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“Proteção à francesa”: A imprensa Luso-brasileira na defesa do Império Português (1808-1811)

“French Protection”: the luso-brazilian press in the defense of the Portuguese Empire (1808-1811)

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo analisar panfletos políticos e notícias de jornal publicadas em Portugal e no Rio de Janeiro durante o período de ocupação francesa do Reino (entre 1808 e 1811), ressaltando como esses dois tipos de publicação utilizavam uma linguagem muito semelhante, apesar da diferença da sua natureza. Caracterizando-se como publicações que procuravam combater os franceses e incitar a resistência de portugueses aos invasores. Dessa forma, o artigo procura apontar para o importante papel assumido pela imprensa como agente político na defesa do Reino contra os invasores, por meio de sua inserção em uma forma de fazer política típica das sociedades de Antigo Regime na qual a ideia de neutralidade da imprensa não passava de um artifício retórico que tinha o objetivo de garantir a sua credibilidade junto ao público leitor.

Palavras-chave:
Imprensa; Impressão Régia do Rio de Janeiro; Gazeta do Rio de Janeiro; Panfletos Políticos; Império português; Guerra Peninsular (1808-1811)

ABSTRACT

The present article aims to analyze political pamphlets and newspaper articles published in Portugal and Rio de Janeiro during the period of French occupation of the Kingdom (between 1808 and 1811), highlighting how these two types of publications used a very similar language, despite of the difference of their nature. Characterizing themselves as works intended to combat the French and to incite the Portuguese resistance to the invaders. The article seeks to point the important role assumed by the press as a political agent in the defense of the Kingdom against the invaders, by its insertion in a typical political way of the societies of Old Regime. By its insertion in a typical political way of the societies of Old Regime in which the idea of neutrality of the press was just a rhetorical device that had the objective of guaranteeing its credibility with the reading public.

Keywords:
Press; Impressão Régia do Rio de Janeiro; Gazeta do Rio de Janeiro; Portuguese Empire; Peninsular War (1808-1811)

Introdução

Em obra de fôlego publicada recentemente, resultado de longa pesquisa de levantamento de fontes, José Murilo de Carvalho, Lúcia Bastos das Neves e Marcello Basile chamaram a atenção para a importância da imprensa no processo de independência do Brasil perante Portugal, naquilo que eles denominaram de “guerra literária”. Como explica Lúcia Bastos das Neves, naquele momento, o papel impresso passou a ter uma função essencial na produção de um novo ideário e de um novo vocabulário político, com a disseminação das ideias liberais e constitucionais. Então, “todo meio de expressão escrita e oral foi utilizado tanto como veículo peculiar de comunicação, quanto como poderosa arma de combate” (NEVES, 2015, p. 155) na criação de uma esfera pública de discussão política, que ultrapassava o âmbito das cortes, palácios e assembleias, e de uma nova cultura política.

A citada obra é nada menos do que uma edição crítica de boa parte da prolífica produção de panfletos políticos impressos no curto período entre 1820 e 1823. Perfazendo um total de 362, divididos em quatro volumes. Definidos por Lúcia Bastos das Neves como uma literatura de argumentação e circunstância que aparece nos tempos de turbulência política, fazendo comentários a fatos recentes ou discussões sobre grandes questões políticas do momento (NEVES, 2002, p. 561). Como gênero literário, os panfletos eram, em geral, redigidos por um único autor, que narrava situações vivenciadas utilizando técnicas retóricas e estilísticas e adotando um tom de grande violência verbal. Apresentando sempre um caráter didático, podiam assumir a forma de diálogos, catecismos políticos, poesias, farsas, dicionários explicativos, paródias de orações religiosas, entre outras. Sua eficácia política provinha, como ressalta ainda Lucia Bastos das Neves, do fato de serem baratos (sendo vendidos por um valor entre 80 e 320 réis) e de rápida circulação. Geralmente escritos em poucas páginas, os panfletos podiam ser lidos em voz alta ou afixados em paredes e postes.

Cerca de uma década antes do processo de independência do Brasil, os panfletos políticos já desempenhavam um papel importante em outro momento de turbulência política da história da monarquia portuguesa. Durante todo o período de ocupação francesa do território português, entre novembro de 1807 e abril de 1811, os generais franceses e seus aliados portugueses governaram o reino enfrentando a oposição de grande número de panfletos políticos que narravam os principais acontecimentos da ocupação francesa, sempre com a intenção de exortar os portugueses à resistência contra os invasores. E, ao mesmo tempo, construindo a memória dos atos dos grandes personagens envolvidos nos acontecimentos: Napoleão e os generais do exército francês, por um lado; D. João, o Duque de Wellington e os generais portugueses e ingleses, por outro. Como afirma Iara Lis Carvalho Souza, “Napoleão e D. João não se enfrentaram na arena aberta da guerra, mas no meio de uma vasta produção discursiva, frequentemente reimpressa no Rio e em Lisboa, onde se rivalizavam no âmbito dos atributos reais” (SOUZA, 1999, p. 54). Tais publicações foram agrupadas e classificadas por Maria Beatriz Nizza da Silva como integrantes daquilo que ela denomina de Ciclo Napoleônico, assim definido pela autora:

Trata-se de obras e folhetos destinados a combater e denegrir o ‘terrível corso’, primeiro em Portugal e depois no Rio de Janeiro. O auge de tais publicações foi atingido nos anos de 1808 e 1809, mas o interesse prolongou-se até 1815. [...] Muitos desses folhetos são diretamente contra Napoleão, outros contra os seus mais célebres generais, outros, finalmente, contra os franceses em geral. Poderíamos ainda considerar como complementos deste ciclo napoleônico as obras panegíricas dos chefes militares ingleses, espanhóis ou portugueses (SILVA, 1978, p. 215).

O presente artigo tem como objetivo analisar uma pequena parte dessa produção, atentando para a sua circulação dos dois lados do Atlântico português, uma vez que, segundo Lucia Bastos das Neves (2002, p. 561), esses foram os primeiros folhetos de intensa circulação no Brasil. Busca-se, ao mesmo tempo, comparar a sua narrativa com a das notícias sobre a guerra peninsular publicadas pela Gazeta do Rio de Janeiro, primeiro periódico a circular regularmente na América portuguesa. Tal comparação tem a intenção de ressaltar como esses dois tipos de publicação utilizavam uma linguagem muito semelhante, apesar da diferença da sua natureza, caracterizando-se como obras destinadas a combater os franceses e a incitar a resistência dos portugueses aos invasores. Dessa forma, o presente artigo procura apontar para o importante papel político assumido pela imprensa como “arma de combate” no contexto das invasões francesas de Portugal, ao mesmo tempo que questiona o discurso de imparcialidade da imprensa, sobre o qual periódicos como a própria Gazeta do Rio de Janeiro procuravam construir a sua reputação de confiabilidade.

Panfletos políticos como os escritos por José Acúrsio das Neves (1766-1834), cujo objetivo era incentivar seus compatriotas a reagir contra a invasão francesa. Acúrsio das Neves ficou mais conhecido pelas suas obras de Economia Política e por ocupar diversos cargos no aparelho administrativo da monarquia no Reino.1 1 Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra (1787), desembargador do Desembargo do Paço, Juiz de Fora (1797 a 1799) e depois Corregedor da cidade de Angra (1799 a 1802), sócio da Academia Real de Ciências de Lisboa (1810), deputado e secretário da Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, deputado da junta de liquidação dos fundos da extinta Companhia de Comércio do Pará e Maranhão, deputado da direção da Real Fábrica das Sedas do Subúrbio do Rato e obras das Águas Livres, Desembargador da Relação do Porto. Foi no exercício dessas funções de administrador fabril, que publicou as suas obras de Economia Política mais importantes: Variedades sobre vários objetos relativos às Artes, Comércio e Manufaturas consideradas segundo os princípios da Economia Política (2 volumes, 1814 e 1817) e Memória sobre os meios de melhorar a Indústria Portuguesa, considerada nos seus diferentes ramos (1820). Mas entre 1808 e 1810 ficou afastado das funções públicas e dedicou-se à redação da sua obra patriótica, como ele mesmo a denominava, cujo traço distintivo, assim como o de outras publicações de natureza semelhante, é uma constante exortação dos povos ibéricos à guerra contra a França. Publicados primeiramente em Portugal, encontraram amplo espaço para a sua pronta reedição também no Rio de Janeiro. Panfletos com títulos sugestivos como A Salvação da Pátria: proclamação aos portugueses sobre a sua honra e o seu dever nas atuais circunstâncias da monarquia, traziam exortações como a que se segue, por ocasião da segunda invasão francesa a Portugal, comandada pelo Marechal Nicolas Jean-de-Dieu Soult:2 2 O período de ocupação francesa do Reino de Portugal não foi ininterrupto, dividindo-se em três invasões dos exércitos franceses, com suas três subsequentes expulsões: a primeira invasão, comandada pelo General Jean-Andoche Junot, durou de novembro de 1807 a agosto de 1808; a segunda, comandada por Nicolas Jean-de-Dieu Soult, de março a maio de 1809; e, finalmente, a terceira, comandada pelo General André Massena, durou de agosto de 1810 a abril de 1811.

Nada de escravidão, briosos portugueses, que não nascestes para serdes tratados como bestas. Não vos deixeis iludir com as proclamações com que esse enviado do Usurpador, o Marechal Soult, tem querido enganar os habitantes das províncias do Norte [...]. Perguntai a vós mesmos pela proteção que achastes no exército de Junot, tendo entrado como amigo e aliado, e julgai a que podereis esperar de Soult, que entra a ferro e fogo, e tem a vingar os caprichos de Napoleão, a injúria das águias e o destroço dos invencíveis? (NEVES, 1809aNEVES, J. A. A Salvação da Pátria: proclamação aos portugueses sobre a sua honra e o seu dever nas atuais circunstâncias da monarquia. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809a., p. 10).

Porém, o mesmo tom de exortação pode ser encontrado também nas notícias sobre a guerra peninsular veiculadas na Gazeta do Rio de Janeiro, cujos primeiros números se dedicavam quase que inteiramente a tais notícias. Era tamanho o volume de notícias publicadas a esse respeito que chegavam, por vezes, a ocupar edições inteiras do jornal, demandando também a publicação de edições extraordinárias que as complementassem. Para o que, o redator do periódico, o Frei Tibúrcio José da Rocha, se utilizava de variados recursos, tais como a publicação na íntegra de proclamações dos governadores do Reino. Como essa de 9 de dezembro de 1808, publicada na edição de 4 de fevereiro de 1809:

Às armas, portugueses, às armas. A necessidade exige que a massa da nação empunhe as armas, e todas as armas na mão robusta de um defensor da pátria são instrumentos decisivos da vitória. O Governo vigia sobre a subsistência dos Exércitos, e aonde não chegam os recursos ordinários das rendas públicas, suprem os donativos dos vassalos, que sabem honradamente sacrificar à pátria os fundos de que ela necessita (PROCLAMAÇÃO..., 1809, p. 3).

Antes de abordar essas publicações, porém, é necessário atentar para dois aspectos importantes da sua produção e circulação: as diferentes dinâmicas em que estiveram envolvidas as tipografias existentes nos dois lados do Atlântico português durante a conjuntura da chamada Guerra Peninsular e a atuação da censura. Apesar de muitos trabalhos publicados em Portugal terem sido oportunamente publicados também pela recém-criada Impressão Régia do Rio de Janeiro, as tipografias na velha e na nova capital do Império não trabalhavam em conjunto. Durante o período de ocupação francesa, os generais franceses utilizaram a Impressão Régia de Lisboa como instrumento de propaganda do seu governo em Portugal e das vitórias napoleônicas na Europa. A própria Gazeta de Lisboa, folha oficial portuguesa originada em 1715, passou a servir como órgão oficial da governação francesa, passando a ostentar no frontispício a águia imperial no lugar das quinas portuguesas (NEVES, 2008, p. 242). Os panfletos políticos que incitavam a resistência aos franceses eram publicados por outras tipografias, como a Oficina de Simão Thadeu Ferreira ou a de Antonio Rodrigues Galhardo. Afirma Lúcia Bastos, porém, que após a primeira expulsão das tropas francesas do território português, em finais de 1808, e enquanto durou a conjuntura de guerra, a imprensa portuguesa conheceu uma inédita liberdade, com o surgimento de vários jornais, redigidos por diversos autores e incentivados pelos governadores do Reino. Em comum, manifestavam o ódio contra a França e a intenção de reforçar a vontade de resistência dos portugueses: “Passado o perigo, porém, retornava a censura aos jornais e renascia o antigo privilégio da Gazeta de Lisboa de publicar com exclusividade as novidades do estrangeiro” (NEVES, 2008, p. 242-243).

A Impressão Régia do Rio de Janeiro, por sua vez, funcionava sob a supervisão de uma Junta Administrativa, nomeada em junho de 1808 e composta por três diretores, e que tinha entre as suas atribuições o exame de tudo o que se mandasse publicar e o impedimento da impressão de papéis e livros cujo conteúdo contrariasse o governo, a religião e os bons costumes (Aviso de 24 de junho de 1808).3 3 Como órgão do aparelho burocrático de administração do Império, subordinada que estava à Secretaria dos Negócios Estrangeiros e da Guerra por seu Decreto de criação (datado de 13 de maio de 1808), cabia à nova tipografia a impressão de toda a legislação e papéis diplomáticos que emanassem de qualquer repartição do Real Serviço. E, como não havia outra tipografia na colônia, ao menos oficialmente, cabia-lhe também imprimir todas as outras obras. Entre 1808 e 1822, a Impressão Régia do Rio de Janeiro publicou mais de mil itens, entre folhetos, opúsculos, sermões, oratória sacra, odes, prospectos, peças de teatro, obras literárias e científicas versando sobre agricultura, comércio, ciências naturais, matemática, história, economia política, direito, medicina, filosofia, romance, poesia e educação, além de traduções de textos franceses e ingleses (MORAES; CAMARGO, 1993). Por meio do decreto de 27 de setembro de 1808, o Príncipe Regente atendeu à solicitação da Mesa do Desembargo do Paço que reivindicava o seu direito de exercer a jurisdição sobre a censura de livros, com base no alvará de 17 de dezembro de 1794.4 4 Tal alvará extinguia a Comissão Geral para o Exame e a Censura dos Livros criada por D. Maria I apenas sete anos antes (decreto de 21 de junho de 1787). Esse ato administrativo reestabelecia a censura tripartida exercida pelo Ordinário, pela Inquisição, e pelo Desembargo do Paço, determinando as diferentes esferas de atuação de cada um desses três órgãos. A partir de então a Igreja podia fazer o exame dos livros religiosos, mas era o Estado que avaliava os livros sobre assuntos laicos e que podia baixar a proibição ou não de todos os livros, fossem eles religiosos ou não. Dessa forma, o Desembargo do Paço desempenhava um papel central (e final) no processo censório, deixando claro que a sua preocupação principal passava do plano religioso para o plano político. Por esse arranjo, a Junta Administrativa ficaria responsável pela censura preventiva, proibindo a impressão de obras consideradas ofensivas à religião e ao Estado; enquanto o Desembargo do Paço atuaria majoritariamente na censura repressiva, exercendo o controle da circulação pela fiscalização da sua entrada nos portos e alfândega e a visita a livrarias. Esse aparato censório vigorou durante praticamente todo o período de governo de D. João no Rio de Janeiro. Até que em 2 de março de 1821, D. João foi obrigado a assinar, por pressão da Junta de Governo da Revolução do Porto, um decreto que abolia a censura prévia para a imprensa em geral. Pelo menos aparentemente, porque por esse decreto a censura não se faria mais sobre os manuscritos, mas sobre as provas tipográficas. Segundo Lúcia Bastos não houve mudança efetiva, “pois os impressores não correriam o risco de proceder à impressão de um trabalho, sob a ameaça de perdê-lo posteriormente, em função das correções exigidas ou de sua proibição” (NEVES, 2002, p. 136).

Porém, a censura no Império Português nunca foi totalmente impermeável à circulação de ideias. Uma obra que não conseguisse licença da Junta Administrativa da Impressão Régia para ser editada pela tipografia, ainda podia circular no Rio de Janeiro, bastando para isso que fosse importada por algum livreiro aí estabelecido e conseguisse a sua liberação pelos censores régios do Desembargo do Paço. Os censores régios deveriam ser homens eruditos, que tivessem conhecimento da obra que estavam examinando. E, por isso, tinham necessariamente que ter acesso às obras proibidas para exercer o seu trabalho, desde que elas não circulassem livremente entre o público geral. O que revelava o caráter seletivo da censura no Império Português, que impunha limites para a posse e leitura de livros em conformidade com a desigualdade inerente a uma sociedade de tipo estamental. De acordo com essa “estamentalização-corporativização” da posse e leitura de livros, como a denomina Luiz Carlos Villalta (2002, p. 66), algumas pessoas podiam ler determinados livros e autores, que inversamente, eram proibidos para a maioria da população. O que parece indicar que, ao fim e ao cabo, os censurados não eram os livros e sim os leitores.

Os autores que primeiro se ocuparam da história da imprensa no Brasil minimizavam a importância da Gazeta do Rio de Janeiro como documento histórico. Chamando a atenção para o seu caráter oficial ou áulico, uma vez que era de propriedade de uma Secretaria de Estado e estava submetida ao rígido aparato censório a que fizemos menção. É o caso, por exemplo, das obras de Carlos Rizzini, O livro, o jornal e a tipografia no Brasil, 1500-1822: um breve estudo geral sobre a informação (publicado pela primeira vez em 1946); de Nelson Werneck Sodré, História da Imprensa no Brasil (1966) e de Rubens Borba de Moraes, Livros e Bibliotecas no Brasil Colonial (1979). Mais recentemente, autores como Marco Morel e Mariana Monteiro de Barros (2003) ou Lúcia Bastos das Neves, Marco Morel, e Tania Bessone Ferreira (2006) vêm chamando a atenção para uma renovação das abordagens políticas e culturais da imprensa que redimensiona a sua importância como fonte documental (uma vez que enuncia discursos e expressões de protagonistas sociais) e como agente histórico, que intervém nos processos e episódios, em vez de servir-lhes como simples “reflexo”. Nessa nova perspectiva, que é também a adotada nesse artigo, ao contrário do que acontecia na historiografia tradicional, a imprensa deixou de ser vista como autêntica narradora dos “fatos” e da “verdade”, assim como também superou-se a perspectiva contrária, que a interpretava como mero veículo de ideias ou forças sociais subordinadas por uma infraestrutura socioeconômica: “Força ativa e não mero registro de acontecimentos” (MOREL; BARROS, 2003, p. 9).

Dessa forma, é importante atentar para o alerta de Lúcia Bastos das Neves sobre o cuidado com a maneira de se utilizar panfletos enquanto fontes para a história. Compreendendo que eles não revelam verdades históricas e nem são meros reflexos das sociedades que os produziram. Mas que devem ser considerados como transmissores de ideias que seus autores tentavam difundir naquele momento histórico em relação às mudanças políticas, à sua própria atuação, às novidades sociais ou à postura perante determinados fatos ou eventos: “embora esses escritos muitas vezes evoquem a História como um saber objetivo e imparcial, capaz de esclarecer o tempo vivido, não podem ser usados com o intuito de reconstruir fielmente o cenário econômico e o jogo político de uma época” (NEVES, 2015, p. 177).

Combate

Procurando manter as aparências dos acordos diplomáticos estabelecidos entre Portugal e França durante as negociações ocorridas ao longo dos anos de 1806 e 1807, as tropas do General Jean-Andoche Junot entraram em Portugal, em novembro de 1807, sob o pretexto de proteger o monarca português e o Reino contra os ingleses, que seriam os verdadeiros inimigos de Portugal. Porém, a aparência de amizade e proteção foi se desfazendo à medida que iam sendo publicados os primeiros decretos de Junot (ainda ao longo dos meses de dezembro de 1807 e janeiro de 1808), que, entre outras coisas, instituíam pesadas contribuições de guerra, o confisco de todo o ouro e prata das igrejas, capelas e confrarias de Lisboa, o sequestro de todos os bens pertencentes à Casa Real portuguesa, a destituição do Conselho de Regência instituído por D. João na véspera da sua partida para a América e da própria Casa de Bragança. Junot procurou também estender o seu controle sobre a população da capital: foram proibidos os ajuntamos nas praças e cafés; o porte de armas mesmo por caçadores; decretado o toque de recolher e o controle das atividades de pesca a fim de evitar fugas ou a comunicação com a esquadra inglesa que se encontrava ancorada fora da barra, bloqueando o porto de Lisboa; e confiscadas todas as propriedades inglesas em Portugal.

Em 1808, foi publicada pela Impressão Régia do Rio de Janeiro a Memória Histórica da invasão dos franceses em Portugal no ano de 1807, de autoria de D. José Caetano da Silva Coutinho. Nomeado bispo do Rio de Janeiro em 1805, Silva Coutinho foi a Lisboa sagrar-se em 1807 e lá se encontrava ainda por ocasião da invasão do Reino pelas tropas de Junot. Não tendo conseguido sair de Portugal junto com a esquadra que levou a Família Real para o Brasil, Silva Coutinho escapou clandestinamente apenas em 4 de março de 1808, como ele mesmo afirma (COUTINHO, 1808COUTINHO, J. C. da S. Memória Histórica da Invasão dos francezes em Portugal no ano de 1807. Rio de Janeiro: Na Impressão Régia, 1808. , p. 73). Na sua Memória, ele narra os acontecimentos entre a partida do Príncipe Regente e a sua própria saída de Portugal.

De acordo com Silva Coutinho, nos primeiros meses de ocupação francesa não se desacreditava ainda, ao menos publicamente, da ideia de proteção e de amizade que tão altamente se tinha proclamado em nome de Napoleão. Porém, essa confiança foi pouco a pouco se desvanecendo. O decreto de destituição da monarquia portuguesa (Edital de Junot, de 1 de fevereiro de 1808) levou Silva Coutinho a escrever um parágrafo inflamado, no qual recupera a memória do episódio da Restauração de 1640, que levou ao trono a dinastia de Bragança, para reatar o passado, o presente e o futuro da monarquia portuguesa em uma linha de continuidade, cuja ruptura era de inteira responsabilidade dos exércitos franceses:

Nunca, pelas leis fundamentais de nenhum Estado da Europa, e muito menos pelas de Portugal, foi vedado a um príncipe sair dos seus Estados por interesse do mesmo Estado ou da Sua Real Pessoa. [...] Quem deu a um corso baixo e vil a autoridade e o direito de tomar contas de sua conduta a um príncipe soberano e independente? Se os portugueses se não lembram do crime de emigração, que nunca existiu, se respeitam, se amam e adoram o herdeiro de uma Casa que eles mesmos chamaram para o trono, que levantaram com tanto sangue e ações de tanta glória, se eles não querem e não podem conhecer outro monarca, qual a razão porque este corso atrevido despreza este monarca e despreza a nação inteira, para se ingerir ele mesmo a dominar como escravos uns povos livres que o aborrecem? [...] Quando os portugueses não tivessem um herdeiro legítimo da Casa Real que os governasse, quando, por impossível, não achassem um português benemérito que fizessem montar sobre o trono, eles iriam buscar para seu rei um turco e um argelino antes do que o fero Monstro da Córsega, que não tem religião nem piedade, nem humanidade, nem justiça, nem ciência, mas só impostura e atrevimento. (COUTINHO, 1808COUTINHO, J. C. da S. Memória Histórica da Invasão dos francezes em Portugal no ano de 1807. Rio de Janeiro: Na Impressão Régia, 1808. , p. 61-63).

A profusão de adjetivos com que o bispo Silva Coutinho presenteia Napoleão no seu panfleto caracteriza aquilo que Lúcia Bastos das Neves denomina de a construção da lenda negra de Napoleão: “Tais escritos possuíam uma certa pretensão histórica, cujo objetivo era assimilar ao imperador a imagem de um tirano cruel e degenerado, um homem indigno, a fim de se lhe atribuir, com verossimilhança, todos os tipos de crimes” (NEVES, 2008, p. 43). Na narrativa dos acontecimentos construída pelos panfletos políticos do ciclo napoleônico, Bonaparte teria sido alçado ao poder pelos ensandecidos revolucionários, que viram nele a capacidade de restaurar a tranquilidade pública na França e, ao mesmo tempo, o seu plano de expansão é apresentado como consequência e continuação do processo revolucionário francês iniciado em 1789. Por isso, ele era sempre tratado pelos panfletários como o Usurpador (escrito sempre em letra maiúscula, como se fosse um título) que teria se apossado do trono francês ilegitimamente. Mas ele era igualmente o Usurpador de outros tronos europeus. Em particular do trono de Portugal, tomado a custa de traições aos tratados celebrados entre esse Reino e a França. O título de Usurpador, segundo José Acúrsio das Neves, isentaria Bonaparte do dever de honrar tratados e respeitar convenções, como ele afirma no seu panfleto intitulado Reflexões sobre a invasão dos franceses em Portugal: “O justo, o moderado Bonaparte tem um título que o dispensa desta e de outras semelhantes práticas prescritas pelas leis fundamentais da sociedade, estabelecidas pela Natureza entre todas as Nações e consagradas pelo uso constante de todos os povos cultos: é o Usurpador Universal” (NEVES, 1809e, p. 23-24, grifo do autor).

A representação negativa de Napoleão contrastava com os elogios que os panfletos teciam ao monarca português e ao rei e marechais britânicos. Acúrsio das Neves escreve um panfleto intitulado A Generosidade de George III e a ambição de Bonaparte: Wellesley e os generais franceses, cuja motivação principal era comparar a atitude “desinteressada” dos ingleses na defesa da Europa com a ambição desmedida do Usurpador:

Vede, de uma parte, a generosidade do imortal Jorge e da nação inglesa, prodigando o seu ouro e expondo as suas tropas para restituírem a liberdade à Europa; da outra, a ambição desmedida do Usurpador, que unindo as máximas do mais atroz despotismo aos princípios revolucionários que aprendeu nos clubs jacobinos, tem feito do continente um campo de destruição (NEVES, 1809bNEVES, J. A. A generosidade de Jorge III e a ambição de Bonaparte: Wellesley e os generais franceses. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809b., p. 21).

Também no seu Manifesto da Razão contra as usurpações francesas, a monarquia britânica é representada como heroína da resistência à Bonaparte e bastião da liberdade europeia:

E que seria, então, do mundo inteiro se a Inglaterra, este fortíssimo baluarte da liberdade da Europa não sustentasse ainda a sua independência, para reivindicar um dia a das outras nações? Generosa Nação Britânica! Os tiranos conjuraram contra ti o continente. Esse mesmo, de que és o firmíssimo apoio. Cuidaram arrancar-te os olhos, excluindo os teus navios de todos os portos da Europa, declarando guerra ao teu comércio e às tuas manufaturas, roubando-te quanto puderam, e declarando-te [...] bloqueado por mar e por terra. Mas primeiro perderam eles a vista. [...] Nação heróica! A Providência te rodeou do teu elemento, para te salvar da tirania do Usurpador. A Providência tem prolongado a tua existência e aumentado o teu poder, para restabeleceres tantos governos abatidos, enxugares as lágrimas a tantos povos assolados (NEVES, 1809cNEVES, J. A. Manifesto da razão contra as usurpações francesas. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809c., p. 17, grifo do autor).

Acúrsio das Neves também comenta o edital de 1 de fevereiro de 1808, que ele apelida de Edital da destruição do nosso Governo e das promessas da nossa felicidade em suas Reflexões sobre a invasão dos franceses em Portugal. Em parágrafo muito semelhante ao do bispo Silva Coutinho, Acúrsio comenta aquilo que denomina de “a destruição do nosso governo”, ou seja, a destituição dos Governadores do Reino nomeados por D. João pelo decreto de 26 de novembro de 1807 e da própria monarquia de Bragança:

O Decreto de 26 de Novembro de 1807 é bem terminante a este respeito: S.A.R., saindo da sua capital para uma outra cidade dos seus Estados, para fugir aos assassinos, e poupar o sangue dos seus vassalos, deixa um Conselho de Regência e lhe prescreve a forma porque à de governar o Reino. É isto renunciar à Soberania? E suponhamos que a tinha renunciado [sic], quem deu autoridade a Bonaparte para se intrometer a governar-nos contra nossa vontade? (NEVES, 1809eNEVES, J. A. Reflexões sobre a invasão dos franceses em Portugal. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809e. , p. 43-44).

As promessas de felicidade, por outro lado, se referiam ao trecho do Edital que afirmava que a “deforme mendicidade não arrastará mais os seus fatos imundos na soberba capital, nem pelo interior do Reino” (EDITAL..., 2001a, p. 165). Segundo Acúrsio, esta afirmação era “um dos maiores descaramentos possíveis”, pois não se via em Lisboa “senão gentes de todas as classes mendigando o sustento pelas ruas e pelas casas; e foi providência que tomassem este caminho, porque de outra forma se não veriam senão ladrões, por serem imensas as pessoas que a invasão francesa reduziu à última miséria” (NEVES, 1809eNEVES, J. A. Reflexões sobre a invasão dos franceses em Portugal. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809e. , p. 48-49).

O fato é que tais promessas contrastavam com a instituição de pesadas contribuições compulsórias, como a de 100 milhões de francos, a título de resgate de todas as propriedades, debaixo de quaisquer denominações que possam ser, pertencentes a particulares, decretada pelo edital de 23 de dezembro de 1807 assinado por Napoleão (publicado na Gazeta de Lisboa apenas em 9 de fevereiro de 1808). O mesmo decreto determinava, ainda, o sequestro de todos os bens da Família Real e dos nobres que acompanharam o Príncipe Regente (EDITAL..., 2001b, p. 169-170). Ao comentá-lo, Acúrsio das Neves o apelida de Edital da subversão das nossas fortunas, se perguntando como era possível cobrar uma contribuição de guerra de um país que se proclamava aliado:

O General em Chefe do Exército Francês veio proclamando desde Alcântara que marchava em socorro de S.A.R. contra os ingleses; quando chegou a Lisboa, proclamou que vinha proteger os portugueses de mandá-lo seu amo, e que ele os protegeria; como Protetor e aliado foi ele recebido com o seu mesmo exército; não se disparou um tiro sobre a sua tropa, nem encontrou ato algum de resistência para se apossar do Reino; o mesmo Napoleão nos fez dizer, pela carta da nossa chamada deputação de 27 de abril de 1808, que não olhava Portugal como um país conquistado. Haja, pois, quem me concilie estas ideias com a de uma contribuição de guerra para resgate de todas as propriedades (NEVES, 1809eNEVES, J. A. Reflexões sobre a invasão dos franceses em Portugal. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809e. , p. 51-52).

A determinação de sequestro dos bens da Igreja deu margens a considerações sobre o desrespeito dos franceses com a religião católica que eles diziam professar e prometiam proteger e socorrer no Edital de primeiro de fevereiro: “A religião de vossos pais, a mesma que todos professamos, será protegida e socorrida pela mesma vontade que soube restaurá-la no vasto Império francês, mas livre das superstições que a desonram” (EDITAL..., 2001b, p. 164). Aqui também a proteção se transformava em usurpação, na narrativa de Acúrsio em seu Manifesto da razão contra as usurpações francesas:

Esta mesma religião e seus ministros, estes mesmos templos viram bem depressa sobre si a proteção do Usurpador: baixaram ordens para todos serem despojados da maior parte das suas rendas, e as igrejas da sua prata e ouro. Ordens tão bem executadas que, em breve tempo, por toda a extensão do Reino, se viram despojados os templos de todas as preciosidades com que a magnificência dos soberanos, e a piedade dos fiéis, os tinham enriquecido por mais de setecentos anos. A estes ajuntou uma soldadesca desenfreada os ultrajes, os escândalos mais sacrílegos. Templos se converteram em quartéis, até dentro da própria Capital; alguns houve de que se fizeram estrebarias; arrastaram-se e queimaram-se as imagens sagradas; profanaram-se as Santas Aras e até os vasos e as partículas Sacro-santas; praticaram-se todas as execrações que traz consigo a irreligião e a libertinagem. (NEVES, 1809cNEVES, J. A. Manifesto da razão contra as usurpações francesas. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809c., p. 24-25, grifo do autor).

Acúrsio chama a atenção também para o fato de que essa mesma espécie de proteção se estendeu aos bens dos nobres que acompanharam o Príncipe Regente, em particular, e com toda a população de Lisboa, em geral:

Iguais cenas de roubos e de dilapidações, paliadas com o nome de sequestros, se praticaram nas casas e nos bens dos vassalos fiéis que acompanharam o soberano, dos oficiais da sua casa e dos seus conselheiros, que além de emigrados foram tratados de pérfidos. [...] Não foi menos dura a proteção dos particulares, daqueles cidadãos tranquilos que não puderam fugir à escravidão, dos honrados habitantes de Lisboa aos quais tanto se clamava que estivessem sossegados nas suas casas porque nada tinham que temer, e tantas felicidades se prometiam. O Grande Napoleão, meu Amo, dizia o General em Chefe no seu manifesto, me envia para vos proteger, eu vos protegerei (NEVES, 1809cNEVES, J. A. Manifesto da razão contra as usurpações francesas. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809c., p. 23-26, grifos do autor).

Enquanto os cronistas e panfletários portugueses replicavam às promessas de prosperidade contidas nas proclamações francesas caracterizando-os como usurpadores e ladrões, pois, como afirmava Acúrsio das Neves, “na arte de furtar ninguém excede a esses generosos protetores da Europa” (NEVES, 1809cNEVES, J. A. Manifesto da razão contra as usurpações francesas. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809c., p. 27, grifo do autor); a população de Lisboa reagia com ironia à autoproclamação dos franceses como protetores de Portugal, contida nos seus Editais. Afirmava o bispo Silva Coutinho que diante de tantos Decretos que determinavam a mais completa espoliação do Reino, ninguém mais acreditava na beneficência e na proteção francesa:

As suas palavras e promessas passam hoje em provérbio ainda mais ignominioso do que a fé púnica entre os romanos; de tal maneira que hoje, em Lisboa, um arrieiro, um barqueiro, uma regateira, um rapaz mesmo de poucos anos, quando querem ameaçar alguém não dizem que hão de batê-lo, roubá-lo ou fazer-lhe qualquer espécie de mal, mas somente lhe dizem todos enfurecidos que hão de protegê-lo. Porque tudo isto significa hoje a proteção à francesa (COUTINHO, 1808COUTINHO, J. C. da S. Memória Histórica da Invasão dos francezes em Portugal no ano de 1807. Rio de Janeiro: Na Impressão Régia, 1808. , p. 69).

A “proteção à francesa” se transformou de tal modo em piada em Portugal a ponto de ter sido publicado em Lisboa, ainda em 1808, e no Rio de Janeiro, no ano seguinte, um panfleto intitulado justamente Proteção à Francesa.5 5 Apesar de não constar o nome do autor no frontispício da publicação, de acordo com anúncio na Gazeta do Rio de Janeiro, a autoria da obra seria de José Daniel Rodrigues da Costa: “Saiu à luz a obra mui jocosa: Surriada a Massena em Portugal e encontro das duas rivais no Palácio Imperial de França, por José Daniel Rodrigues da Costa. Vende-se na loja da Gazeta a 320 réis, onde se acha, do mesmo autor, Proteção à Francesa, por 320 réis, e o Embarque dos apaixonados dos Franceses, por 320 réis” (GAZETA EXTRAORDINÁRIA DO RIO DE JANEIRO, 1811, p. 4). Nele, o autor apresenta, em forma de versos jocosos, o elenco de temas que faria parte das narrativas dos panfletários, tais como a destituição da monarquia de Bragança e o desrespeito com os símbolos da religião católica:

Que vem a ser ter entrado Dias antes do Natal Tropa estranha em Portugal Mal calçada e mal vestida, Esfaimada e entorpecida De cansaço ou de fraqueza? É proteção à francesa. [...] Que vieram cá fazer, Sem lhes mandarmos recado? Comerem-nos pão e gado, Pondo tudo em confusão! Desta gente a proteção Tem diversa natureza É proteção à francesa. Condenar como emigrado, Quem foi para o que era seu, E que nenhum poder deu A bárbaros protetores! Isto, meus ricos senhores, É cobiça muito acesa, É proteção à francesa. [...] Dizerem que são cristãos, Sendo na Lei mascarados, Roubar os vasos sagrados Com sacrilégio tremendo, Na igreja bestas metendo; Este insulto, esta baixeza É proteção à francesa. Por vingança ir aos conventos E com rancor, sem piedade Matar o clérigo e o frade, As freiras ir perseguir, Fazer os povos fugir, E nos seus bens fazer presa! É proteção à francesa. [...] Se os mouros aqui tornassem, Outro tanto não fariam. Se os franceses protegiam Os mais Reinos desta sorte, Já sabem que o saque, a morte, A fome, o engano, a fereza, É proteção à francesa (PROTEÇÃO..., 1809).6 6 Esse mesmo elenco de temas relacionado à primeira ocupação francesa do Reino foi objeto de uma série de Composições Alegóricas alusivas às invasões francesas, de autoria anônima, realizadas entre 1807 e 1808. Reproduzidas em Rodrigues e Brito (1999, p. 292-293).

É possível encontrar uma representação semelhante de Napoleão e dos exércitos franceses a que vemos nos panfletos políticos na publicação das notícias sobre a guerra peninsular feita pela Gazeta do Rio de Janeiro. Tais notícias, que deviam ser muito ansiadas pela população do Rio de Janeiro, sobretudo por aqueles recém-emigrados que haviam deixado em Portugal familiares e pertences, ocupavam a quase totalidade das quatro páginas do periódico entre 1808 e 1816. Era tamanho o volume de notícias publicadas a esse respeito que chegavam a ocupar edições inteiras do jornal, demandando também a publicação de edições extraordinárias que as complementassem.7 7 O primeiro número do periódico veio a público no dia 10 de setembro de 1808 e trazia a informação de que a sua periodicidade seria semanal, que poderia ser encontrado na loja do livreiro Paulo Martin, mas também contava com um sistema de assinaturas. Mas, já a partir do segundo número o periódico passou a circular duas vezes por semana. Dessa forma, até julho de 1821, a Gazeta saía às quartas e aos sábados pela manhã. A partir dessa data passou a circular três vezes por semana, às terças, quintas e aos sábados. Além dos números regulares, também eram publicados os números extraordinários, denominados Gazeta Extraordinária do Rio de Janeiro. A Gazeta do Rio de Janeiro circulou ininterruptamente entre 10 de setembro de 1808 e 29 de dezembro de 1921, totalizando 1413 números ordinários e 204 extraordinários.

Se, por um lado, as notícias sobre a guerra peninsular publicadas pela Gazeta do Rio de Janeiro, não entram em detalhes sobre a ocupação francesa do Reino, como na narrativa dos panfletos políticos; por outro lado, é possível encontrar nelas a mesma caracterização negativa dos atos de Napoleão e dos generais do exército francês e o elogio dos feitos militares de resistência. Como afirma Juliana Gesuelli Meirelles (2008, p. 121): “o fato é que a Gazeta contribuía para a formação de uma imagem mitificada de Bonaparte como a encarnação do Anti-Cristo ao mesmo tempo em que usava sua força para desenhar a figura de D. João como redentor do Novo Mundo”. A respeito de Napoleão, lê-se já no primeiro número do periódico um comentário do redator, o Frei Tibúrcio José da Rocha, em que se repete a caracterização do imperador francês como um usurpador que não respeita acordos e nem honra tratados diplomáticos:

O governo francês ainda há pouco engodava a Prússia enquanto atacava a Áustria, enganava a Áustria enquanto combatia com a Prússia e Rússia, fazia protestações de amizade a Portugal e disfarçava com a Espanha enquanto tinha a contender com as principais potências do Norte, mandava a Rússia invadir a Suécia enquanto se apoderava da Dinamarca; mas agora empreende conjuntamente a conquista do Industão, a ocupação da Pérsia, a desmembração do Império Otomano, a invasão da Sicília, da Suécia, da Espanha, a sujeição de Portugal, a usurpação dos bens e privilégios da Igreja e a proteção da América espanhola. Se ainda pudesse haver uma só pessoa que acreditasse de boa fé a doutrina francesa, bastariam estes fatos para lhe abrir de todo os olhos (GAZETA DO RIO DE JANEIRO, 1808a, p. 3).

Da mesma forma que nos panfletos políticos, os exércitos franceses são representados sempre como bárbaros e heréticos que não respeitam a religião católica, profanando templos, matando padres e roubando bens das igrejas das localidades por eles invadidas. Um bom exemplo pode ser encontrado na edição de 11 de outubro de 1809, na qual é publicada uma carta do Alcaide-mor da localidade de Brozas em que relata a invasão do exército francês àquela cidade:

Os templos foram horrivelmente profanados por estes malvados, Mutilaram as imagens e até se supõe que queimaram algumas, porque se não acham e só deixaram os crucifixos. As igrejas serviram-lhes de cavalariças, não para recolher simplesmente os cavalos mas servindo-se dos altares para deitarem a palha, centeio e cevada, tudo junto. Rasgaram os ornamentos e creio que não ficou um só em estado de poder servir para o culto divino. (NOTÍCIAS..., 1809).

A publicação no Rio de Janeiro das notícias sobre a guerra peninsular acontecia sempre com dois a três meses de atraso. Tempo que as notícias levavam para cruzar o Atlântico, uma vez que as informações sobre a situação europeia publicadas na Gazeta do Rio de Janeiro eram retiradas de periódicos europeus de várias procedências. Especialmente ingleses e portugueses. Como era de se esperar, as notícias oriundas de periódicos franceses eram sistematicamente colocadas em suspeição, por carecerem de imparcialidade com relação aos fatos. E eram publicadas na Gazeta de preferência quando noticiavam algum revés do exército ou da diplomacia francesa. Cartas particulares de militares e políticos, ou mesmo cedidas pelos leitores, também eram publicadas quando traziam alguma notícia de interesse que não constasse da imprensa estrangeira, quando corroboravam alguma notícia já publicada pela Gazeta ou mesmo quando havia falta de notícias decorrente de algum atraso na entrega dos jornais europeus. Mesmo tais fontes, por mais subjetivas que fossem pela sua própria natureza, mereciam mais crédito do que as notícias publicadas em periódicos franceses. Somente a partir de 1815 os periódicos franceses passaram a gozar da mesma credibilidade dos periódicos ingleses e a fazer parte das fontes utilizadas pelo redator da Gazeta sem ressalvas. Na edição de 19 de outubro de 1808, o redator da Gazeta faz uma comparação entre os periódicos ingleses e franceses com relação à sua credibilidade:

As Gazetas, que em Inglaterra são constitucionalmente livres e singelas, vêm a ser em França um dos meios essenciais de que o governo lança mão para se acreditar persuadindo o que quer. É, portanto, necessário ler com suma prevenção tudo quanto são papéis franceses. Quero dizer, todos os dos diferentes países onde existe influência francesa, pois de certo contêm falsidades, e muitas vezes tão descaradas que admira como se atrevem a publicá-las, se não se soubesse que um dos caracteres do despotismo é o desprezo até à verossimilhança (GAZETA DO RIO DE JANEIRO, 1808d, p. 3-4).

Maria Beatriz Nizza da Silva sugere que os conceitos de extrato e narração poderiam resumir a atividade do redator da Gazeta do Rio de Janeiro na publicação das notícias sobre a guerra retiradas dos jornais europeus: “quando ele atuava de maneira mais pessoal, extraía notícias dos periódicos estrangeiros e elaborava uma súmula delas; quando interferia menos, limitava-se a seguir a narração alheia” (SILVA, 2007, p. 10). Nem extrato nem narração, porém, alcançavam algo próximo a uma imparcialidade, apesar do discurso em contrário. Pois, como explica Juliana Gesuelli Meirelles, era prática comum à época intercalar a publicação de documentos e notícias com comentários escritos pelo redator do periódico que realçavam um viés opinativo, mas que, no entanto, os homens de Estado responsáveis pela circulação do periódico procuravam negar: “Para os editores, porém, parecia ser fundamental dissuadir o público leitor da ideia da folha ser oficial, para que assim tentassem evitar associações arbitrárias entre os fatos e notícias veiculadas, e a ótica dos valores monárquicos” (MEIRELLES, 2008, p. 71). Dessa forma, Frei Tibúrcio José da Rocha, oficial da Secretaria dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, redator da Gazeta entre 1808 e 1812, acusava os periódicos franceses de serem parciais e tendenciosos, mas não reconhecia essa mesma característica no seu próprio trabalho. Importante não perder de vista, igualmente, que assim como todas as outras publicações da Impressão Régia, a Gazeta do Rio de Janeiro também estava submetida a rígida censura exercida pela Junta Administrativa da Impressão Régia, que servia também como Junta Diretora da Gazeta.

Um exemplo interessante dessa prática pode ser encontrado na edição de primeiro de outubro de 1808, na qual é copiada uma proclamação de Junot aos habitantes das províncias de Entre Douro e Minho, então sublevadas contra a presença francesa, intercalada com comentários escritos pelo redator do periódico de onde se copiou a proclamação, a Minerva Lusitana, destacados em itálico para diferenciar-se do texto da Proclamação:

O Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Duque de Abrantes, General em Chefe do Exército de Portugal, acaba de dirigir a proclamação seguinte aos habitantes de algumas partes das províncias de Entre Douro e Minho e dos Algarves. O General Junot não é Duque de Abrantes porque ainda semelhante título lhe não foi conferido pelo legítimo soberano deste Reino, de quem só o podia receber. [...] Os quais, deixando-se levar por conselhos pérfidos, se sublevaram. Nós não nos sublevamos. Pegamos em armas para defendermos os direitos do nosso legítimo soberano e da nossa pátria, oprimidos por usurpadores. Nem [ilegível] tivemos conselhos alguns para assim obrarmos. Fizemos o que devíamos de [ilegível] nossa própria deliberação. Sem calcular a impossibilidade de bom êxito durável de uma tão desatinada empresa. O próprio General Junot conhecerá brevemente se a empresa há de ter bom ou mau êxito. (GAZETA DO RIO DE JANEIRO, 1808c, p. 1, grifos do autor).

A primeira expulsão dos franceses do território português, em finais de 1808, foi amplamente noticiada. Ainda no mês de setembro de 1808, o periódico dedica dois números para dar notícias sobre a expulsão dos franceses do Algarve (números 4 e 5, de 24 e 28 de setembro). Em procedimento muitas vezes repetido, depois de publicar o extrato de variada correspondência chegada daquela província, o redator escreve um longo comentário de cunho patriótico, no meio do qual indaga:

As outras províncias de Portugal, vendo aceso no Algarve o nobre fogo do patriotismo, ficarão espectadoras ociosas dos esforços dos seus compatriotas? Os portugueses, que em diferentes épocas tem por mais de uma vez expelido os seus opressores em toda parte do mundo, que tem por brasão o amor da religião, dos soberanos e da pátria, [...] esquecer-se-ão do antigo brio agora que o Algarve lhe apresenta o exemplo? É de esperar que não, pois em todo o reino se manifestam palpáveis sinais de decidida revolta. (GAZETA DO RIO DE JANEIRO, 1808b, p. 2-3).

Os reveses portugueses e dos seus aliados, por outro lado, são sempre noticiados de forma indireta ou acompanhados de comentários do redator. A segunda invasão francesa, ocorrida em março de 1809, é noticiada no Rio de Janeiro apenas na edição extraordinária de 16 de maio a partir da cópia de uma ordem geral do Marechal Beresford publicada em Lisboa em 4 de abril, na qual se comunica a queda da cidade do Porto (Gazeta Extraordinária do Rio de Janeiro, n. 29, 16 de maio de 1809). Nada mais se publica sobre o assunto até a edição de 21 de junho, que traz uma proclamação do Marechal Soult aos portugueses, intercalada de comentários patrióticos que parecem feitos pelo redator do periódico do qual ela foi copiada, em que este procura refutar ponto por ponto as afirmações do comandante francês:

Em consequência dos sucessos memoráveis que tem havido em Espanha, o exército de S.M. o Imperador e Rei, meu Augusto Soberano, outra vez se apresenta no vosso território e deve, em nome do mesmo Senhor ocupar aí toda superfície.

Já quando no mês de fevereiro intentaram os franceses atravessar o Minho, nos enviaram adiante sua papeleta com o ridículo nome de Proclamação. Foram, então, destroçados e passaram a buscar a fronteira de outra província mais aberta e onde supõem, por isso, menos obstáculos. Porém enganam-se, que os peitos Transmontanos, ajudados pelos corpos disponíveis das outras províncias lhes oporão uma barreira de bronze. Poderão ocupar algumas terras limítrofes, porém uma contínua e mortífera guerra lhes fará abandonar sua empresa. Deve ocupar toda superfície! Como os senhores têm nisso vontade, é o que basta. O seu dever não conhecerá outras regras para fazer guerras bárbaras, injustíssimas, e atropelar nações inocentes? Senão de onde nascerá uma tal dívida de nossa parte (GAZETA DO RIO DE JANEIRO, 1809a, p. 1, grifos do autor).

Mas, já na edição de 5 de julho começam a ser publicadas notícias sobre o início da campanha que resulta na segunda expulsão dos franceses, ocorrida efetivamente em maio. Dessa forma, enquanto a segunda ocupação francesa de Portugal durou aproximadamente dois meses, no Rio de Janeiro a divulgação das notícias da invasão e da expulsão dos franceses teve um intervalo de apenas duas semanas:

Por notícias vindas de Lisboa e dadas pelo mestre do navio Flor de Pernambuco, proximamente chegado a este porto com 30 dias de viagem; por cartas de João Antonio Vieira Caldas, negociante daquela praça, e de José Pedro da Costa Barradas, Juiz de Fora da vila de Recardães, consta terem já partido de socorro à cidade do Porto invadida pelo inimigo 19.000 homens, em cujo número entram 4.000 portugueses, esperando-se todos os dias a notícia da retomada da dita cidade pelos nossos e pelos ingleses. Que o inimigo já estava fora de Guimarães e Braga. Que tinha sido expulso de quase toda a Galiza e batido em muitos pontos. Que eram grandes os socorros da Inglaterra tanto para a Espanha quanto para Portugal e muitos os donativos nacionais. [...] Que os franceses do Porto já pediam capitulação, a qual se lhes havia negado. (GAZETA DO RIO DE JANEIRO, 1809b, p. 4).

Segundo a síntese de Tereza Cardoso (1991, p. 400), da análise do conteúdo das notícias publicadas “observamos que foram escritas em tom patriótico, valorizando e incentivando os portugueses em sua luta contra Napoleão”. Ressaltavam, sobretudo, a marcha da restauração em Portugal e Espanha, dando destaque para as derrotas das tropas napoleônicas, e publicavam diversas proclamações dos generais portugueses e dos governadores do Reino aos seus soldados e à população em geral. O que torna a linguagem utilizada no periódico muito parecida com a narrativa encontrada nos panfletos políticos publicados no mesmo período. O que nos permite incluir o periódico entre as publicações identificadas por Maria Beatriz Nizza da Silva como pertencentes ao Ciclo Napoleônico.

Como citado anteriormente, Juliana Gesuelli Meirelles mostra que a difusão da ideia de imparcialidade teria sido uma importante preocupação dos redatores da Gazeta ao longo de todo o período joanino. A edição do periódico de 29 de abril de 1809, todavia, traz um artigo bastante esclarecedor sobre a forma como eles concebiam o papel dos periódicos naquela conjuntura política, intitulado Discurso sobre a utilidade dos papéis públicos na presente guerra. Apesar de ter sido publicado anonimamente na Gazeta do Rio de Janeiro, explica Juliana Gesuelli Meirelles, que o artigo era de autoria de Francisco Soares Franco (1772-1843), bacharel em Medicina pela Universidade de Coimbra e professor de anatomia na mesma universidade, a partir de 1806 (MEIRELLES, 2008, p. 98). No contexto das invasões francesas, a exemplo do que acontece com José Acúrsio das Neves, Soares Franco se afasta das suas funções públicas para escrever uma série de panfletos antinapoleônicos, três dos quais publicados também pela Impressão Régia do Rio de Janeiro (entre 1809 e 1810): Reflexões sobre a conduta do Príncipe Regente de Portugal; Exame das causas que alegou o gabinete de Tulherias para mandar contra Portugal os exércitos francês e espanhol em Novembro de 1807 e a Memória em que se examina qual seria o estado de Portugal se por desgraça os franceses o chegassem a dominar.

Exerceu, ao mesmo tempo, o cargo de redator da Gazeta de Lisboa (entre 1808 e 1812), cujo Discurso sobre a utilidade dos papéis públicos na presente guerra foi primeiramente publicado na edição de 6 de janeiro de 1809 (MEIRELLES, 2008, p. 98). No artigo, Soares Franco acusa os franceses de inaugurarem uma nova modalidade de guerra. Afirma ele que até a Revolução Francesa era possível calcular o resultado de uma guerra sabendo-se de antemão a riqueza do erário, o número das tropas, a habilidade dos generais e a sabedoria dos ministros das diversas potências beligerantes. Porém, a Revolução Francesa, no seu intuito de extinguir a religião e aniquilar a nobreza por toda a Europa, tal como fez na própria França, necessitava iludir os outros povos e os indispor contra seus próprios príncipes, representando os seus governos como “miseráveis, ilegais e incapazes de conduzirem a felicidade aos lares dos seus povos” (FRANCO, 1809FRANCO, F. S. Discurso sobre a utilidade dos papéis públicos na presente guerra. Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 de abril de 1809. n. 66, p. 2-4. (Impressão Régia do Rio de Janeiro)., p. 2):

Então, se proclamou um novo gênero de guerra; uma guerra de direitos sociais que excite a desordem e a divisão até no centro das famílias. Divisão que correspondeu cabalmente aos diabólicos fins que se tinham proposto os Jacobinos de Paris, e que foi a principal chave que abriu as portas às conquistas francesas. Os papéis públicos vieram, em conseqüência, a subministrar uma das principais armas aos exércitos franceses (FRANCO, 1809FRANCO, F. S. Discurso sobre a utilidade dos papéis públicos na presente guerra. Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 de abril de 1809. n. 66, p. 2-4. (Impressão Régia do Rio de Janeiro)., p. 2-3).

Tal como faziam os autores dos panfletos políticos, o autor do artigo apresenta as campanhas de expansão napoleônicas como continuidade da Revolução Francesa e tece um longo elogio ao governo britânico, segundo ele o único da Europa que compreendeu “a força irresistível desta nova arma e tentou destruí-la com outra igual”. Então, em Inglaterra:

Homens de talento que conheciam o estado político da Europa foram incumbidos de desmascarar de diversas maneiras, conforme circunstâncias, as intrigas do Governo Francês, e de sustentar perpetuamente o espírito público e as operações do governo, inclinando-as umas vezes à paz, outras à guerra (FRANCO, 1809FRANCO, F. S. Discurso sobre a utilidade dos papéis públicos na presente guerra. Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 de abril de 1809. n. 66, p. 2-4. (Impressão Régia do Rio de Janeiro)., p. 3).

Segundo o autor, foram os bons escritos periódicos que fizeram duplicar os recursos da Grã-Bretanha para ir à guerra contra a França. Dessa forma, a utilidade dos papéis públicos em tais conjunturas era fazer da guerra em que se luta uma guerra nacional, apresentando aos povos o seu verdadeiro estado político, suas forças, seus recursos ordinários e extraordinários e, principalmente, convencendo-os da sabedoria e do patriotismo de seus chefes. Para ele esses mesmos princípios deveriam ser seguidos por Portugal e Espanha:

É preciso que os escritos periódicos destas duas nações desmascarem os crimes e as intrigas do inimigo comum; é necessário que instruam os povos acerca da sua verdadeira situação e da sua força e recursos irresistíveis; mas é igualmente necessário que, ao mesmo tempo, lhes digam que estes grandes recursos e esta força não é irresistível senão quando as nações têm uma confiança cega e inteira no seu governo e nos seus chefes, quando esperam em tranquilidade as ordens e as executam com prontidão (FRANCO, 1809FRANCO, F. S. Discurso sobre a utilidade dos papéis públicos na presente guerra. Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 de abril de 1809. n. 66, p. 2-4. (Impressão Régia do Rio de Janeiro)., p. 4).

Com a publicação desse texto, o redator da Gazeta do Rio de Janeiro contrariava qualquer pretensão de imparcialidade por parte do periódico, deixando explícitos os objetivos que ele se via obrigado a perseguir, por dever patriótico, ao divulgar as notícias do front europeu no Rio de Janeiro: a utilização da palavra escrita como arma de combate. O que ressalta a semelhança não só de linguagem, mas também de objetivos, entre os periódicos e os panfletos políticos publicados na mesma época; e deixa patente, mais uma vez, a relação intrínseca existente entre saber e poder na mentalidade ilustrada portuguesa, da qual o trabalho da Impressão Régia do Rio de Janeiro se apresentava como herdeira.

Considerações Finais

A análise comparativa da linguagem utilizada nos panfletos políticos antinapoleônicos e nas notícias da Gazeta do Rio de Janeiro sobre a guerra peninsular, aqui intentada, teve como objetivo ressaltar a sua semelhança com o intuito de apontar para um sentido mais geral da atuação da Impressão Régia (em particular) e da imprensa portuguesa (em geral) naquele contexto: o seu papel político fundamental na defesa e sustentação da monarquia portuguesa em uma conjuntura política conturbada, na qual o próprio Império português esteve ameaçado de desaparecer.

Juliana Gesuelli Meirelles (2008) já havia chamado a atenção para o papel de relevo desempenhado pela Gazeta do Rio de Janeiro na sustentação do reinado de D. João no Rio de Janeiro, para além do seu caráter de veículo de informações oficial da corte. A autora atentou para o fato de que não fazia sentido haver uma corte sem uma gazeta na época, uma vez que estas cumpriam um importante papel na instituição monárquica. Explica que, fosse incentivando financeiramente as folhas de interesse real, fosse combatendo os jornais de tendência ofensiva ao governo, a Coroa Portuguesa sob o governo joanino concebeu a imprensa como “parte fundamental da sua ação política e cultural e, consequentemente, em um âmbito mais amplo, como âncora de sustentação do Império Português em ambos os lados do Atlântico” (MEIRELLES, 2008, p. 141). Assim, a atuação da Impressão Régia do Rio de Janeiro inseria-se numa forma típica de fazer política das sociedades de Antigo Regime, cujo discurso de imparcialidade da imprensa não passava de um artifício retórico que tinha o objetivo de garantir a sua credibilidade junto ao público leitor.

Em tempos de disseminação virtual da informação, de luta por uma imprensa que se pretende cada vez menos submetida a ditames políticos e pela livre circulação do conhecimento, diante das constantes tentativas de censura da Internet por parte de diversos governos, este artigo busca chamar a atenção para um tema que se mostra atual ainda hoje: as relações entre saber e poder (ou entre cultura e política). Se, nos dias atuais, o ideal buscado parece ser o de uma cada vez maior desvinculação entre Estado e imprensa; em um ambiente conformado por estruturas políticas e sociais de tipo absolutista, como o do Império Português do início do século XIX, a imprensa era concebida, antes de tudo, como ressalta Juliana Gesuelli Meirelles, como “um instrumento de afirmação da realeza” (MEIRELLES, 2008, p. 71).

É importante não perder de vista que esse papel político só era efetivo enquanto a Impressão Régia era praticamente a única tipografia da América portuguesa e em virtude da ação da censura sobre a sua atuação.8 8 Além da Impressão Régia do Rio de Janeiro, a única tipografia autorizada a funcionar regularmente entre 1808 e 1821 foi a tipografia de Antônio da Silva Serva, em Salvador. Essa tipografia também funcionava sob rígido sistema de censura e, por isso, reproduzia em certa medida a representação do rei e do reinado construída na Corte, aproximando a capital da capitania da Bahia do centro de decisões políticas: a Corte do Rio de Janeiro. Pois, como aponta Rui Tavares, “a censura (bem como a propaganda) é uma forma de intervir sobre as memórias do passado e de reconfigurar as narrativas através das quais ela sobrevive” (TAVARES, 1999, p. 144). Após a regulamentação da liberdade de imprensa nos debates constitucionais nas Cortes de Lisboa e o aviso de 28 de agosto de 1821, que estabelecia aquela liberdade no Brasil, embora com restrições, multiplicaram-se as tipografias particulares. A partir desse momento, pode-se sugerir que deve haver uma amenização da eficácia desse papel político atribuído à Impressão Régia, uma vez que, não estando mais submetida à censura oficial a própria tipografia muda de caráter. Além disso, a pluralidade de vozes abafaria a eficácia do seu papel de sustentação da monarquia.

Porém, apesar dos esforços da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, é importante atentar para o fato de que o discurso sobre os acontecimentos políticos produzido nas diversas partes do Império Português não era homogêneo. A atenção para as suas nuances, que não foi o foco no presente artigo, tem o mérito de revelar as tensões existentes na realização de um projeto político de re-criação da monarquia portuguesa, levado a cabo nessa mesma conjuntura, a partir da necessidade de transferência da corte para a América com a invasão do Reino pelas tropas francesas.

ReferênciasFontes

  • COUTINHO, J. C. da S. Memória Histórica da Invasão dos francezes em Portugal no ano de 1807. Rio de Janeiro: Na Impressão Régia, 1808.
  • EDITAL de 1 de fevereiro de 1808. Correio Braziliense ou Armazém Literário, n. 3, agosto de 1808, São Paulo. Brasília: Imprensa Oficial do Estado; Correio Braziliense, 2001a. p. 163-167. (Edição fac-similar).
  • EDITAL de 23 de dezembro de 1807. Correio Braziliense ou Armazém Literário. n. 3, agosto de 1808, São Paulo. Brasília: Imprensa Oficial do Estado; Correio Braziliense, 2001b. p. 169-176. (Edição fac-similar).
  • FRANCO, F. S. Discurso sobre a utilidade dos papéis públicos na presente guerra. Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 29 de abril de 1809. n. 66, p. 2-4. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • GAZETA DO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro, 10 set. 1808a. n. 1, p. 3. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • GAZETA DO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro, 28 set. 1808b. n. 5, p. 2-3. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • GAZETA DO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro, 1 out. 1808c. n. 6, p. 1. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • GAZETA DO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro, 19 out. 1808d. n. 11, p. 3-4. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • GAZETA DO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro, 21 jun. 1809a. n. 81, p. 1. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • GAZETA DO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro, 5 jul. 1809b. n. 85, p. 4. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • GAZETA EXTRAORDINÁRIA DO RIO DE JANEIRO, Rio de Janeiro, 18 jun. 1811. n. 11, p. 4.
  • NEVES, J. A. A Salvação da Pátria: proclamação aos portugueses sobre a sua honra e o seu dever nas atuais circunstâncias da monarquia. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809a.
  • NEVES, J. A. A generosidade de Jorge III e a ambição de Bonaparte: Wellesley e os generais franceses. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809b.
  • NEVES, J. A. Manifesto da razão contra as usurpações francesas. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809c.
  • NEVES, J. A. O Despertador dos Soberanos e dos Povos. Rio de Janeiro: Na Impressão Régia, 1809d.
  • NEVES, J. A. Reflexões sobre a invasão dos franceses em Portugal. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809e.
  • NOTÍCIAS da Península - Badajoz 6 de Junho, parte dada à Suprema Junta pelo Alcaide Mor de Brozas. Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 out. 1809. n. 113. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • PROCLAMAÇÃO dos governadores do Reino à nação portuguesa, Lisboa 16 de dezembro. Gazeta do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 04 fev. 1809. n. 42, p. 3. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).
  • PROTEÇÃO à francesa. Rio de Janeiro, 1809. (Impressão Régia do Rio de Janeiro).

Livros e Artigos

  • CARDOSO, T. M. F. L. A Gazeta do Rio de Janeiro: subsídios para a história da cidade (1808-1821). Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, Ano 152, n. 371, p. 341-436, abr./jun. 1991.
  • CARVALHO, J. M. de; NEVES, L. M. B. P.; BASILE, M. (Orgs.). Guerra Literária: panfletos da Independência (1820-1823). Belo Horizonte: UFMG, 2014. 4 v.
  • CATROGA, F. Os passos do homem como restolho do tempo: memória e fim do fim da história. Coimbra: Almedina, 2009.
  • MAGALHÃES, J. C. José Acúrsio das Neves. Lisboa: SNI, 1946.
  • MEIRELLES, J. G. A Gazeta do Rio de Janeiro: imprensa e poder na corte joanina. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2008.
  • MORAES, R. B. de. Livros e Bibliotecas no Brasil Colonial. São Paulo: Secretaria de Cultura, Ciência e Tecnologia, 1979.
  • MORAES, R. B. de; CAMARGO, A. M. de A. Bibliografia da Impressão Régia do Rio de Janeiro. São Paulo: EdUSP/Kosmos, 1993. 2 v.
  • MOREL, M.; BARROS, M. M. de. Palavra, Imagem e Poder: O surgimento da Imprensa no Brasil do século XIX. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
  • NEVES, L. M. B. P. das. Entre impressos e manuscritos: a “Guerra da Pena” na Independência do Brasil (1820-1822). In: CURY, C. E.; GALVES, M. C.; FARIA, R. H. M. de (Orgs.). O Império do Brasil: educação, impressos e confrontos sociopolíticos. São Luís: Café & Lápis; Editora UEMA, 2015. p. 155-183.
  • NEVES, L. M. B. P. Napoleão Bonaparte: Imaginário e Política em Portugal c. 1808-1810. São Paulo: Alameda Casa Editorial, 2008.
  • NEVES, L. M. B. P. Panfletos. In: VAINFAS, R. (Dir.). Dicionário do Brasil Imperial (1822-1889). Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. p. 560-562.
  • NEVES, L. M. B. P. das; MOREL, M.; FERREIRA, T. M. B. da C. (Orgs.). História e imprensa: representações culturais e práticas de poder. Rio de Janeiro: DP&A; Faperj, 2006.
  • RIZZINI, C. O livro, o jornal e a tipografia no Brasil, 1500-1822: um breve estudo geral sobre a informação. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1988. (Edição fac-similar de Rio de Janeiro: Kosmos, 1946).
  • RODRIGUES, A. M.; BRITO, J. S. de. D. João VI e o seu tempo. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1999.
  • SILVA, M. B. N. da. A Gazeta do Rio de Janeiro: Cultura e Sociedade. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2007.
  • SILVA, M. B. N. da. Cultura e Sociedade no Rio de Janeiro (1808-1821). 2. ed. São Paulo: Nacional, 1978.
  • SODRÉ, N. W. A Imprensa Colonial. In: SODRÉ, N. W.História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966. p. 11-49.
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  • TAVARES, R. Lembrar, esquecer, censurar. Estudos Avançados, São Paulo, v. 13, n. 37, p. 125-154, set./dez. 1999.
  • VILLALTA, L. C. Censura Literária e inventividade dos leitores no Brasil colonial. In: CARNEIRO, M. L. T. (Org.). Memórias Silenciadas: História da censura no Brasil. São Paulo: EdUSP/FAPESP, 2002. p. 45-89.

Notas

  • 1
    Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra (1787), desembargador do Desembargo do Paço, Juiz de Fora (1797 a 1799) e depois Corregedor da cidade de Angra (1799 a 1802), sócio da Academia Real de Ciências de Lisboa (1810), deputado e secretário da Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, deputado da junta de liquidação dos fundos da extinta Companhia de Comércio do Pará e Maranhão, deputado da direção da Real Fábrica das Sedas do Subúrbio do Rato e obras das Águas Livres, Desembargador da Relação do Porto. Foi no exercício dessas funções de administrador fabril, que publicou as suas obras de Economia Política mais importantes: Variedades sobre vários objetos relativos às Artes, Comércio e Manufaturas consideradas segundo os princípios da Economia Política (2 volumes, 1814 e 1817) e Memória sobre os meios de melhorar a Indústria Portuguesa, considerada nos seus diferentes ramos (1820).
  • 2
    O período de ocupação francesa do Reino de Portugal não foi ininterrupto, dividindo-se em três invasões dos exércitos franceses, com suas três subsequentes expulsões: a primeira invasão, comandada pelo General Jean-Andoche Junot, durou de novembro de 1807 a agosto de 1808; a segunda, comandada por Nicolas Jean-de-Dieu Soult, de março a maio de 1809; e, finalmente, a terceira, comandada pelo General André Massena, durou de agosto de 1810 a abril de 1811.
  • 3
    Como órgão do aparelho burocrático de administração do Império, subordinada que estava à Secretaria dos Negócios Estrangeiros e da Guerra por seu Decreto de criação (datado de 13 de maio de 1808), cabia à nova tipografia a impressão de toda a legislação e papéis diplomáticos que emanassem de qualquer repartição do Real Serviço. E, como não havia outra tipografia na colônia, ao menos oficialmente, cabia-lhe também imprimir todas as outras obras. Entre 1808 e 1822, a Impressão Régia do Rio de Janeiro publicou mais de mil itens, entre folhetos, opúsculos, sermões, oratória sacra, odes, prospectos, peças de teatro, obras literárias e científicas versando sobre agricultura, comércio, ciências naturais, matemática, história, economia política, direito, medicina, filosofia, romance, poesia e educação, além de traduções de textos franceses e ingleses (MORAES; CAMARGO, 1993).
  • 4
    Tal alvará extinguia a Comissão Geral para o Exame e a Censura dos Livros criada por D. Maria I apenas sete anos antes (decreto de 21 de junho de 1787). Esse ato administrativo reestabelecia a censura tripartida exercida pelo Ordinário, pela Inquisição, e pelo Desembargo do Paço, determinando as diferentes esferas de atuação de cada um desses três órgãos. A partir de então a Igreja podia fazer o exame dos livros religiosos, mas era o Estado que avaliava os livros sobre assuntos laicos e que podia baixar a proibição ou não de todos os livros, fossem eles religiosos ou não. Dessa forma, o Desembargo do Paço desempenhava um papel central (e final) no processo censório, deixando claro que a sua preocupação principal passava do plano religioso para o plano político.
  • 5
    Apesar de não constar o nome do autor no frontispício da publicação, de acordo com anúncio na Gazeta do Rio de Janeiro, a autoria da obra seria de José Daniel Rodrigues da Costa: “Saiu à luz a obra mui jocosa: Surriada a Massena em Portugal e encontro das duas rivais no Palácio Imperial de França, por José Daniel Rodrigues da Costa. Vende-se na loja da Gazeta a 320 réis, onde se acha, do mesmo autor, Proteção à Francesa, por 320 réis, e o Embarque dos apaixonados dos Franceses, por 320 réis” (GAZETA EXTRAORDINÁRIA DO RIO DE JANEIRO, 1811, p. 4).
  • 6
    Esse mesmo elenco de temas relacionado à primeira ocupação francesa do Reino foi objeto de uma série de Composições Alegóricas alusivas às invasões francesas, de autoria anônima, realizadas entre 1807 e 1808. Reproduzidas em Rodrigues e Brito (1999, p. 292-293).
  • 7
    O primeiro número do periódico veio a público no dia 10 de setembro de 1808 e trazia a informação de que a sua periodicidade seria semanal, que poderia ser encontrado na loja do livreiro Paulo Martin, mas também contava com um sistema de assinaturas. Mas, já a partir do segundo número o periódico passou a circular duas vezes por semana. Dessa forma, até julho de 1821, a Gazeta saía às quartas e aos sábados pela manhã. A partir dessa data passou a circular três vezes por semana, às terças, quintas e aos sábados. Além dos números regulares, também eram publicados os números extraordinários, denominados Gazeta Extraordinária do Rio de Janeiro. A Gazeta do Rio de Janeiro circulou ininterruptamente entre 10 de setembro de 1808 e 29 de dezembro de 1921, totalizando 1413 números ordinários e 204 extraordinários.
  • 8
    Além da Impressão Régia do Rio de Janeiro, a única tipografia autorizada a funcionar regularmente entre 1808 e 1821 foi a tipografia de Antônio da Silva Serva, em Salvador. Essa tipografia também funcionava sob rígido sistema de censura e, por isso, reproduzia em certa medida a representação do rei e do reinado construída na Corte, aproximando a capital da capitania da Bahia do centro de decisões políticas: a Corte do Rio de Janeiro.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    20 Abr 2017
  • Aceito
    25 Jul 2017
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