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Pesquisas sobre migrações e etnicidade: conhecimento sobre identidades coletivas

Researches on migrations and ethnicity: learning about collective identities

RESUMO

O objetivo desta análise é mostrar a potencialidade dos processos de migração na geração de identidades coletivas no contexto de chegada. Mais especificamente, buscou-se observar, em termos teóricos, a aplicabilidade das teorias de etnicidade para interpretar as situações manifestadas, tendo por pressuposto que fatores econômicos e sociais influenciam na produção de classificações identitárias. O estudo se amparou em trabalhos de pesquisa sobre migrações internas no país, divulgados em teses, dissertações e artigos acadêmicos, os quais, preferencialmente, utilizaram a metodologia da história oral, pois depoimentos costumam descrever vivamente os momentos e os modos como se exteriorizam as categorias sociais.

Palavras-chave
Migrações; Identidade; Etnicidade; História oral

ABSTRACT

We intend through this analysis to present the potentialities of migration processes in creating collectives identities in the context of peoples’ arrivals. In particular, we tried to observe theoretically the ways ethnicity theories can be applied to interpret some situations under the assumption that economic and social factors influence the creation of identities’ classification. This study was supported by researches on internal migrations in the country, published in theses and dissertations and articles, whose main methodology was oral history, once testimonies are a living source for describing moments and means social categories are exposed.

Keywords
Migrations; Identity; Ethnicity; Oral history

Introdução

Este artigo reúne estudos baseados em pesquisas intensivas com indivíduos que se transferiram de uma região a outra do país, partindo do pressuposto que tal movimento tem o potencial de gerar “identidades de origem”. O enfoque, portanto, é o contexto na sociedade de chegada, especialmente as formulações identitárias que se manifestam na convivência (e nas disputas) entre diferentes grupos sociais que habitam um mesmo espaço social e econômico, referendando o reconhecimento das “complexas interconexões entre a migração e a formação e o desenvolvimento das comunidades migrantes e das identidades étnicas” (THOMSON, 2002THOMSON, Alistair. Histórias (co)movedoras: História Oral e estudos de migração. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 22, n. 44, p. 341-364, 2002., p. 342).

A aplicação dos referenciais teóricos da etnicidade já é bem recorrente nos estudos das migrações internacionais, como o de Lúcia Ribeiro Chermont (2011CHERMONT, Lucia Ribeiro. Memória e experiência de judeus de Higienópolis e arredores, São Paulo (1960 - 1970). 2011. 138 f. Dissertação (Mestrado em História Social) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2011.), que resgata o movimento de famílias imigrantes judaicas, até então dispersas em outros bairros e estados, em direção a um bairro da capital de São Paulo, ali desenvolvendo uma cultura comum. A autora cunha a sugestiva expressão “territórios étnicos” (CHERMONT, 2011CHERMONT, Lucia Ribeiro. Memória e experiência de judeus de Higienópolis e arredores, São Paulo (1960 - 1970). 2011. 138 f. Dissertação (Mestrado em História Social) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2011., p. 60) para descrever os lugares judaicos que incentivavam os laços entres os imigrantes: clubes, associações, movimentos juvenis, eventos esportivos etc. Como afirmam Fox e Jones (2013FOX, Jon E.; JONES, Demelza. Migration, everyday life and the ethnicity bias. Ethnicities, v. 13, n. 4, p. 385-400, 2013., p. 385), “a etnicidade é o produto em curso dos processos migratórios que dá a estes forma e significado”. O pressuposto deste artigo é que esses referenciais também podem ser aplicados à compreensão de fenômenos que ocorrem nas migrações internas, o que é pouco usual. Um aporte teórico importante para esta discussão é Fenton (2003, p. 14), para quem a etnicidade se refere à construção social da descendência e da cultura, à mobilização social da descendência e da cultura e aos significados e implicações dos sistemas de classificação construídos à sua volta (FENTON, 2003, p. 142FENTON, Steve. Etnicidade. Lisboa: Instituto Piaget, 2003.). A definição de Abner Cohen (1996COHEN, Abner. The Lesson of Ethnicity [1974] . In: SOLLORS, Werner (ed.). Theories of ethnicity: a classical reader. New York: New York University Press, 1996. p. 370-384., p. 372) para etnicidade - forma de interação entre grupos culturais operando em um comum contexto social - estimula sua aplicação aos grupos migrantes, principalmente porque o autor reconhece que o fenômeno é intenso nas cidades, onde ocorrem divisão de trabalho e intensa luta por recursos. Luta por recursos, como postos de trabalho, estão entre os motivos de classificações etnicizadas, como veremos.

Para a produção deste texto, que configura um exercício teórico, foram recolhidas, por um critério de diversificação, dissertações e teses em História a par de pesquisas em outras áreas das Ciências Humanas. O fato de a maior parte dos trabalhos comentados utilizar fontes orais é bastante justificável, tanto porque estereótipos e preconceitos (expressos em vocabulários, imagens, anedotas, chistes, bordões e outras práticas de discriminação) são manifestações pouco formalizadas, quanto porque as narrativas dos sujeitos que os vivenciaram traduzem melhor seus efeitos. Esse gênero de pesquisa vai ao encontro da proposta de Fox e Jones (2013FOX, Jon E.; JONES, Demelza. Migration, everyday life and the ethnicity bias. Ethnicities, v. 13, n. 4, p. 385-400, 2013., p. 389) quando postulam que estudar a etnicidade em suas manifestações da vida cotidiana pode ser uma forma de evitar o essencialismo que tem estado presente inclusive entre acadêmicos.

O tema migração no Brasil já acumula extensa literatura e não se pode deixar de referenciar alguns autores clássicos como José de Souza Martins, o qual traz a discussão da “fronteira” como situação de conflito social e lugar da alteridade (MARTINS, 1997MARTINS, José de Souza. Fronteira: a degradação do Outro nos confins do humano. São Paulo: Hucitec, 1997., p. 150). Martins expõe os conflitos entre camponeses pobres e grandes proprietários rurais, entre índios e brancos no contexto de uma exploração capitalista: “a fronteira tem um caráter litúrgico e sacrificial, porque nela o outro é degradado para, desse modo, viabilizar a existência de quem o domina, subjuga e explora” (MARTINS, 1997MARTINS, José de Souza. Fronteira: a degradação do Outro nos confins do humano. São Paulo: Hucitec, 1997., p. 13).1 1 “O material básico resultante dessa investigação compreende cerca de duas centenas de horas de entrevista gravadas no Mato Grosso, no Pará, no Maranhão, em Goiás e em Rondônia [...]” (MARTINS, 1997, p. 17).

Nos casos analisados neste artigo, os conflitos que se manifestam também estão associados a relações desiguais entre grupos diferentes, mas nem sempre tratam de contextos tão agudos.2 2 Em pesquisa em cidades do Mato Grosso próximas ao limite com o Pará, Regina Guimarães descobriu que “sob o manto do alardeado progresso, há sangue, tortura, trabalho escravo e muita pressão dos grupos sociais pelo acesso a terra” (GUIMARÃES NETO, 2006, p. 61). O enredo do trabalho e da exploração do capital permanece presente em estudos mais recentes. Ao se propor repensar as migrações internas no Brasil contemporâneo, Luciano Aragão (2014, p. 92) conclui: “Homens e mulheres se deslocam pelos territórios atendendo, sem que tenham consciência, em grande medida, aos desideratos da acumulação do capital”. O autor não desconhece o papel das redes de relações sociais, mas, “à luz da crítica da economia política”, destaca a relação entre os investimentos de capital e a mobilidade do trabalho (ARAGÃO, 2014ARAGUÃO, Luciano Ximenes. Repensando os espaços das migrações internas no Brasil contemporâneo à luz da crítica da economia política: algumas explorações. In: SANTOS, M.; PETRUS, R.; LOUREIRO, A. (Orgs.). Recortes interdisciplinares sobre migrações e deslocamentos. Rio de Janeiro: Léo Christiano Editorial, 2014. p. 89-106., p. 96).

Em termos metodológicos, por estar amparada em produção bibliográfica, esta pesquisa dependeu dos caminhos que os autores escolheram. Por exemplo, uma pesquisa de doutorado em História (CARVALHO, 2011CARVALHO, Carlos Eduardo Souza de. Mudanças e conquistas: história oral da vida de mulheres migrantes em Lucas do Rio Verde - MT 1980-2006. 2011. 210 f. Tese (Doutorado em História Social) - Universidade de São Paulo, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8138/tde-19062012-120046/pt-br.php >. Acesso em: 25 out. 2015.
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) sobre as trajetórias de vida de mulheres que migraram para uma cidade do Mato Grosso, ao priorizar “desafios por elas enfrentados na busca de uma melhor qualidade de vida”, deixa de explorar o fato de que grande parte daquelas migrantes era originária do assentamento de agricultores de Encruzilhada Natalino, no Rio Grande do Sul, origem do Movimento dos Sem Terra. Como o deslocamento para o Mato Grosso foi uma ação em grupo (“Mesmo os que se deslocaram sozinhos, apenas com suas famílias, nunca estavam separados de outros migrantes” [CARVALHO, 2011CARVALHO, Carlos Eduardo Souza de. Mudanças e conquistas: história oral da vida de mulheres migrantes em Lucas do Rio Verde - MT 1980-2006. 2011. 210 f. Tese (Doutorado em História Social) - Universidade de São Paulo, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8138/tde-19062012-120046/pt-br.php >. Acesso em: 25 out. 2015.
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, p. 17]), pode-se cogitar que havia fatores de reforço dos elos desses migrantes, os quais compartilhavam uma história de perda da terra, acampamento provisório e, por fim, deslocamento para um estado distante. Não foi este o foco da pesquisa, cujo autor permaneceu coerente com sua proposta de mostrar as mulheres como agentes de sua própria história no novo contexto.

Em outras situações, o expressivo número de migrantes da cidade foi alvo da atenção de pesquisadoras, mas a origem daqueles, que é diversificada ou não mencionada, não é o foco dos estudos realizados em Itabuna, na Bahia (GLÓRIA, 2011GLÓRIA, Priscila Santos da. Entre a roça e a cidade: trabalho, trajetórias e memórias de migrantes em Itabuna, BA (1960-1990). 2011. 158 f. Dissertação (Mestrado em História Regional e Local) - Universidade do Estado da Bahia, Santo Antônio de Jesus, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.ppghis.uneb.br/_dissertacoes/priscila_santos_da_gloria.pdf >. Acesso em: 16 jan. 2016.
http://www.ppghis.uneb.br/_dissertacoes/...
) e em Canoas, no Rio Grande do Sul ( PENNA & SILVA, 2005SILVA, Maria Aparecida de M. Contribuições metodológicas para a análise das migrações. In: DEMARTINI, Zeila de B.; TRUZZI, Oswaldo (Orgs.). Estudos migratórios: perspectivas metodológicas. São Carlos: EdUFSCar, 2005. p. 53-86.). A pesquisa com história oral nesta segunda cidade registrou aspectos de reconstrução de identidades individuais, principalmente pela participação social. Concluindo, há estudos sobre migrações nos quais a formulação de uma identidade coletiva não comparece, seja porque o fenômeno não se manifestou, seja porque não foi o objeto de estudo.

História e Ciências Sociais no estudo das migrações

Conforme afirma Carla Monteiro de Souza (2004SOUZA, Carla Monteiro de. História, memória e migração: processos de territorialização e estratégias de inserção entre migrantes gaúchos radicados em Roraima. 2004. 301 f. Tese (Doutorado em História) − Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS, 2004., p. 13), “o tema das migrações há pouco tempo figura nas preocupações dos historiadores, embora esteja consolidado e bastante bem estudado por outras ciências como a Geografia, a Demografia, a Sociologia, a Psicologia Social”. O fenômeno da migração em massa de nordestinos para a cidade de São Paulo, a partir da década de 1950, atraiu a atenção de sociólogos, os quais, ao interpretá-lo, desenvolveram a contraposição rural/industrialização, arcaico/moderno e assinalaram a passividade política dos novos operários migrantes. Essa visão “dualista” foi criticada nas décadas seguintes, quando se ampliaram os estudos das migrações internas (FONTES, 2004FONTES, Paulo. Migração nordestina e experiências operárias. São Miguel Paulista nos anos 1950. In: BATALHA, Cláudio H. M.; SILVA, Fernando T. da; FORTES, Alexandre. Culturas de classe: identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004. p. 363-402., p. 366-367), resgatando o protagonismo dos migrantes:

Os migrantes rurais nordestinos não eram apenas reflexo de forças econômicas determinadas externamente, embora estivessem imersos nela. Eles também foram agentes do seu próprio movimento e, dessa forma, por meio de estratégias diversas, contribuíram na moldagem do processo migratório (FONTES, 2004FONTES, Paulo. Migração nordestina e experiências operárias. São Miguel Paulista nos anos 1950. In: BATALHA, Cláudio H. M.; SILVA, Fernando T. da; FORTES, Alexandre. Culturas de classe: identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004. p. 363-402., p. 372).

Dessa produção relativamente mais recente sobre as migrações internas, tomando o tema da migração de gaúchos para outros lugares do país, podemos destacar, na área da Sociologia, a pesquisa de José Vicente Tavares dos Santos (1993SANTOS, José Vicente Tavares dos. Matuchos: exclusão e luta - do sul para a Amazônia. Petrópolis, Vozes, 1993.) sobre gaúchos que migraram para o Mato Grosso, e, na área da geografia, a de Rogério Haesbaert (1997HAESBAERT, Rogério. Des-territorialização e Identidade: a rede “gaúcha” no Nordeste. Niterói: EDUFF, 1997.), que estudou a rede “gaúcha” no Nordeste. A pesquisa de Tavares dos Santos, que deu visibilidade à experiência de um núcleo de colonização na Amazônia mato-grossense, mostra a relação entre colonos e companhias colonizadoras3 3 Com base na regulamentação do INCRA quanto à participação de cooperativas em Programas de Colonização da Amazônia, formou-se uma cooperativa em Tenente Portela, Rio Grande do Sul, que coordenou este projeto (SANTOS, 1993, p. 57). , e, mais especificamente, as frustrações ante as promessas e as dificuldades em “Terranova”, nome do local onde foram instaladas mais de 5.000 pessoas entre 1978 e 1980 (SANTOS, 1993, p. 126-130SANTOS, José Vicente Tavares dos. Matuchos: exclusão e luta - do sul para a Amazônia. Petrópolis, Vozes, 1993.). Os estereótipos nesses projetos de colonização foram fomentados pelas agências de colonização, cuja representação de “colono modelo” considerava os colonos originários do sul com um nível tecnológico e educacional mais elevado que os do Norte e Nordeste (SANTOS, 1993, p. 197SANTOS, José Vicente Tavares dos. Matuchos: exclusão e luta - do sul para a Amazônia. Petrópolis, Vozes, 1993.).

Neste campo interdisciplinar, um dos conceitos, aprimorado pela Geografia, bastante fecundo para os estudos históricos, é o de “território”, em sua acepção que considera que o território é concomitantemente apropriação simbólica e domínio político-econômico de um espaço socialmente partilhado; ou ainda “o território é uma construção histórica e, portanto, social, a partir das relações de poder (concreto e simbólico) que envolvem, concomitantemente, sociedade e espaço geográfico” (HAESBAERT, 2007HAESBAERT, Rogério; LIMONAD, Ester. O território em tempos de globalização. etc, espaço, tempo e crítica. Revista Eletrônica de Ciências Sociais Aplicadas e outras coisas, Niterói, v. 1, n. 2 (4), p. 39-52, 2007., p. 42). É este o sentido da noção que baliza a análise de uma festividade de migrantes maranhenses em Boa Vista (RR): “Ressaltamos também o papel da Festa como marcador de território, pois acontece no bairro que está na zona da cidade onde há a maior concentração de moradores oriundos do Maranhão” (SOUSA, 2014SOUSA, Celene Farias de. A autoafirmação da identidade de maranhense através da festa “o Maranhão é aqui”, comunidade São Raimundo Nonato, bairro Santa Luzia, Boa Vista/RR (2010-2013). Monografia para o Curso de Bacharelado e Licenciatura em História. Universidade Federal de Roraima, 2014., p. 53).

Se as pesquisas sobre migrações internas contemporâneas constituem estudos consolidados em outras disciplinas das Ciências Humanas, expressando-se em congressos, publicações especializadas e linhas de pesquisa institucionais41 4 Veja a presença da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, fundada na década de 1970. Disponível em; <http://www.abep.org.br/?q=a-abep>. , os historiadores, por sua vez, têm se aproximado do tema de modo bastante afirmativo e através de diferentes frentes: pela via das metodologias de história oral e história do tempo presente, pela via teórica da identidade, da territorialidade, do estigma, pelos campos de estudo da história do trabalho, dos processos de colonização e disputa de terras.

Há um fator institucional na ampliação desses estudos que diz respeito à difusão de universidades com cursos de História, eventualmente com Programas de Pós-Graduação, em regiões onde o fenômeno das migrações se mostra intenso nas últimas décadas, seja porque pesquisas sobre o tema são ali desenvolvidas, seja porque seus docentes levam o problema de pesquisa consigo para outros Programas de Pós-Graduação. Temos um exemplo com Carla Monteiro de Souza, que, após seu ingresso na Universidade Federal de Roraima (universidade implantada em 1989), desenvolveu sua dissertação de Mestrado na PUC/RS em 1997, sobre as migrações de gaúchos para Roraima. Várias monografias do curso de História da UFRR tratam do fenômeno das migrações, acompanhando, portanto, a notória presença dos migrantes no Estado: de acordo com levantamentos divulgados pela imprensa em 2011, a porcentagem de não nativos na população de Roraima é de 49% (SOUSA, 2014SOUSA, Celene Farias de. A autoafirmação da identidade de maranhense através da festa “o Maranhão é aqui”, comunidade São Raimundo Nonato, bairro Santa Luzia, Boa Vista/RR (2010-2013). Monografia para o Curso de Bacharelado e Licenciatura em História. Universidade Federal de Roraima, 2014., p. 17). Como exemplo, vejamos alguns títulos de estudos monográficos desenvolvidos em 2014 no Departamento de História da UFRR: Migrantes maranhenses e a formação do município de São Luiz - RR (1976-1982); A migração indígena em Boa Vista - RR: índios no bairro Cauamé, no período de 1990 a 2000; As implicações do processo migratório na formação do bairro Pintolândia IV, atual Senador Hélio Campos, na cidade de Boa Vista - Roraima, na década de 1990; As territorialidades dos paraibanos em Boa Vista - RR: uma leitura a partir da atividade comercial (1980-2014).5 5 UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA. Curso de História. Monografias defendidas no curso. Disponível em: <http://ufrr.br/historia/index.php?option=com_phocadownload&view=category&id=4&Itemid=204&limitstart=0>. Acesso em: 16 fev. 2016. O Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Amazonas possui uma linha de pesquisa denominada Migrações, Trabalho e Movimentos Sociais na Amazônia, no âmbito da qual foram produzidas algumas dissertações sobre migrações a partir de 2010. Criado em 2006, o Programa de Pós-Graduação em História Regional e Local da Universidade Estadual da Bahia já abrigou várias dissertações sobre o tema das migrações.6 6 Universidade Federal do Amazonas, Programa de Pós-Graduação em História. Disponível em: <http://www.ppgh.ufam.edu.br/pesquisa/linhas-de-pesquisa>. Acesso em: 29 jan. 2017. Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Pós-Graduação em História Regional e Local. Disponível em: <http://www.mestradohistoria.com.br/index.php?m=l&id=15>. Acesso em: 15 fev. 2017.

Nem toda migração conduz a uma identidade coletiva que estabeleça laços entre os oriundos de um lugar ou de lugares exteriores ao local para onde migraram. Ao analisar alguns casos, poderemos pensar em fatores que estimulam o surgimento de determinados “grupos” ou “comunidades”, não esquecendo que estes são “simultaneamente reais e construídos” (FENTON, 2003, p. 16FENTON, Steve. Etnicidade. Lisboa: Instituto Piaget, 2003.).

Migrações e identidades regionais: representações em movimento

Um grupo de migrantes para os quais as pesquisas assinalam hostilidade por parte do povo do lugar, como uma reação ao fato de aqueles conquistarem posições economicamente expressivas no universo produtivo local, é o dos “gaúchos”. Os gaúchos que migraram para Roraima tinham recursos próprios, e sua migração, que ocorreu com mais intensidade na década de 1980, teve um caráter espontâneo e contínuo, segundo a tese em História de Carla Monteiro de Souza (2004SOUZA, Carla Monteiro de. História, memória e migração: processos de territorialização e estratégias de inserção entre migrantes gaúchos radicados em Roraima. 2004. 301 f. Tese (Doutorado em História) − Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS, 2004., p. 36, 41, 177). Os marcadores regionais da memória dos gaúchos instalados em Roraima têm basicamente dois suportes, conforme o que foi colhido por entrevista: a) a cultura alemã e italiana, que incentivava a autossuficiência da economia familiar pela criação de animais domésticos e manutenção de hortas, tipificadas na figura do “colono”; b) o cultivo do tradicionalismo, que congrega diferentes povoadores do Rio Grande do Sul, que se expressa no consumo do chimarrão e na frequência ao CTG, Centro de Tradições Gaúchas, que, no caso de Boa Vista, é o CTG Nova Querência (SOUZA, 2004SOUZA, Carla Monteiro de. História, memória e migração: processos de territorialização e estratégias de inserção entre migrantes gaúchos radicados em Roraima. 2004. 301 f. Tese (Doutorado em História) − Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS, 2004., p. 41, 219-221).

A demarcação dos “gaúchos” também se dava de fora: num primeiro momento, o de estranhamento, a reação é negativa, como muro pichado com “fora gauchada” e a recepção pouco amigável que está presente na memória: “praticamente todos os narradores relataram sofrer algum tipo de rejeição, de desconfiança, de hostilidade nos seus primeiros tempos” (SOUZA, 2004SOUZA, Carla Monteiro de. História, memória e migração: processos de territorialização e estratégias de inserção entre migrantes gaúchos radicados em Roraima. 2004. 301 f. Tese (Doutorado em História) − Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS, 2004., p. 41, 222-223). Entretanto, essas animosidades não impediram a inserção profissional de muitos gaúchos, muitas vezes auxiliados por conterrâneos. A rede de relações entre esses migrantes é simbolicamente alicerçada na origem comum (gaúcha) e, na prática, garante acesso a espaços econômicos:

Os vestígios aparecem em quase todas as narrativas e mostram uma rede formada a partir de contatos pessoais, facilitada pela aglutinação propiciada pelo CTG, pelo relativo bom nível escolar e profissional dos que chegavam, que poderia abrir algumas portas, e pela solidariedade intrínseca aos grupos de pertença (SOUZA, 2004SOUZA, Carla Monteiro de. História, memória e migração: processos de territorialização e estratégias de inserção entre migrantes gaúchos radicados em Roraima. 2004. 301 f. Tese (Doutorado em História) − Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS, 2004., p. 271).

Ou seja, os elementos culturais que demarcam uma identidade estão presentes e visíveis por dentro e por fora do grupo dos gaúchos. A posição econômica relativamente autônoma do grupo e suas modalidades de coesão interna neutralizam as possibilidades de que a hostilidade ao forasteiro se transformasse em discriminação. Mesmo que não seja este o enfoque teórico escolhido pela autora, sua tese fornece descrições e interpretações que nos permitem vislumbrar um encontro étnico, pois, ainda que a população do lugar não seja tão visível na obra, ela atua na demarcação (uso de nominativos e classificações) dos “gaúchos” como um grupo socialmente distinto.

A dissertação de mestrado em História de Marilva Cavalcante (2011CAVALCANTE, Marilva B.. Por (de) trás das memórias: trajetórias de migrantes paraibanos na capital do feijão, 1960-1970. 2011. 174 f. Dissertação (Mestrado em História Regional e Local) - Universidade do Estado da Bahia, Santo Antônio de Jesus, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.mestradohistoria.com.br/imagens_sys/MARILVA_CAVALCANTE.pdf >. Acesso em 15 jan. 2016.
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), sobre populações que, nas décadas de 1960 e 1970, rumaram do sertão paraibano para Irecê, uma cidade da Bahia com desenvolvimento econômico baseado no plantio de feijão, traz alguns dados sobre a existência de fronteiras culturais entre os paraibanos e a sociedade envolvente. A cidade de Irecê foi destino migratório de indivíduos de vários estados do Nordeste, entre os quais predominavam os paraibanos; em conjunto, esses sujeitos eram chamados pelos ireceenses de “nortistas” (p. 24) ou “povo do Norte” (p. 127). Essa categoria unificadora não é associada, no relato da pesquisa, a uma representação que apontasse aos adventícios um lugar social à parte, em que pese alguns relatos que rememoram que, nos primeiros anos, foi difícil conviver com os baianos.

As entrevistas apontam práticas de reforço a uma identidade paraibana. Os novos migrantes eram recebidos por seus conterrâneos, mesmo que não fossem parentes, que lhes forneciam abrigo até que estivessem empregados (CAVALCANTE, 2011CAVALCANTE, Marilva B.. Por (de) trás das memórias: trajetórias de migrantes paraibanos na capital do feijão, 1960-1970. 2011. 174 f. Dissertação (Mestrado em História Regional e Local) - Universidade do Estado da Bahia, Santo Antônio de Jesus, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.mestradohistoria.com.br/imagens_sys/MARILVA_CAVALCANTE.pdf >. Acesso em 15 jan. 2016.
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, p. 79). Parte desses migrantes se estabeleceu coletivamente em um local específico da cidade, fixando moradia e cultuando valores e símbolos de suas raízes como alimentação, criação dos filhos, enlaces matrimoniais e outros. Essa prática de fixação desses sujeitos em um determinado espaço na cidade demarcou para esse ambiente o título de “Beco dos Paraibanos” (CAVALCANTE, 2011CAVALCANTE, Marilva B.. Por (de) trás das memórias: trajetórias de migrantes paraibanos na capital do feijão, 1960-1970. 2011. 174 f. Dissertação (Mestrado em História Regional e Local) - Universidade do Estado da Bahia, Santo Antônio de Jesus, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.mestradohistoria.com.br/imagens_sys/MARILVA_CAVALCANTE.pdf >. Acesso em 15 jan. 2016.
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, p. 38). Retorno periódico à Paraíba para rever amigos é outra forma de manutenção de uma identidade de origem (CAVALCANTE, 2011CAVALCANTE, Marilva B.. Por (de) trás das memórias: trajetórias de migrantes paraibanos na capital do feijão, 1960-1970. 2011. 174 f. Dissertação (Mestrado em História Regional e Local) - Universidade do Estado da Bahia, Santo Antônio de Jesus, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.mestradohistoria.com.br/imagens_sys/MARILVA_CAVALCANTE.pdf >. Acesso em 15 jan. 2016.
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, p. 47-48).

A leitura da dissertação permite inferir que houve, após alguns anos de instalação, uma simetria, em termos sociais, entre nativos e migrantes. Os estereótipos negativos do período inicial da migração eram recíprocos, como aparece em um depoimento: “Onde dissesse é da Bahia, era pra gente terra de macumbeiro. Já eles, nos viam como assassinos e daí que com o tempo acabou o medo da macumba e eles viram que não era nada disso” (CAVALCANTE, 2011CAVALCANTE, Marilva B.. Por (de) trás das memórias: trajetórias de migrantes paraibanos na capital do feijão, 1960-1970. 2011. 174 f. Dissertação (Mestrado em História Regional e Local) - Universidade do Estado da Bahia, Santo Antônio de Jesus, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.mestradohistoria.com.br/imagens_sys/MARILVA_CAVALCANTE.pdf >. Acesso em 15 jan. 2016.
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, p. 99). Mais tarde, baianos, paraibanos e outros migrantes passaram a conviver em alguns espaços de lazer (CAVALCANTE, 2011CAVALCANTE, Marilva B.. Por (de) trás das memórias: trajetórias de migrantes paraibanos na capital do feijão, 1960-1970. 2011. 174 f. Dissertação (Mestrado em História Regional e Local) - Universidade do Estado da Bahia, Santo Antônio de Jesus, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://www.mestradohistoria.com.br/imagens_sys/MARILVA_CAVALCANTE.pdf >. Acesso em 15 jan. 2016.
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, p. 108). Os relatos indicam que o objetivo econômico foi atingido e os entrevistados relutam em retornar à Paraíba, por mais que exteriorizem seu afeto pelo local de origem.

Há um mosaico de encontros populacionais no país. Como se configura, em termos de identificações, a presença concentrada de nordestinos em um bairro da cidade de São Paulo, no qual há uma grande fábrica onde eles trabalham? Sendo um estudo de história do trabalho, o autor demonstra, citando entrevistas, que as relações sociais tecidas desde os lugares de origem, além de outras desenvolvidas no bairro, eram a base para a coesão e solidariedade, bem como essenciais para a formação de uma identidade de classe, ou seja, contrariamente às interpretações dos primeiros estudos de migrantes, essas diferentes identidades de origem e de vizinhança não serviam de obstáculo a ações coletivas dentro das empresas (FONTES, 2004FONTES, Paulo. Migração nordestina e experiências operárias. São Miguel Paulista nos anos 1950. In: BATALHA, Cláudio H. M.; SILVA, Fernando T. da; FORTES, Alexandre. Culturas de classe: identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004. p. 363-402., p. 382).

E como se manifestavam as identidades regionais? Externamente, os migrantes eram denominados “baianos”, categoria que encobria e simplificava as diferenças entre eles e dava vazão ao estereótipo de pobreza, ignorância, propensão à violência atribuída ao grupo de nordestinos como um todo. Internamente, eles mantinham rivalidades regionais, mesmo estando longe de seus lugares de origem (FONTES, 2004FONTES, Paulo. Migração nordestina e experiências operárias. São Miguel Paulista nos anos 1950. In: BATALHA, Cláudio H. M.; SILVA, Fernando T. da; FORTES, Alexandre. Culturas de classe: identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004. p. 363-402., p. 389-390). O operário migrante, como mostra um depoimento, podia, por sua vez, alegar sua superioridade de trabalho com relação ao paulista e sua contribuição para o progresso da cidade (FONTES, 2004FONTES, Paulo. Migração nordestina e experiências operárias. São Miguel Paulista nos anos 1950. In: BATALHA, Cláudio H. M.; SILVA, Fernando T. da; FORTES, Alexandre. Culturas de classe: identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004. p. 363-402., p. 395). Se havia disposição da empresa (Nitro Química) em recrutar migrantes, particularmente nordestinos, e se eles eram destinados a um ambiente de trabalho perigoso e insalubre (FONTES, 2004FONTES, Paulo. Migração nordestina e experiências operárias. São Miguel Paulista nos anos 1950. In: BATALHA, Cláudio H. M.; SILVA, Fernando T. da; FORTES, Alexandre. Culturas de classe: identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004. p. 363-402., p. 375, 379-380), pode-se sugerir que as representações negativas dos “baianos”, conjugando a origem regional e o alegado comportamento social, endossavam a posição subalterna no trabalho fabril. Pesquisando a mesma região, Zona Leste de São Paulo, alguns anos depois, Valéria Barbosa de Magalhães (2013MAGALHÃES, Valéria Barbosa de. Nordestinos na Zona Leste: memórias e redes de migrantes. In: SANTHIAGO, R.; MAGALHÃES, V. B. (Orgs.). Depois da utopia. São Paulo: Letra e Voz, Fapesp, 2013. p. 227-258., p. 244) encontra também generalizações preconceituosas, estereótipos, que se referiam aos nordestinos como “baiano” e “cabeça chata”.

Tomemos essas duas pesquisas sobre migrantes nordestinos em uma zona da capital paulista para mostrar a fecundidade das teorias étnicas na interpretação do encontro entre grupos sociais distintos. Magalhães (2013MAGALHÃES, Valéria Barbosa de. Nordestinos na Zona Leste: memórias e redes de migrantes. In: SANTHIAGO, R.; MAGALHÃES, V. B. (Orgs.). Depois da utopia. São Paulo: Letra e Voz, Fapesp, 2013. p. 227-258., p. 245-247) interpreta a negativa de muitos em reconhecer a existência de preconceitos como “uma tentativa de esquecimento” ou a atribui a problemas na condução de algumas entrevistas.7 7 Os referenciais utilizados pela autora (MAGALHAES, 2013, p. 245, 253) são Elias e Scotson (internalização de estereótipos), Portes e Jensen (enclave étnico, para o subgrupo dos baianos) e Sayad ([i]migrante como força de trabalho supostamente provisória). Sem desconhecer essas variáveis, outra interpretação é possível a partir da resposta, recorrente em algumas entrevistas, “tinha muito nordestino aqui já”, a qual sugere que os nordestinos já haviam tomado o espaço, onde instalaram um “território”, no qual o preconceito externo perde força. Por sua vez, aquilo que a autora chama de “mecanismo de generalização”, gerador de estereótipos, remete às definições “globalizantes” ou etiquetas “englobantes” (POUTIGNAT; STREIFF-FENART, 1998POUTIGNAT, P.; STREIFF-FENART, J. Teorias da etnicidade . São Paulo: Editora da UNESP, 1998., p. 144-145), as quais, segundo a teoria da etnicidade, por serem “exo-definições”, tendem a ser excludentes ou pejorativas. Entretanto, nem toda exo-definição englobante tem caráter estigmatizante, desempenhando por vezes a “função simplificadora da categorização social”, tendo, inclusive, o efeito de “produzir uma solidariedade real entre as pessoas assim designadas”. Voltando aos estudos de Fortes e Magalhães, pode-se sugerir que as categorias “baianos” e “cabeça chata” são excludentes e recusadas, enquanto que a de “nordestino”, mesmo sublimando as diferenças internas entre os migrantes da periferia paulista, é uma categoria unificadora, um gentílico, utilizado pelos próprios autores.

Preconceito e mercado de trabalho estão fortemente vinculados na pesquisa de Marineide Ribeiro (2015RIBEIRO, Marineide da Silva. “A gente veio do interior sem saber muita coisa da capital”: vivências de paraenses interioranos em Manaus (1970-2014). 2015. 136 f. Dissertação (Mestrado em História) − Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2015.) sobre paraenses que migraram para Manaus entre 1970 e 2014. A implantação da Zona Franca de Manaus, na década de 1970, atraiu paraenses (60% da migração intrarregional) e também um expressivo contingente (15%) do Sudeste, a quem coube a liderança das fábricas do Distrito Industrial de Manaus (RIBEIRO, 2015RIBEIRO, Marineide da Silva. “A gente veio do interior sem saber muita coisa da capital”: vivências de paraenses interioranos em Manaus (1970-2014). 2015. 136 f. Dissertação (Mestrado em História) − Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2015., p. 16). Segundo a autora, as manifestações preconceituosas teriam sido ativadas com mais intensidade num período de crise econômica, a partir de 1990, e se traduziam em piadas e gracejos depreciativos por parte dos manauaras com relação aos paraenses. O que se tornou mais repetitivo foi caracterizar o paraense como “ladrão”, e, ativada a disputa, o amazonense passou a ser chamado de “preguiçoso” (RIBEIRO, 2015RIBEIRO, Marineide da Silva. “A gente veio do interior sem saber muita coisa da capital”: vivências de paraenses interioranos em Manaus (1970-2014). 2015. 136 f. Dissertação (Mestrado em História) − Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2015., p. 29). Por trás dessas altercações, estaria a disputa por vagas de trabalho na cidade, num momento em que elas escassearam (RIBEIRO, 2015RIBEIRO, Marineide da Silva. “A gente veio do interior sem saber muita coisa da capital”: vivências de paraenses interioranos em Manaus (1970-2014). 2015. 136 f. Dissertação (Mestrado em História) − Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2015., p. 33). Buscando dignificar os paraenses, um entrevistado constrói uma curiosa genealogia, na qual desloca o preconceito para os amazonenses por suas origens indígenas.

Não é que o amazonense seja preguiçoso, mas a cultura dele não é tá trabalhando tanto. Já o paraense, ele veio pra cá pra trabalhar, e também porque o paraense, a descendência dele é nordestina, e a descendência do amazonense é local, é dos indígenas, [...]. Do Pará é uma descendência nordestina ou é do Sul. [...] ou seja, só gente que trabalha muito, né? O pessoal do Sul é descendente de alemães e italianos, que trabalham muito com a agricultura. O pessoal do Nordeste é descendente de escravos, negros, que são povo trabalhador (RIBEIRO, 2015RIBEIRO, Marineide da Silva. “A gente veio do interior sem saber muita coisa da capital”: vivências de paraenses interioranos em Manaus (1970-2014). 2015. 136 f. Dissertação (Mestrado em História) − Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2015., p. 38).

Os paraenses também organizam festas que são descritas pela autora como “estratégias de resistência para terem o direito à cidade”, e espaços de culinária paraense (RIBEIRO, 2015RIBEIRO, Marineide da Silva. “A gente veio do interior sem saber muita coisa da capital”: vivências de paraenses interioranos em Manaus (1970-2014). 2015. 136 f. Dissertação (Mestrado em História) − Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2015., p. 48, 55). A dissertação de Marineide Ribeiro (2015RIBEIRO, Marineide da Silva. “A gente veio do interior sem saber muita coisa da capital”: vivências de paraenses interioranos em Manaus (1970-2014). 2015. 136 f. Dissertação (Mestrado em História) − Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2015., p. 29) está bem ancorada na história social e história cultural, por exemplo, utilizando a figura do riso de Mikhail Bakhtin para explicar as manifestações jocosas. Entretanto, é possível complementar a análise e propor que na cidade de Manaus ocorre a construção de sujeitos étnicos, sendo a citação acima bastante emblemática.

Vários elementos já comentados comparecem em uma pesquisa de doutorado em Estudos Interdisciplinares em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social (UFRJ), que analisa migrantes alagoanos, desalojados de áreas rurais no Nordeste, que se inseriram como operários em fábricas de sardinha ou no extrativismo do mexilhão em um bairro do município de Niterói (RJ). Tendo por moradia barracos instalados em lugares alagáveis, sobreocupados e com precárias condições sanitárias, os nordestinos causavam insatisfação às famílias tradicionais do bairro, expressa em uma categoria que os (des)identificava como “paraíbas”, e também como “sem-terra” que poderiam tomar a casa dos residentes (RITTER, 2013RITTER, Paula. “Da favela a Alphaville”: memórias de migrantes alagoanos em Jurujuba, Niterói (RJ). História Oral , v. 16, n. 1, p. 189-207, jan./jun. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://revista.historiaoral.org.br/index.php?journal=rho&page=article&op=view&path%5B%5D=279 >. Acesso em: 24 abr. 216.
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, p. 199-201). Entretanto, um projeto governamental, Mexilhão Rio, que previa a substituição da extração do marisco por seu cultivo, no qual os migrantes se engajaram, possibilitou sua ascensão e reconhecimento social, o que se manifesta, entre outros aspectos, na possibilidade de nordestinos serem vistos como cônjuges para moças do local (RITTER, 2013RITTER, Paula. “Da favela a Alphaville”: memórias de migrantes alagoanos em Jurujuba, Niterói (RJ). História Oral , v. 16, n. 1, p. 189-207, jan./jun. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://revista.historiaoral.org.br/index.php?journal=rho&page=article&op=view&path%5B%5D=279 >. Acesso em: 24 abr. 216.
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, p. 204). A representação social, portanto, alterou-se com a mudança econômica.

O contexto é analisado pela autora pelo recurso à noção de estigma com base em Erving Goffman e Póvoa Neto (coordenador do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Migratórios da UFRJ), pelo esquema estabelecidos/outsiders de Elias e Scotson, pela vinculação estreita entre migrante e trabalho de Abdelmalek Sayad, e através de autores que abordam o tema da identidade e da memória coletiva. Para explicar que “o estigma regional é transferido por mecanismos sociais”, a base da autora é Bourdieu (RITTER, 2013RITTER, Paula. “Da favela a Alphaville”: memórias de migrantes alagoanos em Jurujuba, Niterói (RJ). História Oral , v. 16, n. 1, p. 189-207, jan./jun. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://revista.historiaoral.org.br/index.php?journal=rho&page=article&op=view&path%5B%5D=279 >. Acesso em: 24 abr. 216.
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, p. 200). Poderíamos sugerir a noção de “atribuição categórica” de Barth (1998BARTH, Fredrik. Grupos étnicos e suas fronteiras [1969]. In: POUTIGNAT, P.; STREIFF-FENART, J. Teorias da etnicidade. São Paulo: UNESP, 1998. p. 187-227.), com potencial hermenêutico para explicar porque exo-atribuições (“paraíbas”) tendem a ser negativas e excludentes.

A origem regional associada à segmentação salarial apareceu em estudos paralelos sobre usinas de produção de açúcar na região de Ribeirão Preto (SP) e na Zona da Mata (PE). A existência de alojamentos diferenciados para mineiros, baianos, paraibanos, pernambucanos etc., está ligada ao pagamento de salários diferenciados, ou seja, à diminuição do preço da força de trabalho. Para a autora da pesquisa, a socióloga Maria Aparecida Silva (2005SILVA, Maria Aparecida de M. Contribuições metodológicas para a análise das migrações. In: DEMARTINI, Zeila de B.; TRUZZI, Oswaldo (Orgs.). Estudos migratórios: perspectivas metodológicas. São Carlos: EdUFSCar, 2005. p. 53-86., p. 63-64), no Estado de São Paulo o estigma contra os trabalhadores de fora, considerados “baianos”, e imagens preconceituosas de mineiros camuflam preconceitos contra negros e mestiços, contribuindo para a segmentação racial/étnica do trabalho. Esse estudo, onde também está presente a referência a Póvoa Neto por sua relação migrante-estigma, indica a possibilidade de uma aproximação com Wallerstein (2011WALLERSTEIN, Immanuel. Capitalismo histórico e civilização capitalista. Rio de Janeiro: Contraponto Editora, 2011., p. 66-67), para quem sempre houve “alta correlação entre etnicidade e papel ocupacional/econômico nas várias áreas espaço-temporais do capitalismo histórico”. A etnicização da força de trabalho nessas usinas não ocorreria apenas em função das distinções raciais, mas as próprias diferenciações regionais podem operar como “conjunto particular de padrões de comportamento cotidiano”, que Wallerstein associa aos grupos étnicos, os quais preenchem a função, tão vital para o capital, de prover uma quantidade suficiente de trabalhadores em cada categoria, com expectativas de renda apropriadas.

Se acima foi cogitado que a autonomia ou a simetria social e econômica podem ser fatores neutralizantes de visões negativas de um grupo sobre outro, tomemos agora, para contraponto, o mesmo estado de Roraima, onde se instalaram os gaúchos, sob o ponto de vista dos maranhenses, os quais corresponderiam a 21% de toda população migrante de Roraima e seriam discriminados por sua condição de pobreza. Vários dos relatos colhidos para um Trabalho de Conclusão de Curso em História falam de discriminação, desvalorização e mesmo em violência; piadas generalizantes e depreciativas sobre maranhenses enviadas até mesmo por redes sociais, nominação de “macumbeiro” dita de modo preconceituoso (SOUSA, 2014SOUSA, Celene Farias de. A autoafirmação da identidade de maranhense através da festa “o Maranhão é aqui”, comunidade São Raimundo Nonato, bairro Santa Luzia, Boa Vista/RR (2010-2013). Monografia para o Curso de Bacharelado e Licenciatura em História. Universidade Federal de Roraima, 2014., p. 40). A pesquisa em questão aborda também uma bem-sucedida ação cultural que visava “valorizar a pessoa maranhense” (p. 41), desenvolvida no bairro Santa Luzia, na zona oeste da capital Boa Vista, região que concentra migrantes maranhenses e onde está localizada uma igreja católica dedicada ao santo padroeiro de algumas cidades do Maranhão, São Raimundo Nonato. Nessa comunidade católica, a partir de 2010, ocorre o arraial “O Maranhão é Aqui”, organizado por migrantes maranhenses e apresentando aspectos culturais daquele estado (SOUSA, 2014SOUSA, Celene Farias de. A autoafirmação da identidade de maranhense através da festa “o Maranhão é aqui”, comunidade São Raimundo Nonato, bairro Santa Luzia, Boa Vista/RR (2010-2013). Monografia para o Curso de Bacharelado e Licenciatura em História. Universidade Federal de Roraima, 2014., p. 10). Mesmo sendo uma festividade vinculada a uma paróquia religiosa, os elementos católicos (o evento, em junho, festeja São João) convivem com aqueles associados aos maranhenses, principalmente o bumba-meu-boi e o reggae (SOUSA, 2014SOUSA, Celene Farias de. A autoafirmação da identidade de maranhense através da festa “o Maranhão é aqui”, comunidade São Raimundo Nonato, bairro Santa Luzia, Boa Vista/RR (2010-2013). Monografia para o Curso de Bacharelado e Licenciatura em História. Universidade Federal de Roraima, 2014., p. 43).

Com isso, o arraial dos maranhenses - “O Maranhão é Aqui!” -, funciona como uma estratégia de identidade, pois eles estão “manobrando” a situação do preconceito para mostrar e fortalecer os seus laços identitários. Acreditamos que a partir do momento que acontece esse fortalecimento, e a valorização desta identidade, a Festa mostra para os demais maranhenses que é importante repensar esta situação de “inferioridade”. Mostra também para a sociedade boa-vistense que os migrantes maranhenses não se acomodam diante do preconceito e do estereótipo que se expressam de várias formas, como nas piadas (SOUSA, 2014SOUSA, Celene Farias de. A autoafirmação da identidade de maranhense através da festa “o Maranhão é aqui”, comunidade São Raimundo Nonato, bairro Santa Luzia, Boa Vista/RR (2010-2013). Monografia para o Curso de Bacharelado e Licenciatura em História. Universidade Federal de Roraima, 2014., p. 53).

Em termos da prática da história oral, há que anotar que essa pesquisa se insere naquilo que os sociólogos denominam “metodologias participativas” (THIOLENT, 2006THIOLENT, Michel. A inserção da pesquisa-ação no contexto da extensão universitária. In: BRANDÂO, Carlos R.; STRECK, Danilo R. Pesquisa participante: a partilha do saber. Aparecida: Ideias e Letras, 2006. p. 151-165.), uma vez que a autora do trabalho estava envolvida com o projeto Cartografia dos Maranhenses no Bairro Santa Luzia, subprojeto do Programa Nova Cartografia Social da Amazônia, elaborado no Departamento de Ciências Sociais da UFRR, tendo colhido alguns relatos durante os minicursos e oficinas do projeto (SOUSA, 2014SOUSA, Celene Farias de. A autoafirmação da identidade de maranhense através da festa “o Maranhão é aqui”, comunidade São Raimundo Nonato, bairro Santa Luzia, Boa Vista/RR (2010-2013). Monografia para o Curso de Bacharelado e Licenciatura em História. Universidade Federal de Roraima, 2014., p. 14). Analiticamente, a noção de identidade foi das mais comentadas, com base em Stuart Hall e nos antropólogos Cardoso de Oliveira e Ruben Oliven, além de autores que fizeram pesquisas sobre identidades de migrantes.

Uma pesquisa que trata explicitamente sobre a etnicização do migrante maranhense é a tese de doutoramento de Idelma Santiago da Silva (2010SILVA, Idelma Santiago da. Fronteira cultural: a alteridade maranhense no sudeste do Pará (1970-2008). 2010. 230 f. Tese (Doutorado em História) − Programa de Pós-Graduação em História. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2010., p. 12), cujo objetivo foi buscar as “condições sócio-históricas que torna(ra)m possível a construção do maranhense como categoria étnica no sudeste do Pará, na segunda metade do século XX e início do século XXI”. Empreendimentos econômicos (carvoarias e desmatamento, produção de celulose, fazendas de gado) provocaram expulsões no Maranhão, gerando migrações das pessoas desapossadas (SILVA, 2010SILVA, Idelma Santiago da. Fronteira cultural: a alteridade maranhense no sudeste do Pará (1970-2008). 2010. 230 f. Tese (Doutorado em História) − Programa de Pós-Graduação em História. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2010., p. 109-110). Essas populações migrantes serão associadas a analfabetismo, doenças, prostituição, violência. Os estereótipos vão se constituindo de várias formas: anedotas, frases conhecidas, blogue contra maranhenses.

Esse estudo é apropriado para demonstrar que a categoria étnica, “maranhense”, pode adotar um nome regional ou gentílico (“maranhense”), mesmo que os indivíduos abrangidos pela categoria não correspondam estritamente a uma mesma origem regional. No sudoeste do Pará há um conjunto de “pioneiros” egressos do Maranhão que se contrapuseram aos índios (SILVA, 2010SILVA, Idelma Santiago da. Fronteira cultural: a alteridade maranhense no sudeste do Pará (1970-2008). 2010. 230 f. Tese (Doutorado em História) − Programa de Pós-Graduação em História. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2010., p. 27) e que, entretanto, mantêm uma diferenciação com relação às novas levas de “maranhenses”, compostas por migrantes das camadas subalternas, em busca de terras livres ou ocupações diversas, oriundos do Maranhão, mas também do Piauí e norte de Goiás. Sendo uma representação, categorias étnicas não têm contornos precisos, constituindo tarefa do pesquisador buscar seus significados. Assim, “maranhense” no sudeste do Pará não inclui todos os maranhenses, principalmente aqueles da denominada frente pioneira, e nem exclui outros migrantes, especialmente nordestinos. É uma categoria que tem passado a nomear, difusamente, qualquer indivíduo ou grupo social de migrantes considerados desqualificados e que também “são alvo de atribuições identitárias étnico-culturais, especialmente remetidas a afro-descendência (práticas culturais e elementos do fenótipo), construídas sob bases discricionárias” (SILVA, 2010SILVA, Idelma Santiago da. Fronteira cultural: a alteridade maranhense no sudeste do Pará (1970-2008). 2010. 230 f. Tese (Doutorado em História) − Programa de Pós-Graduação em História. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2010., p. 153).8 8 A discriminação de afro-indígenas maranhenses iniciou-se no próprio Maranhão, principalmente quando houve empreendimento editorial para apoio ao projeto de criar o estado do Maranhão do Sul (SILVA, 2010, p. 73).

Contrapondo-se a estas exo-categorizações, Idelma Silva encerra sua pesquisa com as entrevistas feitas em um núcleo urbano de Marabá, separado do restante da cidade pelo rio Tocantins. Resgata, com os mais velhos, a convivência entre os migrantes e índios Gaviões, antigos ocupantes da região. E com os jovens vinculados ao Grupo de Ação Cultural de São Félix (GAC), observou uma pauta de identidade negra que “fez a inversão de uma representação de suposta identidade negra do bairro, externamente atribuída, mas que vinha impingida de uma conotação pejorativa, para tomá-la como uma diferença capaz de referenciar seus sentidos de identidade, por exemplo, nos signos inscritos no corpo, nas performances da dança e nos temas das obras artísticas e atividades” (SILVA, 2010SILVA, Idelma Santiago da. Fronteira cultural: a alteridade maranhense no sudeste do Pará (1970-2008). 2010. 230 f. Tese (Doutorado em História) − Programa de Pós-Graduação em História. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2010., p. 186). Como outros pesquisadores, Idelma se ampara em Goffman, Helion Póvoa Neto, e também nas historiadoras Olga Cabrera e Isabel Guillen, além de outros autores. A destacar, o recurso, para teorização étnica, ao livro dos autores franceses Philippe Poutignat e Jocelyne Streiff-Fenart.

Segundo a autora, os antagonismos e conflitos são ativados não apenas pela migração e pelas relações entre os diferentes no novo espaço, “mas especialmente pela disputa em torno da apropriação e domínio do território e seus recursos” (SILVA, 2010SILVA, Idelma Santiago da. Fronteira cultural: a alteridade maranhense no sudeste do Pará (1970-2008). 2010. 230 f. Tese (Doutorado em História) − Programa de Pós-Graduação em História. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2010., p. 25).

A disputa pelo território e a assimetria entre grupos sociais em contato se manifestam de modo agudo quando um campesinato negro vê suas terras serem cobiçadas por grandes agricultores. No início do século XX, no planalto gaúcho, um conjunto de famílias negras se territorializou em uma área denominada Sítio Novo/Linha Fão, cedida por um grande proprietário, antigo escravista (AGUILAR, 2012AGUILAR, Maria do Carmo. Famílias negras no planalto médio do Rio Grande do Sul (1940-1960): terra, migração e relações familiares. 2012. 203 f. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012., p. 60). Entre as décadas de 1940 e 1960, com a especulação fundiária e com o incentivo ao desenvolvimento da produção agrícola (soja), direcionada ao mercado internacional, ocorre a expropriação de camponeses e a usurpação de terras de lavradores pobres (AGUILAR, 2012AGUILAR, Maria do Carmo. Famílias negras no planalto médio do Rio Grande do Sul (1940-1960): terra, migração e relações familiares. 2012. 203 f. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012., p. 97, 100). Maria do Carmo Aguilar acessa, por meio de entrevistas, a memória de um grupo familiar que, desalojado da Linha Fão, vive um período de itinerância, até instalar-se em Rincão dos Caixões (Jacuizinho/RS), em área doada em 1960 por um jovem proprietário da região (AGUILAR, 2012AGUILAR, Maria do Carmo. Famílias negras no planalto médio do Rio Grande do Sul (1940-1960): terra, migração e relações familiares. 2012. 203 f. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012., p. 18). Estamos diante de um grupo de famílias negras que se desterritorializou, migrou e se reterritorializou; nesse novo espaço, essas famílias buscam a titularidade de suas terras, enfrentando, novamente, a hostilidade de proprietários mais poderosos. Entretanto, o grupo tem a seu favor, além de um arcabouço legal para demandar a posse da terra, sua história e sua memória, consolidadas por seus laços de parentesco, em suma, sua identidade social.

A cidade de Jaraguá do Sul, no interior de Santa Catarina, protagoniza uma situação muita específica, pois reúne 1) uma população negra, 2) migrantes genericamente denominados “paranaenses” e 3) os habitantes dominantes na cidade que cultivam uma ancestralidade dita germânica e hostilizam os outros dois grupos. Ancelmo Schörner (2006SCHÖRNER, Ancelmo. A Pedra, o Migrante e o Morro: feridas narcísicas no coração de Jaraguá do Sul/SC - 1980-2000. 2006. 228 f. Tese (Doutorado em História) − Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006.), que nos apresenta esse quadro em uma tese de doutoramento em História, buscou as origens históricas dessa configuração peculiar, as quais remontam a 1870 quando o engenheiro Emilio Jourdan, amigo do Conde d’Eu e da Princesa Isabel, recebeu terras na região e ali instalou negros como trabalhadores livres (SCHÖRNER, 2006SCHÖRNER, Ancelmo. A Pedra, o Migrante e o Morro: feridas narcísicas no coração de Jaraguá do Sul/SC - 1980-2000. 2006. 228 f. Tese (Doutorado em História) − Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006., p. 23). Os trabalhadores negros, primitivos habitantes da região, foram sistematicamente expulsos das regiões centrais do que hoje é Jaraguá do Sul, seja quando o Estabelecimento Jaraguá fechou (1884) e os deixou sem lugar para ficar e sem pagamento; e depois, no início do século XX, quando foram expulsos por ordem judicial conseguida pelos proprietários da companhia que comprou as terras que haviam pertencido a Jourdan (SCHÖRNER, 2006SCHÖRNER, Ancelmo. A Pedra, o Migrante e o Morro: feridas narcísicas no coração de Jaraguá do Sul/SC - 1980-2000. 2006. 228 f. Tese (Doutorado em História) − Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006., p. 172, 174). Eles passaram então a ocupar o morro Boa Vista, o qual, em uma atribuição étnica externa (negativa), era chamado de Morro África. Já os imigrantes (húngaros, alemães e italianos) chegaram a partir da década de 1890 (SCHÖRNER, 2006SCHÖRNER, Ancelmo. A Pedra, o Migrante e o Morro: feridas narcísicas no coração de Jaraguá do Sul/SC - 1980-2000. 2006. 228 f. Tese (Doutorado em História) − Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006., p. 23-24); porém, segundo o autor, “nunca houve espaços eminentemente alemães em Jaraguá do Sul. Pode-se dizer que o que sempre existiu foi um mosaico étnico e cultural, composto de negros, húngaros, italianos, poloneses e alemães” (p. 103); portanto, estamos diante de uma “pretensa cidade alemã”.

É nesse quadro social que levas de migrantes paranaenses em busca de mercado de trabalho passam a ser inseridas a partir da década de 1980. A eles coube o Morro da Pedra. Para explicar o preconceito com relação aos paranaenses, Schörner (2006SCHÖRNER, Ancelmo. A Pedra, o Migrante e o Morro: feridas narcísicas no coração de Jaraguá do Sul/SC - 1980-2000. 2006. 228 f. Tese (Doutorado em História) − Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006., p. 97) aponta que sua chegada coincide com o crescimento da cidade, o que torna visível a pobreza e as desigualdades sociais dos morros e dos bairros periféricos. Aqui também se manifesta o fenômeno do englobamento que recusa a reconhecer diferenças, pois o termo descritivo “paranaense” passou a ser aplicado para todo aquele que vem de fora, mesmo que uma parcela dos migrantes não seja oriunda do Paraná (SCHÖRNER, 2006SCHÖRNER, Ancelmo. A Pedra, o Migrante e o Morro: feridas narcísicas no coração de Jaraguá do Sul/SC - 1980-2000. 2006. 228 f. Tese (Doutorado em História) − Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006., p. 121). Atribuir um rótulo negativo aos de fora é uma forma de preservar imaginariamente o núcleo de uma identidade jaraguaense original: a das populações que habitam as terras planas do centro da cidade (SCHÖRNER, 2006SCHÖRNER, Ancelmo. A Pedra, o Migrante e o Morro: feridas narcísicas no coração de Jaraguá do Sul/SC - 1980-2000. 2006. 228 f. Tese (Doutorado em História) − Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006., p. 98).

Nessa tese, o referencial étnico (identidade e pertença étnica), com base em Poutignat e Streiff-Fenart, está presente, ainda que não seja predominante. Também aqui temos as noções pares estabelecidos/outsiders de Elias e Scotson, e Goffman está citado com seu livro sobre estigma.

Voltando ao estado do Rio Grande do Sul, podemos observar modos de expressão de alteridade desenvolvidos por migrantes que se deslocaram para cidades portadoras de identidades locais calcadas em sua herança da colonização europeia do século XIX. Duas dissertações de mestrado desenvolvidas em universidades do sul do Brasil abordaram fenômenos similares: o reforço da identidade regional “gaúcha” por parte dos migrantes (em geral de cidades vizinhas) que se instalaram em cidades onde há um matiz étnico acentuado em parte da população, Santa Cruz do Sul, cidade “alemã”, e Caxias do Sul, referência principal da identidade italiana no Rio Grande do Sul. Na pesquisa em Santa Cruz (ALMEIDA, 2008ALMEIDA, Carina Santos de. A representação juvenil do desenvolvimento regional: estudo de caso em Santa Cruz do Sul/RS. 2008. 267 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) − Universidade de Santa Cruz do Sul, UNISC, 2008.), a ênfase foi a identidade juvenil, tendo os jovens sido percebidos como portadores de uma fraca identidade local e uma forte identidade regional gaúcha. O sentimento de não pertencimento local dos jovens migrantes é atribuído, principalmente, à associação da cidade com a cultura germânica; por contraponto, o povo gaúcho é visto como guerreiro e trabalhador (ALMEIDA, 2008ALMEIDA, Carina Santos de. A representação juvenil do desenvolvimento regional: estudo de caso em Santa Cruz do Sul/RS. 2008. 267 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) − Universidade de Santa Cruz do Sul, UNISC, 2008., p. 134, 137). Quanto aos trabalhadores das empresas metal mecânicas de Caxias do Sul, entre as décadas de 1980 e 2000, Bolivar Kieling (2015) resgatou, por meio de entrevistas, o processo de formação dos Centros de Tradições Gaúchas vinculados às empresas. Sendo os agentes desse processo, em sua grande maioria, migrantes que se deslocaram à cidade em busca dos postos fabris, é de se supor que eles buscaram na identidade regional “gaúcha” um modo próprio de sociabilidade, distinto, por consequência, da ênfase à italianidade existente na cidade.

Anotações conclusivas

Esta pesquisa destacou a frequente geração de preconceitos que se dá sem demora quando migrantes aportam em lugares onde existem grupos sociais já instalados; entretanto, ela também enunciou que as populações que migram podem atrair dois sentidos: um positivado, calcado na ideia de “pioneiro”, e um negativado, que remete a migrantes pobres, com frequência considerados como uma população indesejada. Nem todos os casos analisados aqui seguem o “padrão verificado em estudos sobre migração, segundo o qual os migrantes acabam por se dedicar a atividades menos qualificadas e por ocupar áreas menos valorizadas” (RITTER, 2013RITTER, Paula. “Da favela a Alphaville”: memórias de migrantes alagoanos em Jurujuba, Niterói (RJ). História Oral , v. 16, n. 1, p. 189-207, jan./jun. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://revista.historiaoral.org.br/index.php?journal=rho&page=article&op=view&path%5B%5D=279 >. Acesso em: 24 abr. 216.
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, p. 198), mas, onde isso ocorreu, foi constante o surgimento de representações com entonações depreciativas, que expressam uma dada reação às novas configurações sociais e econômicas. As desigualdades regionais em nosso país motivam as populações a se pôr em movimento, e as diferenças culturais dos grupos que entram em contato podem servir para classificações de poder.

A grande maioria dos estudos migratórios trata da questão do trabalho, dos modos de instalação e sobrevivência, econômica e social, no novo território, pois a busca de postos de trabalho ou terra constitui, justamente, o grande motivador das migrações. Os problemas decorrentes dos minifúndios estiveram na base da migração de camponeses de Tenente Portela (RS) para a Amazônia Legal (SANTOS, 1993, p. 68SANTOS, José Vicente Tavares dos. Matuchos: exclusão e luta - do sul para a Amazônia. Petrópolis, Vozes, 1993.). Paulo Fontes (2004FONTES, Paulo. Migração nordestina e experiências operárias. São Miguel Paulista nos anos 1950. In: BATALHA, Cláudio H. M.; SILVA, Fernando T. da; FORTES, Alexandre. Culturas de classe: identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004. p. 363-402., p. 367), todavia, alerta que “a análise das influências do processo migratório na formação da classe trabalhadora brasileira ainda carece de maior pesquisa e sistematização”.

A partir dos casos analisados, podemos operar a categoria de simetria/assimetria entre o migrante e o seu entorno no lugar de chegada. Há casos, dos quais os “gaúchos” são os mais recorrentes, em que os adventícios em poucos anos adquirem uma proeminência na região onde se instalam; em uma situação intermediária, os migrantes atingem uma autonomia, com contato relativo com outras populações (paraibanos na Bahia, alagoanos em Niterói); e há situações em que os migrantes constituem uma mão de obra assalariada dependente dos empregos da região ou vivem em condição de subemprego (nordestinos em São Paulo, paraenses em Manaus, maranhenses no Pará, paranaenses em Santa Catarina). A questão que este artigo se propôs analisar foi a relação entre as classificações identitárias, ou melhor, as conotações assumidas por essas classificações, e as posições dos migrantes na estrutura social que encontraram. As pesquisas com entrevistas nos relataram inúmeros termos depreciativos, frases ou anedotas que cunhavam representações, pichações provocativas, portanto, várias formas de enquadrar aquele a quem se quer inferior, por ser estranho. Para além de uma reação aos forasteiros, essas imagens defendiam, pleiteavam (para si) ou indicavam (ao outro) determinadas posições no mercado de trabalho ou no espaço da cidade; em outras palavras, pode-se dizer que “as classificações práticas estão sempre subordinadas a funções práticas e orientadas para a produção de efeitos sociais” (BOURDIEU, 1989BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Lisboa: DIFEL, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989., p. 112).

Quanto ao potencial da teoria étnica para contribuir com os estudos migratórios, o que pode ser observado é que seus referenciais não substituem os que têm sido utilizados (estigma, território, identidade etc.), mas podem auxiliar, principalmente quando os grupos sociais em contato estiverem em posições econômicas não simétricas. É possível, portanto, evitar a contradição enunciada por Idelma Silva (2010SILVA, Idelma Santiago da. Fronteira cultural: a alteridade maranhense no sudeste do Pará (1970-2008). 2010. 230 f. Tese (Doutorado em História) − Programa de Pós-Graduação em História. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2010., p. 145), que entende que o “maranhense não compõe um grupo étnico”, ao mesmo tempo em que discute sua construção como uma categoria étnica. Os estudos de migrações podem se beneficiar da ótica do contato interétnico, que privilegia a dinâmica interno/externo na análise das identidades, complementando as pesquisas das formas endógenas de construção da identidade do migrante.

É possível, portanto, valorizar o aporte da etnicidade em estudos migratórios, mantendo a habilidade de apreciar outras modalidades de diferença e evitando a suposição que a comunidade étnica ou a identificação étnica sejam inevitáveis (FOX; JONES, 2013FOX, Jon E.; JONES, Demelza. Migration, everyday life and the ethnicity bias. Ethnicities, v. 13, n. 4, p. 385-400, 2013., p. 386).

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  • WALLERSTEIN, Immanuel. Capitalismo histórico e civilização capitalista Rio de Janeiro: Contraponto Editora, 2011.

Notas

  • 9
    Regina WEBER. Professora titular do Departamento de História e do Programa de Pós-Graduação em História da UFRGS. Av. Bento Gonçalves, 9500 - Prédio 4331, sala 116. CEP: 91.509-900 - Porto Alegre/RS. Este artigo é resultado do projeto de pesquisa “Identidade e relações sociais: cultura e economia em diferentes contextos históricos”, financiamento CNPq/PIBIC.
  • 1
    “O material básico resultante dessa investigação compreende cerca de duas centenas de horas de entrevista gravadas no Mato Grosso, no Pará, no Maranhão, em Goiás e em Rondônia [...]” (MARTINS, 1997, p. 17).
  • 2
    Em pesquisa em cidades do Mato Grosso próximas ao limite com o Pará, Regina Guimarães descobriu que “sob o manto do alardeado progresso, há sangue, tortura, trabalho escravo e muita pressão dos grupos sociais pelo acesso a terra” (GUIMARÃES NETO, 2006, p. 61).
  • 3
    Com base na regulamentação do INCRA quanto à participação de cooperativas em Programas de Colonização da Amazônia, formou-se uma cooperativa em Tenente Portela, Rio Grande do Sul, que coordenou este projeto (SANTOS, 1993, p. 57).
  • 4
    Veja a presença da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, fundada na década de 1970. Disponível em; <http://www.abep.org.br/?q=a-abep>.
  • 5
    UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA. Curso de História. Monografias defendidas no curso. Disponível em: <http://ufrr.br/historia/index.php?option=com_phocadownload&view=category&id=4&Itemid=204&limitstart=0>. Acesso em: 16 fev. 2016.
  • 6
    Universidade Federal do Amazonas, Programa de Pós-Graduação em História. Disponível em: <http://www.ppgh.ufam.edu.br/pesquisa/linhas-de-pesquisa>. Acesso em: 29 jan. 2017. Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Pós-Graduação em História Regional e Local. Disponível em: <http://www.mestradohistoria.com.br/index.php?m=l&id=15>. Acesso em: 15 fev. 2017.
  • 7
    Os referenciais utilizados pela autora (MAGALHAES, 2013, p. 245, 253) são Elias e Scotson (internalização de estereótipos), Portes e Jensen (enclave étnico, para o subgrupo dos baianos) e Sayad ([i]migrante como força de trabalho supostamente provisória).
  • 8
    A discriminação de afro-indígenas maranhenses iniciou-se no próprio Maranhão, principalmente quando houve empreendimento editorial para apoio ao projeto de criar o estado do Maranhão do Sul (SILVA, 2010, p. 73).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Jun 2018
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    19 Fev 2017
  • Aceito
    03 Set 2017
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