Acessibilidade / Reportar erro

Quando a consciência histórica é a consciência organizativa: formação política e ensino de História no MST

When historical consciousness is the organizational consciousness: political training and teaching of History within the MST

Resumos

Neste artigo propõe-se analisar a relação entre consciência histórica e consciência organizativa no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), considerando-se o lugar ocupado pelo estudo da história na formação de quadros políticos num período de consolidação do movimento social. Ao longo dos anos, meios de comunicação e materiais didáticos do MST se tornaram instrumentos de difusão de representações políticas, o que permite entender como o movimento social deu sentido ao passado e ao ensino de História na organização dos sem-terra. Trata-se de uma abordagem sobre representações que delinearam funções preliminares da consciência histórica e do ensino de História na mobilização dos trabalhadores rurais sem-terra.

consciência histórica; movimento social; ensino de História


This article aims to analyze the relationship between historical consciousness and organizational consciousness of the Landless Rural Workers Movement (MST), considering the role played by the study of history to form political cadres in a period that the social movement was being consolidated. Over the years, MST media and course books became tools to spread political representations, which allow us to understand how the social movement provided meaning to the past as well as to history teaching within the organization. This is an approach about representations that designed the primary functions of historical consciousness and history teaching in the rural landless workers mobilization.

historical consciousness; social movement; History teaching


Introdução

O debate sobre a relação entre teoria e prática ocupou espaço na formação e consolidação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Durante as décadas de 1980 e 1990, muito se discutiu sobre as dimensões e tentativas de superação de dicotomias no movimento social. Em grande parte, os temas que alimentaram debates sobre a organização do MST foram sistematizados e divulgados por meios de comunicação direcionados para a militância, seja na forma de notícias no Jornal dos Sem Terra, seja como informações para capacitação de quadros nos Cadernos de Formação, seja como orientações pedagógicas por meio dos Cadernos de Educação.

Nestes impressos, percebe-se a gradativa preocupação de lideranças do MST com a prática da militância para quebrar dicotomias que prejudicavam o avanço da luta pela reforma agrária. Um deles, o Caderno de Formação intitulado Ações de massa, foi amplamente divulgado após 1985 em acampamentos, assentamentos e Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs) filiados à Central Única dos Trabalhadores (CUT). Como um de seus objetivos, apresentou contradições que a organização do MST deveria combater: qualidade/quantidade, mobilização/organização, agitação/propaganda, bom/justo, massa/vanguarda, direção/liderança, imediato/estratégico, basismo/dirigismo. Cada uma das dicotomias suscitou análises sobre elementos que permearam a mobilização dos sem-terra. O que chama atenção no decorrer do impresso é o conceito de mudança, considerado o "último da ordem de agir, [...] o primeiro na ordem de pensar" (CADERNO, 1985, p. 5CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.), o que infere a presença incômoda da dissociabilidade entre teoria e prática no movimento social.

Ações de massa resultou de um curso de formação de lideranças do MST aplicado pelo sindicalista Ranulfo Peluso na cidade de São Paulo (SP), no final de 1984. Conforme apresentação da cartilha em nome do coletivo da Secretaria Nacional do MST, as questões levantadas poderiam contribuir para a compreensão da história e organização do movimento social. A mudança para ser alcançada dependia da consciência organizativa dos sem-terra. Para tanto, como parte da formação política da militância, era necessário formar a consciência histórica, ou seja, posições sustentadas pelas experiências passadas e pelas perspectivas futuras enquanto continuidade ou processo educativo.

Nesta direção, o presente artigo propõe analisar a relação entre consciência histórica e consciência organizativa na configuração de leituras do passado do MST, considerando-se o lugar ocupado pelo conhecimento histórico na formação de quadros políticos, num período de consolidação do movimento social. Toma-se o conceito de consciência histórica em suas especificidades teóricas e em suas relações com o conceito de consciência organizativa difundido por meios de comunicação produzidos ou apropriados por lideranças sem-terra, intelectuais, ativistas, jornalistas, artistas e religiosos que constituíram o MST. As narrativas elaboradas por estes atores históricos delinearam formas, leituras e funções do passado e estruturaram o conceito de consciência organizativa como sinônimo de consciência histórica perante a condição de pertença e o forjar de uma identidade dos trabalhadores rurais sem-terra. Portanto, trata-se de uma abordagem da configuração ou delineamento de conceitos no MST que deram sentido preliminar ao ensino de História em propostas educacionais e de capacitação de quadros do movimento social.

É importante considerar que a história da organização dos sem-terra se correlaciona com a elaboração e apropriação de uma variedade de meios de comunicação, como boletins informativos, jornal impresso, cadernos de formação política, de educação e cooperação agrícola, revista, audiovisuais e homepage. A construção de um saber histórico se confunde com a configuração de instrumentos políticos dos trabalhadores rurais sem-terra. Pensar sobre o passado, escrever sobre ele e torná-lo acessível a um maior número de militantes permeou a organização de meios de comunicação do movimento social.

Assim, pretende-se apresentar alguns conceitos de consciência histórica para adentrar nas elaborações teóricas que fomentaram a militância e fortaleceram os laços de mobilização, pelo que se convencionou chamar de consciência organizativa. Em meio a um manancial de meios de comunicação e materiais didáticos de formação política, alguns impressos foram selecionados com o objetivo de apreender a configuração de uma consciência histórica enquanto consciência organizativa do MST.

Vale mencionar que o aprendizado histórico é entendido como uma das dimensões e manifestações da consciência histórica, é um mecanismo de socialização e individualização pertinente às operações políticas do grupo social. A esta dimensão se soma a produção discursiva do MST por meio de materiais informativos e didáticos, o que sugere, num primeiro momento, a análise do conceito de consciência histórica para, num segundo, a partir de produções impressas do MST, tratar da consciência organizativa e da função do passado na legitimação política que delinearam representações e sentidos do ensino de História na organização dos sem-terra.

Consciência histórica e historiografia

A recorrência de historiadores ao conceito de consciência histórica, embora com ressalvas quanto a sua aplicabilidade na pesquisa, ganhou relevância mediante estudos que problematizaram o conhecimento histórico em práticas sociais do ensino de História. Embora não exista neste artigo a pretensão de analisar historicamente o conceito, assim como apontam estudos sobre percursos históricos e configurações de termos (KOSELLECK, 2013KOSELLECK, R. et. al. O conceito de história. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.), vale mencionar que muitas pesquisas que tratam do tema recorrem a autores como Hans-Georg Gadamer, Agnes Heller e Jörn Rüsen.

Para o que se pretende neste texto, além destes autores, convém tomar como referência os estudos de Marc Ferro (1983 e 1989)FERRO, M. A história vigiada. São Paulo: Martins Fontes, 1989., que tratam das manipulações da história no ensino e nos meios de comunicação e dos focos de consciência histórica, entendidos como constructos de agentes sociais que delimitam sentidos coletivos de existência. Em A história vigiada, Ferro (1989)FERRO, M. A história vigiada. São Paulo: Martins Fontes, 1989. usou o termo "contra história" para identificar focos de consciência histórica em grupos sociais, cujo embate à história institucional torna-se pertinente para analisar representações de passado e reivindicações pelo ensino de História por movimentos sociais.

Estudos sobre a produção do conhecimento histórico por meio da teoria da história e das práticas sociais do ensino de História instigam análises sobre o uso do passado por grupos sociais e colocam conceitos, como os de consciência histórica e cultura histórica, no centro dos debates sobre o ensino de História para além do universo da cultura escolar institucional. De maneira geral, tais estudos estão sendo usados para se compreenderem as relações sociais cotidianas como fundamento da historiografia e do ensino de História, a condição esparsa da consciência histórica decorrente da difusão de representações por meios de comunicação e a questão da falta de integração entre as discussões sobre a consciência histórica, os elementos constitutivos do pensamento histórico e a prática social do ensino de História.

Para se pensarem as origens do uso do conceito nas ciências humanas, as conferências de Gadamer, realizadas a partir de 1958 e que se transformaram no livro O problema da consciência histórica (1998), organizado pelo filósofo Pierre Fruchon, tornaram-se trabalho recorrente por pesquisadores dedicados ao tema da consciência histórica. Em Problemas epistemológicos das ciências humanas, o filósofo alemão apontou que as sociedades contemporâneas passaram por um processo de tomada de consciência que privilegiou o homem moderno de uma consciência de historicidade e de relatividade das opiniões. Assim, neste contexto no qual emergem, os historiadores compreendem o passado e empreendem modos de reflexão entendidos como senso histórico, ou seja, capacidade de superar valores e verdades adquiridos. (FRUCHON, 1998, p. 18FRUCHON, P. (org.). O problema da consciência histórica. Rio de Janeiro: FGV, 1998.).

Apesar das implicações do uso do conceito no campo historiográfico, não se devem relegar autores dedicados ao problema da consciência histórica na produção do conhecimento histórico. Uma vertente que marca estudos mais recentes sobre consciência histórica, conhecimento histórico e ensino de História pode ser identificada nos estudos de teorias da história, com Agnes Heller e Jörn Rüsen como importantes referências.

Para Heller (1993)HELLER, A. Uma teoria da história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993., a consciência histórica é composta por diversos estágios, inerente à condição humana. A percepção humana de sua historicidade, enquanto consciência de alguém que no mundo não estava, está e um dia não estará mais, é uma construção do significado de pertença dos indivíduos nos grupos sociais. A criação de normas de convivência que inserem o grupo num coletivo mais abrangente - neste caso, o conceito de humanidade - concebe o mundo como histórico, existindo um percurso de construção da consciência histórica - da consciência não refletida à consciência refletida na generalidade - que a torna a consciência da mudança.

[...] a consciência da mudança implica a intenção de mudar (de aperfeiçoar ou de restaurar). Mas a mudança traz algum bem? Devemos escolher o dinamismo ou a estagnação? [...] A consciência de história implica, pois, uma nova forma de racionalidade. Ao passo que na etapa da generalidade não refletida a conduta racional significa a conservação e observância das normas homogêneas de conduta, garantindo a reprodução da sociedade, a consciência refletida questiona tais sistemas de conduta. Surge a distinção entre as formas corretas e incorretas de argumentar. (HELLER, 1993, p. 21HELLER, A. Uma teoria da história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993.).

Atribuições de sentido à temporalidade se fazem desde as relações sociais cotidianas aos conhecimentos sistematizados, embora seja possível a inserção no tempo sem haver a devida consciência. A consciência histórica não é uma opção, mas uma necessidade para dar significado a coisas sobre que não se tem controle, como a própria transformação. Agir ou deixar de agir faz parte de interpretações de culturas passadas que ainda existem enquanto formos capazes de imaginá-las sem intenções de atribuir significados ao tempo.

Para Rüsen (2001)RÜSEN, J. Razão histórica. Teoria da história I: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: UnB, 2001., a consciência histórica é algo amplo e elementar do pensamento histórico, está relacionada com a vida humana prática, pois as interpretações que os homens fazem da evolução temporal orientam, de maneira intencional, suas práticas no tempo. Ao configurar a consciência histórica, o homem articula em sua vida prática a experiência e as intenções no tempo, orientando o agir e o sofrer no tempo.

A consciência histórica é, assim, o modo pelo qual a relação dinâmica entre experiência do tempo e intenção do tempo se realiza no processo da vida humana. [...] A consciência histórica é o trabalho intelectual realizado pelo homem para tornar suas intenções de agir conformes com a experiência do tempo. Esse trabalho é efetuado na forma de interpretações das experiências do tempo. Estas são interpretadas em função do que se tenciona para além das condições e circunstâncias dadas da vida. (RÜSEN, 2001, p. 58-59RÜSEN, J. Razão histórica. Teoria da história I: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: UnB, 2001.).

As experiências do tempo, entendido pelo autor como "tempo natural", carecem de interpretações na medida em que significam um obstáculo ao agir do homem, pois, ao pensar a mudança do mundo e da vida, o homem vê o "tempo natural" como algo impediente e resistente que o direciona para a morte. O tempo é uma perturbação de uma ordem na qual o homem tem de pensar no seu mundo para se orientar. Em oposição ao fatídico "tempo natural", Rüsen coloca o "tempo humano" como aquele em que as intenções do homem predominam como representações temporais para o agir e a organização da vida prática. As atividades intelectuais contribuem para aproximar o "tempo natural" do "tempo humano", com a consciência histórica constituída pelos sentidos e autointerpretação do homem sobre o mundo, estabelecendo-se parâmetros para agir e sofrer.

Os sentidos do homem sobre o mundo decorrem de uma operação intelectual, narrativa da vida prática, que determina a narrativa histórica como um elemento constituinte da consciência histórica. A narrativa recorre às lembranças, que são relações determinantes com a experiência do tempo, e o impulso para o passado é dado pelas experiências do tempo presente, consideradas por Rüsen (2001, p. 63)RÜSEN, J. Razão histórica. Teoria da história I: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: UnB, 2001. a única forma de pensar a consciência histórica que, em meio às carências de orientações da vida prática, questiona o passado e oferece referências decorrentes da mobilização das lembranças transpostas para o presente mediante a narrativa.

Posto desta forma, a mera subsistência do passado na memória não constitui consciência histórica, é necessária para isto a correlação expressa do presente com o passado, entendida como atividade intelectual identificada e descrita como narrativa histórica que, ao representar mudanças temporais do passado como processos contínuos, pode inserir perspectivas de futuro nas experiências do tempo presente. A recorrência ao passado face às carências do presente cria a consciência de tempo, ou seja, uma unidade integrada entre passado, presente e futuro, também entendida como "representação da continuidade", que constitui a consciência histórica.

No que se concebe como "continuidade", Rüsen (2001)RÜSEN, J. Razão histórica. Teoria da história I: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: UnB, 2001. entende que sua representação abrangente medeia, na consciência histórica, a relação entre interpretação do passado, entendimento do presente e expectativa do futuro, o que faz da narrativa histórica um mecanismo que configura sentidos sobre a experiência do tempo e, portanto, de identidades.

Toda narrativa [histórica] está marcada pela intenção básica do narrador e de seu público de não se perderem nas mudanças de si mesmos e de seu mundo, mas de manterem-se seguros e firmes no fluxo do tempo. Os homens têm de interpretar as mudanças temporais em que estão enredados a fim de continuarem seguros de si e de não terem de recear perder-se nelas, ao se imiscuírem nelas pelo agir, o que precisam fazer, para poderem viver. A resistência dos homens à perda de si e seu esforço de autoafirmação constituem-se como identidade mediante representações de continuidade [...]. A narrativa histórica é um meio de constituição da identidade humana. (RÜSEN, 2001, p. 66RÜSEN, J. Razão histórica. Teoria da história I: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: UnB, 2001.).

Considerando que a narrativa histórica não é única e, doravante, a consciência histórica também não é, em suas configurações existem batalhas pela consolidação de valores de grupos sociais, o que constitui identidades culturais que se distanciam ou se aproximam da história dita oficial ou institucional. O silêncio do ensino de História em torno da temática dos movimentos sociais em ditaduras militares é um dos típicos exemplos de como o controle sobre a narrativa histórica e a indiferença diante de assuntos considerados nocivos para a manutenção da ordem social fazem do conhecimento histórico um campo vigiado a serviço dos interesses de grupos políticos.

Para Marc Ferro (1989, p. 44)FERRO, M. A história vigiada. São Paulo: Martins Fontes, 1989., esse silêncio é um dos vestígios da "contra-história". Embora se dedique à inserção da "contra-história" em nações por meio de povos ou etnias que não são reconhecidos pelos parâmetros institucionais, interessante é a condição de movimentos sociais que encontraram na história ou na "contra-história" mecanismos para se manterem nas fronteiras das narrativas históricas institucionalizadas ou se deslocarem para outros campos de ação política, justificando a construção de identidades.

Questão semelhante foi levantada por François Hartog (2013)HARTOG, F. Regimes de historicidade: presentismo e experiências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. ao tratar de regimes de historicidade. O historiador francês apontou a fragmentação de representações de passado por meio de atores sociais que buscam legitimação, envolvendo a história, a memória e o patrimônio. Para ele:

[...] hoje em dia, o privilégio real da definição da história memória-nacional sofre concorrência ou contestação em nome de memórias parciais, setoriais, particulares (de grupos, associações, empresas, coletividades, etc.), que querem ser reconhecidas como legítimas, tão legítimas, ou mesmo mais legítimas. O Estado-nação não precisa mais impor seus valores, mas salvaguardar mais rapidamente o que, no momento presente, imediatamente, ou até na necessidade, é tido como "patrimônio" pelos diversos atores sociais. (HARTOG, 2013, p. 236HARTOG, F. Regimes de historicidade: presentismo e experiências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.).

Assim, surgem focos de consciência histórica, seja pelo silêncio, seja pelo aparecimento ou reaparecimento de representações do passado de grupos sociais ou étnicos, quando se sentem excluídos, dominados, explorados, privados de história e carentes de explicações para se colocarem como atores políticos no presente. A denúncia das perversões, dos silêncios ou das proibições de histórias institucionais (FERRO, 1989, p. 45)FERRO, M. A história vigiada. São Paulo: Martins Fontes, 1989. desencadeia contrapontos narrativos que, ao se situarem como espécies de "contra-história", colocam-se como discursos históricos paralelos e representam interesses políticos de movimentos sociais. Contrapontos narrativos podem se institucionalizar quando o Estado se apropria de modelos interpretativos que conquistaram espaços políticos.

No Brasil, esta situação é perceptível diante do crescimento do movimento democrático no final da década de 1970 e início de 1980. A pressão de movimentos dos direitos humanos e pela redemocratização sobre a ditadura militar (1964-1985) fez a "contra-história" dos movimentos sociais e políticos influenciar propostas curriculares de história, sob forte inspiração marxista, nos anos de consolidação do Estado democrático. Interpretações do passado advindas de atores políticos contrários ao regime autoritário, representados por instituições civis, religiosas e diversas organizações não governamentais (ONGs) foram publicadas em impressos, cujas características eram variadas, mas se situavam na condição de modelos alternativos de comunicação. Na maioria destes materiais, o estudo da história foi colocado como instrumento para a formação da consciência política, estruturado por concepções de continuidade, em que a interpretação do passado contribui para o entendimento do presente e produz crença sobre ações futuras. Assim, práticas sociais de ensino de História foram apontadas como fundamentais para a consolidação da consciência e identidades políticas.

Na construção de representações e na legitimação de ações políticas, a atuação de movimentos sociais torna a consciência histórica um elemento relevante para compreender a formação de identidades. Para tanto, colocam-se como problemas a articulação e reivindicações pelo direito de escrever, interpretar e difundir significações do passado para justificar ações, bem como os instrumentos elaborados ou apropriados para difundir a história que identifica os atores envolvidos nas demandas políticas defendidas por grupos sociais.

A organização do MST e o discurso pela reforma agrária se correlacionaram com a luta pela comunicação, que agregou ao movimento social a produção e distribuição de materiais de formação política dos trabalhadores rurais sem-terra. Diante da variedade de impressos voltados para a formação e capacitação de quadros políticos, configurou-se um projeto em que a função da história era contribuir para a formação da consciência organizativa defendida por lideranças e apoiadores do movimento social.

Formação política e configurações do ensino de História no MST

Ao tratar da relação entre consciência histórica e consciência organizativa no MST, vale mencionar que práticas desenvolvidas pelo movimento social teceram representações de passado que reforçaram relações solidárias entre os trabalhadores rurais sem-terra. Isto decorreu, em grande parte, do trabalho de entidades de apoio na formação do MST, o que impulsionou debates sobre o passado da organização campesina, o reconhecimento da história do movimento social pela historiografia, a produção de materiais impressos que difundiram representações de passado na militância, as práticas de ensino em escolas de acampamentos e assentamentos e as configurações do ensino de História em propostas educacionais e de capacitação de quadros políticos do movimento social.

Neste contexto, a arregimentação de lutas regionais pela terra contou com o apoio de entidades religiosas, civis e sindicais, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento de Justiça e dos Direitos Humanos do Rio Grande do Sul (MJDH-RS), a Pastoral Universitária de Porto Alegre (RS), o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC) e o Centro de Assessoria Multiprofissional (CAMP). No que se refere à educação popular, o CAMP desenvolveu projetos que envolveram movimentos sociais regionais e incentivaram lideranças na discussão de temas relativos à organização popular. Apoiado por organizações do Brasil e de vários países, o CAMP abrigou, entre 1983 e 1985, a produção do Boletim Sem Terra e sua transformação no Jornal dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Este informativo, além de servir como instrumento de articulação política entre movimentos sociais regionais, tornou-se porta-voz da direção nacional do MST num período de definições organizativas.

A estruturação interna e de representatividade conferida ao MST num jogo político de transição democrática também ocupou espaço nos Cadernos de Formação; materiais direcionados para um público formador de opiniões nos acampamentos, assentamentos, Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e Sindicatos de Trabalhadores Rurais. A preocupação de lideranças sem-terra, sindicalistas, religiosos e intelectuais com o estudo da história foi apontada no primeiro Caderno de Formação, lançado em 1984, com o título A organização do movimento: quem é quem na luta pela terra. Nele, evidenciou-se a importância do estudo do passado na organização dos sem-terra e foram elencadas experiências vividas para melhor conduzir as reivindicações e ações coletivas do movimento social.

O que chama atenção na cartilha são as páginas iniciais, dedicadas ao que lideranças do MST denominaram Histórico do Movimento Sem Terra. Para justificar o estágio de organização, foi delimitado, entre 1978 e 1986, um conjunto de datas e fatos considerados relevantes na trajetória do movimento social, resumindo as principais ações dos trabalhadores rurais sem-terra. (CADERNO, 1986, p. 3CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.). Deve-se considerar que o impresso foi aplicado em vários cursos de capacitação de quadros políticos. O termo "histórico" denotou uma relação de eventos muito usual, com forte apelo ao factual, característico de trabalhos memorialísticos. Contracenando com o enfoque cronológico, o desenvolvimento do material tratou da conjuntura nacional pelo viés das lutas de classes, apontando a dicotomia entre trabalhadores e burgueses, sem perder de vista as perspectivas de ações futuras do MST.

A distribuição do material de formação política em acampamentos e assentamentos deixou dúvidas quanto a sua aplicabilidade, ao mesmo tempo considerado simplista em seu escopo teórico e de difícil leitura para trabalhadores rurais. Este desarranjo, além de demonstrar as dificuldades de recepção de ideias nas bases do movimento, estampou a situação incômoda de intelectuais no MST, sejam religiosos, professores e escritores. Para lideranças sem-terra, os textos dos Cadernos de Formação e do Jornal Sem Terra deveriam alcançar a realidade dos trabalhadores rurais, o que gerava críticas àqueles que não tinham vínculo orgânico com o trabalho agrícola.

Um ano depois da publicação de A organização do movimento: quem é quem na luta pela terra, o Caderno de Formação Ações de massa apresentou as dicotomias enfrentadas pelo movimento social e centralizou o problema da teoria e da prática a partir do que se entendia como papel dos intelectuais no MST:

Só dirige quem sabe, por isso os trabalhadores precisam saber. Os padres, os jornalistas, os assessores nos mais variados campos, etc... devem servir à organização dos trabalhadores, incentivar, apoiar, ou até mesmo criar movimentos, capacitar os trabalhadores nas técnicas: mimeógrafos, boletins, etc., dar elementos de informações: teoria, história, conjuntura, metodologia... Mas devem evitar toda tutela, ou seja, ajudar a autonomia dos trabalhadores que capacitados poderão dirigir suas próprias organizações. (CADERNO, 1985, p. 8-9CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.).

O trecho demonstra um período de tensão política na organização do MST, caracterizado pela crescente sindicalização de lideranças sem-terra à CUT e posições críticas frente a entidades de apoio do início da década de 1980, que tinham como referência a CPT. Os instrumentos de capacitação e informação da militância sem-terra passavam por transformações que repercutiram no aumento da influência de lideranças sem-terra sobre a elaboração e publicação de materiais impressos.

Neste conjunto de mudanças internas, o conhecimento histórico ainda era tarefa ou privilégio dos que assessoravam a luta dos sem-terra, quando o protagonismo na história estava mais vinculado às ações políticas em diferentes espaços e menos à capacidade de leitura, interpretação e escrita da história pela militância. Tal situação era criticada por lideranças sindicais e sem-terra por meio de um discurso que combatia os que apenas escreviam sobre a luta pela terra e não participavam das mobilizações do MST.

O frade franciscano Sérgio Antônio Görgen, sensível ao problema, escreveu um texto que foi publicado na condição de Caderno de Formação, como "número especial", intitulado Reforma Agrária com os pés no chão. Nele, o religioso contribuiu na definição do papel dos intelectuais e entidades de apoio, demonstrando que a relação entre teoria e prática que constituía o movimento social era um dos grandes problemas a ser enfrentado pelos apoiadores e lideranças sem-terra. Difundir experiências passadas da luta pela reforma agrária demandava um árduo trabalho de incentivo à leitura, nas bases do MST. Mesmo abordando conceitos complexos, fossem de fundo político ou histórico, os textos deveriam ser agradáveis. A partir do texto foi sugerido aos sem-terra resistência perante as adversidades existentes na luta e aos agentes de apoio - como jornalistas, padres, escritores, acadêmicos, professores e estudantes - e pertinência para preparar materiais de fácil assimilação, capazes de incentivar a formação política dos trabalhadores rurais. (CADERNO, 1986, p. 3CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.).

Além disso, o material impresso apresentou Lições da História, em que o propósito é a inserção do MST num conjunto de lutas fundamentado no passado.

Para colocar os pés no chão é necessário também conhecer a história, as classes envolvidas e seus interesses, formular propostas, estabelecer táticas e formas de luta, identificar os inimigos e as forças concretas capazes de impulsionar a luta, estabelecer objetivos e estratégias políticas para alcançá-los. (CADERNO, 1986, p. 3CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.).

Não desmerecendo o papel dos intelectuais, mas deixando clara a importância de os sem-terra ganharem espaço na organização do MST, Görgen defendeu a expressão "pés no chão" como um jogo de "possibilidades reais" com que os trabalhadores rurais deveriam se envolver para conquistar a reforma agrária. As conquistas do MST dependiam da prática daqueles "que diariamente andavam com os pés no chão". (CADERNO, 1986, p. 3CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.).

A formação da consciência histórica enquanto consciência organizativa englobava a ação e o discurso que destacavam qualidades que os líderes camponeses deveriam possuir - compromisso político, competência, respeito de base, fidelidade com a causa popular e da organização - princípios que seriam fortalecidos com o conhecimento do passado dos movimentos sociais rurais. Por meio do discurso, situavam-se as "distinções" (ARENDT, 2001, p. 191ARENDT, H. A condição humana. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.) entre os sem-terra e outras categorias sociais. Sua difusão dependia da distribuição de materiais de formação, como também das formas como seriam trabalhados nas bases da luta para maior assimilação por parte dos sem-terra, condições elementares para a consolidação de uma identidade política.

Grande parte da execução deste projeto político de consolidação do movimento social se deu com a conquista de espaço do Setor de Educação na organicidade do MST, que agregou educadores de acampamentos e assentamentos, lideranças sem-terra e professores universitários, com o objetivo de discutir, planejar e publicar materiais para a capacitação. Encontros do Setor de Educação tornaram-se frequentes na Associação Nacional de Cooperação Agrícola (ANCA), cujo trabalho de assessoramento oferecia espaço para reuniões e recursos para a publicação dos materiais de educação. Foi na ANCA que os setores de Educação e Formação se aproximaram, pois a proposta de capacitação de educadores compreendia a tarefa formativa, função exercida pelos produtores dos Cadernos de Formação desde 1984. Retratando estes vínculos, em 1991 uma equipe de integrantes dos dois setores do MST, identificada coletivamente, lançou o Caderno de Formação O que queremos com as escolas dos assentamentos.

No impresso foram pontuados objetivos para a educação dos sem-terra priorizando-se a preparação de lideranças e o futuro da militância. Sindicatos, cooperativas de produção de bens e serviços, associações de bairros rurais e outros movimentos populares foram apresentados como elementos que agregariam valores para a formação da identidade sem-terra. A escola deveria ser o "lugar da vivência e desenvolvimento de novos valores" para alcançar uma consciência organizativa. O espaço de aprendizagem dos sem-terra deveria "preparar igualmente para o trabalho manual e intelectual", com ensino da "realidade local e geral" e criação de "sujeitos da história". Para a equipe dos setores de Educação e Formação, a consciência organizativa estava relacionada à construção de "sujeitos da história" por meio de comemorações de datas importantes da classe trabalhadora e do cultivo de valores, como "o cuidado com a saúde, a livre expressão de ideias e sentimentos". (CADERNO, 1991, p. 3CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.).

Na elaboração de uma proposta diferente de escola, como um espaço que deveria ajudar os estudantes a "conhecer a realidade", fundamentou-se um "currículo centrado na prática" que, assim como a história do Setor de Educação, deveria partir do tempo presente para a busca de um conhecimento mais abstrato. Nas bases do projeto pedagógico, o ensino de História estava relacionado à compreensão do assentamento, a partir dos temas "Nossa luta pela terra" e "Nossa cultura e nossa história de luta". (CADERNO, 1992, p. 39-42CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.).

Estes temas foram considerados elementares para um conhecimento crítico da realidade dos sem-terra. A "memória da luta" significava uma ferramenta na constituição de "sujeitos da história".

Um povo que não tem memória não é capaz de fazer a sua história. Queremos que a escola crie oportunidades para as crianças irem conhecendo, reconhecendo e registrando a sua história, a história da luta de seus pais, a história de luta de outros trabalhadores. As crianças participam da luta pela terra. É preciso que elas entendam o porquê desta luta. Que carecem a conhecer desde pequenas o MST como um todo e os principais fatos e dados que rodeiam sua realidade específica. (CADERNO, 1992, p. 39-42CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.).

A legitimação do coletivo se dava por depoimentos e práticas sociais que rememoravam eventos passados e traçavam relações com o cotidiano e o futuro das ações políticas. (LE GOFF, 1994LE GOFF, J. História e Memória. 3. ed. Campinas: Unicamp, 1994.). A construção da memória coletiva do MST estava relacionada com o "fazer história" dos sem-terra, aprendizado que aproximava prática e teoria. Esta interrelação de dimensões concretas e abstratas era considerada fundamental para a formação dos "sujeitos da história", entendidos como aqueles que, ao usarem o poder político da memória, eram capazes de "fazer suas histórias" por meio do reconhecimento no grupo e da alteridade em relação a outros.

A "memória cultural da luta pela terra", entendida como parte da memória coletiva que fortalecia a identidade sem-terra, assim foi apresentada:

Que as crianças tenham a oportunidade de conhecer e refletir sobre os símbolos, as canções, as histórias do MST. Que possam sentir e pensar também sobre o lado poético e belo da luta de que participam; que alimentem seu potencial criador; que aprendam a se expressar cada vez melhor e que valorizem sua própria cultura: que se preocupem em entender o jeito de viver e de pensar de seus pais e que seus companheiros sejam estimulados a inventar novos jeitos. (CADERNO, 1992, p. 39-42CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.).

Mediante estudos, posições e argumentos, pretendia-se produzir efeitos de um convívio, base de um mundo socialista. Os assentamentos deveriam ser valorizados como espaços de elaboração desta cultura política, em que a identidade sem-terra seria manifestada nas relações sociais e na valorização do ensino de História da luta pela terra. A formação de "sujeitos da história" dependia da inserção nas ações políticas do movimento social, o que possibilitou cada vez mais a reivindicação do MST por escolas em acampamentos e assentamentos, baseadas em propostas educacionais direcionadas para preparar militantes. Isto exigia um protagonismo em que a prática política construiria a história, colocando o discurso numa condição equivalente à ação política.

A crítica ao militante que apenas teorizava ficou marcante:

[...] para ser militante só discurso não basta. Só ativismo político também não é suficiente. Ser militante é ser sujeito de práxis, ou seja, ter clareza de objetivos, consciência organizativa, conhecimento teórico e ter competência prática. E esse é o futuro que pretendemos para nossas crianças. (MST/DER-FUNDEP, 1993, p. 1) [não consta nas referências]).

Assim, propostas de ensino de História no MST foram configuradas para se pensar a história "a partir da prática" e para além da concepção de disciplina escolar. Estudar a história significava formar quadros políticos em todo o processo educativo. Questão como esta bem diz sobre as inquietações que o passado traz nas definições de agendas políticas que sustentam movimentos sociais, o que supõe que o manuseio do passado era algo inerente à construção da identidade sem-terra, parte integrante do projeto político de consolidação do MST.

Isto se confirma pela farta produção de impressos no decorrer da década de 1990 voltada para a educação no movimento social. As orientações pedagógicas elaboradas por lideranças sem-terra, pedagogos e professores de atuação no campo tiveram suporte do Departamento de Educação Rural da Fundação de Desenvolvimento, Educação e Pesquisa (DER/FUNDEP), do Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária (ITERRA) e do Setor de Educação do MST. Dentre a vasta produção, chamam atenção Cadernos de Educação, Boletins da Educação e as coleções Saber e Fazer, Fazendo História e Fazendo Escola.

Com um extenso trabalho de sistematização e leitura destes materiais, encontra-se o Caderno de Educação Como fazemos a Escola de Educação Fundamental, escrito pelo religioso e educador popular Paulo Ricardo Cerioli e a pedagoga do Setor de Educação Roseli Salete Caldart. Por meio do material foram propostas ações para a educação dos sem-terra e para o trabalho pedagógico de professores atuantes em acampamentos e assentamentos. A escola defendida pelos autores deveria transformar aqueles que consideravam os "desgarrados da terra" e os "pobres de tudo" em cidadãos "dispostos a lutar por um lugar digno na história". Assim, os sem-terra foram apresentados como um dos elos na composição da "tradição de lutadores sociais" que faziam parte da história, com base no "enraizamento no passado e projeto no futuro". (CADERNO, 1999, p. 2-6CADERNO de educação, 1992; 1999.).

A formação da consciência histórica dos trabalhadores rurais sem-terra dependia do desenvolvimento de capacidades para se inserirem, enquanto "sujeitos da história", na organização do movimento social, compreendendo experiências passadas e projeções da luta pela terra. Para Cerioli e Caldart, o lugar ocupado pelo estudo da história na formação de quadros políticos dependia da "pedagogia da história", que consistia na formação de "sujeitos da história" por meio de práticas de valorização da memória e de sentidos do passado, entendidos como referências nas escolhas de vidas dos sem-terra. Para isso, ensinar história significava transpor significados, de uma disciplina estanque para uma dimensão que abrangia todo o processo educativo, o que demandava "o cultivo da memória e da compreensão do sentido da história e da percepção de ser parte dela, não apenas como resgate de significados, mas como algo a ser cultivado e produzido". (CADERNO, 1999, p. 10-11CADERNO de educação, 1992; 1999.).

Como se vê, o estudo da história tinha por objetivo fazer os trabalhadores rurais "sentir o passado" e "fazer a história" como algo inerente à vida e às relações humanas, como sentido de escolha individual e, ao mesmo tempo, experiência coletiva que fortaleceria a consciência organizativa. Para "sentir o passado" e "fazer a história" seria necessário desenvolver percepções de "lugares de memória" para, assim, enquanto "sujeitos da história", transformar a realidade. Para se perceberem no tempo, os trabalhadores rurais sem-terra deveriam conhecer e compreender a história e seu movimento, seja o movimento no sentido do ator político coletivo, seja o movimento no sentido da mudança social.

Com a consolidação e visibilidade social alcançada pelo MST, a produção da história que parecia ser privilégio e responsabilidade apenas de intelectuais, lideranças sem-terra e sindicais passou a ser questionada por representar um limitador da autonomia dos trabalhadores rurais sem-terra enquanto "sujeitos da história". Com o surgimento de novas demandas para a organização do movimento social, dentre as quais o aperfeiçoamento de estratégias de comunicação para enfrentar as críticas oriundas da imprensa comercial e a reivindicação por escolas e professores adequados à realidade do campo, a relação entre teoria e prática foi discutida no sentido de aproximar o "pensar" e o "agir", o que resultou em propostas educacionais e de ensino de História centradas na prática social, propondo-se uma revisão da teoria enquanto dimensão superior no processo histórico do MST.

Tais questões suscitam possibilidades de pesquisa sobre os usos da história por grupos sociais submetidos a diversas formas de exploração. Formulações de explicações históricas por movimentos sociais se forjam em ambientes que reconhecem aspirações coletivas num jogo de embates políticos. As variadas construções da história por atores coletivos, quando não reconhecidas pela história institucional, se coadunam como "contra-história" num campo de disputas discursivas, por meios próprios de comunicação. Diante das representações de passado produzidas pelo MST catalisaram-se diferentes forças sociais que pressionaram e constituíram plataformas políticas, o que permitiu apropriações de discursos num plano institucional e abriu margens para estudos sobre as representações de movimentos sociais em materiais didáticos de educação básica.

Referências

  • ARENDT, H. A condição humana. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.
  • CADERNO de educação, 1992; 1999.
  • CADERNO de formação, 1991; 1985-1986.
  • FERRO, M. A história vigiada. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
  • FERRO, M. A manipulação da história no ensino e nos meios de comunicação. São Paulo: Ibrasa, 1983.
  • FRUCHON, P. (org.). O problema da consciência histórica. Rio de Janeiro: FGV, 1998.
  • HARTOG, F. Regimes de historicidade: presentismo e experiências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.
  • HELLER, A. Uma teoria da história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993.
  • KOSELLECK, R. et. al. O conceito de história. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.
  • LE GOFF, J. História e Memória. 3. ed. Campinas: Unicamp, 1994.
  • MST/DER-FUNDEP. A importância da prática na aprendizagem das crianças. Três Passos: MST, 1993.
  • RÜSEN, J. Razão histórica. Teoria da história I: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: UnB, 2001.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    26 Mar 2014
  • Aceito
    10 Out 2014
Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho Faculdade de Ciências e Letras, UNESP, Campus de Assis, 19 806-900 - Assis - São Paulo - Brasil, Tel: (55 18) 3302-5861, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, UNESP, Campus de Franca, 14409-160 - Franca - São Paulo - Brasil, Tel: (55 16) 3706-8700 - Assis/Franca - SP - Brazil
E-mail: revistahistoria@unesp.br