Mangarielo, esposa e sócia de Fernando Mangarielo desde a fundação da editora, seu marido tem uma relação muito especial com os livros que edita: “Até hoje, o livro para o Fernando não é um produto, é um filho. Ele nasce da alma dele” (Entrevista com Claudete Mangarielo, 2013Entrevista com Claudete Mangarielo realizada no dia 15 de maio de 2013 por Flamarion Maués, Sandra Reimão e João Elias Nery.). De fato, devemos levar isso em conta ao analisar a história da Alfa-Omega5 5 Para mais informações sobre a trajetória de vida de Fernando Mangarielo e suas experiências no campo editorial e livreiro antes da Alfa-Omega, ver REIMAO; MAUES; NERY, 2015; 2016. .

Marx, Engels, Lenin e Mao Tsetung

Em 1975, inicia-se uma nova etapa da vida da editora, com a publicação do primeiro volume das obras escolhidas de Marx e Engels (serão três volumes no total). Em virtude do clima político repressivo, o editor tomou certas precauções nesta edição. Por exemplo, a obra foi lançada com o título de Textos (e não Obras Escolhidas). Além disso, utiliza o selo Edições Sociais6 6 Interessante assinalar que uma das mais importantes editoras ligadas ao Partido Comunista Francês foi fundada em 1927, e se chamava Éditions Sociales. Também em Portugal surgiu, em 1974, após a Revolução dos Cravos, uma Edições Sociais, criada pelo editor Rui Moura, militante do Partido Comunista Português. , e não Alfa-Omega. Mangarielo explica essa opção:

A publicação de Marx nas Edições Sociais, com o nome Textos, foi uma coisa motivada pelo terror, pelo medo. [...] eu montei de forma inversa [a ordem dos textos nos volumes], o “Manifesto do Partido Comunista” aparece no volume I da edição oficial e nos Textos aparece no volume III, no último. Os textos mais conhecidos eu botei no volume III, fora da data, fora da cronologia original, era uma maneira de enganar a censura.

A segunda edição da obra já foi feita com o título Obras Escolhidas e com o selo Alfa-Omega. Mangarielo recorda como foi o processo dessas edições:

As edições das Obras Escolhidas de Marx e Engels, e do Lenin, foram feitas a partir das edições para o português feitas em Moscou. É importante entender isso, a Revolução dos Cravos em Portugal veio antes, foi em 1974. Então, eu tinha como parâmetro a edição da Avante!, a editora do PCP [Partido Comunista Português]. Mas a edição da Avante! foi traduzida pelo Instituto de Marxismo Leninismo da União Soviética, foi feita lá, e tudo mais. Eu tinha uma amiga brasileira, que foi minha colega na USP, a Clarice Lima, que foi para lá, passou 39 anos na URSS. Morou 39 anos lá, e ela trabalhava... era subordinada à redação portuguesa, por falar português. Depois ela é que assumiu essa posição com o Brasil. Muito interessante isso. É uma coisa que não aparece, mas eu percebia isso. Então, a nossa edição é essa soviético-portuguesa, que foi fac-similada da edição soviética em português, que depois gerou a portuguesa, da Avante!, e assim por diante.

Depois de Marx e Engels, a Alfa-Omega editou as Obras escolhidas de Lenin, também em três volumes, e as Obras escolhidas de Mao Tsetung, em quatro volumes. No total, mais de 3 mil páginas de clássicos do marxismo.

Censura e repressão

Dois livros publicados pela Editora Alfa-Omega foram censurados durante a ditadura: 4 cantos de pavor e alguns poemas desesperados, de Álvaro Alves de Faria, publicado em 1973, e Em câmara lenta, de Renato Tapajós, publicado em 1977.

O caso do romance Em câmara lenta, lançado em maio de 1977, foi certamente o mais assustador. O livro tinha como diferencial o fato de ser uma das primeiras obras de ficção a falar da guerrilha urbana no Brasil. Seu autor, Renato Tapajós, havia sido militante da organização Ala Vermelha, que pregava a luta armada para a derrubada da ditadura, e estivera preso por este motivo de 1969 a 1974. O romance foi escrito quando Tapajós ainda se encontrava preso em São Paulo. Assim, o livro não só trata da experiência da luta armada, como foi escrito por uma pessoa que participou dessa luta7 7 Existem alguns trabalhos que analisam o caso da censura ao livro Em Câmara Lenta: RIDENTI, 2000; ARAGÃO, 2013; REIMÃO, 2011; MAUÉS, 2007; SILVA, 2008. .

Além de apresentar uma visão de quem viveu diretamente essa realidade, o livro faz também uma lúcida autocrítica dessa opção. Trata-se, além disso, de uma contundente denúncia da prática de torturas contra opositores políticos durante a ditadura.

Apesar de o autor apresentar uma visão muito crítica da opção pela luta armada feita por setores da esquerda brasileira, o regime viu o livro como uma incitação à luta armada - uma leitura distorcida da obra. Por esse motivo, o autor foi preso em julho de 1977, pouco mais de dois meses após o lançamento do livro. O curioso é que a obra somente foi proibida em 13 de agosto (ARAGÃO, 2013ARAGÃO, Eloisa. Censura na lei e na marra: como a ditadura quis calar as narrativas sobre suas violências. São Paulo: Humanitas, 2013., p. 68). Trata-se de um dos poucos casos de autor preso durante a ditadura militar por causa do conteúdo de um livro. O autor foi também processado pela edição do livro, e o editor, Fernando Mangarielo, juntamente com sua esposa, Claudete, foram chamados para depor no processo, num claro ato de intimidação. Tapajós ficou preso cerca de um mês em São Paulo. Mangarielo também chegou a ficar detido em função da edição do livro.

Mangarielo recorda:

[...] o caso com o Renato Tapajós foi o mais forte de repressão da editora, foi o mais truculento de todos que eu conheci, com meus colegas também. Prenderam o autor. [...] O caso teve muita repercussão. E, ao fim, tornou a editora mais conhecida. Sobretudo pelos aficionados do pensamento crítico. Mas para mim me deu uma experiência muito dolorida no bolso, porque foi o livro meu mais xerocado e não vendido. A primeira edição foi de 3 mil, e a segunda foi de 2 mil e ainda tenho exemplares, para lhe dar uma ideia, mas eu posso dizer que ele reverberou mais do que vendeu.

Literatura nacional

Nos anos 1970, a Alfa-Omega também teve como característica a edição de jovens autores da literatura nacional. É curioso que, apesar de este ser um dos propósitos da editora, não existiu uma coleção específica dedicada à literatura brasileira. Os livros desses autores surgiram em três coleções: Biblioteca Alfa-Omega de Cultura Universal - Atualidade, Biblioteca Alfa-Omega de Literatura Latino-Americana - Nova Ficção Brasileira, e Biblioteca Alfa-Omega de Literatura Latino-Americana - Antologias.

Alguns dos autores publicados pela editora foram Márcia Denser (Tango fantasma, 1976); Furio Lonza (Contos de esquina, 1977); Luiz Fernando Emediato (Não passarás o Jordão: contos, 1977); Caio Fernando Abreu (Pedras de Calcutá, 1977); Roniwalter Jatobá de Almeida (Ciriaco Martins e outras histórias, 1977); Rodolfo Konder (Cadeia para os mortos: Histórias de ficção política, 1977; Tempo de ameaça: autobiografia política de um exilado, 1978); Renato Pompeu (Quatro-olhos: romance, 1976; A saída do primeiro tempo: romance, 1978; A greve da rosa, 1980).

Uma coleção importante foi a de antologias, em que foram editadas coletâneas que reuniam jovens contistas de alguns estados do país: Assim escrevem os gaúchos, Janer Cristaldo (org.), 1976; Assim escrevem os catarinenses, Emanuel Medeiros Vieira (org.), 1976; Assim escrevem os paranaenses, Domingos Pellegrini Jr. (org.), 1978; e Assim escrevem os paulistas, Hamilton Trevisan (org.), 1977. Sobre essa coleção, Mangarielo recorda: “Durante certo tempo fazíamos literatura, mas aí eu recolhi porque eu não tinha o feeling para a coisa. Tivemos a coleção ‘Assim escrevem...’. Isso foi uma tentativa de dar acolhida... pra editar os olhos da repressão sobre nós com a literatura. Mas não tivemos a habilidade”.

A editora também iniciou uma coleção de autores latino-americanos que teve três títulos, entre eles O Túnel, de Ernesto Sábato (1976), e Crônicas de Bustos Domecq, de Jorge Luis Borges e Adolfo Bioy Casares (1976).

Em 1976, Mangarielo iniciou também uma nova frente de atuação editorial, cujo foco era a literatura nacional. Ao lado do editor Moysés Baumstein, dono da Símbolo S/A Indústrias Gráficas, criou as Edições Símbolo, cujo projeto editorial era voltado para o autor nacional e para a literatura brasileira (“Por atacado”, 1976“Por atacado”. Veja, São Paulo, 28/4/1976, p. 128., p. 128). A parceria, entretanto, não teve continuidade, tendo durado cerca de um ano.

A experiência com bancas de jornal

Em outubro de 1977, a Alfa-Omega iniciou a venda de seus livros em bancas de jornal, criando, em 1977, a coleção Alfa-Omega de Bolso, cujo primeiro título foi A prisão: histórias dos homens que vivem no maior presídio do mundo, do jornalista Percival de Souza. A tiragem teria sido de 20 mil exemplares, dos quais 12 mil teriam sido vendidos em 45 dias (“Livros e Autores”, 1977“Livros e Autores”. Jornal do Brasil, 10 dez 1977.). Apesar do aparente sucesso da coleção, ela teve apenas mais um lançamento, o livro A sangue-quente: a morte do jornalista Vladimir Herzog, do jornalista Hamilton Almeida Filho, em 1978.

O livro A Ilha também entrou nessa experiência, pois a partir da sua 14ª edição a obra passou a ser editada em formato de bolso, para permitir a venda em bancas.

Ainda nesta linha, em 1978 foi lançada a coleção História Imediata, também criada especialmente para as bancas de jornal. Esta coleção era editada em formato de revista (21 x 28 cm), em papel jornal, e trazia grandes reportagens sobre temas políticos quentes e polêmicos, e sempre de questionamento do regime militar. Os títulos dessa coleção foram cinco:

  1. A guerrilha do Araguaia, de Palmério Dória, Sérgio Buarque, Vicent Carelli e Jaime Sautchuck. 1978.

  2. A greve na voz dos trabalhadores: da Scania a Itu. Uma reportagem Oboré. 1979.

  3. Araceli: corrupção em sociedade: tóxico, tráfico de influência, violência, de Carlos Alberto Luppi. 1979.

  4. D. Paulo Evaristo Arns: o cardeal do povo, de Getúlio Bittencourt e Paulo Sergio Markun. 1979.

  5. A volta da UNE: de Ibiúna a Salvador, de Luiz Henrique Romagnoli e Tania Gonçalves. 1979.

Mangarielo relata os problemas que levaram ao fim dessa coleção:

No caso da História Imediata tivemos outra vez uma espécie de censura, de cima para baixo, com total truculência, neste caso feita pela empresa que fazia a distribuição para as bancas. O volume A História da UNE, eu entreguei para a [distribuidora] Abril 25 mil exemplares, ela não pôs nas bancas mais do que 12 mil, e vendeu 8 mil, e eu entubei todo o resto. Aí não fiz mais, porque não tinha outra distribuidora, era só a Abril na época. Eu estava nas mãos deles. Não se bota raposa para tomar conta de galinheiro.

Desse modo, a tentativa de transformar as bancas de jornal em um canal eficaz de distribuição e comercialmente compensador durou pouco tempo, apenas cerca de três anos.

Revista Socialismo & Democracia

Em 1984, a Alfa-Omega começou a editar a revista Socialismo & Democracia, voltada para debates políticos e ideológicos. Editada em formato de livro, tinha periodicidade bimestral (ou quase) e no total lançou 13 edições entre 1984 e 1988. Fernando Mangarielo fala da revista:

O [Jacob] Bazarian participou também como parceiro da feitura da revista Socialismo & Democracia, que a Alfa-Omega lançou. Foram 13 números, quatro anos de trabalho fazendo esses 13 números e a direção era dele8 8 A revista foi editada entre 1984 e 1988. Os três primeiros números tiveram como editores Jacob Bazarian e Daniel Fresnot. A partir do quarto número, Bazarian passou a ser o único editor. . Eu fornecia a água da inundação, convocava as pessoas, e nas discussões nós acertávamos a pauta, os temas, os autores. Por exemplo, no segundo ano uma coisa que deu à revista uma característica muito singular era que nós propúnhamos três temas, fazíamos uma pergunta dirigida a quatro pessoas de quatro facções. Respondiam à mesma pergunta. Os leitores sentiam-se extasiados porque viam diferentes dimensões apresentadas ali, análises que contrastavam e que tinham um sentido. Então nós mostramos o que é a importância da luta político-ideológica. O Bazarian gostou tanto do resultado que disse: “A revista Socialismo & Democracia, depois da minha morte, é a única pela qual não serei esquecido”9 9 Jacob Bazarian relembrou da seguinte forma a criação de Socialismo & Democracia: “A revista nasceu de uma proposta de meu grande amigo Fernando Mangarielo de publicar um periódico sobre o pensamento socialista. Como eu ajudava a Editora Alfa-Omega como orientador da coleção de filosofia e sociologia marxista, Fernando achou que eu poderia dirigir também essa revista. Eu disse ao Fernando, que nas condições atuais do Brasil e do mundo o mais acertado e útil seria fazer uma revista independente (de partidos e subsídios de quem quer que fosse), pluralista, polêmica e de debates, que pudesse refletir as opiniões dos diferentes partidos e movimentos que lutam por uma democracia socialista, que ainda não existe em país nenhum”. Cf. “Entrevista com Jacob Bazarian: Três anos em defesa do socialismo e da democracia”. Socialismo & Democracia, São Paulo, Alfa-Omega, nº 12, out/dez. 1986, p. 6-7. .

A partir dessa visão ampla do projeto e da ação editorial da Alfa-Omega em seus primeiros anos, analisarei agora aquele que seria o primeiro grande sucesso comercial da editora, o livro A Ilha: um repórter brasileiro no país de Fidel Castro, de autoria do jornalista Fernando Morais, lançado em 1976. O sucesso desse livro permitiu o crescimento e a consolidação da editora, a fez mudar de patamar no nível comercial e também no que diz respeito ao alcance do trabalho da Alfa-Omega junto a um público mais amplo.

História editorial do livro A Ilha

Dados do livro

Coleção Biblioteca Alfa-Omega de Cultura Universal, Série Atualidade, vol. 3.

1ª edição: agosto de 1976, 3 mil exemplares (2ª ed., setembro de 1976, 3 mil exemplares; 3ª ed., outubro de 1976, 3 mil exemplares; 4ª ed., novembro de 1976, 3 mil exemplares; 5ª ed., dezembro de 1976, 3 mil exemplares; 6ª ed., janeiro de 1977, 3 mil exemplares10 10 Não obtive dados sobre as tiragens das demais edições. ).

Contém um “PrefácioCALLADO, Antonio. “Prefácio”. In: MORAIS, Fernando. A iha: um repórter brasileiro no país de Fidel Castro. São Paulo: Alfa-Omega, 1976.” do jornalista Antonio Callado. A partir da quarta edição, passou a trazer mais um prefácio, intitulado “Uma explicação”, de autoria do jornalista Carmo Chagas, na época redator-chefe da revista Veja. Contém um apêndice intitulado “Entrevista com Carlos Rafael Rodriguez”, vice-primeiro-ministro de Cuba na época.

Brochura, formato 14 X 21 cm, 126 páginas.

Figura 1 -
Capa do livro A Ilha.

Figura 2:
Contracapa do livro A Ilha

A partir da 14ª edição (1978), o livro passou a ser publicado em formato de bolso (11 cm X 18 cm), e foi acrescido de um caderno de fotos e de um capítulo inédito, além de um novo prefácio, de Fernando Peixoto, intitulado “Um pedaço de terra cercada de amigos e inimigos - Prefácio à décima quarta edição”. A capa também mudou, passando a ter como elemento central uma foto de Fidel Castro. A capa anterior tinha como destaque um charuto, produto que simboliza Cuba.

Em 2001, quando o livro teve a sua 30ª edição, passou a ser publicado pela Editora Companhia das Letras. Esta edição traz um “Prefácio à 30ª edição. Cuba revisitada, um quarto de século depois”, com 30 páginas, além de um caderno com fotos realizadas por Rita de Morais, filha do autor. Contém ainda os seguintes novos apêndices: “Entrevista com Fidel Castro”; “A guerra em Angola segundo Fidel Castro”; e “O médico da Sierra Maestra”. A capa foi modificada.

O autor

Fernando Morais é jornalista. Nasceu em Mariana (MG), em 1946. Em 1965, mudou-se para São Paulo, onde trabalhou em A Gazeta, Jornal da Tarde, Visão, Folha de S. Paulo, O Estado de São Paulo, TV Cultura, Bondinho, Opinião e Status.

Em 1970, havia publicado o livro Transamazônica, em parceria com Ricardo Gontijo e Roberto de Oliveira Campos (Brasiliense), decorrente de uma reportagem feita para o Jornal da Tarde, que havia recebido o Prêmio Esso daquele ano.

Quando o livro A Ilha foi editado, trabalhava na revista semanal Veja.

Em 1978, candidatou-se a deputado estadual em São Paulo pelo MDB e foi eleito, exercendo mandato entre 1979 e 1986. Destacou-se como um dos parlamentares “autênticos” do MDB - ou seja, com posições mais à esquerda e mais firmes no combate à ditadura - e também na oposição ao governo de Paulo Maluf em São Paulo.

Reelegeu-se em 1982. Em 1986, candidatou-se a deputado federal constituinte, mas não foi eleito. Foi secretário estadual da Cultura no governo de Orestes Quércia (1987-90), e da Educação no governo de Luiz Antônio Fleury (1991-1994), ambos do PMDB.

Em 1985, lançou pela Editora Alfa-Omega outro livro que teria grande sucesso e que marcaria o início de sua trajetória como biógrafo: Olga: a vida de Olga Benário Prestes, judia comunista entregue a Hitler pelo governo Vargas. É autor ainda de Chatô, o Rei do Brasil(1994), biografia de Assis Chateaubriand, Corações Sujos(2000), Na Toca dos Leões(2005), e O Mago(2008), biografia do escritor Paulo Coelho, entre outros livros. Em 2011, Morais voltou a ter Cuba como tema no livro Os últimos soldados da Guerra Fria (Companhia das Letras), em que narra a trajetória da Rede Vespa, um grupo de doze homens e duas mulheres criado no início da década de 1990 pelo governo cubano para se infiltrar nos Estados Unidos e espionar grupos anticastristas sediados na Flórida.

O livro

A Ilha surgiu do desejo de Fernando Morais conhecer melhor os resultados da Revolução Cubana, que desde 1959 vinha transformando o pequeno país da América Central no primeiro território socialista do continente. Possivelmente, foi também um projeto estimulado pelo êxito de seu primeiro livro, Transamazônica, do qual era um dos autores.

A ideia da reportagem sobre Cuba surgira três anos antes do livro:

Em 1973, quando trabalhava no Jornal da Tarde de São Paulo, interessou-se em fazer uma reportagem sobre Cuba e o regime de Fidel Castro. Durante um ano e meio, sucursais e correspondentes do jornal no exterior encaminharam vários quilos de documentos a muitas embaixadas cubanas em todo o mundo, cumprindo as exigências para que fosse autorizado o desembarque do repórter em Havana. Em fins de janeiro de 1975, quando Morais já se desligara da empresa, foi surpreendido com o visto de entrada em Cuba. Permaneceu lá dois meses, agora a serviço da revista Visão. Voltou com o material mas não conseguiu publicá-lo porque saiu da empresa. Resolveu, então, transformá-lo em livro (ESCOSTEGUY, 1976ESCOSTEGUY, Jorge. “Sem fundo falso”. Veja, São Paulo, 18 ago 1976.).

Desde o golpe de 1964, o Brasil rompera relações diplomáticas com Cuba, seguindo a política de isolamento internacional do país determinada pelos Estados Unidos, em decorrência da Guerra Fria existente entre os países capitalistas e socialistas, desde os anos 1950. Assim, Cuba e seu regime haviam se tornado, no regime militar, tema proibido e censurado, sobre o qual pouco se podia falar, ou melhor, só se podia falar se fosse negativamente. Era um assunto tabu, em relação ao qual “a ditadura proibia qualquer menção. Sumiram livros, discos, pôsteres, camisetas com a efígie de Guevara” (GALVÃO, 2005GALVÃO, Walnice Nogueira. “A voga do biografismo nativo”. Estudos Avançados, São Paulo, v. 19, n. 55, 2005., p. 352).

Tal proscrição foi um dos fatores que colaboraram para o êxito de A Ilha: “Se a gente lê o seu relato [de Fernando Morais] com tão apaixonado interesse é porque quase tudo que se diz de Cuba ressente-se de tom polêmico, no contra como no a favor” (CALLADO, 1976CALLADO, Antonio. “Prefácio”. In: MORAIS, Fernando. A iha: um repórter brasileiro no país de Fidel Castro. São Paulo: Alfa-Omega, 1976., p. XVIII).

O livro não é uma história da Revolução Cubana, vitoriosa em 1959, mas um relato das mudanças em Cuba depois da revolução e sobre como vivia a população 17 anos após a vitória de Fidel Castro e seus guerrilheiros. Preocupava-se em mostrar a vida cotidiana, como as mudanças políticas decorrentes do regime socialista instalado na ilha afetavam a vida dos cubanos comuns no seu dia a dia. De acordo com a resenha da revista Veja, o livro tinha “uma iniludível vantagem sobre outros livros publicados no Brasil a respeito de países comunistas: não contém adjetivos nem distribui conceitos políticos-filosóficos a favor ou contra o que seu autor viu em Cuba” (ESCOSTEGUY, 1976ESCOSTEGUY, Jorge. “Sem fundo falso”. Veja, São Paulo, 18 ago 1976.).

Assim, os capítulos do livro buscavam mostrar como funcionava o racionamento de alimentos, e de alguns outros produtos, ao qual estava submetida toda a população, como eram as condições de moradia - destacando a ausência de favelas, um problema que ganhava cada vez mais destaque no Brasil -, como se delineavam as áreas da educação, da saúde pública, como se configurou a participação da mulher na sociedade, como funcionava a imprensa, a justiça, como eram as eleições, como foi feita a reforma agrária e quais suas consequências (outro tema caro à esquerda brasileira), além de apresentar questões sobre a cultura revolucionária criada em Cuba a partir de 1959. Não deixava também de abordar assuntos polêmicos, como drogas, homossexualismo e prostituição.

O balanço de Fernando Morais era muito positivo, resultando em uma visão favorável ao processo em desenvolvimento naquele país. Apesar de mostrar algumas deficiências e limitações do sistema cubano, a visão geral era de um povo que lutava por sua independência e conseguia superar a miséria em que vivia antes da revolução, com ótimos resultados principalmente nas áreas de saúde e educação. Ficavam no ar algumas questões sobre liberdade política e de opinião que, todavia, no balanço geral do autor não pareciam comprometer o saldo positivo da experiência.

O fato de tratar de modo tão positivo a experiência socialista de Cuba, e ao mesmo tempo quebrar o silêncio que a ditadura queria impor sobre o tema no país fazia de A Ilha um livro de oposição, ou seja, uma obra que representava, por seu conteúdo e por seu posicionamento no quadro político nacional no momento de sua edição, uma contraposição ao governo instituído, na forma de denúncia ou de confronto ideológico. Ao apontar os aspectos positivos do socialismo em Cuba, o livro se chocava com a posição do governo militar de desqualificar tudo que se relacionasse ao socialismo e ao pensamento socialista.

Repercussão

Tão logo foi lançado, o livro alcançou um grande êxito. “Milhares de brasileiros desejavam informações fidedignas sobre Cuba, e isto foi o que A Ilha trouxe, junto com uma visão positiva a respeito dos resultados da implantação de um regime socialista, trazido pela Revolução Cubana” (GALVÃO, 2005GALVÃO, Walnice Nogueira. “A voga do biografismo nativo”. Estudos Avançados, São Paulo, v. 19, n. 55, 2005., p. 354). A Ilha foi o primeiro livro de oposição a alcançar grande sucesso de vendas, o primeiro e provavelmente o maior best-sellers entre os livros de oposição - talvez apenas O que é isso, companheiro?, de Fernando Gabeira (CODECRI, 1979), possa superá-lo.

A primeira resenha da obra parece ter sido a da revista Veja, em meados de agosto de 1976 (ESCOSTEGUY, 1976ESCOSTEGUY, Jorge. “Sem fundo falso”. Veja, São Paulo, 18 ago 1976.). Já na primeira semana de outubro, o livro aparecia na lista de mais vendidos de não ficção da revista. Em outubro, tornava-se um dos dois mais vendidos na tradicional Feira do Livro de Porto Alegre, ao lado do livro Solo de Clarineta, de Érico Verissimo (Jornal do Brasil, 2/11/1976).

A sexta edição do livro, em janeiro de 1977, informava que haviam sido lançadas, desde agosto, seis edições sucessivas de 3 mil exemplares, totalizando até aquele momento, apenas cinco meses após o lançamento do livro, 18 mil exemplares.

O livro permaneceu na lista dos livros mais vendidos de não ficção de Veja por 62 semanas, entre 1 de setembro de 1976 e 11 de janeiro de 1978, ou seja, por mais de um ano, e diversas vezes ocupou o primeiro lugar.

Todavia, até hoje parece não haver um consenso sobre o número total de exemplares vendidos do livro. Lawrence Hallewell fala em 146 mil exemplares vendidos até 1980, em 16 edições (HALLEWELL, 2005HALLEWELL, Laurence. O livro no Brasil (Sua história). São Paulo: Edusp, 2005., p. 590). Fernando Mangarielo, editor e proprietário da Editora Alfa-Omega, em entrevista em 2015 (Entrevistas de Fernando Mangarielo, 2013Entrevistas de Fernando Mangarielo a Flamarion Maués, Sandra Reimão e João Elias Nery, concedidas em 15 de maio e 19 de junho de 2013; REIMÃO; MAUES; NERY, 2015), dizia que A Ilha teria vendido 125 mil exemplares. No entanto, a contracapa das primeiras edições do livro Olga, de Fernando Morais, lançado em 1985 pela Alfa-Omega, mencionava que A Ilha vendera “mais de 250 mil exemplares”. Matéria da Folha de S. Paulo de 1996 falava em 265 mil exemplares (ANTENORE, 1996ANTENORE, Armando. “Fernando Morais expulsa os soviéticos de ‘A Ilha’”. Folha de S.Paulo, São Paulo, 22 nov 1996.).

O que parece certo é que A Ilha foi um grande best-seller, tendo vendido dezenas de milhares de exemplares desde o seu lançamento.

O livro já foi traduzido para 23 idiomas e teria vendido, em todo o mundo, cerca de 3 milhões de exemplares (CAMINHA, 2006CAMINHA, Edmilson. Cuba e Brasil: modos de ver, maneiras de sentir. Brasília: Thesaurus, 2006., p. 27).

A Ilha foi importante também para que a Editora Alfa-Omega pudesse ampliar suas atividades e se consolidar como uma editora de oposição e de esquerda, na segunda metade dos anos 1970 e no começo dos anos 1980. De acordo com Fernando Mangarielo, “O primeiro livro [da editora] que teve um grande sucesso de vendas foi A Ilha, do Fernando Morais, sobre Cuba [...] O sucesso de A Ilha me deu mais capacidade financeira, inclusive eu aumentei o número de funcionários. Chegamos a ter 24 funcionários. [...] Subsidiada por isso”.

A editora lançou, nesse período, outras obras de Fernando Morais. Em 1980, publicou Socos na porta, livro com discursos do autor como deputado estadual, e Não às usinas nucleares: ação popular movida contra o presidente da República pelo deputado Fernando Morais; em 1982, Primeira página, com entrevistas realizadas por Fernando Morais. Além desses, em 1981 fora editado o livro Freguesia do Ó: o inquérito que desmascarou as brigadas de Paulo Maluf, que trazia o relatório da Comissão de Inquérito presidida por Morais na Assembleia Legislativa paulista sobre violências patrocinadas pelo então governador nomeado do estado.

Isso mostra que houve um esforço do editor Mangarielo para, por um lado, produzir obras do autor e mantê-lo vinculado à Alfa-Omega, e, por outro, para capitalizar o máximo possível o sucesso de A Ilha.

Tal esforço teve êxito, pois a edição de Olga: a vida de Olga Benário Prestes, judia comunista entregue a Hitler pelo governo Vargas, em outubro de 1985, representou o segundo grande sucesso de vendas da editora - ainda maior que o de A Ilha. 11 11 No final dos anos 1980, divergências comerciais levaram Fernando Morais a não renovar o contrato de edição de Olga com a Alfa-Omega. O rompimento entre Mangarielo e Morais deveu-se a questões contratuais referentes a direitos autorais da obra e à sua negociação com outros países e para a adaptação cinematográfica. Para Mangarielo, o contrato deixava claro que tais negociações deveriam ser feitas pelo editor, e não pelo autor. “Então, ele não soube contemporizar, no sentido de buscar um entendimento antes de mais nada, ele tentou tomar pra si”, diz Mangarielo. Essa desavença fez com que A Ilha também deixasse de ser editada pela Alfa-Omega. O rompimento do editor com o seu autor de maior sucesso de vendas certamente marcou o início do declínio da editora, ao lado de outros fatores, tanto de ordem comercial, como editorial e política.

Como seria de esperar, A Ilha gerou também reações contrárias e críticas, principalmente em relação ao que alguns consideravam uma excessiva simpatia do autor com o regime cubano, que se refletiria em um grau de tolerância exagerado no que dizia respeito a possíveis ações antidemocráticas ou autoritárias no país. Um exemplo desse tipo de reação aparece em artigo do crítico literário Wilson Martins, que, ao analisar o livro de Morais e o de Ignácio de Loyola Brandão (Cuba de Fidel), assinala que “seria talvez demasiado ingênuo esperar” imparcialidade de ambos, mas que o surpreendeu, “tratando-se de jornalistas experimentados e inteligências argutas, [...] a falta de espírito crítico que não lhes permitiu reconhecer na práxis política de Cuba as manifestações rotineiras dos sistemas totalitários” (MARTINS, 1979MARTINS, Wilson. “Os bastidores da revolução (I)”. Jornal do Brasil, 17 mar 1979.).

O sucesso e a repercussão do livro A Ilha levaram também a uma onda de livros sobre Cuba. Virou quase uma moda literária. Tivemos assim, entre outros, Passaporte sem carimbo, de Antonio Callado (Avenir, 1978); Cuba hoje: 20 anos de revolução, de Jorge Escosteguy (Alfa-Omega, 1978); Cuba de Fidel: Viagem a Ilha Proibida, de Ignácio de Loyola Brandão (Cultura, 1978); Da guerrilha ao socialismo: a Revolução Cubana, de Florestan Fernandes (T. A. Queiroz, 1979); Trabalhadores na revolução de Cuba - ontem e hoje, de Márcio Moreira Alves (Vega, 1979); Cuba, anotações sobre uma revolução, de Eric Nepomuceno (Alfa-Omega, 1981).

O sucesso do livro teve também repercussões diretamente políticas. Fernando Morais candidatou-se, em 1978, a deputado estadual em São Paulo, pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro)12 12 Com a extinção dos partidos políticos decretada pelo Ato Institucional nº 2, em outubro de 1965, a ditadura passou a permitir apenas a existência de dois partidos, um de apoio ao governo (Arena) e um da oposição consentida (MDB). Fundado em 1966, o MDB acabou por se tornar de fato um aglutinador dos diversos setores oposicionistas. Em 1978, ocorreram as últimas eleições, em que puderam participar apenas a Arena e o MDB. . A projeção que o livro lhe havia dado, assim como sua vinculação ao campo socialista que a obra deixava clara, foram elementos fundamentais para a candidatura.

Como já destacado, ele se vinculou ao grupo chamado de “autêntico” do partido, em geral formado pelos setores mais à esquerda. Morais elegeu-se deputado estadual e foi reeleito em 1982. Assim, o livro colaborou para que pudesse durante alguns anos ter uma atuação política no campo parlamentar e, posteriormente, também no executivo, uma vez que ocupou os cargos de secretário estadual da Cultura e da Educação no estado de São Paulo em governos do PMDB nos anos 1980 e 1990.

Um livro contra o anticomunismo

O livro A Ilha teve papel importante no arejamento do debate público sobre o regime cubano no Brasil, ou seja, sobre o único país socialista do continente. Ao “apresentar uma leitura inovadora para a época de um tema, a revolução cubana, que estava no topo dos assuntos proibidos pelo regime” (REIMÃO; MAUES; NERY, 2015), o livro contribuía para oferecer uma visão positiva do socialismo cubano e, desse modo, se contrapunha à política de isolamento e combate permanente que o governo brasileiro adotava em relação àquele país. Como tal questão se colocava no campo do debate ideológico que opunha capitalismo versus comunismo/socialismo, estabelecido pelo contexto da Guerra Fria, o livro inseria nesse debate um testemunho positivo e atual sobre a realidade cubana, colaborando para equilibrar um pouco a discussão no Brasil.

Podemos considerar, dessa forma, que o livro cumpriu um papel político ao combater o forte anticomunismo que imperava nas políticas e nas doutrinas oficiais brasileiras daquele período, inserindo-se no debate ideológico da Guerra Fria no país. Com sua narrativa que destacava os pontos positivos do regime cubano e os avanços sociais obtidos desde a revolução de 1959 - uma revolução que instaurou um regime socialista -, A Ilha apontava para a perspectiva de que era possível pensar em uma nova sociedade, baseada em princípios muito diferentes daqueles seguidos pela ditadura brasileira. Era um livro que sustentava uma ideia subversiva, portanto.

Para Luiz Schwarcz, editor da Companhia das Letras, que desde 2001 publica A Ilha, o livro seria o emblema de uma geração. “Percorrendo os meandros do socialismo, iluminando um país quase mítico, o livro punha em revista os sonhos de toda uma época” (ANTENORE, 1996ANTENORE, Armando. “Fernando Morais expulsa os soviéticos de ‘A Ilha’”. Folha de S.Paulo, São Paulo, 22 nov 1996.).

É importante lembrar que “Naquele momento [em que o livro foi lançado] havia alguma perspectiva da derrota da ditadura e da construção de uma nova sociedade, fatores essenciais para que o livro se tornasse um best-seller, atraindo leitores ávidos por relatos de utopias alternativas à realidade ditatorial brasileira” (REIMÃO; MAUES; NERY, 2015). Visto a partir dos dias atuais, “o livro deixa de expressar aqueles aspectos que fizeram dele um sucesso de vendas e referência para o pensamento crítico dos anos 1970” (REIMÃO; MAUES; NERY, 2015). Assim, “[...] embora o livro A Ilha fale de uma Cuba que não existe mais, a obra guarda seu valor até hoje, três décadas após sua publicação, como um documento de registro sócio-histórico do país [...]” (LOPES; RODRIGUES, 2012LOPES, Camila A. de Oliveira; RODRIGUES, Naiana. A Ilha: um repórter brasileiro nos caminhos do Novo Jornalismo. In: XIV CONGRESSO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO NA REGIÃO NORDESTE. Anais... Recife, 14 a 16 de junho de 2012. Compact Disc, CD., p. 10).

Figura 3 -
Capa da edição de bolso de A Ilha.

Figura 4 -
Capa da 30º edição de A Ilha (Companhia das Letras, 2001)

O sucesso do livro, que levou inclusive a que vários outros títulos sobre o tema fossem lançados em seguida, mostra que A Ilha foi uma espécie de abre-alas para reintroduzir o debate sobre Cuba e o socialismo no Brasil, mas sob novas condições, ou seja, tendo como referência não apenas toda a propaganda negativa despejada pelo governo brasileiro e pela maior parte dos meios de comunicação nacionais e internacionais, mas também um relato que apontava muitos pontos positivos dos “barbudos”.

A repercussão do livro foi tal, que seu autor tornou-se “uma espécie de embaixador sem pasta” (GALVÃO, 2005GALVÃO, Walnice Nogueira. “A voga do biografismo nativo”. Estudos Avançados, São Paulo, v. 19, n. 55, 2005., p. 352) de Cuba no Brasil, o que de certa forma ocorre até hoje.

A carreira política do autor, certamente impulsionada pelo êxito do livro, é outro fator que mostra o alcance que um livro - em especial os livros políticos - pode ter. Neste caso, foi um aspecto determinante para que Fernando Morais se tornasse um parlamentar de oposição, com atuação destacada no estado de São Paulo.

A trajetória do livro A Ilha e de seu autor parecem ser um excelente exemplo de como um livro político pode ser um fator de intervenção nos debates políticos de seu tempo e gerar consequências diretas não só no âmbito ideológico e cultural, mas até mesmo no campo da política institucional.

Detenção na volta de Cuba

O lançamento e o sucesso do livro A Ilha fez com que o editor Fernando Mangarielo fosse convidado para participar, em 1978, do júri do prêmio literário da Casa de las Américas, prestigiada instituição cubana. Aliás, ele não foi o único brasileiro convidado naquele ano. Compareceram também Chico Buarque de Holanda, Antonio Callado, Fernando Morais e Ignácio de Loyola Brandão.

Na volta da viagem, Mangarielo foi detido pelo DOPS (Delegacia de Ordem Política e Social) paulista ao desembarcar no aeroporto de Congonhas no dia 24 de fevereiro de 1978. Detido às 9:30, foi “[...] interrogado numa sala do próprio aeroporto” e depois “Liberado às 11:30m, após ter vários objetos confiscados”. Ao ser liberado, foi intimado a prestar novo depoimento no DOPS às 17:00 daquele mesmo dia (“Editor paulista...”, 1978“Editor paulista que esteve em cuba é detido em Congonhas”. O Globo, Rio de Janeiro, 22 fev 1978.).

Esta intimidação gerou novos contratempos ao editor, pouco tempo depois dos problemas gerados pela perseguição ao livro Em câmara lenta, mas não o intimidaram. Ainda em 1978 e nos anos seguintes, a Alfa-Omega lançou novos títulos sobre a Revolução Cubana. Mas fizeram com que rompesse relações com a Câmara Brasileira do Livro. Ele explica: “Vou falar do segundo trauma que eu tive na minha carreira na sociedade industrial. Quando voltei de Cuba e fui preso, quem me defendeu foi a UBE, União Brasileira de Escritores, e não a organização a que eu pertencia, que era a Câmara Brasileira do Livro. E eu disse: enquanto vocês não me pedirem desculpas eu não retorno a esta instituição. E saí, continuo fora da CBL e de todas as outras”.

A detenção, as ameaças e a intimidação - pouco tempo depois dos problemas gerados pela perseguição ao livro Em câmara lenta - geraram novos contratempos ao editor, mas não fizeram com que a Alfa-Omega modificasse sua linha editorial de oposição. A edição do livro Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia, de Cristina Pinheiro Machado, em 1979MACHADO, Cristina Pinheiro. Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia. São Paulo: Alfa-Omega, 1979, p. 19., demonstra isso claramente.

História editorial do livro Os exilados

Dados do livro

Coleção Biblioteca Alfa-Omega de Cultura Universal, Série Esta América, vol. 9

1ª edição: fevereiro de 1979

Contém Apresentação do advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, presidente do Comitê Brasileiro pela Anistia - São Paulo.

Brochura, formato 14 X 21 cm, 129 páginas.

Tiragem: 3 mil exemplares

Figura 5 -
Capa do livro Os exilados

Figura 6 -
Contracapa do livro Os exilados.

A autora

Cristina Pinheiro Machado era uma jovem jornalista de 26 anos quando o livro foi lançado. Nasceu em São Manuel (SP). Trabalhou na sucursal do jornal O Globo em São Paulo, na Folha de S.Paulo e em O Estado de São Paulo.

Nos últimos anos, adotou o nome Anjee Cristina Pinheiro Machado. Em 2005, publicou o livro Filhos da Lua e do Sol: uma saga sul-americana (Brasília, LGE), em que narra como “modernos viajantes revivem a saga dos povos nativos que subiram cordilheiras, penetraram florestas e navegaram rios na América do Sul”, de acordo com o texto da contracapa do livro13 13 “Marcado por uma grande subjetividade, o relato de Anjee Cristina Pinheiro Machado [...] indica que as principais impressões sobre o Caminho das Missões repousam sobre o foco místico, ultrapassando a curiosidade cultural: ‘para mim, foi basicamente um roteiro de iniciação espiritual, que abriu janelas para experiências profundamente transformadoras’ ”. ALVES, 2007. .

O livro

Trata-se de uma longa reportagem baseada em entrevistas com exilados e ex-exilados, além de utilizar cartas, textos, depoimento escritos e de reproduzir trechos de entrevistas do livro Memórias do Exílio (Livramento, 1978).

A autora destaca que “[...] quem deixa o seu país por razões políticas é geralmente aquele que mais se apaixonou pela questão nacional, e, por caminhos certos ou errados, mesclou a própria vida aos destinos do seu povo” (MACHADO, 1979MACHADO, Cristina Pinheiro. Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia. São Paulo: Alfa-Omega, 1979, p. 19., p. 19), deixando claro o peso e a dor do exílio para esses brasileiros.

A obra procura mostrar um quadro abrangente dos exilados brasileiros desde o golpe de 1964. Entre os entrevistados do livro aparecem personalidades de destaque no governo João Goulart, intelectuais, estudantes, operários, militares, ex-parlamentares e guerrilheiros. Os exilados entrevistados são José Maria Rabêlo, Almino Affonso, Darcy Ribeiro, Alberto Carmo, David Lerer, Luiz Hildebrando Pereira da Silva, Jean Marc van der Weid, Derly José de Carvalho, Maurício Vieira de Paiva, Domingos Fernandes, Alfredo Syrkis, Edmauro Gopfert, Carlos Minc, Flávio Tavares, Vera Sílvia de Araújo Magalhães, Cícero Viana, Fernando Perrone, Roberto Las Casas. Outros que aparecem, por meio de depoimentos que já haviam sido publicados antes na imprensa ou em outros livros, são Francisco Julião, Herbert José de Souza (Betinho), Luís Travassos, Vladimir Palmeira, José Ibrahim e Maria Auxiliadora Lara Barcellos.

Cristina Pinheiro Machado mostra no livro que tinha havido “duas grandes levas de imigração de brasileiros por motivos políticos. A primeira ocorreu em 1964 e a segunda, a partir do final de 1968”. O primeiro grupo era formado pelos “expurgados de 1964”, em geral aliados do governo deposto (FEIJÓ, 2011FEIJÓ, Sara Duarte. “Em teu nome... e Batismo de sangue: formas cinematográficas de representar o exílio na ditadura brasileira”. Projeto História, São Paulo, nº 43 dez. 2011.). Entre eles, constatou a autora, “era geral a impressão de que o exílio seria um episódio rápido, e que em breve voltariam ao Brasil” (MACHADO, 1979MACHADO, Cristina Pinheiro. Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia. São Paulo: Alfa-Omega, 1979, p. 19., p. 19).

Já o segundo grupo de exilados surge a partir de 1969, “em sua maioria estudantes de classe média, sem experiência ou expressão política”. Era um grupo mais numeroso, se comparado à primeira leva de exilados (MACHADO, 1979MACHADO, Cristina Pinheiro. Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia. São Paulo: Alfa-Omega, 1979, p. 19., p. 53).

O livro destaca que o exílio fez com que muitos exilados “descobrissem” a América Latina, pois tiveram de viver no Uruguai, no Chile, na Bolívia, no México ou no Peru, entre outros países. Apresenta, ainda, autocríticas de alguns militantes, seja em relação à ausência de resistência logo após o golpe, em 1964, seja em relação à opção pela luta armada. Há também um capítulo dedicado a exilados que morreram fora do país.

Um ponto importante da obra é mostrar a atuação das embaixadas e de diplomatas do Brasil contra os exilados brasileiros no Chile, após o golpe militar naquele país, em setembro de 1973. Essa ação no Chile representou o início de uma política do governo brasileiro contra os exilados, através de suas embaixadas, que culminaria

na distribuição de ‘listas negras’ de brasileiros pelo mundo inteiro (fornecidas não só a embaixadas mas aos governos passíveis de concederem asilo), negativas de passaportes para os proscritos e seus filhos (até mesmo bebês, que em alguns casos teriam seus registros de nascimento recusados pelas embaixadas), e perseguições policias aos banidos (MACHADO, 1979MACHADO, Cristina Pinheiro. Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia. São Paulo: Alfa-Omega, 1979, p. 19., p. 49-50).

O advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, que na época atuava na defesa de vários presos políticos e era presidente da seção paulista do Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA), afirma na apresentação da obra: “Este livro tem a simplicidade das obras sérias. No estilo aparentemente efêmero da reportagem, é um trabalho de registro histórico que não podia faltar: servirá, fatalmente, como ponto de referência a quem hoje trata da matéria, e atuará como advertência às gerações futuras” (GREENHALGH, 1979GREENHALGH, Luiz Eduardo. “Apresentação”. In: MACHADO, Cristina Pinheiro. Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia. São Paulo, Alfa-Omega: 1979, p. XIII-XIV., p. XIII-XIV).

Ele ainda destaca que Os exilados seria um “livro-tarefa” (GREENHALGH, 1979GREENHALGH, Luiz Eduardo. “Apresentação”. In: MACHADO, Cristina Pinheiro. Os exilados: 5 mil brasileiros à espera da anistia. São Paulo, Alfa-Omega: 1979, p. XIII-XIV., p. XV), demarcando o sentido de intervenção e a urgência do livro naquele momento.

A contracapa do livro traz a seguinte informação: “Este livro é recomendado pelo Comitê Brasileiro pela Anistia”. Aqui, cabe salientar que o Comitê Brasileiro pela Anistia apoiou ou participou da edição de alguns livros. Foi o caso, por exemplo, do livro Inventário de cicatrizes, de Alex Polari, uma coedição de 1978 da Global Editora, do Teatro Ruth Escolar e do Comitê Brasileiro pela Anistia. E também de Desaparecidos políticos, prisões, sequestros, assassinatos: artigos, entrevistas, documentos, reportagens..., livro organizado por Reinaldo Cabral e Ronaldo Lapa e publicado numa coedição do Comitê Brasileiro pela Anistia/RJ e da Editora Opção. Em outros casos, o CBA recebeu o apoio de autores e editores, como no livro Tortura, a história da repressão política no Brasil, de Antônio Carlos Fon (Global, 1979). Em uma das edições da obra, o autor doou os direitos autorais para o CBA (MAUÉS, 2011).

No caso do livro Os exilados, o fato de a obra receber a recomendação do CBA deixava claro para os leitores que a autora tinha a simpatia da organização e, ao mesmo tempo, que a autora apoiava a luta do CBA.

Repercussão

O livro foi lançado no começo do ano de 1979 e teve repercussão discreta na imprensa. Um dos primeiros registros na imprensa sobre o lançamento da obra é uma pequena nota no Jornal do Brasil, datada de 3 de fevereiro de 1979. No dia seguinte, a Folha de S.Paulo também mencionava o lançamento na nota “Movimento editorial”. Estas datas são importantes, pois mostram que o livro foi lançado num momento em que a campanha pela anistia ampla, geral e irrestrita ganhava impulso na sociedade brasileira.

Localizei apenas uma resenha, publicada no jornal Folha de S.Paulo (CAMPOLLIM, 1979CAMPOLLIM, Silvia. “À espera do esquecimento”. Folha de S.Paulo, São Paulo, 4 mar 1979.), jornal onde a autora trabalhava quando o livro foi lançado. A obra teve apenas uma edição. A resenha da Folha valorizava o fato de que o livro não se limitava a mostrar a trajetória de alguns exilados, mas apresentava também suas autocríticas. Assim, segundo a autora da resenha, a obra “descerra as inúmeras tentativas de críticas já feitas por esses mesmos opositores à atuação passada, que agora devem alicerçar sua disposição de construção futura” (CAMPOLLIM, 1979CAMPOLLIM, Silvia. “À espera do esquecimento”. Folha de S.Paulo, São Paulo, 4 mar 1979.).

Uma matéria sobre a questão do retorno dos exilados, publicada na revista IstoÉ em fevereiro de 1979, teve como base o livro Os exilados - utilizava várias informações e trechos de entrevistas do livro. A matéria destacava o papel de alguns livros recentes ao trazer as vozes dos exilados “até nós, depois do silêncio que obstruiu durante anos todos os canais de comunicação entre elas e o país” (CASTRO, 1979CASTRO, Ruy. “Às vésperas da volta”. IstoÉ, São Paulo, 21 fev 1979, pp. 122-24.).

Um livro na campanha pela anistia

As reivindicações de anistia começaram a surgir logo após o golpe de 1964, mas só em 1975 iniciou-se uma campanha mais efetiva e organizada pela anistia, com o surgimento do Movimento Feminino Pela Anistia (MFPA), organizado inicialmente em São Paulo sob o comando de Therezinha Zerbine. Em fevereiro de 1978, havia sido lançado oficialmente, no Rio de Janeiro, o primeiro Comitê Brasileiro de Anistia, e em novembro daquele ano se realizou o I Congresso Nacional pela Anistia, em São Paulo (MAUÉS, 2011).

“O movimento de anistia se estruturou em ritmo veloz, e forte foi o apoio conquistado nos mais diferentes setores sociais. A mobilização se dava nas ruas, em passeatas e atos públicos. [...] Jornalistas e artistas ecoavam a palavra de ordem da Anistia em seus meios de comunicação e expressão” (SANT’ANNA, 2006SANT’ANNA, Vanya. “A campanha pela anistia”. In: MAUÉS, Flamarion e ABRAMO, Zilah (orgs.). Pela democracia, contra o arbítrio: A oposição democrática, do golpe de 1964 à campanha das Diretas Já. São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo, 2006, p. 293).

O ano de 1979 marcaria o auge da campanha e das discussões na imprensa, na sociedade e no parlamento sobre os vários projetos de anistia. Nesse ano, “muitos sindicatos de trabalhadores fortaleceram a luta pela anistia, em especial os que expressavam o novo sindicalismo, nascido no ABC paulista” (SANT’ANNA, 2006SANT’ANNA, Vanya. “A campanha pela anistia”. In: MAUÉS, Flamarion e ABRAMO, Zilah (orgs.). Pela democracia, contra o arbítrio: A oposição democrática, do golpe de 1964 à campanha das Diretas Já. São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo, 2006, p. 293). A campanha foi ganhando apoios cada vez mais amplos, com a realização de atos públicos em diversas cidades. Tornou-se “o primeiro movimento nacional unificado contra a ditadura militar e representou a maior frente política de caráter progressista da história brasileira” (SANT’ANNA, 2006SANT’ANNA, Vanya. “A campanha pela anistia”. In: MAUÉS, Flamarion e ABRAMO, Zilah (orgs.). Pela democracia, contra o arbítrio: A oposição democrática, do golpe de 1964 à campanha das Diretas Já. São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo, 2006, p. 291), até aquele momento.

Nesse contexto, obras que traziam os testemunhos e as histórias dos exilados, alguns deles há 15 anos impedidos de voltar ao país, desempenhavam importante papel na luta pela anistia.

Livros como Os exilados - ao lado de outros, como Memórias do exílio: Brasil 1964-19??, coordenado por Pedro Celso Uchoa Cavalcanti e Jovelino Ramos (Livramento, 1978CAVALCANTI, Pedro Celso Uchoa; RAMOS, Jovelino (coords.). Memórias do exílio: Brasil 1964-19??. São Paulo: Livramento, 1978.); Liberdade para os brasileiros: anistia ontem e hoje, de Roberto Ribeiro Martins (Civilização Brasileira, 1978); Tempo de ameaça (Autobiografia política de um exilado), de Rodolfo Konder (Alfa-Omega, 1978); e Anistia, semente de liberdade, de Therezinha Godoy Zerbine (Edição do autor, 1979) - traziam a voz dos exilados para o país, reforçando as mobilizações em favor da anistia e tornando de certa forma mais concreta essa demanda, pois apresentava a muitos brasileiros mais jovens quem eram os exilados, ou seja, quem eram algumas das pessoas que seriam beneficiadas pela anistia. Nesta mesma linha de raciocínio, também foram fundamentais os livros que começavam a trazer, no mesmo período, os testemunhos dos presos políticos brasileiros.14 14 Mais informações sobre estes livros em MAUES, 2011.

A anistia aprovada pelo parlamento em agosto de 1979 não foi ampla, geral e irrestrita como queriam os setores democráticos; mas, apesar de suas limitações, representou naquele momento uma vitória - parcial - da oposição à ditadura.

É importante destacar que os livros não foram os primeiros a ouvir e dar voz aos exilados. O tema do exílio apareceu, ainda que de maneira discreta e apesar da censura, na imprensa, mesmo quando a repressão foi mais atuante. Algumas vezes, a questão da anistia também surgia nestes veículos.

Todavia, o papel desse tipo de livro no Brasil - os livros de oposição - não deve ser subestimado. O impacto desses trabalhos se dava por reunirem um conjunto de informações e análises sobre temas fortes da luta política contra a ditadura. É o caso de Os exilados, que trazia a voz de ex-parlamentares, militares cassados, líderes operários e camponeses, estudantes, ex-guerrilheiros, entre outros. Inseria-se, desse modo, na campanha pela anistia - um elemento a mais na mobilização por essa causa.

Uma editora de oposição e os livros de oposição

A Alfa-Omega foi uma das mais destacadas editoras de oposição dos anos 1970 no Brasil. Atraiu autores que tinham posicionamento crítico em relação à ditadura, com destaque de um lado para intelectuais ligados à universidade, principalmente à USP, e de outro para jornalistas que, mesmo atuando na grande imprensa, expressavam pontos de vista críticos utilizando as brechas existentes.

Além disso, marcou sua existência pela edição de obras de alguns dos principais teóricos marxistas: Karl Marx, Friedrich Engels, Lenin e Mao Tsetung.

Fernando Mangarielo mostra um grande apreço pelo seu trabalho como construtor da Alfa-Omega e como editor:

Eu queria uma editora crítica. Que contribuísse com a ciência. [...] Então eu disse: não tenho espaço para publicar todo mundo, eu tenho que selecionar o pensamento crítico [...] Editar livros era uma necessidade minha, pessoal, porque era a maneira de eu sentir o remuo da sociedade. Pá pum! Eu batia lá e voltava [...] eu sei o grau de utilidade social que tem a editora e que tem a minha profissão. Meu objetivo é publicar livros que tragam um aumento da consciência científica em primeiro lugar, da consciência crítica em segundo.

Sobre suas simpatias políticas e o trabalho editorial, Mangarielo afirma:

[...] minha proximidade foi mais com o PCB, Partido Comunista Brasileiro, do Prestes. Prova é que quando inauguramos esta sede própria da editora, inauguramos aquele salão lá no fundo com a presença do Boris Koval, da Academia de Ciências da União Soviética e diretor do Instituto do Movimento Operário Internacional, e depois com o Prestes na semana seguinte. [...] O Prestes fez uma palestra, botamos aqui 180 pessoas. E passamos a fazer eventos neste salão nos fundos da editora.

Todavia, ele salienta que “[...] A política partidária nunca me seduziu, nem me seduzirá. Falo peremptoriamente. Nunca tive uma atitude servil, puxa-saco”. E faz questão de afirmar:

[...] como editor, acolhia todos. [...] Mas a editora apoiou causas. Apoiamos até hoje. Todas as correntes que tivessem obras não doutrinárias, mas denúncias, contribuições, críticas, nós publicamos. [...] Então, o que eu sabia era que necessitava de um ponto de referência para esses pequenos eleitos que elegiam o conhecimento como uma forma de lutar. Isso sim. Esse é o papel da editora. Exatamente. Agora, nunca acenei com programação em três, quatro livros desse partido, daquela sigla, ou daquela outra sigla. Não. Era o que vinha.

Ele tem uma definição pessoal sobre o trabalho do editor:

O editor tem muito do garimpeiro. É uma pessoa que tem que ter uma energia muito grande, tenacidade para remover montanhas, para catar pelotinhas e saber identificar que aquele é o metal precioso, que é o autor, o título... Como deve ser o título, qual deve ser o número de páginas, a apresentação gráfica, o preço para o mercado. Começa-se do máximo para o mínimo ou do mínimo para o máximo? Todas essas dúvidas. Essa dúvida metódica, cartesiana, tem que ser aplicada. [...] É como um maestro, uma orquestra com cem instrumentos e mais 104 vozes do coral, você tem que fazer com que tudo isso entre no tempo certo.

A Editora Alfa-Omega mantém-se em atividade desde 1973. A partir da segunda metade dos anos 2000, apenas os proprietários trabalham regularmente na empresa. As ferramentas digitais têm sido grandes aliadas na manutenção da editora. As tiragens passaram a ser feitas por demanda. No aspecto da distribuição e comercialização, a principal ação da editora é enviar regularmente a uma grande lista de endereços eletrônicos informações sobre suas publicações; é possível adquirir exemplares por telefone e pela internet. Além disso, a editora também pretende produzir alguns de seus livros na versão eletrônica (ebook). A Editora atualmente conta com mais de 200 títulos em catálogo.

As dificuldades econômicas foram uma constante na trajetória da editora, apesar de a Alfa-Omega ter tido momentos de grande êxito editorial e comercial, com dois grandes best-sellers (A Ilha e Olga) que possibilitaram, em certos períodos, a produção de um volume significativo de novos títulos a cada ano e um movimento comercial importante. Mas, a partir de 1990, a editora teve uma grande redução em seu volume de vendas.

Claudete Mangarielo tem uma interpretação clara sobre os problemas que a Alfa-Omega enfrenta nos últimos tempos:

E esses tempos atuais têm castigado muito porque houve uma mudança global em dois sentidos: um, é o político. A editora, nós não podemos perder o foco de que ela foi fundada em cima de um movimento político. [...] Então, a editora começou em cima disso. Ela tinha um apoio incontestável dos professores da USP, ela tinha um apoio da mídia, tinha um apoio de todos os grupos políticos do momento: trotskistas, maoístas, leninistas, marxistas... Não havia separação. Quando o movimento se acabou, que caiu o Muro de Berlim, a União Soviética deixou de ser comunista, houve uma mudança política que veio afetar a Alfa-Omega. Claro, o foco dela era todo esse. Então, o que aconteceu? Cada um se dividiu. Os que defendem Marx, Lenin, foram para o lado deles; os trotskistas para outro, e a mídia mudou. É um novo conceito de livro no Brasil (Entrevista com Claudete Mangarielo, 2013Entrevista com Claudete Mangarielo realizada no dia 15 de maio de 2013 por Flamarion Maués, Sandra Reimão e João Elias Nery.).

Parte importante da produção da Alfa-Omega, particularmente entre 1973, ano de sua fundação, e 1985, quando é editado Olga, é composta por livros de oposição, conforme descrito no início deste artigo.

Levando em conta os dois casos aqui analisados, podemos dizer que os livros de oposição no Brasil, nos anos 1970 e até meados dos anos 1980, foram obras literárias que representavam uma manifestação política pública de oposição em um período de forte restrição às liberdades democráticas, em que a censura e a repressão política e cultural eram marcas definidoras do país. A edição dessas obras foi um dos meios encontrados por setores oposicionistas para ter voz pública e ativa num quadro de forte cerceamento da ação política, principalmente para os setores mais à esquerda.

Os livros de oposição, além do seu conteúdo e da sua circulação, abriam espaço para eventos públicos de caráter político, como, por exemplo, lançamentos públicos, debates e noites de autógrafos, eventos cujo caráter social possibilitava muitas vezes reuniões públicas para discussão de temas políticos que sob outras formas talvez fossem mais difíceis de realizar naquele momento.

Sabemos da realização de muitos lançamentos e noites de autógrafos de livros de oposição no período aqui estudado, eventos que ocorriam em diversas cidades. Nos anos de 1978 e 1979, muitos desses eventos se integraram na campanha da anistia; outros se relacionavam aos movimentos sindicais e grevistas que ressurgiam naqueles anos. Esse ponto marca, a meu ver, algumas possibilidades diferenciadas que a edição em livro permite, particularmente se tratando de livros de oposição. Se contrapusermos esses livros à imprensa, por exemplo, vemos que, apesar de esta ter quase sempre uma tiragem superior à dos livros, tem uma repercussão muito concentrada no tempo, e em geral um tanto efêmera. De certo modo, a tendência é que logo as matérias publicadas pela imprensa percam força, deixem de ser consideradas “quentes”.

O livro, apesar de sua tiragem em geral muito menor em termos quantitativos, permite detalhamento de informações e, ao mesmo tempo, dá ao texto perenidade, proporcionado que ele circule e repercuta por um tempo muito maior. E permite também que diversos eventos, como lançamentos e noites de autógrafos, sejam promovidos em torno da publicação, fazendo com que o livro seja lançado diversas vezes, em lugares diferentes, possibilitando, em cada ocasião, a realização de debates e mobilizações sobre o tema abordado. Além disso, permite ao autor conceder entrevistas, realizar palestras e outras atividades relacionadas à sua obra.

Se pensarmos no livro de oposição em um sentido mais amplo e não delimitado cronologicamente, podemos defini-lo como aquele que representa, por seu conteúdo e por seu posicionamento no quadro político local no momento de sua edição, uma contraposição ao governo e/ou às instituições vigentes, na forma de denúncia ou de confrontação político-ideológica.

Referências

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  • CAVALCANTI, Pedro Celso Uchoa; RAMOS, Jovelino (coords.). Memórias do exílio: Brasil 1964-19??. São Paulo: Livramento, 1978.
  • “Editor paulista que esteve em cuba é detido em Congonhas”. O Globo, Rio de Janeiro, 22 fev 1978.
  • Entrevista com Claudete Mangarielo realizada no dia 15 de maio de 2013 por Flamarion Maués, Sandra Reimão e João Elias Nery.
  • Entrevistas de Fernando Mangarielo a Flamarion Maués, Sandra Reimão e João Elias Nery, concedidas em 15 de maio e 19 de junho de 2013
  • ESCOSTEGUY, Jorge. “Sem fundo falso”. Veja, São Paulo, 18 ago 1976.
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    » http://www6.ufrgs.br/emquestao/pdf_2005_v11_n2/3_tersimplesmente.pdf
  • MAUÉS, Flamarion. “A tortura denunciada sem meias palavras: um livro expõe o aparelho repressivo da ditadura”. In: SANTOS, Cecília MacDowell; TELES, Edson Luís de Almeida; TELES, Janaina de Almeida (Orgs.). Desarquivando a Ditadura: memória e Justiça no Brasil São Paulo, Hucitec, 2009, p. 110-134.
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  • SANT’ANNA, Vanya. “A campanha pela anistia”. In: MAUÉS, Flamarion e ABRAMO, Zilah (orgs.). Pela democracia, contra o arbítrio: A oposição democrática, do golpe de 1964 à campanha das Diretas Já São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo, 2006
  • SILVA, Mário Augusto Medeiros da. Escritores da guerrilha urbana: literatura de testemunho, ambivalência e transição política (1977-1984). São Paulo, Annablume, 2008.

Notas

  • DECLARAÇÃO DE FINANCIAMENTO

    Este artigo é resultado de projeto de pós-doutorado financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP, processo 2013/08668-0). As opiniões, hipóteses e conclusões ou recomendações expressas neste material são de responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a visão da FAPESP.
  • *
    Este artigo dá continuidade à pesquisa sobre a atuação editorial de Fernando Mangarielo e da editora Alfa-Omega, feita em coatoria com Sandra Reimão e João Elias Nery, que já resultou em outros dois artigos: REIMAO; MAUES; NERY, 2015; 2016.
  • 1
    Mas é importante assinalar que na década de 1960 já havia algumas editoras isoladas que tinham um perfil oposicionista, como Civilização Brasileira, Brasiliense, Saga, Felman-Rego, José Álvaro Editor e Laemmert.
  • 2
    No artigo “‘Ter simplesmente este livro nas mãos é já um desafio’: Livros de oposição no regime militar, um estudo de caso”, de minha autoria, apresento o estudo de um livro de oposição (Poemas do povo da noite, de Pedro Tierra) feito com base neste modelo de análise. Ver MAUES, 2005MAUÉS, Flamarion. ‘Ter simplesmente este livro nas mãos é já um desafio’: Livros de oposição no regime militar, um estudo de caso. Questão, Revista da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, v. 11, n. 2, jul.-dez. 2005, p. 259-279. Disponível em: <http://www6.ufrgs.br/emquestao/pdf_2005_v11_n2/3_tersimplesmente.pdf>.
    http://www6.ufrgs.br/emquestao/pdf_2005_...
    . Também em meu artigo “A tortura denunciada sem meias palavras: um livro expõe o aparelho repressivo da ditadura” utilizo este modelo de análise para estudar o livro Tortura: A história da repressão política no Brasil, do jornalista Antonio Calos Fon. Ver MAUES, 2009MAUÉS, Flamarion. “A tortura denunciada sem meias palavras: um livro expõe o aparelho repressivo da ditadura”. In: SANTOS, Cecília MacDowell; TELES, Edson Luís de Almeida; TELES, Janaina de Almeida (Orgs.). Desarquivando a Ditadura: memória e Justiça no Brasil. São Paulo, Hucitec, 2009, p. 110-134..
  • 3
    Entrevistas com Fernando Mangarielo realizadas nos dias 15 de maio e 19 de junho de 2013 por Sandra Reimão, Flamarion Maués e João Elias Nery.. Todas as demais citações de falas de Mangarielo são destas entrevistas, a não ser que sejam identificadas de forma diferente.
  • 4
    Mais informações sobre o surgimento e o projeto da editora Alfa-Omega podem ser vistos em RIDENTI, 2000RIDENTI, Marcelo. Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV. Rio de Janeiro: Record, 2000.; MAUÉS, E. A., 2007MAUÉS, Eloísa Aragão. “A editora Alfa-Omega nos anos de chumbo: Entrevista com Fernando Mangarielo”. Oralidades, São Paulo, Núcleo de História Oral da USP, N. 2, jul-dez, 2007, p. 155-171.; SILVA, 2008SILVA, Mário Augusto Medeiros da. Escritores da guerrilha urbana: literatura de testemunho, ambivalência e transição política (1977-1984). São Paulo, Annablume, 2008.; REIMÃO, 2009; ARAGÃO, 2013ARAGÃO, Eloisa. Censura na lei e na marra: como a ditadura quis calar as narrativas sobre suas violências. São Paulo: Humanitas, 2013..
  • 5
    Para mais informações sobre a trajetória de vida de Fernando Mangarielo e suas experiências no campo editorial e livreiro antes da Alfa-Omega, ver REIMAO; MAUES; NERY, 2015; 2016.
  • 6
    Interessante assinalar que uma das mais importantes editoras ligadas ao Partido Comunista Francês foi fundada em 1927, e se chamava Éditions Sociales. Também em Portugal surgiu, em 1974, após a Revolução dos Cravos, uma Edições Sociais, criada pelo editor Rui Moura, militante do Partido Comunista Português.
  • 7
    Existem alguns trabalhos que analisam o caso da censura ao livro Em Câmara Lenta: RIDENTI, 2000RIDENTI, Marcelo. Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV. Rio de Janeiro: Record, 2000.; ARAGÃO, 2013ARAGÃO, Eloisa. Censura na lei e na marra: como a ditadura quis calar as narrativas sobre suas violências. São Paulo: Humanitas, 2013.; REIMÃO, 2011REIMÃO, Sandra. Repressão e resistência: Censura a livros na ditadura militar. São Paulo: Edusp/Fapesp, 2011.; MAUÉS, 2007MAUÉS, Flamarion. Livros contra a ditadura: editoras de oposição no Brasil, 1974-1984. São Paulo: Publisher, 2013.; SILVA, 2008SILVA, Mário Augusto Medeiros da. Escritores da guerrilha urbana: literatura de testemunho, ambivalência e transição política (1977-1984). São Paulo, Annablume, 2008..
  • 8
    A revista foi editada entre 1984 e 1988. Os três primeiros números tiveram como editores Jacob Bazarian e Daniel Fresnot. A partir do quarto número, Bazarian passou a ser o único editor.
  • 9
    Jacob Bazarian relembrou da seguinte forma a criação de Socialismo & Democracia: “A revista nasceu de uma proposta de meu grande amigo Fernando Mangarielo de publicar um periódico sobre o pensamento socialista. Como eu ajudava a Editora Alfa-Omega como orientador da coleção de filosofia e sociologia marxista, Fernando achou que eu poderia dirigir também essa revista. Eu disse ao Fernando, que nas condições atuais do Brasil e do mundo o mais acertado e útil seria fazer uma revista independente (de partidos e subsídios de quem quer que fosse), pluralista, polêmica e de debates, que pudesse refletir as opiniões dos diferentes partidos e movimentos que lutam por uma democracia socialista, que ainda não existe em país nenhum”. Cf. “Entrevista com Jacob Bazarian: Três anos em defesa do socialismo e da democracia”. Socialismo & Democracia, São Paulo, Alfa-Omega, nº 12, out/dez. 1986, p. 6-7.
  • 10
    Não obtive dados sobre as tiragens das demais edições.
  • 11
    No final dos anos 1980, divergências comerciais levaram Fernando Morais a não renovar o contrato de edição de Olga com a Alfa-Omega. O rompimento entre Mangarielo e Morais deveu-se a questões contratuais referentes a direitos autorais da obra e à sua negociação com outros países e para a adaptação cinematográfica. Para Mangarielo, o contrato deixava claro que tais negociações deveriam ser feitas pelo editor, e não pelo autor. “Então, ele não soube contemporizar, no sentido de buscar um entendimento antes de mais nada, ele tentou tomar pra si”, diz Mangarielo. Essa desavença fez com que A Ilha também deixasse de ser editada pela Alfa-Omega. O rompimento do editor com o seu autor de maior sucesso de vendas certamente marcou o início do declínio da editora, ao lado de outros fatores, tanto de ordem comercial, como editorial e política.
  • 12
    Com a extinção dos partidos políticos decretada pelo Ato Institucional nº 2, em outubro de 1965, a ditadura passou a permitir apenas a existência de dois partidos, um de apoio ao governo (Arena) e um da oposição consentida (MDB). Fundado em 1966, o MDB acabou por se tornar de fato um aglutinador dos diversos setores oposicionistas. Em 1978, ocorreram as últimas eleições, em que puderam participar apenas a Arena e o MDB.
  • 13
    “Marcado por uma grande subjetividade, o relato de Anjee Cristina Pinheiro Machado [...] indica que as principais impressões sobre o Caminho das Missões repousam sobre o foco místico, ultrapassando a curiosidade cultural: ‘para mim, foi basicamente um roteiro de iniciação espiritual, que abriu janelas para experiências profundamente transformadoras’ ”. ALVES, 2007ALVES, Carlos Augusto Silveira. O Caminho das Missões e seus peregrinos: nova modalidade de produto turístico na Região das Missões. 2007. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, PUC-RS, Porto Alegre, 2007. .
  • 14
    Mais informações sobre estes livros em MAUES, 2011MAUÉS, Flamarion. Livros na campanha pela anistia. In: Perseu: História, Memória e Política. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2011, p. 257-277..

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    19 Jul 2018
  • Aceito
    03 Jul 2019
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