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JUSTIFICANDO NOBREZAS: Velhas e novas elites coloniais 1750-1807

RESUMO

Entre 1750 e 1807, 259 súditos ultramarinos da monarquia portuguesa recorreram à justificação de nobreza para receber brasões de armas. Ao analisar o acervo, o artigo empregou o método quantitativo para traçar o perfil social sobretudo das elites luso-brasileiras e assim constatou que os oficiais das tropas auxiliares e das ordenanças era a categoria social mais predominante. O estudo ainda detectou que as antigas elites eram pouco representativas na Bahia e Rio de Janeiro e muito presentes em Pernambuco e Maranhão.

Palavras-chave:
Nobreza; Elites; Militar; Ultramar; Brasil colonial

ABSTRACT

Between 1750 and 1807, 259 overseas subjects of the Portuguese monarchy used the justification of nobility process to receive coats of arms. This article uses quantitative methods to analyze their petitions and trace their social profile, especially of the Luso-Brazilian elites, noting that the new elites, particularly the officers of the militia, were the predominant social category. The study also found that the old elites were hardly representative in Bahia and Rio de Janeiro and very present in Pernambuco and Maranhão.

Keywords:
Nobility; Elites; Military; Overseas; Colonial Brazil

No Antigo Regime,1 1 Agradeço à leitura e crítica de Nuno Monteiro, Thiago Krause, Alexandre Pelegrino e Giovane Albino. João Fragoso e Nuno Monteiro ainda me auxiliaram com as fontes e bibliografia. a honra não era um mero valor, uma distinção etérea e subjetiva. Ela devia se materializar em privilégios, isenções e liberdades que permitiam enquadrar o indivíduo na hierarquia social. Pouco valia ser honrado e permanecer sem os títulos e as benesses da monarquia. Como reconhecimento da honra, o soberano concedia privilégios, cargos, patentes e títulos que tornavam visível a posição social do súdito. Deixava, assim, a honra de ser apenas um epíteto para materializar-se, torna-se referência social. Com o reconhecimento régio, o indivíduo estava apto a ocupar posições nobres, contar com justiça especial, isenções de determinados impostos, receber tenças ou vultuosas comendas, exercer cargos disponíveis ao segundo estado, introduzir-se nos melhores ambientes e desfrutar da sociabilidade de seus pares (MARAVALL, 1989MARAVALL, José Antonio. Poder, honor y elites en el siglo XVII. Madrid: Siglo XXI, 1989., p. 11-146; MONTEIRO, 1987MONTEIRO, Nuno. Notas sobre nobreza, fidalguia e titulares nos finais do Antigo Regime. Ler História, Lisboa, n. 10, p. 15-51, 1987. , p. 15-51).

Desde o início da colonização, aos moradores da América estavam destinados somente três tipos de honraria: os foros de fidalgo, as comendas e os hábitos das Ordens Militares. Vale aí mencionar que os títulos da alta nobreza estavam vetados aos moradores do ultramar. As três mencionadas remunerações comumente originavam-se dos serviços militares. Por isso, a distribuição de mercês régias se tornou intensa logo após as guerras contra os neerlandeses. Os moradores das capitanias de Pernambuco e Bahia, entre 1640 e 1680, fizeram 439 pedidos de mercê de hábitos. Desse montante, somente 116 tiveram o pedido negado e não ingressaram nas ordens militares portuguesas. Os foros de fidalgo eram também cedidos aos moradores do Brasil como remuneração de guerra. À época, existiam duas ordens de fidalgos: na primeira, com os foros mais prestigiados, encontravam-se "fidalgo cavaleiro", "fidalgo escudeiro" e "moço fidalgo"; na segunda, "cavaleiro fidalgo", "escudeiro fidalgo" e "moço de câmara" que estava na base dessa hierarquia. Entre 1641 e 1681, 244 beneméritos receberam título (ou foro) de fidalgo pelos serviços militares executados no Estado do Brasil e no Estado do Maranhão. Os foros da segunda ordem, particularmente os cavaleiros fidalgos, perfazem 69% de todas as mercês. Entre os fidalgos de primeira ordem, somente 18% eram filhos de fidalgos. Entre os 244 novos fidalgos, somente 11% já eram cavaleiros das Ordens de Cristo e Santiago. No entanto, entre os 27 cavaleiros, 18 receberam o foro mais prestigioso, o de fidalgo-cavaleiro.2 2 Sobre os hábitos das ordens militares e foros de fidalgo ver: KRAUSE (2012 , p. 94-96, 133-152), RAMINELLI (2015 , p. 23-59, 132). Para a venalidade dos hábitos no período pombalino ver: OLIVAL (1988-1989 , p. 73-97; 2001, p. 202-217), STUMPF (2014 , p. 265-360). Sobre a concessão de foros de fidalgo em Portugal, indico as médias decenais apresentadas por OLIVAL (2001 , p. 176). A citação encontra-se na página 177.

Os estudos luso-brasileiros também investigaram as Ordens Militares no período pombalino (1750-1777) quando os vassalos ultramarinos passaram a receber títulos de cavaleiro mediante a compra de serviços militares de terceiros e do perdão régio para o eventual defeito mecânico. Eram notadamente militares, mineiros e comerciantes ricos e dispostos a despender altas somas de capital para ingressar na baixa nobreza lusitana. Os pretendentes deviam adquirir 10 ações da Companhia do Grão-Pará e Maranhão ou da Companhia de Pernambuco e Paraíba, ou entregar oito arrobas de ouro anuais nas Casas de Fundição da Capitania de Minas Gerais

Na América portuguesa, os títulos de cavaleiro proporcionavam tenças, foro privilegiado na justiça e limpeza de sangue. Os agraciados deveriam ser julgados pelos juízes dos cavaleiros ou pelos bispos. Não poderiam ser presos na cadeia e castigados em praça pública. Seus bens não poderiam ser confiscados em caso de guerras ou em outras eventualidades. Antes da restauração (1640), estavam isentos dos dízimos os comendadores, cavaleiros das Ordens Militares, desembargadores, fidalgos, oficiais de guerra, familiares do Santo Ofício, entre outros. No entanto, o novo governo cassou esse privilégio, embora a nobreza da terra tentasse resistir às ordens régias (RAMINELLI, 2015RAMINELLI, Ronald. Nobrezas do Novo Mundo. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2015. , p. 23-25).

Os estudos sobre os privilégios recebidos pelas elites ultramarinas ainda precisam de muitos detalhamentos. Embora haja trabalhos sobre os cavaleiros das Ordens Militares para o Seiscentos em Pernambuco e Bahia, falta conhecimento sobre as demais capitanias. Para o século das luzes, as investigações são ainda mais incipientes, e não contamos com levantamento geral dos cavaleiros das Ordens Militares residentes no Brasil, Grão-Pará e Maranhão. A concessão de foros de fidalgo e a fidalguia luso-brasileira são temas quase inexplorados. Os estudos são ainda mais lacunares quando se referem aos processos de justificação da nobreza e de concessão de brasões de armas, embora haja farta documentação depositada na Torre do Tombo.

O presente artigo pretende explorar os processos de justificação da nobreza depositados no fundo dos Feitos Findos da Torre do Tombo e as concessões de brasões de armas registradas no Archivo Heraldico-Genealogico do Visconde de Sanches de Baena (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872.). As duas fontes são complementares, pois para se obter os brasões era imprescindível comprovar a nobreza. O enfoque, porém, estará nos autos de justificação da nobreza e não nos brasões de armas. O estudo pretende traçar um perfil sociológico dos colonos que desejavam comprovar a sua nobreza. Por certo, os suplicantes eram homens abastados e honrados, mas se originavam das primeiras famílias ou se consolidaram como elites ao longo do século XVIII? Eram novas ou velhas elites? As antigas famílias tinham interesse de ter um brasão de armas? Vale mencionar que o presente artigo pretende analisar resultados quantitativos e terá condições limitadas para explorar o assunto com mais vagar.

Brasão de armas e seu processo judicial

Desde a Idade Média, os reis portugueses procuraram preservar os antigos brasões de armas e controlar a concessão de novos. D. Fernando (1367-1383) ordenou fazer um rico paramento, todo bordado, com as armas de Portugal para conservar seus brasões e apelidos, "querendo que só aqueles, a quem de direito tocavam, fossem honrados com elas. Para isto ordenaram os Reis de Armas, em cujos os livros mandaram pintar as insígnias de todas as linhagens do Reino" (FARIA, 1740FARIA, Manuel Severim de. Noticias de Portugal. Lisboa: Officina de António Isidora da Fonseca, 1740. , p. 109-110). Desde então, os reis de armas estavam encarregados de analisar a justificação da nobreza, confeccionar e registrar os brasões. O controle sobre as insígnias tornou-se relevante porque era, de fato, o reconhecimento régio da nobreza das famílias. El-rei D. Afonso V (1438-1477) buscou então reformar a dinâmica da concessão dos brasões com o intuito de reprimir os abusos e intervir, de forma mais efetiva, na composição da nobreza. À época, criou-se o livro de registros e tombos das armas de todos os fidalgos antigos e de linha direta (FRANCO, 1989FRANCO, Luís F. Farinha. Les officiers d'Armes (rois d'armes, herauts et poursuivants) et les reformateurs du greffe de la noblesse XVII-XVIII siècles. Arquivo do Centro Cultural Português, Lisboa, n. 26, p. 453-598, 1989., p. 453).

Em 1476, o monarca defendia que nenhum plebeu estava autorizado a trazer armas em escudos, exceto os nobres hierarquicamente acima dos fidalgos de cota de armas (SÃO PAYO, 1927SÃO PAYO, Marquês de. Do direito heráldico português. Lisboa: Centro Tip. Colonial, 1927., p. 21). O descumprimento da norma acarretava a pena de um marco de prata pago ao rei de armas. Assim, o soberano reforçava a atuação de seus agentes responsáveis pelos brasões. Anos depois, D. Manuel (1495-1521) ordenou a composição de dois livros com as armas de todas as famílias do reino que seriam depositados em diferentes locais: o primeiro na Torre do Tombo (Real Arquivo) e o outro em poder do armeiro-mor. O rei ainda mandou ver todas as sepulturas do reino para verificar as armas e imagens aí encontradas. De fato, o monarca tencionava mandar pintar todos os escudos com as suas cores e timbres, obra executada nos paços de Cintra (SÃO PAYO, 1927RHEINGANTZ, Carlos G. Primeiras famílias do Rio de Janeiro (séculos XVI e XVII). Rio de Janeiro: Livraria Brasiliana Editora, 1965-1967. 2v., p. 21; BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. XII-XIV). Aliás, o mesmo soberano criou uma estrutura institucional e funcional sob a forma de uma corporação capaz de reforçar as atribuições do mencionado funcionário régio.3 3 Sobre o rei de armas encontrei alguns estudos. Ver: SÃO PAYO (2001 , 2001 a); CABRAL (2001) ; CUNHA (1963 , p. 367-383). O Regimento da Nobreza dos Reis de Armas (1512) estabeleceu uma carreira e indicou representantes para cada reino: Portugal, Algarves e Índia. Assim, a arte heráldica estava sob a responsabilidade dos reis de armas, arautos e passavantes, denominados oficiais de armas.4 4 Somente muito mais tarde o Brasil terá um rei de armas, pois no Quinhentos era somente a terra de pau-brasil ( FRANCO, 1989 , p. 453-454; CUNHA, 1963 , p. 367-383).

Segundo o direito heráldico português, as cartas de brasão de armas não estavam ao alcance de todos os nobres. Somente mereciam a distinção os fidalgos hierarquicamente superiores ao fidalgo de cota de armas. Ou seja, somente poderiam pleitear a distinção os fidalgos de grande qualidade, fidalgos de solar, fidalgos de linhagem, fidalgos notáveis e fidalgos assentados nos livros d'El Rei, denominados "fidalgos principais" ou "nobreza principal do reino". Nesse grupo seleto ainda estavam os fidalgos do conselho, fidalgos cavaleiros, fidalgos escudeiros, fidalgos capelães e moços fidalgos. Embora pudessem ter brasões, os fidalgos de cotas de armas se localizavam na segunda ordem, onde estavam os nobres de linhagem (com quatro avós nobres), os cavaleiros fidalgos, desembargadores de El Rei, os cavaleiros das Ordens Militares, as pessoas denominadas por dom. Por fim, a terceira ordem se compunha de "pessoas de nobreza ordinária", como os simples letrados, pessoas de grau de letras, professores régios de gramática latina e grega, de retórica e os cavaleiros, escudeiros e homens bons (SÃO PAYO, 1927SÃO PAYO, Marquês de. Do direito heráldico português. Lisboa: Centro Tip. Colonial, 1927., p. 12-13).

Assim, pela norma acima exposta, o brasão de armas era uma condecoração própria da alta nobreza. Todos os descendentes de homens abrasonados, por linha paterna ou materna, herdavam a distinção. Ao conceder os brasões, os monarcas nobilitavam os agraciados, como remuneração de serviços prestados. Quando as concessões nobilitavam plebeus, denominavam-se armas novas, mas quando se referiam à modificação de armas já existentes e usadas, eram confirmação ou acrescentamento de armas (SEIXAS, 2011SEIXAS, Miguel Metelo de. Heráldica, representação do poder e memória da nação. Lisboa: Universidade Lusíadas Editora, 2011., p. 230). Ao longo do tempo, os princípios se flexibilizaram, pois a concessão de carta de brasões não se dava apenas pela comprovação da ascendência de certas e determinadas famílias (brasão de armas de sucessão). O monarca podia conceder o brasão a súditos que tivessem prestado serviços sobretudo nas guerras, concedendo aos leais vassalos o título de fidalgo de cotas de armas, ou seja, a posição mais baixa entre os fidalgos capaz de receber a carta de brasão. Ao passar do tempo, as normas foram relaxadas, e a concessão de fidalguia e brasão de armas se generalizou para premiar serviços diplomáticos, judiciais, financeiros, palacianos e outros. Para tanto, os suplicantes deveriam comprovar os serviços relevantes à monarquia. Segundo o marquês de São Payo, a carta de armas por sucessão ou a confirmação da fidalguia de cota de armas eram obtidas mediante justificação da nobreza. A investigação da geração do suplicante iniciava-se perante um dos quatro corregedores do cível da Corte e Casa de Suplicação em Lisboa, ou perante o juiz ordinário nos demais municípios da monarquia. O processo pretendia comprovar, por testemunhos e documentos, a filiação, nobreza e fidalguia, ou ao menos o título de fidalgo de cota de armas.

As normas previstas nos regimentos nem sempre eram obedecidas, sobretudo quando se tratavam das comprovações documentais. Não raro, os corregedores do cível e os juízes ordinários não se apegavam às provas documentais e se satisfaziam com os testemunhos que comprovavam se os quatro avós do justificante eram nobres, por vezes localizados abaixo dos fidalgos de cota de armas. Aliás, a lei era desrespeitada quando os juízes e reis de armas se contentavam com provas deficientes, pois "a fidalguia de linhagem havia de se provar pelas árvores de geração aprovadas pelo rei de armas, segundo preceituava a lei de 11 de maio de 1607" (SÃO PAYO, 1927SÃO PAYO, Marquês de. Do direito heráldico português. Lisboa: Centro Tip. Colonial, 1927., p. 22). Ou seja, as autoridades não podiam se ater à comprovação da nobreza do pai, deviam investigar também os avós. Nesse sentido, percebe-se como a fidalguia diferia da nobreza, pois ter privilégios da nobreza não era sinônimo de fidalguia. Para tanto, pais e avós deveriam ser nobres ou fidalgos.

No reinado de D. João V, os abusos dos reis de armas continuaram, e o monarca nomeou na qualidade de reformador do Cartório da Nobreza o padre frei José da Cruz, seguido do frei Manuel de Santo Antônio. A reforma buscava sindicar sobre a verdade das alegações perpetradas pelos requerentes às insígnias. Segundo o visconde de Baena, os serviços prestados pelos reformadores buscaram aperfeiçoar a heráldica em Portugal. No entanto, os esforços de aperfeiçoamento foram duramente sacrificados pelo terremoto de Lisboa que destruiu por completo o Cartório da Nobreza. Nessa tragédia, 13 livros in-folio com registros de três mil cartas de brasão de armas se perderam. Restaram somente 150 cartas que estavam copiadas em um livro particular, documentos transcritos e guardados fora do cartório pelo reformador frei Manuel de Santo Antônio. Os novos registros se iniciaram em 1764 e foram aperfeiçoados e feitas mais de uma cópia a partir do ano seguinte. Tempos depois, para aperfeiçoar ainda mais o processo, a provisão de 1807 estabeleceu a necessidade de exigir comprovação documental para todas as informações concedidas no momento de suplicar pelos brasões de armas por sucessão. Mas a exigência não conteve os abusos, pois casos duvidosos, como os mencionados pelo Visconde (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. XVI; SÃO PAYO, 1927SÃO PAYO, Marquês de. Do direito heráldico português. Lisboa: Centro Tip. Colonial, 1927.), se multiplicam nas cartas referentes aos moradores do Brasil, como veremos a seguir.

As falsificações eram recorrentes e nos levam a indagar sobre as razões para se subverter as normas. Valia a pena forjar um passado nobre, pagar genealogistas e testemunhas para criar antepassados saídos da alta fidalguia? Com certeza, os brasões concediam prestígio às famílias e facilitavam a ascensão social de novos ricos. Além de ser fidalga e pertencer à ordem mais distinta do reino, a família abrasonada dispunha do privilégio de vincular o brasão ao morgado, de trazer seus lacaios com librés divisadas pelas diversas cores de suas armas. Os membros da família podiam usá-los nos arreios, sinetes e divisas durante as batalhas, nos campos e escaramuças, exibi-los em suas casas, sepulturas, capelas e mais edifícios (SÃO PAYO, 1927SÃO PAYO, Marquês de. Do direito heráldico português. Lisboa: Centro Tip. Colonial, 1927., p. 24).

O trâmite para se obter a carta de brasão de armas de sucessão se iniciava na instauração de um processo administrativo perante o juízo da Nobreza, constituído pelo rei de armas de Portugal, como juiz presidente com plena alçada, e o respectivo escrivão. À porta fechada, investigam-se os documentos de justificação e, por fim, o rei de armas ordenava ao escrivão que redigisse a carta com a indicação das armas respectivas. No entanto, todo processo partia da sentença judicial de justificação da nobreza do requerente, ou seja, reconhecimento judicial da posse do estado de nobreza de acordo com as ordenações do reino. No caso do ultramar, encontrei manuscrito do Arquivo Histórico Ultramarino (AHU) que menciona o auto de comprovação da nobreza, iniciado na ouvidoria (juízo da Ouvidoria Geral do Maranhão) e despachado de São Luís pelo escrivão José Manuel dos Reis ao Conselho Ultramarino ou à Secretaria de Estado do Ultramar.5 5 AHU, Maranhão, doc. 8047.

Para provar a nobreza de geração, ou seja, a fidalguia, o suplicante devia apresentar um "trem de vida" segundo os costumes da nobreza, com cavalos, criados e amas para os filhos. Não podia ter exercido "ofícios mecânicos ou de procurador judicial, mas também que descendia das famílias armoriadas de cujas armas o mesmo justificante pretendia usar [...]". Embora as provas documentais fossem da maior importância, encontram-se nos processos de justificação da nobreza somente certidões de batismo sobretudo dos justificantes e, por vezes, de seus pais e avós. Apresentavam igualmente carta de foro de fidalgo, algumas certidões de serviços, atestados de genealogistas avulsos e transcrições de obras impressas. Assim, poucos seguiam as exigências e desconsideravam a comprovação taxativa da nobreza e da fidalguia alegadas (SÃO PAYO, 2001SÃO PAYO, Marquês de. Cartas de brasão de armas: (ensaio de diplomática). Porto: Centro de Estudos de Genealogia e História da Família da Universidade Moderna , 2001a. , p. 7-8; 2001a).

De todo modo, vale analisar as concessões de carta de brasão de armas e perceber como os reis as distribuíram ao logo do tempo. Baseado no enorme levantamento realizado pelo visconde Sanches de Baena, analisei o número de cartas de brasões concedidas nos reinados de D. José I (1750-1776) e D. Maria I (1777-1807).6 6 Vale aqui explicar os cortes cronológicos. O reinado de D. José findou em fevereiro 1777, mas para efeito quantitativo estabeleci como fim o ano de 1776. Na presente pesquisa, o governo de D. Maria finaliza com o estabelecimento da corte no Rio de Janeiro. Infelizmente, não pode se avaliar as concessões anteriores a 1755 devido à destruição do Cartório da Nobreza durante o terremoto (CABRAL, 2001CABRAL, Gonçalo A. V. O cartório da nobreza no período de 1700-1755. Porto: Centro de Estudos de Genealogia, Heráldica e História da Família da Universidade do Porto, 2001.). No governo de D. José, encontramos 521 cartas de brasões de sucessão, enquanto no governo de D. Maria, 864 cartas. A diferença entre os governos pode ser percebida de forma mais nítida quando se calculam as concessões anuais: entre 1750 e 1776, temos 19,3 concessões por ano; enquanto entre 1777 e 1807 a média anual cresce para 27,8. Proporções semelhantes se verificam entre as concessões feitas aos moradores do ultramar. Em princípio, constata-se que os brasões eram cedidos particularmente aos reinóis, embora os moradores do Brasil, Grão Pará e Maranhão fossem os mais agraciados no ultramar lusitano.

Fidalgos, nobres e elites do ultramar

Os brasões de armas dos moradores do ultramar nunca receberam a devida atenção dos historiadores, embora a documentação estivesse acessível, como mencionara acima. Entre os arrolados pelo visconde encontram-se 239 brasonados ultramarinos - América, África e Índia. Para além dos mencionados fidalgos, encontrei, no fundo Feitos Findos da Torre do Tombo, 20 autos de justificação da nobreza referentes somente aos moradores da América portuguesa. Aí existem vários processos mencionados no livro de Baena, outros, porém, não constam da relação do Visconde e por isto foram incluídos na pesquisa. Assim, o universo de análise deste artigo se compõe de 259 processos de vassalos ultramarinos, datados entre 1750 e 1807 (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872.).7 7 Vale aqui ressaltar que vários irmãos solicitaram a carta de brasão em um mesmo processo. Nestes casos, contei somente com um dos irmãos.

Vale novamente destacar que o presente estudo não será dedicado aos brasões, mas ao perfil dos vassalos interessados em ter o reconhecimento régio de sua nobreza e fidalguia. Nos casos referidos pelo Visconde não tenho dúvida sobre a concessão das cartas de brasão, mas a mesma certeza não vale para os 20 autos do fundo Feitos Findos. Aliás, como não se trata de estudo sobre os brasões, os resultados dos processos de justificação são pouco relevantes, ou seja, não serão analisados se os vassalos receberam ou não a graça régia. De fato, desconheço o fundo documental que reúne os pleitos negados pelas ouvidorias ou pelos reis de armas. Enfim, não farei distinção entre as informações concedidas pelo Visconde e pelos autos dos Feitos Findos. Este procedimento metodológico ficará mais claro em seguida.

Para tratar os 259 processos, montei uma base Excel com as seguintes colunas: número do processo, nome do vassalo, cargos e títulos, filiação, cargos e títulos do pai, cargos e títulos dos antepassados, local de moradia, local de nascimento, data da concessão ou data do documento. Neste universo, encontram-se 224 residentes nas capitanias da América Portuguesa; 28 vassalos moradores da África e Ásia, entre esses somente três se fixaram no reino posteriormente; 7 vassalos sem identificação precisa da morada.

Segundo pesquisa do visconde de Baena, entre 1750 e 1807, a monarquia portuguesa concedeu 1385 cartas de brasão de armas: somente 17% dos brasões (239) referiam-se ao ultramar, 16% (219) à América Portuguesa.8 8 Devido ao caráter lacunar das informações sobre os brasonados ultramarinos arrolados pelo visconde de Baena, procurei complementar os dados recorrendo aos processos de justificação da nobreza dos Feitos Findos, sobretudo quando os vassalos estavam em ambas as fontes documentais. Em uma amostra de cerca de 50 autos, percebi que a precariedade dos dados não se originava da pesquisa insuficiente do Visconde, mas dos próprios autos. Comparados aos armoriados do reino, os brasílicos tinham presença bastante reduzida, fato que comprova, mais uma vez, que a nobilitação dos súditos se fazia maciçamente na metrópole (RAMINELLI, 2015RAMINELLI, Ronald. Nobrezas do Novo Mundo. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2015. ; MONTEIRO, 2009MONTEIRO, Nuno. A circulação das elites no império dos Bragança. Tempo, Niterói, 27, p. 65-82, 2009., p. 65-82). Ao analisar a geografia dos brasonados no ultramar lusitano, as elites da Bahia se destacam: Bahia, 21% (54 vassalos); Pernambuco, 14% (37); Rio de Janeiro, 13% (35); Maranhão, 6% (16) e São Paulo, 6% (15). Nas demais conquistas lusas, destaca-se Angola, com 4% (11). Mesmo o Rio de Janeiro sendo um grande porto, centro econômico do ultramar na virada entre os séculos XVIII e XIX, suas elites pleitearam ou receberam número reduzido de brasões quando comparado à Bahia. Essa capitania contava com famílias honradas que remontavam aos séculos XVI e XVII, fato que talvez explique o predomínio da antiga capital.

Ao analisar as justificações da nobreza por ano, concebi o Gráfico 1 e constatei a enorme incidência de carta de brasão de armas e justificações na regência joanina (1792-1807), período bastante conturbado pelas revoluções na França e no Haiti. Os números são os seguintes: entre 1750-1776, encontram-se 73 autos, ou cerca de 2,7 autos por ano; entre 1778-1791, 67 ou 5,1 por ano; entre 1792-1807, 119 ou 7,9 por ano. Por certo, as guerras e a instabilidade política podem explicar a concessão de número crescente de brasão de armas. Em contrapartida, no período pombalino a incidência era bem menor. Infelizmente, não temos estudos sobre a concessão de hábitos de cavaleiro das ordens militares para o último corte cronológico. Seria fundamental comparar e avaliar a incidência das mercês, sobretudo na regência joanina.

Gráfico 1
Brasões e justificações, incidência anual por reinados

Vale aqui mencionar a preocupação do secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, D. Rodrigo de Souza Coutinho, com a harmonia entre as províncias do império e seus planos para neutralizar as forças revolucionárias que rondavam as metrópoles e suas colônias durante a regência de D. João. Para tanto, Lisboa e seu ultramar teriam de obedecer aos mesmos usos e costumes, receber as mesmas honras e privilégios, pois somente a sacrossanta unidade permitiria que os súditos da monarquia, radicados nas mais distantes paragens, se julgassem somente portugueses. Suas palavras buscavam fortalecer a integridade do império sob o comando do monarca, união baseada em trocas e interdependências entre colônias e metrópole. A defesa de uma única identidade seria responsável por unir os habitantes das mais diferentes províncias do império. D. Rodrigo pretendia ainda evitar os sentimentos antilusitanos, possivelmente difundidos entre os letrados nas Minas Gerais, no Rio de Janeiro ou entre os populares da Bahia. Nos planos do secretário de Estado estavam a reforma fiscal e a crescente participação dos jovens brasileiros formados em Coimbra nas decisões administrativas (RAMINELLI, 2008RAMINELLI, Ronald. Viagens ultramarinas. São Paulo: Alameda, 2008. , p. 177-178; MAXWELL, 1978MAXWELL, Kenneth. A devassa da devassa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978., p. 254). Em suma, o Gráfico 1 reflete a política destinada a integrar as elites coloniais no estrato inferior da nobreza lusitana.

Entre os homens que tencionavam justificar a sua nobreza estavam muitos militares, 52% (134) do total. Com presença muito reduzida, os religiosos (presbíteros, cônegos, padres e vigários), segunda categoria mais numerosa, perfazem somente 8% (22) e os burocratas (agentes do poder local e magistrados), 6% (15). Embora tivessem grande destaque na sociedade colonial, os senhores de engenho (2) e os negociantes (1) tiveram presença quase nula. Os primeiros por certo consideravam a posse de engenhos e terras de menor monta quando comparada às patentes militares. A quase ausência de comerciantes pode ser devido à preferência dos homens abastados de indicar as patentes militares, ao invés de ressaltar o passado humilde como caixeiro e a trajetória de ascensão social.

Por certo, ao fim da vida, os homens de negócio apresentavam os serviços militares e os títulos para alavancar a sua honra. Não raro, o percurso como militar era muito recente e destituído de feitos; aí a patente era mais honorífica do que efetiva. A trajetória do rico comerciante português José Gonçalves da Silva, também denominado "o barateiro", demonstrou nitidamente como seus aportes financeiros à Coroa lhe possibilitaram a patente de coronel, o hábito da Ordem de Cristo, foro de fidalgo da Casa Real e a carta de brasão de armas em 1797.9 9 Sobre a ajuda financeira do rico comerciante ver os vários documentos encontrados no AHU, Lisboa, Maranhão, docs. 7720, 7750, 8191 e 8222. Sobre os títulos e a patente de coronel das milícias do Maranhão, ver: AHU, Maranhão, doc. 8395; BAENA (1872 , p. 385). Para tanto, passou a usar a patente como símbolo de distinção social, embora sua carreira como militar fosse muito recente. Somente um estudo aprofundado e prosopográfico, próprio de um livro, permitirá confirmar essa hipótese. De todo modo, vai aqui uma possível explicação para o número tão reduzido de comerciantes arrolados entre os suplicantes.

O perfil socioprofissional se torna bem mais complicado quando se percebem as lacunas dos autos de justificação da nobreza. Aí 20% (52) dos vassalos não trazem informação sobre suas atividades. A imprecisão documental é flagrante, como destacou o marquês de São Payo (1927SÃO PAYO, Marquês de. Do direito heráldico português. Lisboa: Centro Tip. Colonial, 1927., p. 22-24; 2001, p. 7-8). Aliás, para além de comprovar a linhagem fidalga, os suplicantes deviam viver ao modo da nobreza com cavalos, criados e amas. Deviam provar também que jamais exerceram ofícios mecânicos ou de procurador judicial. A falta de dados só comprova a debilidade dos processos.

Para além desta lacuna, a forte presença dos militares deve-se também ao acúmulo de atividades. Entre os luso-brasileiros que almejavam os brasões, encontram-se 46 militares que também eram burocratas, bacharéis, senhores de engenho, vereadores e negociantes, enquanto 43 ainda apresentavam títulos: cavaleiros das ordens militares, fidalgos e nobres. Na Bahia, de 54 vassalos, 22 eram militares (41%); em Pernambuco, de 37/16 (43%); no Rio de Janeiro, 35/20 (57%); no Maranhão, 16/10 (62%); em São Paulo, 15/10 (67%). Os religiosos se destacavam entre os vassalos de Pernambuco (6), enquanto na Bahia registram-se apenas 2 e no Rio de Janeiro somente 1. De todo modo, na distribuição dos militares no ultramar, percebe-se o predomínio do Rio de Janeiro, Maranhão e São Paulo.

Em todo o ultramar, existem apenas 12 militares com as mais altas patentes10 10 Para hierarquia militar ver mapa dos regimentos das tropas pagas: AHU, Pernambuco, doc. 9235. Agradeço a Giovane Albino a indicação e a transcrição deste documento. Infelizmente, não tenho espaço suficiente para fazer referência aos estudos sobre história militar. (4,6%). Estão incluídas nesse cômputo as patentes de brigadeiro, coronel, tenente-coronel e sargento-mor. Vale destacar que nem sempre existem referências sobre as tropas comandadas, se eram as pagas, auxiliares ou ordenanças. Para além das patentes citadas, as mais representativas entre os suplicantes eram: capitão-mor, capitão de fortaleza, capitão, alferes e tenentes. Entre os pais dos militares, mencionados para comprovar a fidalguia, somente cinco eram militares de alta patente. Na Bahia em particular, os proprietários e mercadores não tinham interesse de se integrar às tropas regulares. Além dos exercícios constantes, os principais da terra e seus filhos entendiam que a carreira militar era mal remunerada, não gerava privilégio e prestígio (KENNEDY, 1973KENNEDY, John N. Bahian elites, 1750-1822. Hispanic American Historical Review, Durham, n. 53, p.415-439, 1973., p. 429).

Para assegurar a nobreza, 63 súditos apresentaram seus títulos de cavaleiros e de fidalgo; a distinção estava assegurada em apenas 24% dos casos. Dos 63 títulos, 57 eram de cavaleiros das Ordens Militares; os demais eram cavaleiros fidalgos (14) e somente um era comendador - Pedro Dias Paes Leme, denominado fidalgo, comendador da Ordem de Cristo e guarda-mor geral de Minas Gerais (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 544). Partindo da determinação do direito heráldico português, as cartas de brasão de armas eram destinadas aos fidalgos hierarquicamente superiores ao fidalgo de cota de armas. Se somente esse princípio valesse, poucos vassalos ultramarinos podiam ser agraciados com a distinção. De todo modo, os títulos dos suplicantes não eram os únicos quesitos no momento de comprovar a nobreza de linhagem. Vale então analisar o perfil de seus pais e avós.

O perfil paterno não se diferencia muito dos filhos, pois dos 259 pleitos 111 indicaram que o pai era militar (43%) e 16 que era burocrata (6%). O caráter lacunar da documentação se constata mais uma vez, pois 97 pleitos (37%) não indicam a posição social paterna. Vale ainda mencionar que registraram aqui 37 cavaleiros da Ordem de Cristo e fidalgos, notadamente cavaleiros fidalgos, ou seja, fidalgo de segunda ordem. Cabe citar o negociante de grosso trato, fidalgo cavaleiro e cavaleiro da Ordem de Cristo, Fernando Carneiro Leão (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 166), residente no Rio de Janeiro, que indicou o pai, Braz Carneiro Leão, como fidalgo cavaleiro. A falta de rigor da justificação da nobreza pode ser avaliada não somente nos 97 pleitos sem referências paternas do total de 259, mas também nos 50 vassalos (19%) que não indicaram nem pai nem outro familiar.

Para comprovar a qualidade da geração, o avô foi mencionado em 77 pleitos, sendo que 83% (64) dos avôs eram militares e somente 14 apresentavam hábito das ordens militares ou foro de fidalgo, mas nenhum fidalgo de primeira ordem. De todo modo, os resultados da pesquisa se coadunam com a endogamia das famílias militares, conforme estudo de John N. Kennedy (1973KENNEDY, John N. Bahian elites, 1750-1822. Hispanic American Historical Review, Durham, n. 53, p.415-439, 1973., p. 428). Em relação ao parentesco mais remoto, vale destacar que se encontram várias referências à alta nobreza portuguesa, pois os vassalos indicaram como antepassado o duque de Cadaval, o conde do Prado e os marqueses das Minas, o conde de Galveas, o conde de Pombeiro, o conde de Aveiras e o conde de Quinzal (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 63, 78, 216, 427). Tais parentescos são bastante duvidosos porque nos processos nem sempre as linhagens ilustres são devidamente asseguradas com provas documentais. Muitas vezes bastavam os testemunhos orais ou informações de ouvir dizer.11 11 Sobre as falsificações genealógicas em Pernambuco, ver MELLO (1989). Menciono também as várias formas de falsear a nobreza estudadas por SORIA MESA (2007 , p. 261-318).

Muitos suplicantes (67) informaram aos juízes sobre a sua árvore genealógica, remetendo sua família às guerras contra os holandeses em Pernambuco e Maranhão, aos primórdios da colonização do Brasil ou ao passado medieval português. Vale aqui mencionar o sargento-mor e cavaleiro fidalgo da Casa Real Antônio Borges da Fonseca que era descendente dos Bandeiras de Mello, família de valorosos militares das guerras de Pernambuco. O suplicante era quinto neto de Pedro Bandeira de Mello, que chegou a Olinda em companhia do donatário Duarte Coelho Pereira. Antes da aventura americana, Gonçalo Peres Bandeira obrou na batalha de Toro, em 1476, quando recuperou o estandarte das mãos do inimigo. Entre seus antepassados ilustres estava D. Rodrigo de Mello, comendador do Pombeiro.12 12 Este antepassado comendador não está mencionado na Nobiliarquia Pernambucana ( FONSECA, 1925 , p. 184). Por parte materna, era neto de Antônio Borges da Fonseca, coronel do regimento da infantaria de Olinda e governador da capitania da Paraíba. Ao contrário dos dados do Visconde, Antônio era neto de Antônio José Vitoriano da Fonseca, capitão do Ceará entre 1765 e 1781, genealogista e autor da Nobiliarquia Pernambucana (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 32; VARNHAGEN, 1981VARNHAGEN, F A. . História Geral do Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo; Edusp, 1981. 3v., v. 3, t. 5, p. 268; FONSECA, 1925FONSECA, Antônio J. V. Borges da. Nobiliarchia pernambucana. Anais da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, XLVII, p. 7-502, 1925. ). O erro se originava da documentação ou do visconde de Baena? Infelizmente, ainda não localizei o seu processo de justificação da nobreza na Torre do Tombo.

Talvez a imprecisão dos autos de justificação da nobreza tenha permitido a alguns suplicantes criar genealogias retumbantes como o doutor Ignacio Teixeira da Cunha, presbítero e abade da paróquia de São João da Cova em Braga, natural da freguesia de São Gonçalo da Cachoeira do arcebispado da Bahia. Segundo seus papéis, era descendente de D. Isabel Pereira, "irmã do condestável D. Nuno Álvares Pereira, todos descendentes da primeira e mais ilustre fidalguia e nobreza destes reinos". A mesma ascendência justificava a fidalguia de suplicante Luiz Teixeira da Cunha Coutinho Carvalho e Abreu, natural de São Gonçalo dos Campos, vila da Cachoeira, arcebispado da Bahia (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 267, 457). Por certo era parente do presbítero Ignacio da Cunha, mencionado acima. Se esses súditos tinham ou não antepassados tão ilustres, nada se pode comprovar. Vale ainda mencionar que suas cartas de brasão de armas não foram concedidas pelos seus próprios feitos heroicos, tampouco pelos títulos de seus pais e avós. Sua nobreza estava assentada somente nos feitos e fama do condestável.

A falta de testemunhos escritos para comprovar a nobreza se repete nos autos. Ao invés de tentar demonstrar as invenções genealógicas, o presente artigo passa agora a analisar se as elites brasílias tradicionais estavam representadas nos pedidos de brasão de armas. Ou seja, mesmo respaldadas na tradição, nas conquistas, nas fundações de vilas e cidade, nos feitos militares nas guerras contra franceses, holandeses, índios e quilombolas, as elites brasílicas viam a sua honra alavancada pelos brasões de armas?

Antigas e novas elites brasílicas

Na base de dados, existem duas colunas dedicadas à filiação dos proponentes às cartas de brasão. A primeira é dedicada aos pais, e a segunda aos avós e parentes mais antigos. Aí existem 39 suplicantes que não forneceram dados dos pais, nem de outro antepassado. Ou seja, 15% dos autos não precisaram de informar a filiação para ingressar com o pedido da mencionada benesse. Por vezes, esses processos remetem a outros da mesma família que receberam brasão de armas e por esta razão não cumprem a exigência de enumerar os parentes. 47 (18%) não forneceram dados sobre o pai, mas somente de outros antepassados, enquanto 49 informaram somente sobre o pai. Mais cuidadosos, 113 (44%) respaldaram os seus pedidos com dados sobre a qualidade do pai e de outros antepassados. No presente artigo, a estratégia de distinguir o pai dos antepassados busca identificar as antigas e as novas elites. Aliás, alguns suplicantes (67) mencionaram feitos e títulos de antepassados que remontavam às guerras de Pernambuco, à alta nobreza lusitana e até ao condestável Nuno Álvares Pereira. A este tipo de dado denominei "longa filiação". Em princípio, não me preocupei em determinar a sua veracidade, embora em alguns casos eu lance dúvidas sobre a genealogia espetacular.

Assim, os 49 suplicantes que forneceram somente dados paternos foram aqui concebidos como nobreza recente, enquanto os 113 que informaram sobre os títulos e cargos dos pais e dos antepassados tendem a ser nobreza mais antiga. Passo então a testar essa hipótese nos dados fornecidos pelo visconde de Baena e pelos 20 autos de justificação localizados nos Feitos Findos, conforme mencionado anteriormente. Para tornar a investigação viável, não recorri a todos os processos, mas somente aos suplicantes das seguintes capitanias: Bahia (54 autos), Pernambuco (37), Rio de Janeiro (35), Maranhão (16) e São Paulo (15). A escolha das mencionadas capitanias pautou-se não somente na relevância dos números, mas também no suporte concedido pelas genealogias publicadas.13 13 Nesta fase da pesquisa tornou-se fundamental a consulta a obras dedicadas à genealogia: CALMON (1985) , FONSECA ( 1925 ; 1926 ), RHEINGANTZ (1965-1967) , COUTINHO (2005) , LEME (1980) .

Sem causar surpresa, os pernambucanos apresentam-se como a nobreza mais antiga devido aos altos índices de referências paternas e dos antepassados ilustres, conforme Quadro 1. Destacam-se aí oito vassalos da família Albuquerque e seus serviços prestados nas guerras de Pernambuco, embora dois suplicantes não tivessem feito referências, nos autos, aos feitos da linhagem. Vale mencionar o filho do capitão de granadeiros de infantaria auxiliar José Mariano Albuquerque Cavalcante que teve seu processo de justificação da nobreza simplificado porque seu parente, José Joaquim Cavalcante de Albuquerque Lino, bacharel e secretário da capitania do Mato Grosso, recebera um brasão de armas em 1782 (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 406, 338). Tampouco os feitos dos antepassados foram necessários para Manuel de Mello Albuquerque receber um brasão de armas. De fato, ele era descendente dos Mello e Albuquerque e ocupava o posto de capitão da infantaria paga do regimento de Olinda (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 497). Talvez, nesse processo, sua linhagem e qualidades pessoais não tivessem que ser comprovados para alcançar a mercê. Em suma, em alguns casos, a falta de dados não se refere a uma ascensão social recente. Passo a analisar caso por caso.

Quadro 1:
Elites por capitanias14 14 Vale aqui mencionar os números da capitania de Minas Gerais, embora não serão analisados neste artigo: número total, 29; dados paternos, 62%; demais antepassados, 72%; longa filiação, 31%. Com esses números, o perfil dos suplicantes da capitania se assemelha aos do Maranhão e Pernambuco. No entanto, uma análise mais detalhada é fundamental para fazer esta aproximação.

A família Maciel Monteiro não aparece na genealogia de Borges da Fonseca como a Albuquerque, mas o visconde Baena registrou quatro irmãos com carta de brasão entre 1794 e 1802. A mencionada linhagem surge do casamento entre o professo da Ordem de Cristo e capitão comandante dos auxiliares da capitania de Pernambuco, Antônio Francisco Monteiro, e D. Joanna Ferreira Maciel, neta do capitão das ordenanças e vereador de Olinda, Braz Ferreira Maciel. São esses os pais dos quatro irmãos agraciados com brasão de armas que suplicaram pela mercê de forma separada, o que não era comum. Entre os irmãos, encontram-se: Antônio Francisco, tenente coronel da cavalaria auxiliar de Pernambuco; José Francisco, bacharel formado na faculdade de leis e opositor dos lugares de letras; Luís Franco, cadete de infantaria do regimento do Recife; Manuel Francisco, bacharel formado nos sagrados cânones da Universidade de Coimbra e capitão comandante agregado dos auxiliares da capitania de Pernambuco (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 49, 382, 450, 478-479). Por certo, essa família era abastada e honrada para manter dois filhos em Coimbra e ainda inserir mais dois nas tropas da capitania. No entanto, nenhum irmão recorreu aos serviços militares de seus antepassados nas guerras de Pernambuco. A família tinha se incluído entre os principais da terra mais recentemente, conforme verifica-se na trajetória dos brasonados.

Nos papéis do AHU, os registros sobre os irmãos se tornam frequentes depois de 1794. Neste ano, quando recebeu o brasão de armas, Manuel Francisco é nomeado pelo governador D. Tomás José de Melo (1787-1798) para o cargo de administrador dos Fundos da extinta Companhia Geral. Em 1798, Antônio Francisco pede à rainha confirmação da sua patente de tenente-coronel do Regimento de cavalaria da vila de Sirinhaém. O mesmo tenente-coronel solicita para ser reformado no posto de coronel das milícias em 1800. Vale ainda mencionar que Manuel Francisco, denominado tenente-coronel do Regimento de Milícias dos Nobres da vila do Recife, pede ao regente D. João para ser provido ao posto de coronel do Regimento Velho de Milícias, em 1802.15 15 Encontrei várias referências à família no AHU, Pernambuco, docs. 12915, 13735, 13934, 14827 e 15965 Assim, na virada para o século XIX, a família Maciel Monteiro parece ter muito prestígio e qualidade para receber os brasões de armas, embora a sua linhagem não fosse tão antiga.

Ainda entre os pernambucanos, localizei dois descendentes da família Fonseca Galvão, não incluída na Nobiliarquia Pernambucana (1748) de Borges da Fonseca, embora afirmem que seus antepassados lutaram contra os holandeses. Encontram-se inúmeras referências a militares e religiosos com este sobrenome nos documentos avulsos de Pernambuco do AHU. Entretanto, o documento mais remoto refere-se ao capitão da infantaria paga da capitania de Pernambuco, José Lopes da Fonseca Galvão, datado de 1726. Nos autos de justificação o antepassado mais antigo é Manuel Lopes Galvão, mestre de campo da infantaria da cidade de Olinda, nome não localizado nos registros do AHU.16 16 Os suplicantes são o cônego Cypriano Lopes Fonseca Galvão e o presbítero José Bernardo da Fonseca Galvão ( BAENA, 1872 , p. 133-4, 369); os dois têm a mesma ascendência. Sobre os membros da família, ver os seguintes documentos: AHU, Pernambuco, docs. 3639, 4022, 4841, 5419, 6621, 7330, 7375, 7972, 8325 e 8404. Em suma, os Maciel Monteiro e os Fonseca Galvão não estavam entre descendentes dos libertadores de Pernambuco, mas integravam-se aos principais da terra ao longo da segunda metade do século XVIII.

Imortalizadas na genealogia (FONSECA, 1925FONSECA, Antônio J. V. Borges da. Nobiliarchia pernambucana. Anais da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, XLVII, p. 7-502, 1925. , p. 52, 66, 142, 184, 199), os membros das famílias Albuquerque, Cavalcanti, Borges da Fonseca, Carneiro da Cunha e Bandeira de Mello se valeram dos feitos militares de seus antepassados para solicitar os brasões. Entretanto, os suplicantes das tradicionais famílias Campello, Uchoa, Paes Barreto não recorrem à sua antiguidade. Vale ainda mencionar que, com exceção dos Albuquerque, as demais famílias estão na base de dados com somente um representante. Enfim, os brasões de armas cedidos aos ilustres moradores de Pernambuco estavam em larga medida estribados na tradição, nos feitos heroicos das guerras contra os holandeses e em serviços militares posteriores. De todo modo, percebe-se uma renovação dos principais da terra evidenciada pelas famílias Maciel Monteiro e Fonseca Galvão.

Os vassalos do Maranhão estão representados por algumas poucas famílias. Devido ao número mais reduzido (16 autos), dois grupos parecem dominar os brasões de armas nesse período. Aí se destacam os descendentes de Diogo Campos Moreno, com seis representantes, e de Lourenço Belfort, com quatro representantes. As origens dessas linhagens remontam a diferentes conjunturas. A primeira refere-se à conquista do Maranhão e aos combates contra os franceses, ao sargento-mor Diogo Campos Moreno, natural de Tanger e militar com experiência nas guerras em Flandres. Em 1602, veio para Pernambuco no governo de Diogo Botelho (1601-1608) e em seguida participou ativamente da conquista do Maranhão. Para além dos serviços castrenses, escreveu duas obras importantes: Livro da Razão do Estado do Brasil e Jornada do Maranhão (VARNHAGEN, 1981VARNHAGEN, F A. . História Geral do Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo; Edusp, 1981. 3v., v. 1, t. 2, p. 55).

A segunda família descende de Lancelot (Lourenço) Belfort, irlandês nascido em Dublin e morador de Lisboa. Instalou-se no Maranhão por volta de 1736 e tornou-se um rico proprietário de terras e fundador do engenho Kelru. Participou do senado da câmara de São Luís em várias legislaturas, entre 1744 e 1759. Em 1758, o monarca concedeu-lhe o hábito da Ordem de Cristo (COUTINHO, 2005COUTINHO, Mílson. Fidalgos e barões: uma história da nobiliarquia luso-maranhense. São Luís: GEIA, 2005. , p. 97-98; MOTA, 2007MOTA, Antonia da Silva. A dinâmica colonial portuguesa e as redes de poder local na Capitania do Maranhão. 2007. 188 f. Tese (Doutorado em História do Brasil) - Universidade Federal Pernambuco, Recife, 2007 . , p. 21-45). Na justificação da nobreza de seus descendentes, ainda consta que o patriarca da família detinha a patente de mestre de campo. Seu ingresso formal nas tropas auxiliares ocorreu tardiamente, por volta dos 60 anos. Tornava-se então militar depois de reunir um importante patrimônio, pois era próspero proprietário de terras, senhor de engenho e rico produtor agrícola. Por certo, Lourenço tornou-se militar não pelos seus feitos em guerras, mas pela honra e riqueza acumuladas ao longo da vida.

Para além das duas famílias, encontra-se entre os abrasonados do Maranhão o tenente dos granadeiros do regimento de São Luís, o fidalgo e cavaleiro de Avis Francisco Xavier de Miranda. Contando com longa carreira militar, ele ainda era filho do capitão-mor José Machado de Miranda, cidadão de São Luís, procurador da Coroa e Fazenda e terceiro neto do capitão-mor Manuel Pita da Veiga,17 17 As referências ao capitão-mor datam dos anos de 1640. Ver os seguintes documentos: AHU, Maranhão, docs. 188, 189, 229, 230, entre outros. militar atuante nos anos de 1640. Pouco antes de receber a carta de brasão de armas, o tenente solicitou ao Conselho Ultramarino o privilégio de ter a sua família incluída no rol da nobreza do Maranhão e suplicou pelo hábito da Ordem de São Bento de Avis.18 18 AHU, Maranhão, doc. 8352.

Sem o respaldo da linhagem, mas com carta de recomendação do secretário de Estado D. Rodrigo de Sousa Coutinho e um fabuloso patrimônio, o comerciante português, radicado no Maranhão, José Gonçalves da Silva, "o barateiro", como mencionara acima, tinha muito prestígio na corte. Com seus inúmeros aportes financeiros, na conjuntura bélica das invasões francesas, recebeu um hábito da Ordem de Cristo e o brasão de armas aos 50 anos (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 385). Aqui, mais uma vez, a patente de coronel das milícias da cidade de São Luís funcionava como um título honorífico, pois o comerciante não seguira carreira militar antes de receber a patente.

Exceto o mencionado comerciante de grosso trato, todos os armoreados do Maranhão eram naturais da capitania,19 19 Passo agora a citar dados de 13 fidalgos a partir das biografias realizadas por Coutinho (2005). Assim, ficam de fora do cômputo três suplicantes. nascidos em São Luís e Alcântara. Dos 13 suplicantes, quatro receberam o brasão entre 24 e 29 anos, todos descendentes de Diogo Campos Moreno ou Lourenço Belfort. Com idade mais avançada, entre 40 e 60 anos, encontram-se seis descendentes das novas e velhas famílias. Em suma, os resultados oriundos das capitanias de Pernambuco e Maranhão me permitem duvidar se os brasões de armas eram dádivas régias hereditárias. Estou seguro que os pais não podiam transmitir os brasões para seus filhos e netos, do contrário não seriam necessárias tantas justificações da nobreza. Seria especificidade ultramarina? Se o irmão ou parente próximo detinha a carta de brasão de armas, porque deviam comprovar a nobreza? Por que a família Albuquerque, condecorada com títulos e patentes desde meados do século XVII, precisava comprovar a nobreza para obter brasão de armas?

Mencionadas na genealogia do frei Jaboatão, as linhagens mais tradicionais da Bahia estão bastante ausentes nos autos de justificação da nobreza. De fato, os principais proprietários de terras e senhores de engenho não solicitaram, à época, os brasões, tampouco os ricos comerciantes de grosso trato (KENNEDY, 1973KENNEDY, John N. Bahian elites, 1750-1822. Hispanic American Historical Review, Durham, n. 53, p.415-439, 1973.; BORGES, 2015BORGES, Eduardo J. S. Viver sob as leis da nobreza: a casa dos Pires de Carvalho e Albuquerque e as estratégias de ascensão social na Bahia do século XVIII. 2015. 313 f. Tese (Doutorado em História social) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2015., p. 141, 237, 247). Os suplicantes da Bahia eram militares das tropas auxiliares e das ordenanças, e suas qualidades podem ser avaliadas recorrendo aos hábitos das ordens militares, mesmo sabendo que tais títulos, segundo o direito heráldico, eram insuficientes para valer um brasão de armas. Aí somente 11 cavaleiros baianos apresentaram as insígnias para respaldar seu pedido, ou seja, somente 20% dos autos podiam contar com os hábitos. Embora a Bahia tenha o maior número de autos de justificação da nobreza, 29 processos (54%) não informam sobre os pais, enquanto 15 (28%) mencionam a inserção militar do progenitor. Em relação à longa filiação, aos avós e aos demais antepassados, 55% dos baianos seguiram as normas e os mencionaram. Os avós paternos e maternos eram notadamente militares de altas patentes (mestre de campo, sargento-mor, tenente-coronel, coronel e governador) e cavaleiros das Ordens Militares. Quando mencionaram familiares mais remotos, quatro suplicantes recorreram à alta nobreza lusitana, ao duque de Cadaval e ao condestável Nuno Álvares Pereira.

O escrivão da Câmara de Salvador, Antônio José da Rocha Sousa Dormondo, se considerava bisneto dos condes do Prado e dos marqueses das Minas. Na genealogia, frei Jaboatão informou que a sua família era da ilha da Madeira, mas não aludiu aos condes e marqueses (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 63; CALMON, 1985CALMON, Pedro. Introdução e notas ao catálogo genealógico das famílias de Frei Jaboatão. Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 1985., p. 651-664). O suplicante Francisco Leonardo Carneiro da Rocha de Sousa Meneses mencionou a sua "descendência por varonia dos Adornos, fidalgos venezianos" (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 202). Por fim, Hilário de Carvalho Resende mencionou o brasão de armas concedido ao pai em 1751 e a um antepassado em 1519.20 20 O brasão de armas do pai não consta da relação de Baena (1872) , tampouco há a comprovação em sua justificação da nobreza. Ver: Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Feitos Findos, Justificação da nobreza, 12, 21. Vale mencionar a família Melo e Vasconcelos, descendente de um certo Manuel, combatente em Alcácer Quibir, que se tornou cavaleiro da Ordem de Cristo e se instalou na Bahia em fins do século XVI (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 206-208; CALMON, 1985CALMON, Pedro. Introdução e notas ao catálogo genealógico das famílias de Frei Jaboatão. Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 1985., p. 345-346), a família Siqueira e Bulcão com três descendentes (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 289, 838, 876; CALMON, 1985CALMON, Pedro. Introdução e notas ao catálogo genealógico das famílias de Frei Jaboatão. Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 1985., p. 181, 594); e Brito Freire com um representante (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 874; CALMON, 1985CALMON, Pedro. Introdução e notas ao catálogo genealógico das famílias de Frei Jaboatão. Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 1985., p. 224-226).

Em 10 autos encontram-se referidos os serviços militares de seus antepassados. Destes, cinco suplicantes se referem às guerras na Índia e Pernambuco, um no Maranhão e outro na Galícia. Para além do escrivão da Câmara, dois suplicantes atuavam na administração local: Antônio de Sousa Castro Meneses, cavaleiro da Ordem de Cristo, provedor da saúde e vereador do senado da Câmara de Salvador, e Francisco Gomes de Sousa, contador geral da Real Fazenda (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 86, 193).

Enfim, os suplicantes baianos forneceram dados insuficientes sobre sua qualidade. Este vazio fica ainda mais evidente quando se constata que cerca de 25% dos autos não fornecem dados sobre os pais, nem dos antepassados. As principais famílias da capitania e as altas patentes militares eram raras entre os suplicantes. Talvez a elite mais antiga da Bahia não desse a mesma importância aos brasões de armas como fizeram as melhores famílias do Maranhão. Entre os suplicantes baianos, encontram-se apenas dois sargentos-mores (da cavalaria e do terço da guarnição da cidade), enquanto os outros eram capitães e oficiais, mas todos das tropas auxiliares e das ordenanças. Se 41% dos baianos eram militares, os demais podem ser comerciantes, bacharéis, filhos de militares e homens abastados sem inserção social definida. Esse contingente ainda não identificado pode, de algum modo, receber a carta de brasão sem informar sobre a sua qualidade e a origem de seus antepassados. Outro dado fundamental que nos escapa é a idade em que receberam o brasão de armas. Aliás, nesses processos, nem sempre se registraram o nascimento do suplicante. A carência de dados ainda nos leva a cogitar sobre a possibilidade de homens ricos e de origem mecânica comprarem um parecer positivo das autoridades locais e apresentar aos reis de armas. De todo modo, seria fundamental procurar os suplicantes baianos em outras bases documentais: em testamentos, registros de mercê e na correspondência do AHU.

Por ora, menciono um caso bastante emblemático. A família Santos Marinho e Castro está ausente da genealogia de Jaboatão, mas existem quatro representantes entre os brasonados: Dona Anna Quitéria do Nascimento e Castro era esposa do negociante de grosso trato, Francisco Marinho e Castro, e avó materna dos armoreados Anna Constança Marinho e Castro, Antônio Cardoso dos Santos Marinho e Pedro Antônio Cardoso dos Santos Marinho e Castro (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 23-24, 34). Os três últimos eram filhos de Antônio Cardoso dos Santos, coronel, cavaleiro da Ordem de Cristo, tesoureiro da bula da Santa Cruzada, tesoureiro geral da Junta da Real Fazenda e negociante de grosso trato.

Em setembro de 1799, Pedro Marinho e Castro envia requerimento ao príncipe regente para receber hábito da Ordem de Cristo e menciona que seu falecido pai estabeleceu em Salvador "uma das maiores Casas de Comércio de toda a América que girava avultados cabedais para os portos da Europa e África, com quem pagou para a Real Fazenda imensa soma de Direitos [...]". Devido à sua alta qualidade, o rico comerciante ocupou vários postos na administração e sempre viveu segundo a lei da nobreza. O governador Manuel da Cunha e Meneses (1774-1779) criou um regimento da infantaria auxiliar, chamado dos úteis, e nomeou o seu pai para atuar como tenente-coronel. Depois de cinco anos no posto, tornou-se coronel agregado do regimento.21 21 AHU, Bahia, doc. 15094.

O pedido de mercê de Pedro Marinho revela a extraordinária ascensão social e enobrecimento dos comerciantes. A riqueza permitia não somente controlar postos de prestígio e poder na administração, mas também receber títulos de cavaleiro e brasões de armas. Demonstra ainda como os homens de cabedais passavam a controlar soldados e disputavam com os militares de carreira as altas patentes da tropas auxiliares. Nesta casa, única neste conjunto documental, existem duas mulheres (avó e neta) agraciadas com brasão de armas. Entre 1790 e 1802, quatro membros da família tiveram a graça de exibir seus brasões, demonstrando a trajetória rápida de enobrecimento impulsionado tanto pelo mérito quanto pelo vasto patrimônio (RAMINELLI, 2015RAMINELLI, Ronald. Nobrezas do Novo Mundo. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2015. , p. 103-132).

Os autos (15) referentes à capitania de São Paulo se destacam pelas referências paternas, notadamente por seus serviços militares e inserção na Câmara. Em compensação, os demais antepassados não se tornaram relevantes no momento de justificar a nobreza. Em princípio, pode-se aventar a hipótese de que entre os paulistas predominavam as novas elites. Vale, no entanto, mencionar os vários descendentes do capitão-mor Amador Bueno (c.1584- c.1649) que ainda guardavam na memória este ilustríssimo antepassado. Segundo Pedro de Taques, ele ocupou "os honrosos empregos da república da sua pátria, tendo as rédeas do governo dela repetidas vezes [...]" (LEME, 1980LEME, Pedro de Taques de A. Paes. Nobiliarquia paulistana histórica e genealógica. 5. ed. Belo Horizonte; São Paulo: Itatiaia; Edusp, 1980. 3 Tomos., p. 75-110). Para além de tal parentesco, vale mencionar que os abrasonados se vinculavam também ao genealogista Pedro de Taques e o informam na justificativa. Quatro suplicantes fazem parte desta família: Francisco Leandro de Toledo Rendon, José Arouche de Toledo Rendon,22 22 Sobre vida e obra, ver RODRIGUES (1979 , p. 157-159). Segundo Rodrigues, os Rendon eram mestiços com índios guaianá. Diogo de Toledo Rendon e João Ferreira de Oliveira Bueno.

Os três primeiros ainda se filiam aos Rendon, família mencionada na Nobiliarchia Paulistana, moradora das capitanias de São Paulo e Rio de Janeiro, mas oriunda do reino de León na Espanha. Os três primeiros Rendon que passaram ao Brasil eram filhos do hidalgo D. Pedro Matheus Rendon, regedor da justiça na vila de Ocaña. A serviço régio, os fidalgos D. João Matheus Rendon, D. Francisco Rendon de Quebedo e D. Pedro Matheus Rendon Cabeza de Vacca aportaram na baía de Todos os Santos com o general castelhano D. Fradique de Toledo Ozorio em 1625 (LEME, 1980LEME, Pedro de Taques de A. Paes. Nobiliarquia paulistana histórica e genealógica. 5. ed. Belo Horizonte; São Paulo: Itatiaia; Edusp, 1980. 3 Tomos., II, p. 249-290).

Como representante das principais famílias paulistas, encontrei o vassalo Luiz Rodrigues Pacheco de Godois e Alvarenga de Moraes que se filiava, em princípio, a duas famílias mencionadas por Taques: Godoy e Alvarenga. A primeira se originou do Balthazar Godoy, cavalheiro castelhano radicado em São Paulo no tempo da União Ibérica (LEME, 1980LEME, Pedro de Taques de A. Paes. Nobiliarquia paulistana histórica e genealógica. 5. ed. Belo Horizonte; São Paulo: Itatiaia; Edusp, 1980. 3 Tomos., III, p. 141-170). Os Alvarengas eram oriundos de Lamego e descendentes de Antônio Rodrigues de Alvarenga, família de fidalgos de cota de armas. Segundo Taques, em junho de 1681, o capitão Estevão Ribeiro de Alvarenga, também natural de Lamego, recebeu o brasão de armas, concedido pelo escrivão da geração e rei de armas de Portugal. A carta do capitão deve ter sido perdida no terremoto porque não faz parte do conjunto publicado por Baena. Vale ainda mencionar que Pedro de Taques encontrou esse registro nos papéis da Câmara de São Paulo (LEME, 1980LEME, Pedro de Taques de A. Paes. Nobiliarquia paulistana histórica e genealógica. 5. ed. Belo Horizonte; São Paulo: Itatiaia; Edusp, 1980. 3 Tomos., p. 253-282), prática ainda não verificada nas demais capitanias. Não raro, os processos de justificação da nobreza se iniciavam nas ouvidorias. A novidade desse dado está no registro da carta de brasão pelas autoridades municipais, ou seja, o retorno a São Paulo da decisão tomada em Lisboa.

Em princípio, eram apenas cinco os paulistas armoreados da antiga nobreza da terra. Os demais não mencionaram a sua linhagem. Restam 10 suplicantes que não deixaram dados sobre os antepassados mais remotos e valeram-se da qualidade paterna para alcançar os brasões de armas. Nove eram militares, sargentos-mores, capitães e alferes, geralmente oficiais das ordenanças, radicados em São Paulo ou em Jundiaí.23 23 Sobre as patentes militares destes oficiais, ver em vários documentos: AHU, São Paulo, doc. 648, 699, 714, 978, 1031, 1075, 1064, 1084, 1131, 1183, entre outros. Cinco eram filhos de militares e dois filhos de cidadãos de São Paulo. Aliás, os dois últimos eram irmãos, ambos sargentos-mores. Em suma, 67% dos abrasonados de São Paulo não pertenciam às antigas famílias, eram militares e informaram pouco sobre o passado familiar. Mesmo assim, todos receberam a carta de brasão de armas.

Os suplicantes da capitania do Rio de Janeiro se destacam pela incidência de 22 militares (57%) e pela presença de seis oficiais de alta patente da tropa paga. Na Bahia, eram apenas dois; Pernambuco, um; enquanto no Maranhão e em São Paulo não existiam os altos oficiais entre os suplicantes. Embora tal distribuição de oficiais fosse previsível, pois o Rio de Janeiro era a capital do Estado do Brasil, não tenho indícios que seus antepassados se inserissem na nobreza da terra. Dos 22 oficiais, somente 7 tinham pais e avós militares. Aliás, nos autos de justificação da nobreza, os militares do Rio de Janeiro não apresentaram uma longa filiação, ou seja, antepassados para além dos avós. Pertenciam, então, às famílias que se inseriam no oficialato nos últimos cinquenta anos. Tampouco apresentavam serviços nas guerras contra os holandeses em Pernambuco, Angola e Bahia, contra franceses na tomada da baía de Guanabara no início do século XVIII e contra os castelhanos nas fronteiras do sul.

Os demais suplicantes apresentaram provas de nobreza ainda mais frágeis porque 43% não forneceram dados sobre os pais, enquanto 51% não mencionaram os demais antepassados. Em apenas três autos existem referências sobre parentes ilustres. Vale então mencionar: Antônio Justino de Brito Lima, cujo pai recebera brasão de armas em 1772.24 24 O visconde de Baena menciona a carta de brasão do pai, Antônio Aniceto Brito de Lima, natural de Villa Nova de Cerveira ( BAENA, 1872 , p. 27). Seus antepassados, em linha paterna e materna, eram cavaleiros das ordens militares, familiares do Santo Ofício, cavaleiro fidalgo da Casa Real. Por fim, era quarto neto de João Novais de Campos, governador interino de Angola (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 65).25 25 É conhecido o governador de Angola, Paulo Dias Campos (1575-1588). O doutor em cânones em Coimbra, Ignácio Rodrigues Mascarenhas, asseverou que a sua família era da casa do conde Palma, e o capitão da infantaria paga do Rio de Janeiro, João de Oliveira Barbosa, indicou-se como o neto do alcaide-mor da cidade da Bahia e, de forma bastante vaga, afirmou que seus ascendentes foram pessoas nobres e se trataram à lei da nobreza (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 255, 315).

Com a ajuda de João Fragoso, pude encontrar dois suplicantes da família Amaral Gurgel (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 188, 427; SANTOS, 2015SANTOS, Douglas C. P. Assassinos, facínoras e caçadores de homens. XXVIII Simpósio Nacional de História. Florianópolis: Anpuh, 2015.) que não recorreram aos feitos dos antepassados para justificar a nobreza, embora a família fosse da maior importância desde o início do século XVII. O primeiro era o capitão-mor da vila de Parati, Francisco Carvalho da Cunha Amaral (Gurgel), que indicou o pai como coronel e a mãe como membro da mencionada família, mas subtraiu do seu nome o Gurgel.26 26 Há vários registros de mercês em seu nome: ANTT, Registro Geral das Mercês de D. João V, li. 8, f. 290; Registro Geral das Mercês de D. José liv. 3 , f. 318. O segundo era o cavaleiro da Ordem de Cristo, José Viana do Amaral Rocha, não citado por Rheingantz (1967RHEINGANTZ, Carlos G. Primeiras famílias do Rio de Janeiro (séculos XVI e XVII). Rio de Janeiro: Livraria Brasiliana Editora, 1965-1967. 2v., v. 2, p. 324-340). Ele se diz descendente do capitão João Batista Jordão e sua esposa Ângela Arã do Amaral, filha de Touvem Gurgel (Toussaint Grugel), natural do reino de França. Pelo sobrenome Rocha era descendente do fidalgo francês Monsieur de la Rocha que passou a Portugal "nas guerras que tinha naquele tempo" e se intitulou conde de Quinzal. Há que se investigar porque ambos não exaltaram o patrimônio e o poder da família no Rio de Janeiro para justificar a nobreza.27 27 Nesta investigação encontrei Francisco Carneiro da Cunha Amaral não mencionado por Baena e Rheingantz. Embora precise de ler o processo, tenho quase certeza de que é mais um Amaral Gurgel. ANTT, Justificação da Nobreza, Feitos Findos, 10, 29.

Em suma, como na Bahia, muitos suplicantes do Rio de Janeiro eram militares de tropas auxiliares e das ordenanças e alguns pertenciam às mais tradicionais famílias da capitania. Vale ainda registrar a presença dos poderosos negociantes de grosso trato Brás Carneiro Leão e seu filho Fernando Carneiro Leão, que receberam cartas de brasão de armas e acumulavam títulos e patentes militares nas milícias do Rio de Janeiro. No entanto, o primeiro era o único da lista de 17 comerciantes de grosso trato mencionada por Fragoso (BAENA, 1872BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872., p. 116, 166; FRAGOSO, 1998FRAGOSO, João L. Homens de grossa aventura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. , p. 361). Os Carneiro Leão eram muito ricos, mas não contavam com a honra inerente às famílias dos primeiros moradores.

Os dados do Quadro 2 destacam as linhagens dos 158 suplicantes das capitanias da Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro, Maranhão e São Paulo. Mais uma vez, destacam-se os militares (68 suplicantes), notadamente aqueles que apresentaram como antepassados pai e avós militares (53). No cômputo geral, as antigas casas estão bem representadas, mas vale lembrar que os "principais da terra" eram de origem antiga e atuavam nos regimentos e milícias e, portanto, eram em grande parte militares. De fato, as genealogias evidenciaram a sobrevivência econômica e política dessas famílias, formadas entre os séculos XVI e XVII nas capitanias acima mencionadas, embora fosse fenômeno mais evidente em Pernambuco e Maranhão. Aliás, vale destacar que, nos autos de justificação da nobreza, nem sempre as primeiras e principais casas estavam devidamente indicadas. Por isso, recorri às genealogias para identificá-las. Em suma, os brasões de armas eram almejados pela "nobreza da terra", pelos nobres e militares.

Quadro 2
Linhagem dos suplicantes*

Conclusão

Antes de concluir, alerto mais uma vez para as especificidades das análises quantitativas. Os resultados aqui apresentados são muito promissores, mas nem sempre a documentação seriada resolve os problemas revelados por este tipo de estudo. Na próxima etapa da investigação, recorrerei a outros fundos documentais, como os testamentos, correspondência administrativa e registros de mercês. Seria impossível agregar esses dados ao espaço de um artigo. Mesmo com essas ressalvas passo às conclusões.

Na América portuguesa, os reinóis raramente receberam brasões de armas. Seguramente, os suplicantes eram naturais do ultramar, atuavam como militares e receberam, com mais intensidade, a carta de brasão na regência joanina, período de enorme instabilidade em Portugal e no Brasil. Nesse sentido, a condecoração de militares das tropas auxiliares e das ordenanças aponta para o reconhecimento régio dos seus serviços, para a necessidade de valorizar os vassalos encarregados de manter a ordem interna e a proteção contra as ameaças externas nas diferentes capitanias. Como a nossa história militar ainda precisa de muitos estudos, considero como provável que as tropas se concentrassem no Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco. Assim, a incidência de militares nessas capitanias explicaria o maior número de suplicantes.

Encontrei ainda evidências que contrariam as normas da heráldica portuguesa. Vale mencionar a mais notória, a hereditariedade dos brasões de armas. Segundo as normas lusitanas, a nobreza hereditária se transmitia de pais para filhos, ou mesmo de avós para netos (OLIVEIRA, 1806OLIVEIRA, Luiz da Silva Pereira. Privilégios da nobreza, e fidalguia de Portugal. Lisboa: Officina de João Rodrigues Neves, 1806. , p. 15-32). Consequente a esse mesmo princípio, a carta de brasão de armas era concessão régia de caráter público e hereditário, perpetuando-se "até ao fim dos tempos" (SEIXAS, 2011SEIXAS, Miguel Metelo de. Heráldica, representação do poder e memória da nação. Lisboa: Universidade Lusíadas Editora, 2011., p. 230). Na pesquisa, esta máxima é contrariada por três evidências. A primeira refere-se aos 65 suplicantes, 46 pais e 19 avós que se apresentaram como fidalgos ou cavaleiro das Ordens Militares. Embora inseridos no segundo estado, eles tiveram de comprovar a sua nobreza, do contrário não teriam os brasões. A segunda evidência constata que, para obter brasões de armas, os descendentes das principais famílias das capitanias, notadamente os condecorados com honrarias desde o século XVII, não tinham garantias da sua nobreza e buscaram individualmente comprová-la. A terceira estabelece que vários membros de uma mesma linhagem ou família recorreram pessoalmente à justificação para assegurar a sua inserção no segundo estado. Se o primeiro familiar recebera brasão de armas, a herança garantia aos demais a mesma benesse, sem passar pela habilitação. Em geral, a presenta pesquisa assegura que a norma da hereditariedade não se aplicava aos súditos do ultramar. Por conseguinte, os suplicantes tiveram de requerer a justificação da sua nobreza, mesmo se seus antepassados fossem fidalgos e nobres.

Conforme o direito heráldico lusitano, na hierarquia nobiliárquica, somente a partir dos fidalgos de cota de armas havia a qualidade necessária para receber o brasão. De fato, poucos moradores da América Portuguesa eram fidalgos cavaleiros, fidalgos notórios, fidalgos de solar, enfim fidalgos de primeira ordem, mas nem por isto ficaram sem seus brasões. Seria essa a explicação para se submeterem individualmente à justificação de nobreza? Infelizmente, as normas heráldicas não respondem a esse questionamento, tampouco a historiografia. De todo modo, encontram-se no ultramar, fidalgos de primeira ordem que justificaram a sua nobreza.

Se o princípio da hereditariedade não se aplicava aos suplicantes da América Portuguesa, concluo que todos os abrasonados deveriam ter a justificação para dispor da benesse. Ou seja, os ausentes desta lista não eram agraciados com brasão. Assim, as principais famílias, com cabedal e linhagem antiga, não detinham brasões por razões que estavam além da falta de qualidade e de posses.

Recorrendo às genealogias, evidenciei que as famílias mais antigas tiveram menor incidência na Bahia (20% do total de suplicantes), Rio de Janeiro (11%) e São Paulo (33%), mas em Pernambuco (51%) e Maranhão (43%) tiveram presença destacada. Em geral, os resultados quantitativos indiciam que nas primeiras capitanias as justificações da nobreza se pautaram nos serviços e feitos mais recentes, pois os militares das tropas auxiliares e das ordenanças raramente respaldavam os seus pedidos nos antepassados do século XVII ou mesmo da primeira metade do século XVIII. Talvez as hierarquias sociais aí tivessem sofrido maiores alterações do que em Pernambuco e Maranhão, onde os suplicantes descendentes das antigas famílias ainda valorizam os brasões e tiveram condições política e econômica de pleiteá-los. Como no ultramar a justificação da nobreza era requerida individualmente e não estava pautada na hereditariedade, esses quadros se tornam mais convincentes, pois não considero provável que os brasões de armas do século XVII ainda valessem na segunda metade do XVIII.

Assim, a análise dos Quadros 1 e 2 permite constatar que os suplicantes de Pernambuco e Maranhão pertenciam a uma elite mais antiga, enquanto nas demais capitanias as elites tradicionais ou já não tinham poder para requer brasões de armas ou não os consideravam uma honraria capaz de alavancar a sua honra. A última hipótese está bem comprovada para a Bahia, pois, baseado em vários estudos, constatei que os principais da terra não constam da lista dos abrasonados.28 28 A lista das principais famílias, grandes proprietários e comerciantes de grosso trato assegura o desinteresse do grupo pelos brasões. Ver os seguintes estudos: KENNEDY (1973 , p. 429), BORGES (2015) , SOUSA (2003) . Em princípio, a ausência das "primeiras e principais famílias" pode indiciar a sua decadência, mas esse não é o caso da Bahia. Em geral, boa parte dos suplicantes fazia parte de grupos emergentes que recorriam às insígnias para acumular honra ao seu patrimônio material e político. Como eram nobres sem linhagem, recorriam aos brasões, exibidos nas casas e roupas, para compensar a nobreza recente.

Enfim, a análise qualitativa buscará explicar porque as famílias mais antigas estavam ausentes entre os suplicantes da Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo. Somente um estudo dos vários estratos sociais tornará possível responder a indagação proveniente da quantificação. Da mesma forma, ainda não entendi a razão para alguns indivíduos não mencionarem seus antepassados ilustres quando solicitaram a justificação da nobreza. Por que omitiram a antiguidade da linhagem em autos de comprovação da nobreza? Para essa investigação, devo percorrer caso a caso e reconstruir a trajetória de seus progenitores. De todo modo, o estudo quantitativo levantou questões da maior importância: a dinâmica entre as velhas e novas elites nas sociedades coloniais.

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  • SOUSA, Avanete P. Poder local, cidade e atividades econômicas (Bahia, século XVIII). 2003. Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003.
  • STUMPF, Roberta G. Cavaleiros do ouro e outras trajetórias nobilitantes nas Minas setecentistas. Belo Horizonte: Fino Traço, 2014.
  • VARNHAGEN, F A. . História Geral do Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo; Edusp, 1981. 3v.
  • 1
    Agradeço à leitura e crítica de Nuno Monteiro, Thiago Krause, Alexandre Pelegrino e Giovane Albino. João Fragoso e Nuno Monteiro ainda me auxiliaram com as fontes e bibliografia.
  • 2
    Sobre os hábitos das ordens militares e foros de fidalgo ver: KRAUSE (2012 KRAUSE, Thiago N. Em busca da honra. São Paulo: Annablume, 2012. , p. 94-96, 133-152), RAMINELLI (2015 RAMINELLI, Ronald. Nobrezas do Novo Mundo. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2015. , p. 23-59, 132). Para a venalidade dos hábitos no período pombalino ver: OLIVAL (1988-1989 OLIVAL, Fernanda. O Brasil, as Companhias pombalinas e a nobilitação no terceiro quartel do setecentos. Anais, Évora, n. 8/9, p.73-97, 1988-1989. , p. 73-97; 2001, p. 202-217), STUMPF (2014 STUMPF, Roberta G. Cavaleiros do ouro e outras trajetórias nobilitantes nas Minas setecentistas. Belo Horizonte: Fino Traço, 2014. , p. 265-360). Sobre a concessão de foros de fidalgo em Portugal, indico as médias decenais apresentadas por OLIVAL (2001 OLIVAL, Fernanda. As ordens militares e o Estado Moderno. Lisboa: Estar, 2001. , p. 176). A citação encontra-se na página 177.
  • 3
    Sobre o rei de armas encontrei alguns estudos. Ver: SÃO PAYO (2001 SÃO PAYO, Marquês de. Do processo judicial de acção de justificação de nobreza no antigo direito adjectivo português e do seu merecimento historiográfico. Porto: Centro de Estudos de Genealogia e História da Família da Universidade Moderna, 2001. , 2001 SÃO PAYO, Marquês de. Cartas de brasão de armas: (ensaio de diplomática). Porto: Centro de Estudos de Genealogia e História da Família da Universidade Moderna , 2001a. a); CABRAL (2001) CABRAL, Gonçalo A. V. O cartório da nobreza no período de 1700-1755. Porto: Centro de Estudos de Genealogia, Heráldica e História da Família da Universidade do Porto, 2001. ; CUNHA (1963 CUNHA, Rui Vieira da. Os primeiros reis de armas do Brasil. Revista de História, São Paulo, n. 56, p. 367-383, 1963. , p. 367-383).
  • 4
    Somente muito mais tarde o Brasil terá um rei de armas, pois no Quinhentos era somente a terra de pau-brasil ( FRANCO, 1989 FRANCO, Luís F. Farinha. Les officiers d'Armes (rois d'armes, herauts et poursuivants) et les reformateurs du greffe de la noblesse XVII-XVIII siècles. Arquivo do Centro Cultural Português, Lisboa, n. 26, p. 453-598, 1989. , p. 453-454; CUNHA, 1963 CUNHA, Rui Vieira da. Os primeiros reis de armas do Brasil. Revista de História, São Paulo, n. 56, p. 367-383, 1963. , p. 367-383).
  • 5
    AHU, Maranhão, doc. 8047.
  • 6
    Vale aqui explicar os cortes cronológicos. O reinado de D. José findou em fevereiro 1777, mas para efeito quantitativo estabeleci como fim o ano de 1776. Na presente pesquisa, o governo de D. Maria finaliza com o estabelecimento da corte no Rio de Janeiro.
  • 7
    Vale aqui ressaltar que vários irmãos solicitaram a carta de brasão em um mesmo processo. Nestes casos, contei somente com um dos irmãos.
  • 8
    Devido ao caráter lacunar das informações sobre os brasonados ultramarinos arrolados pelo visconde de Baena, procurei complementar os dados recorrendo aos processos de justificação da nobreza dos Feitos Findos, sobretudo quando os vassalos estavam em ambas as fontes documentais. Em uma amostra de cerca de 50 autos, percebi que a precariedade dos dados não se originava da pesquisa insuficiente do Visconde, mas dos próprios autos.
  • 9
    Sobre a ajuda financeira do rico comerciante ver os vários documentos encontrados no AHU, Lisboa, Maranhão, docs. 7720, 7750, 8191 e 8222. Sobre os títulos e a patente de coronel das milícias do Maranhão, ver: AHU, Maranhão, doc. 8395; BAENA (1872 BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872. , p. 385).
  • 10
    Para hierarquia militar ver mapa dos regimentos das tropas pagas: AHU, Pernambuco, doc. 9235. Agradeço a Giovane Albino a indicação e a transcrição deste documento. Infelizmente, não tenho espaço suficiente para fazer referência aos estudos sobre história militar.
  • 11
    Sobre as falsificações genealógicas em Pernambuco, ver MELLO (1989). Menciono também as várias formas de falsear a nobreza estudadas por SORIA MESA (2007 SORIA MESA, Enrique. La nobleza en la España. Madrid: Marcial Pons, 2007. , p. 261-318).
  • 12
    Este antepassado comendador não está mencionado na Nobiliarquia Pernambucana ( FONSECA, 1925 FONSECA, Antônio J. V. Borges da. Nobiliarchia pernambucana. Anais da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, XLVII, p. 7-502, 1925. , p. 184).
  • 13
    Nesta fase da pesquisa tornou-se fundamental a consulta a obras dedicadas à genealogia: CALMON (1985) CALMON, Pedro. Introdução e notas ao catálogo genealógico das famílias de Frei Jaboatão. Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 1985. , FONSECA ( 1925 FONSECA, Antônio J. V. Borges da. Nobiliarchia pernambucana. Anais da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, XLVII, p. 7-502, 1925. ; 1926 FONSECA, Antônio J. V. Borges da. Nobiliarchia pernambucana. Anais da Biblioteca Nacional . Rio de Janeiro, XLVIII, p. 5-488, 1926. ), RHEINGANTZ (1965-1967) RHEINGANTZ, Carlos G. Primeiras famílias do Rio de Janeiro (séculos XVI e XVII). Rio de Janeiro: Livraria Brasiliana Editora, 1965-1967. 2v. , COUTINHO (2005) COUTINHO, Mílson. Fidalgos e barões: uma história da nobiliarquia luso-maranhense. São Luís: GEIA, 2005. , LEME (1980) LEME, Pedro de Taques de A. Paes. Nobiliarquia paulistana histórica e genealógica. 5. ed. Belo Horizonte; São Paulo: Itatiaia; Edusp, 1980. 3 Tomos. .
  • 14
    Vale aqui mencionar os números da capitania de Minas Gerais, embora não serão analisados neste artigo: número total, 29; dados paternos, 62%; demais antepassados, 72%; longa filiação, 31%. Com esses números, o perfil dos suplicantes da capitania se assemelha aos do Maranhão e Pernambuco. No entanto, uma análise mais detalhada é fundamental para fazer esta aproximação.
  • 15
    Encontrei várias referências à família no AHU, Pernambuco, docs. 12915, 13735, 13934, 14827 e 15965
  • 16
    Os suplicantes são o cônego Cypriano Lopes Fonseca Galvão e o presbítero José Bernardo da Fonseca Galvão ( BAENA, 1872 BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872. , p. 133-4, 369); os dois têm a mesma ascendência. Sobre os membros da família, ver os seguintes documentos: AHU, Pernambuco, docs. 3639, 4022, 4841, 5419, 6621, 7330, 7375, 7972, 8325 e 8404.
  • 17
    As referências ao capitão-mor datam dos anos de 1640. Ver os seguintes documentos: AHU, Maranhão, docs. 188, 189, 229, 230, entre outros.
  • 18
    AHU, Maranhão, doc. 8352.
  • 19
    Passo agora a citar dados de 13 fidalgos a partir das biografias realizadas por Coutinho (2005). Assim, ficam de fora do cômputo três suplicantes.
  • 20
    O brasão de armas do pai não consta da relação de Baena (1872) BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872. , tampouco há a comprovação em sua justificação da nobreza. Ver: Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Feitos Findos, Justificação da nobreza, 12, 21.
  • 21
    AHU, Bahia, doc. 15094.
  • 22
    Sobre vida e obra, ver RODRIGUES (1979 RODRIGUES, J. Honório. História da História do Brasil. São Paulo: Companhia editora Nacional, 1979. , p. 157-159). Segundo Rodrigues, os Rendon eram mestiços com índios guaianá.
  • 23
    Sobre as patentes militares destes oficiais, ver em vários documentos: AHU, São Paulo, doc. 648, 699, 714, 978, 1031, 1075, 1064, 1084, 1131, 1183, entre outros.
  • 24
    O visconde de Baena menciona a carta de brasão do pai, Antônio Aniceto Brito de Lima, natural de Villa Nova de Cerveira ( BAENA, 1872 BAENA, Visconde de Sanches de. Archivo heráldico-genealógico. Lisboa: Typographia Universal, 1872. , p. 27).
  • 25
    É conhecido o governador de Angola, Paulo Dias Campos (1575-1588).
  • 26
    Há vários registros de mercês em seu nome: ANTT, Registro Geral das Mercês de D. João V, li. 8, f. 290; Registro Geral das Mercês de D. José liv. 3 , f. 318.
  • 27
    Nesta investigação encontrei Francisco Carneiro da Cunha Amaral não mencionado por Baena e Rheingantz. Embora precise de ler o processo, tenho quase certeza de que é mais um Amaral Gurgel. ANTT, Justificação da Nobreza, Feitos Findos, 10, 29.
  • 28
    A lista das principais famílias, grandes proprietários e comerciantes de grosso trato assegura o desinteresse do grupo pelos brasões. Ver os seguintes estudos: KENNEDY (1973 KENNEDY, John N. Bahian elites, 1750-1822. Hispanic American Historical Review, Durham, n. 53, p.415-439, 1973. , p. 429), BORGES (2015) BORGES, Eduardo J. S. Viver sob as leis da nobreza: a casa dos Pires de Carvalho e Albuquerque e as estratégias de ascensão social na Bahia do século XVIII. 2015. 313 f. Tese (Doutorado em História social) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2015. , SOUSA (2003) SOUSA, Avanete P. Poder local, cidade e atividades econômicas (Bahia, século XVIII). 2003. Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003. .

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    10 Jul 2016
  • Aceito
    19 Out 2016
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