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Um "distinto bibliógrafo e bibliófilo": Capistrano de Abreu editor de documentos históricos

A "distinct bibliographer and bibliophile": Capistrano de Abreu, publisher of historical documents

Resumos

Este artigo examina as práticas do historiador brasileiro João Capistrano de Abreu (1853-1927) em seu trabalho como editor de documentos históricos. Seu esforço em estabelecer o autor de um texto, traçar-lhe a biografia, contextualizar e apresentar o texto ao leitor, fornecer indicações bibliográficas sobre os assuntos tratados nos escritos, entre outros pontos, permitem não apenas entrever sua prática específica como editor, mas, de forma geral, a do historiador Capistrano de Abreu diante de um documento histórico.

Capistrano de Abreu; Edição de textos; Documentos históricos


This article examines the practices of the Brazilian historian João Capistrano de Abreu (1853-1927) in his work as a publisher of historical documents. His efforts in establishing the author of a text, outline his biography, contextualize and present the text to the reader, give bibliographical indications about topics approached in the texts, among other things, allow us to foresee not only his specific practice as a publisher, but in general terms, the one from the historian Capistrano de Abreu facing a historical document.

Capistrano de Abreu; Text publishing; Historical documents


ARTIGOS ARTICLES

Um "distinto bibliógrafo e bibliófilo": Capistrano de Abreu editor de documentos históricos1 1 Bolsista CNPq durante a pesquisa que resultou neste artigo. Este artigo procede de uma re-elaboração de parte do segundo capítulo de nossa dissertação de mestrado, História erudita e popular: edição de documentos históricos na obra de Capistrano de Abreu. FFLCH-USP, 2009.

A "distinct bibliographer and bibliophile": Capistrano de Abreu, publisher of historical documents

Pedro Afonso Cristovão dos Santos

Mestre em História - Doutorando - Programa de Pós-Graduação em História Social - USP - Univ. de São Paulo - Rua do Lago, 717, CEP: 04280-000, São Paulo, São Paulo, Brasil. E-mail: pedro.afonso.santos@usp.br

RESUMO

Este artigo examina as práticas do historiador brasileiro João Capistrano de Abreu (1853-1927) em seu trabalho como editor de documentos históricos. Seu esforço em estabelecer o autor de um texto, traçar-lhe a biografia, contextualizar e apresentar o texto ao leitor, fornecer indicações bibliográficas sobre os assuntos tratados nos escritos, entre outros pontos, permitem não apenas entrever sua prática específica como editor, mas, de forma geral, a do historiador Capistrano de Abreu diante de um documento histórico.

Palavras-chave: Capistrano de Abreu; Edição de textos; Documentos históricos.

ABSTRACT

This article examines the practices of the Brazilian historian João Capistrano de Abreu (1853-1927) in his work as a publisher of historical documents. His efforts in establishing the author of a text, outline his biography, contextualize and present the text to the reader, give bibliographical indications about topics approached in the texts, among other things, allow us to foresee not only his specific practice as a publisher, but in general terms, the one from the historian Capistrano de Abreu facing a historical document.

Keywords: Capistrano de Abreu; Text publishing; Historical documents.

1. Apresentação

João Capistrano de Abreu (1853-1927) editou, ao longo de sua vida, por diversas formas, vários textos históricos e/ou historiográficos relativos ao passado luso-brasileiro. Concorreu, por exemplo, para a publicação de textos-chave para o estudo desse passado, como os escritos dos jesuítas José de Anchieta, Manoel da Nóbrega e Fernão Cardim, e teve papel decisivo na recuperação da História do Brasil (1627) de Frei Vicente do Salvador, obra fundamental na bibliografia histórica brasileira. Tais textos serviram não somente aos estudos históricos, mas à elaboração de marcantes interpretações sobre o Brasil calcadas em análises de sua história; são fontes, assim, de obras como Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda, e Casa-Grande e Senzala, de Gilberto Freyre.

Capistrano de Abreu, em seu empenho de divulgar fontes históricas, não se destaca de seu tempo, podendo ser inserido em um processo que remonta às gerações anteriores. Desde o século XIX inúmeras iniciativas, pelo menos no Ocidente, voltaram-se para a edição e publicação de fontes para as histórias nacionais. Empreendimentos como a Monumenta Germaniae Historica (iniciada na década de 1820), na Alemanha, e a Collections de Documents Inédits sur l'Histoire de France (iniciada na década de 1830), na França, constituem a face mais conhecida de um intenso movimento de divulgação de fontes históricas no mundo ocidental. (Na França, cabe ainda destacar a Ecole des Chartes, fundada em 1821, fechada em 1823 e finalmente reaberta em 1829). No Brasil, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), fundado em 1838, também traz entre seus objetivos a recolha e divulgação das fontes para a "história pátria", no que é seguido pelos institutos regionais. Autores como Varnhagen também dão sua contribuição, não só no corpo de suas obras, onde transcrevem documentos copiados nos arquivos, mas em edições próprias de textos históricos, como as que o Visconde de Porto Seguro fez do Diário de Navegação de Pero Lopes de Sousa (irmão de Martim Afonso) - obra que seria reeditada em 1927 com colaboração de Capistrano-, e dos escritos de Gabriel Soares de Sousa, do primeiro século de colonização portuguesa na América. Capistrano insere-se, portanto, em um amplo processo de divulgação de documentos que vai ampliando, ao longo do século XIX, o acesso às fontes para os estudiosos de história, e que tem continuidade no início do século XX (a publicação das Atas da Câmara e dos Inventários e Testamentos, em São Paulo, neste começo de século, é mais uma iniciativa sintomática no caso brasileiro).

Pretendemos estudar tal faceta da produção de Capistrano a partir da necessidade que o autor viu, em seu tempo, de se ampliar e aprimorar as formas de divulgação de documentos. Tornar textos de difícil acesso disponíveis a um número maior de interessados (neste sentido a expressão divulgar, tornar vulgar, ou "vulgarizar", como era corrente na época), mas ao tempo disseminar uma prática historiográfica mais rigorosa, "erudita". Desse modo, coexistem em suas edições opções editoriais voltadas à popularização dos textos, como a atualização da grafia do português do século XVI para o português contemporâneo, por exemplo, com procedimentos rigorosos no âmbito da cópia dos textos ou da citação das fontes.

2. A edição de textos históricos

Editar um volume à primeira vista parece fácil; mas na realidade é muito difícil. Não falemos do caso em que há muitas cópias, com variantes com erros de copistas, como sucedeu com o Roteiro de Gabriel Soares, que devemos a Varnhagen. Tomemos o caso mais simples, o em que só há um manuscrito autógrafo; os estudos sobre o autor e sua época, os esclarecimentos dos pontos obscuros, as retificações, as notas não são trabalhos que qualquer pessoa faça (ABREU (c), 1976, p.166, artigo de 30 de outubro de 1880, publicado na Gazeta de Notícias).

Parece incrível, mas é exato; quase não há no Instituto [Histórico e Geográfico Brasileiro] quem saiba fazer esta coisa tão simples - editar um livro. A prova é que nem mesmo as coisas tão comezinhas, como determinar a época em que foi escrito e assim circunscrever o período em que se deve procurar o autor quando o livro é anônimo, nem mesmo a isto se julgam obrigados os seus sócios. Nos cinqüenta e tantos volumes de que consta a Revista, talvez o Roteiro de Gabriel Soares seja o único impresso segundo as regras [editado por Varnhagen] (ABREU (c), 1976, p.282, artigo de 2 de setembro de 1881, publicado na Gazeta de Notícias).

Se quiseres tomar esta incumbência, os princípios a seguir são estes: escrever de um lado só para não termos de recopiá-la, e seguir a ortografia atual, porque a nossa edição é popular, e não fazer notas polêmicas (ABREU (f), 1977, p.327, carta a Lino de Assunção, 2 de abril de 1886).

Os documentos desta ordem V. até hoje tem publicado com a falta de ortografia e pontuação no original, deixando a cada um interpretá-los como entender. O sistema que eu e [Alfredo do Vale] Cabral introduzimos é diferente por muitos motivos: primeiramente nosso trabalho, embora feito com o maior rigor a que podemos atingir, é de vulgarização; em segundo lugar, ater-se à ortografia arcaica é conjurar contra si todos os compositores e revisores; em terceiro lugar, o editor preocupado com a grafia não tem tempo de atender a questões mais sérias; em quarto lugar, é preciso que quem edita (sic) qualquer papel assuma a responsabilidade da interpretação (ABREU (d), 1977, p.148-149, carta a Guilherme Studart, 5 de fevereiro de 1900).

Capistrano afirmou e reafirmou, em vários momentos de sua produção, a necessidade de os historiadores concorrerem para a divulgação de fontes históricas, suprindo diferentes necessidades: a disponibilização dessas fontes a quem quisesse estudar a "história pátria"; o fornecimento das mesmas para que a narrativa dos textos historiográficos pudesse ser confrontada, e conferida; e a preservação do conteúdo de papéis em estado de deterioração nos arquivos, estão entre as principais. Fundamentalmente, era uma tarefa obrigatória para os autores de estudos históricos naquele período no Brasil, na sua visão, e saber fazê-la também o era. Isso implica um conjunto de procedimentos, onde estaria a diferença dos trabalhos de Capistrano para os demais de edição de textos - não dele individualmente, mas de sua filiação a determinados trabalhos e autores que primariam por determinado tipo de edições.

Qual é esse tipo e por que ele é necessário são as perguntas que colocamos. Segundo entendemos, sua necessidade, que marcaria também sua especificidade, permitiria ao leitor um contato quase imediato com a fonte, por dispensá-lo de possuir conhecimentos que demandam algum estudo (e, quiçá, especialização). Quero dizer: podemos observar nas edições de Capistrano seu propósito de vulgarização dos conhecimentos históricos. Textos seiscentistas, por exemplo, com a grafia das palavras atualizada, livrando o leitor de ter de saber o português antigo; notas que o colocam em contato com toda uma bibliografia especializada, e outras fontes relacionadas, com referências completas das obras; notas que retificam ou complementam a narrativa dos textos, dando ao leitor a exposição "correta" dos eventos, paralelamente ao relato da fonte; explicações históricas; glossários para as palavras pouco conhecidas (ou cujo conhecimento demanda familiaridade com estudos específicos, como no caso das línguas indígenas); panoramas históricos que contextualizam autor e época do texto, entre outros pontos. Embora nem sempre observados todos juntos, esses procedimentos popularizam não apenas o estudo da história, como sua escrita, a partir das fontes e suas indicações. É ainda um tipo específico de escrita que se dissemina, marcado pela disponibilização também das fontes e sua referência precisa, abrindo ao questionamento o texto historiográfico, já que o leitor passa a ter a indicação da fonte em que se baseou o historiador, podendo contestá-la ou confrontar interpretações.

O grau que atinge essa vulgarização depende, evidentemente, da extensão do "círculo de leitores" (BESSONE, 1999) em que caem essas publicações, muito limitado, no caso de Capistrano - qual seja, o Brasil da virada do século XIX para o XX. Essa extensão não está vinculada exclusivamente ao critério da alfabetização, muito restrito no Brasil de então. Depende também do acesso a instituições onde se dá a produção historiográfica. As notas de uma edição, por exemplo, ao se referirem a outra fonte, só podem ser plenamente utilizadas pelo leitor que tem como chegar, se quiser, àquela fonte; deve ser um frequentador da Biblioteca Nacional, ou do arquivo do IHGB, por exemplo. Se se trata de um livro, o leitor deve ter como adquiri-lo, por alguma livraria que frequente, ou consultá-lo, também nas bibliotecas.

Para o caso dos estudiosos da "história pátria" naquele contexto, Capistrano continuava a ver como problema a disponibilização das fontes, malgrado diversas iniciativas nesse sentido, desde meados do século XIX: pois essas nem sempre (senão raramente) seguiriam as "regras" a que se refere na segunda citação, isto é, o conjunto de procedimentos que elencara no primeiro trecho por nós transcrito. Como resposta, e como caminho escolhido nesta atividade, Capistrano definiu um "sistema", com seus "princípios", entre eles o de "vulgarização" ou "popularização", dos textos que editava. Nas citações acima, Capistrano se refere a esse "sistema" em dois momentos: o primeiro, na carta a Lino de Assunção, em ação, quando, ao lado de Vale Cabral e Teixeira de Melo, tenta realizar a publicação de uma ampla coleção de textos históricos, nos anos 1880, a Materiais e Achegas para a História e Geografia do Brasil (que acabou tendo apenas três números); o segundo, na carta a Studart, onde trata desse "sistema" retrospectivamente.

3. O trabalho de editor

Resolvemos, afinal, publicar a História de Fr. Vicente em dois volumes: o primeiro chegará até o quarto livro, até onde não há lacunas. Deve ficar pronto para 27 de dezembro, se não houver circunstâncias em contrário. Será anotado por mim, mas a introdução será do [Vale] Cabral e tratará da biografia e da bibliografia. (...). Precisamos, pois, com urgência [de] informações tuas - sobre o formato do Mss., número de páginas, se são ou não numeradas, marca d'água do papel, encadernação & [etc.] - isto para a bibliografia. Para a biografia talvez nos possas arranjar um documento importantíssimo. Fr. Vicente chamava-se no mundo Vicente Rodrigues Palha, nasceu em janeiro de 1567 e formou-se in utroque jure na Universidade de Coimbra. Provavelmente matriculou-se por 1587. Não será possível obter-se a certidão da matrícula? Deixo-o a teu cuidado e zelo. Preciso para as notas finais de Frei Vicente: (...) (ABREU (f), 1977, p.344-345, carta a Lino de Assunção, 18/10/1886).

No primeiro texto histórico que publicou, Do princípio e origem dos índios do Brasil, de Fernão Cardim (1881), Capistrano de Abreu, na introdução pela qual ficou responsável, dedicou-se ao "nosso trabalho de editor" (ABREU (a), 1975, p.128). Este trabalho só tem início, porém, ao final da introdução, ocupando apenas seus últimos parágrafos. Deveria conter uma biografia do autor, postergada, pois que, apesar das "copiosas notas" tomadas pelo editor, ainda lhe escapavam ao conhecimento "anos e anos da vida de Fernão Cardim" (ABREU (a), 1975, p.128). O "trabalho de editor" acaba por consistir nas justificativas da edição (seis parágrafos curtos), em relação à ortografia adotada, ao propósito irrealizado da edição (figurar na Exposição de 1881 da Biblioteca Nacional), e às notas de Batista Caetano, esclarecendo vocábulos indígenas. Esse "trabalho de editor" assenta-se fundamentalmente sobre os dois campos que ele e Vale Cabral procuravam preencher para Frei Vicente, com a ajuda de Lino de Assunção: a biografia do autor e de pessoas citadas na obra editada, e a bibliografia, não só da própria obra como de outros documentos contemporâneos e de monografias sobre pontos mencionados no texto.

3.1 O "distinto bibliógrafo e bibliófilo o Sr. João Capistrano de Abreu"

No ano de 1881, em seu tomo 1º, a Revista Mensal da Seção da Sociedade de Geografia de Lisboa no Brasil, do Rio de Janeiro, inicia a publicação de manuscrito encontrado entre os papéis do falecido presidente da seção, o senador Cândido Mendes de Almeida. Informa José de Arimatéia Pinto do Carmo, em sua Bibliografia de Capistrano de Abreu, que, "Após publicadas as primeiras páginas, a direção da Revista resolve não prosseguir, pela razão seguinte, exposta no tomo citado [1º.], ps. 153-154", em Advertência:

Antes de prosseguir na publicação do manuscrito, darei uma agradavel notícia aos leitores.

Conhecedor e apreciador do mérito do distinto bibliógrafo e bibliófilo o Sr. João Capistrano de Abreu, roguei-lhe se dignasse investigar donde procederia a cópia que existia entre os manuscritos do primeiro ex-presidente desta Secção [sic], visto que só a especialidade em tal gênero de pesquisas [grifo nosso] poderia dar um útil, proveitoso e pronto resultado (Apud CARMO, 1942, p.79).

Quem escreve é o redator chefe da Revista, Fernando Mendes de Almeida, filho de Cândido. Sua consideração de Capistrano como um "distinto bibliógrafo e bibliófilo" não só denota aqui a plena inserção de Capistrano no que Tânia Bessone conceituou como "círculo de leitores" do Rio de Janeiro de fins do século XIX, início do XX, como aponta para sua inserção como autoridade nesse círculo, isto é, alguém a quem se recorrer em caso de dúvida sobre obras e manuscritos, em função de seu domínio de uma especialidade.2 2 Sobre o "bibliófilo", cf. BESSONE, 1999, p.143. A si próprio, Capistrano definiu-se, em carta do dia das Treze mil virgens (provavelmente "Onze mil virgens", dia 21/10, segundo o antigo calendário católico) de 1922 a Paulo Prado, como " bookmanger"; ao falar da imensa biblioteca de Rui Barbosa a João Lúcio de Azevedo (carta de 26/03/1919), disse que aquele tinha "verdadeiro amor de bibliófilo aos livros" (ABREU (e), 1977, p.423 e 118, respectivamente). Seu trabalho na Biblioteca Nacional, seus artigos na imprensa e suas relações pessoais dentro do círculo certamente o qualificavam como tal; isso embora o diálogo de que estamos tratando tenha ocorrido antes ainda da Exposição Nacional de História e Geografia do Brasil que a Biblioteca Nacional inauguraria em dezembro de 1881, cujo Catálogo deve ter contribuído muito para o reconhecimento, enquanto "bibliógrafos", dos funcionários da Biblioteca Nacional (começando por seu diretor Ramiz Galvão, e passando por Capistrano, Alfredo do Vale Cabral, Teixeira de Melo e demais colaboradores). Mas os Anais da Biblioteca Nacional, publicados desde 1876, já podem ter servido para assegurar a esse grupo preeminência nos estudos bibliográficos.3 3 No segundo volume dos Anais, 1876-77, Alfredo do Vale Cabral se refere à publicação como "revista bibliographica". Annaes da Bibliohteca Nacional do Rio de Janeiro, vol. II, Fascículo I, 1876-1877, p.201.

Interessa observar, na citação do redator da Revista, que à Capistrano (e, por conseguinte, a todos os "bibliógrafos") é atribuído um conjunto de conhecimentos específicos: "visto que só a especialidade em tal gênero de pesquisas poderia dar um útil, proveitoso e pronto resultado". Fernando procurara Capistrano para esclarecer de que se trataria o manuscrito, uma cópia de documento, encontrado entre os papéis de seu pai, recém-falecido, Cândido Mendes de Almeida (1818-1881). Na resposta de Capistrano acreditamos poder identificar quais seriam as especialidades (passamos nós para o plural) contidas na prática de um bibliófilo. Fernando Mendes de Almeida transcreve a carta-resposta de Capistrano, onde este procura dirimir as dúvidas do caso (Apud CARMO, 1942, p.79-81).

Em seu raciocínio, a expectativa inicial era de que o dono do manuscrito pudesse conhecê-lo melhor e esclarecer as dúvidas quanto ao texto: sua natureza, autor e data de composição, cumprindo assim as tarefas do editor. Isso não só por se tratar do dono da cópia, mas por este ser Cândido Mendes de Almeida, grande erudito, por quem Capistrano demonstrou várias vezes admiração, em função de seus estudos históricos. Não sendo isso possível, aparece Capistrano como alguém habilitado a tratar do documento em função de um "acaso feliz" - estava estudando texto que acreditava ser do mesmo autor, e preparando-o para publicação. Postas estas condições, parte para o trabalho de "bibliógrafo" propriamente dito. E em que consiste este?

Em primeiro lugar, o que sobressai é uma erudição específica. É o conhecimento dos instrumentos de pesquisa, no caso o catálogo da Biblioteca de Évora, de coleções de textos (Purchas), e de obras de história em que esses textos aparecem citados, bem como as referências contidas nessas obras aos textos. Por meio das leituras, Capistrano chega à data de composição da obra: 1584. Chega também à constatação de que o texto que publica a Revista liga-se a outro, também contido em Purchas. O Rivara a que Capistrano de Abreu se refere é Joaquim Heliodoro da Cunha Rivara, bibliotecário da Biblioteca de Évora, que mandara organizar catálogo da mesma, saído em Lisboa, 1850: o Catalogo dos Manuscritos da Bibliotheca Eborense, como informa Rodolfo Garcia na edição de 1925 das obras de Fernão Cardim (CARDIM, 1980, p.17).

3.2 Instrumentos de pesquisa

O trabalho bibliográfico necessário para a realização de uma edição (que veremos com mais detalhe posteriormente) tinha no domínio dos instrumentos de pesquisa, como os catálogos de biblioteca, um elemento indispensável. Catálogos de acervos particulares, de bibliotecas públicas, de coleções postas à venda, de livreiros, bibliografias gerais e dicionários de autores são alguns exemplos dessa literatura com a qual o historiador tinha de ser familiarizado para poder realizar suas pesquisas - e que tomavam importância específica quando se tratava de apresentar ou estudar uma determinada obra. Capistrano colaborou, ele mesmo, com a elaboração de ao menos três catálogos: o monumental Catálogo da Exposição de História e Geografia do Brasil da Biblioteca Nacional, de 1881, quando era funcionário da instituição; o "Catálogo dos Documentos Mandados copiar pelo Senhor D. Pedro II", publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo LXVII, parte 1ª., vol. 109, 1904 (1906);4 4 Segundo José Honório Rodrigues, um "inventário das cópias mandadas fazer por Antônio Gonçalves Dias e João Francisco Lisboa, utilíssima lista que compendia os esforços dos dois pesquisadores" (RODRIGUES, 1969, p.95). Capistrano demonstrou largo conhecimento destas pesquisas oitocentistas, indicando muitas de suas deficiências. Este catálogo pode ser corolário direto de suas pesquisas nos anos 1880 e 1890, quando mergulhou nas consultas do Conselho Ultramarino, conforme diz em carta a Rio Branco, de 17/04/1890; ABREU (d), 1977, p.130. O "Catálogo" divide-se em: Torre do Tombo, Academia Real das Ciências, Biblioteca de Évora, Conselho Ultramarino - Registos e Conselho Ultramarino - Papéis Vários, de acordo com a procedência das cópias mandadas fazer pelo Imperador. Capistrano ainda indica quais documentos já haviam sido publicados (ou "impressos", na sua terminologia), e onde o foram, e publica regimentos e relatos de viagem após o "Catálogo". Cf. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo LXVII, parte I, vol. 109, 1904 (1906). O "Catálogo" foi publicado anonimamente; Vieira Fazenda atribuiu-o a Capistrano (VIANA, 1955, p.50). e o catálogo da biblioteca de Francisco Ramos Paz, seu amigo pessoal, saído em 1920.5 5 Capistrano escreveu no Suplemento do catálogo texto que está reproduzido em ABREU (b), 1976, pp.129-139. Sobre Ramos Paz, cf. BESSONE, 1999, capítulo 3. Capistrano começou o trabalho de catalogação do acervo de Ramos Paz, mas teve de abandoná-lo; cf. BESSONE, 1999, p.165. Outra bibliografia com a elaboração da qual teria colaborado Capistrano é a Biblioteca Brasiliense, de José Carlos Rodrigues, o catálogo de sua muito reputada brasiliana (publicado no Rio, em 1907), várias vezes citada por Capistrano nos "Prolegômenos" da edição de 1918 da História do Brasil de frei Vicente do Salvador. Segundo dois biógrafos de Capistrano, Hélio Viana (que remete a informação a Afonso Taunay) e José Aurélio Saraiva Câmara, Capistrano teria participado anonimamente da confecção deste catálogo. Cf. VIANA, 1955, p.51, e CÂMARA, 1969, p.159. Este último expôs, em seu testamento, o seguinte desejo:

Pretendo dispor dos livros, quadros e mais objetos de arte, mas se isto não se verificar como é possível, neste caso peço ao meu bom amigo J. Capistrano de Abreu que coopere na venda, para evitar que tudo seja sacrificado. Peço-lhe também que retire, como lembrança, vinte volumes a sua escolha. Pretendia pedir também cooperação do dedicado dr. Ramiz Galvão; mas vendo-o agora exercer um cargo de tanto trabalho não me animo a fazer-lhe tal pedido (Apud BESSONE, 1999, p.161).6 6 Tânia Bessone mostra os perigos de desmembramento dos acervos quando estes iam a leilões, após a morte de seus proprietários. Capistrano, no texto saído no Suplemento do catálogo, demonstra o alívio sentido quando a biblioteca de Paz foi adquirida, na íntegra, por Arnaldo Guinle, que ainda "doou o espólio [...] à Biblioteca Nacional e destinou uma verba para continuar e completar as coleções" (ABREU (b), 1976, p.139).

A citação a Capistrano e Ramiz Galvão, por Ramos Paz, em seu testamento, chama a atenção para um núcleo importante da "bibliofilia" do Rio de Janeiro na passagem do século XIX para o XX: a Biblioteca Nacional, em especial após Ramiz assumir sua direção, em 1870, onde permaneceu até 1882. Entre os resultados de seu trabalho na instituição está a produção de catálogos e bibliografias, de que os Anais da Biblioteca Nacional (também feito de sua administração) fornecem exemplos. Vimos que Capistrano, ao assinar a carta que enviou a Fernando Mendes de Almeida, não assina apenas Rio de Janeiro, no final; faz questão de colocar "Biblioteca Nacional", destacando o lugar de onde fala.7 7 Lugar no sentido dado por Michel de Certeau, como um dos componentes da "operação historiográfica" (CERTEAU, 1982, p.65-114).

O Catálogo da exposição de 1881 certamente merece destaque neste âmbito. Um "guia indispensavel aos estudiosos", nas palavras de Ramiz Galvão em sua apresentação, "O catalogo da presente Exposição não é pura e simplesmente um indicador de livros, paineis, estampas ou medalhas. Tanto quanto no-lo permittiram o espaço e o tempo, vae nelle um esbôço de bibliographia historica brazileira, considerada a historia em sua maior amplitude, e não exquecidos os documentos subsidiarios que a-podem esclarecer" (Catálogo, 1981, p.VI e VII). Um "esbôço", que, no dizer de José Honório Rodrigues, era "a maior bibliografia histórica publicada sobre um país no mundo. Nem as bibliografias do mundo europeu, nem as norte-americanas, se comparavam, na época, ao Catálogo da Exposição de História do Brasil publicado em 1881" (Catálogo, 1981, p.VII-XIX). Segundo José Honório, os funcionários da Biblioteca Nacional não tinham muitos modelos em que se apoiar em 1881, dentro do universo da língua portuguesa, para seu Catálogo:

Os únicos exemplos que Ramiz Galvão, diretor da Biblioteca Nacional, com seus colaboradores possuíam na tradição luso-brasileira eram a Biblioteca Luzitana, Critica e Chronologica na qual se comprehende a noticia dos autores portugueses e das obras que compuzeram desde o tempo da promulgação da Lei da Graça até o tempo presente [Lisboa, 1741-1759, 4 vols. reeditada várias vezes, obra de Diogo Barbosa Machado] que só veio a ser superada pelo Diccionario Bibliographico Portuguez de Innocencio Francisco da Silva [1858-1879, 9 vols., continuados por P. V. de Brito Aranha, 1883-1914, do 10º. ao 21º. volumes] (Catálogo, 1981, p.VII).

Estas obras, de Barbosa Machado e Inocêncio, são referências constantes nas cartas e notas bibliográficas de Capistrano, denotando a permanência de sua importância para as pesquisas e trabalhos que envolviam bibliografia. Outras bibliografias que ele cita com frequência (e naturalidade, isto é, sem explicá-las ao leitor ou interlocutor quando as menciona, como vimos acima com Rivara) são a Epitome de la Biblioteca Oriental y Occidental, de Antonio León Pinelo, 1ª. ed. 1629, 2ª. ed. 1737 (de onde Capistrano extrai pista para sugerir que Ambrósio Fernandes Brandão foi o autor dos Diálogos das Grandezas do Brasil; ABREU (a), 1975, p.207), a Biblioteca Historica Portuguesa, de Jorge Cesar Figanière (Lisboa, 1850), e a Bibliothèque de la Compagnie de Jesus, de Carlos Sommervogel (Bruxelas, 1890-1909), o Catálogo da Biblioteca do Porto, entre outras. Usa ainda a Bibliotheca Americana Vetustissima, a description of works relating to America published between 1492 and 1551, de Henry Harrisse (Nova Iorque, 1866), segundo José Honório Rodrigues "a primeira tentativa de bibliografia histórica americana geral de livros raros e esgotados" (Catálogo, 1981, p.VII), que aparece, por exemplo, na tese de 1883 sobre o Descobrimento.

Na introdução a essa obra, Harrisse8 8 Henry Harrisse (1823-1910) nasceu em Paris, mas mudou-se ainda menino para os Estados Unidos. Sua intenção, como chega a expor na introdução à Bibliotheca Americana Vetustissima, era escrever uma história da ascensão e queda do Império Espanhol na América; como condição preliminar, dispôs-se a elaborar uma bibliografia sobre a América, que é esta obra. Harrisse, que em função da pouca repercussão da obra nos EUA mudou-se de volta para a França, publicou diversos escritos sobre a época da descoberta da América, que parecem ter sido altamente estimados no fim do século XIX, começo do XX. Capistrano de Abreu cita alguns nos prolegômenos à História do Brasil, de frei Vicente do Salvador, edição de 1918. expõe ideias que podem ajudar a entender a visão a respeito da bibliografia na época. Primeiramente, o autor apresenta uma concepção progressiva, coletiva e cumulativa de ciência, dentro da qual cada área deve ser continuamente subdividida - a ciência faz-se, em sua visão, necessariamente através de uma comunhão de pesquisadores e seus esforços particulares. A bibliografia, "one secondary section" "in that vast field of historical studies" (HARRISSE, 1866, p.II), contribui para o trabalho analítico e sintético dos historiadores. Os bibliógrafos estão entre aqueles

who devote themselves to devise and perfect instruments to alleviate the efforts of synthetic philosophers and historians; to the modest callings which aim at placing within the reach of others, whosoever they may be, appliances which rarely fail to impart method logic and precision (HARRISSE, 1866, p.IV-V).

Fiel à noção de ciência como formada por várias áreas, cada uma com suas atribuições, Harrisse assinala que "The task of extracting from the materials thus supplied [pelo bibliógrafo] the synthesis required, devolves exclusively upon the historian. Bibliography thus understood [...] assumes an encyclopoedical character, which we deem necessary to bring the science in closer connection with historical studies" (HARRISSE, 1866, p.IX, grifo nosso). Consciente de que a tarefa de auxiliar o historiador a trabalhar suas fontes, deixando para este último a síntese, não deveria atrair muitos interessados para a bibliografia, Harrisse salienta o caráter "both adequate and honorable" (HARRISSE, 1866, p.IX) dessa ocupação - contribuinte importante, em sua visão, para o progresso da ciência.

Sem tornar-se exclusivamente um bibliógrafo, como o caracterizara Fernando Mendes de Almeida, Capistrano de Abreu afirmou-se como historiador. Capistrano e Harrisse, no entanto, parecem compartilhar de noções correntes à época, entre elas o caráter coletivo e cumulativo da ciência.9 9 As edições e traduções de textos de Capistrano contavam, regularmente, com colaboradores melhor versados que ele em áreas específicas, como o estudo de determinadas línguas indígenas. O caráter de suas notas parece atestar uma concepção progressiva e cumulativa do conhecimento histórico, envolvendo revisão, retificação e correção destes conhecimentos. Remetemos à nossa dissertação de mestrado, SANTOS, 2009, para uma análise destas edições. A bibliografia aparece como parte fundamental nos trabalhos de edição de textos, não só pela análise e descrição da obra editada e seu autor, como também fornecendo seu histórico de edições, a localização dos manuscritos e/ou exemplares existentes, além da indicação de textos contemporâneos e monografias que auxiliem ou complementem a obra editada. A bibliografia deveria fazer parte do domínio do historiador, sem a qual não poderia guiar-se pelas fontes. Como Harrisse coloca, enfatizando veementemente a importância do documento escrito, a bibliografia é para o historiador como a carta geográfica para o marinheiro (HARRISSE, 1866, p.XLIV): um guia para orientar-se pelo imenso mar de textos escritos existentes - o historiador deve dispor de uma, ou prepará-la ele mesmo, antes de dedicar-se ao estudo do objeto de sua escolha. Deveria manter sempre uma boa bibliografia "debaixo dos cotovelos" enquanto estuda, na expressão que usa Harrisse algumas vezes na introdução, para saber quais as fontes e estudos existentes sobre seu tema. Pela correspondência, vemos que é o que ocorre não só com Capistrano, mas de forma geral entre seus correspondentes os quais também se dedicavam a estudos históricos, dado que suas referências a bibliografias são, via de regra, naturais; menciona-as abreviadamente, consciente de que o interlocutor sabe a que obra se refere. Demonstrava a necessidade de elaborar bibliografias às vezes apenas para as próprias pesquisas, como uma lista de "DOCUMENTOS do século XVI relativos ao Brasil e existentes na Biblioteca Nacional, na do Instituto Histórico ou na S[ua]. M[ajestade]. I[mperial].", completada por uma lista das cartas de José de Anchieta existentes na Biblioteca Nacional, que envia para Lino de Assunção; essa lista é dos documentos copiados da Torre do Tombo, onde realizava pesquisas o engenheiro português. Capistrano queria que Lino verificasse se havia alguma coisa que os brasileiros não conheciam (ABREU (f), 1977, p.306-310, carta de 12/03/1885).

Destarte, o conhecimento desses catálogos e bibliografias (e a capacidade de elaborá-los também, para fins públicos ou para o estudo pessoal) coloca em contato o historiador e editor de textos, ocupado com pesquisas e com o dever do editor de dar precisas indicações bibliográficas, com o universo das bibliotecas e dos amantes e colecionadores de livros da época - ou de outrora, que tivessem deixado catálogos ainda importantes para referências bibliográficas. Cremos que a catalogação das obras referentes a um país, ou período histórico, ou região, inscreve-se na mesma perspectiva dos esforços de pesquisa em arquivos e divulgação de fontes para a escrita de histórias nacionais, que examinamos na primeira parte da dissertação. A elas, somam-se, por seu lado, a catalogação dos acervos particulares, sujeitas a outros imperativos (como questões de herança, tal o caso de Francisco Ramos Paz), que passam a servir de fonte inescapável aos estudiosos e colecionadores.

3.3 O uso dos instrumentos de pesquisa

Mas o conhecimento dessa literatura combina-se a seu uso crítico. No caso de Fernão Cardim, Capistrano não aceita a autoria proposta por Purchas, e o faz com base em outro domínio: o conhecimento da história. É por meio do saber sobre o contexto histórico delimitado pela data de escrita da obra que Capistrano decide pela implausibilidade da autoria sugerida por Purchas: um irmão da Companhia de Jesus não teria condições de escrever tais textos. O conhecimento do contexto histórico permite a elaboração de uma lógica que determina probabilidades (do tipo "dentro daquele contexto, é mais provável que isto tenha se passado, do que aquilo"). A sua hipótese de autoria será desenvolvida na introdução a Do Princípio (1881), e possivelmente também na que escreve para a Revista Mensal da Seção da Sociedade de Geografia de Lisboa, quando da publicação definitiva, no tomo III do periódico, de janeiro-fevereiro de 1885, páginas 1-36, de Do Clima do Brasil e de Algumas Cousas Notáveis que se acham assim na Terra como no Mar, que teve prefácio e notas de Capistrano de Abreu. Não conhecemos tal edição.

O redator chefe da Revista, Fernando Mendes de Almeida, após transcrever a carta de Capistrano, faz as seguintes considerações, aduzindo outras características que habilitariam Capistrano para a produção de um "preciso estudo bibliográfico": "A confrontação dos escritos antigos, o conhecimento do estilo dos escritores e sobretudo a ciência da história geográfica do Brasil [grifos nossos] podem concorrer, poderosamente, para o preciso estudo bibliográfico que nos promete o inteligente colaborador" (Apud CARMO, 1942, p.81). Portanto, além do que já elencamos, isto é, um domínio das fontes e dos conhecimentos históricos do período de escrita dos textos, esses três outros pontos complementam um estudo bibliográfico; e Capistrano os demonstra todos na introdução a Do Princípio, de 1881, como deve ter feito também na Revista, em 1885.

Quando edita as Informações e fragmentos históricos do padre José de Anchieta (duas Informações e um conjunto chamado pelo editor de Fragmentos históricos, de excertos de textos de Anchieta), em 1886, Capistrano parte também de textos sem autor determinado (sendo que Varnhagen e Cândido Mendes de Almeida já haviam defendido Anchieta como autor da primeira Informação, a única que conheceram). Para atribuí-los a José de Anchieta, vale-se de seus conhecimentos históricos e da biografia do padre. A segunda informação, segundo ele, "é evidentemente escripta pelo Provincial" da Companhia de Jesus no Brasil, que na época da escrita do texto era o padre José de Anchieta; uma prova "extrínseca", na terminologia que usou em Cardim (e usa em outros momentos). Havia informado antes que os textos são em "lettra contemporanea do seculo XVI"; esta uma prova "intrínseca". A primeira Informação refere-se com minúcia, diz Capistrano, a eventos e lugares que Anchieta presenciou ou conheceu bem. Em relação a esta, Capistrano consegue ainda estabelecer a época de sua feitura (entre 21 e 31 de dezembro de 1584), no Rio de Janeiro, tempo em que lá estava Anchieta, reforçando ainda mais sua hipótese de autoria (Informações, 1886, p.VII-IX e XIV-XV). Capistrano ainda reproduz, na Introdução às Informações, os argumentos de Cândido Mendes de Almeida, na Revista do IHGB, para atribuir a autoria da primeira Informação a Anchieta, subscrevendo-os (apesar de fazer dois reparos).

Esses seriam, em suma, os procedimentos básicos de Capistrano face o problema da autoria, na ausência de uma "prova material": circunscrever a época em que o texto foi escrito, e os conhecimentos que aparecem ali, delimitando possíveis (ou "prováveis") autores. O confronto de textos, comparando estilos e conteúdo, seria um auxiliar, quando houvesse os textos para comparação. O domínio dos conhecimentos bibliográficos poderia lhe fornecer pistas, informações sobre a obra ou mais elementos com que acercar o autor. Em essência, é por esses métodos que chega também à hipótese de autoria dos Diálogos das Grandezas do Brasil (Ambrósio Fernandes Brandão - sem comprovação definitiva, mas até hoje a melhor hipótese). Visaria cumprir, assim, uma das tarefas do editor: fornecer a biografia do autor. O que, em alguns casos, levou-o a um exaustivo trabalho preliminar.

3.4 A biografia do autor

A biografia de José de Anchieta, na edição de 1886, talvez exemplifique o procedimento de Capistrano, em particular aquilo em que se fixa ao traçar a vida de um autor: pai, mãe, data e local de nascimento, ocupações que teve e funções que exerceu, lugares por onde passou (sempre tentando estabelecer as datas desses fatos com precisão), posição social, eventos que presenciou, data e local de morte, e, por fim, as obras que teria deixado (Informações, 1886, p.XIII-XIV). Podemos observar, na mesma, a menção aos eventos que teria presenciado o autor do texto editado e as funções que ocupara - aspectos que auxiliam, a partir da análise do conteúdo do texto, na sua identificação como autor. Também aparece a delimitação de seus anos de vida, igualmente importante sob o ponto de vista do estabelecimento da autoria. Finalmente, arrola as obras que escreveu e indica onde poderiam ser encontradas (ou não, se estivessem perdidas).

Em artigo de 1925 sobre Fernão Cardim, aproveitado na edição do mesmo ano das obras do jesuíta, Capistrano retoma esses eixos de apreciação da biografia de um autor. Tratando dos eventos que poderia ter relatado Cardim, revela alguma decepção, pois, por essa lógica, o autor deixou de mencionar alguns fatos: "Em fins de junho de [15]85 o Visitador [da Cia. de Jesus, Cristóvão de Gouvêa, a quem Fernão Cardim acompanhava em visita ao Brasil] partiu para Pernambuco. Cardim bem poderia referir alguns sucessos então passados sob seus olhos: (...)" (ABREU (b), 1976, p.220-221, grifo nosso). A relação vida do autor - obra gera a expectativa em Capistrano de encontrar o relato, em Cardim, de eventos que este presenciou. O autor é testemunha. Nesse sentido, o visitador Cristóvão de Gouvêa e Fernão Cardim "Assistiram em Piratininga, a 25 de janeiro de 1585, ao trigésimo aniversário da fundação da humilde casa, germe da vila de S. Paulo. Esteve presente Anchieta, talvez o último sobrevivente do ato que determinou a história paulista e tanto influiu sobre a do Brasil" (ABREU (b), 1976, p.221). Delimitando uma unidade temporal e espacial (sabe que Cardim esteve no Brasil, entre este e aquele ano, e passou por determinados lugares e tais épocas), Capistrano tem ideia do que pode procurar em seus escritos.

O que orienta fundamentalmente a preocupação com o autor neste trabalho, a nosso ver, é a noção de que o texto pode fornecer informações importantes para as diferentes áreas de estudo do interesse dos leitores aos quais se dirige o editor. As considerações de Capistrano sobre os autores, em suas edições, não se limitam a isto; são notáveis, principalmente no caso de frei Vicente do Salvador, os comentários com o sentido de posicionar os autores em uma história da literatura brasileira, ou mesmo da historiografia brasileira.10 10 Na primeira de suas edições da História do Brasil, que saiu nas páginas do Diário Oficial (entre julho de 1886 e fevereiro de 1887), Capistrano e Alfredo do Vale Cabral assinam breve introdução em que realçam o valor do texto "às letras e à história do Brasil, permitindo que enfim seja ouvido o primeiro brasileiro que se ocupou de escrever os anais de sua pátria" (Apud CARMO, 1942, pp.89-90). No "Aviso Preliminar" da edição da Materiais e Achegas para a História e Geografia do Brasil (1887), Capistrano afirma tratar-se o dia em que frei Vicente concluiu sua obra (20 de dezembro) "um dos maiores de nossa litteratura colonial" (SALVADOR, 1887, p.I). Na edição da Biblioteca Nacional, que sai em separata (1888-89), Capistrano aponta esta data como "tão importante em nossa historiographia" (SALVADOR, 1889, p.IV) - caso raro de uso seu deste termo. Na "Nota Preliminar" da edição de 1918, a História de frei Vicente aparece como "modelo" (SALVADOR, 1975, p.39). Tais colocações deveriam ressoar nos debates sobre a história da literatura brasileira de fins do século XIX, pois Capistrano chega a reivindicar para frei Vicente o reconhecimento como "o mais antigo de nossos prosadores" (SALVADOR, 1887, p.I), conferindo, por conseguinte, à Bahia a honra de ser o berço de nossa prosa. Uma crítica da visão que Capistrano constrói da História do Brasil encontra-se em ANDRADE, 2004. Para o trabalho crítico, porém, que nos interessa, parece-nos que o entendimento do texto como fonte para estudos é primordial. Leitores interessados no estudo da história, da geografia, da etnografia, da linguística, entre outros saberes, seriam o foco de introduções e prefácios que lhes mostrassem que o autor editado é um depositário fiel de informações necessárias a esses estudos - numa palavra, é uma fonte de valor. A estada do autor em determinado lugar, em determinada época, suas viagens, o conhecimento que pode ter adquirido de livros e fontes, sua posição social e talentos pessoais habilitam o texto que produziu a ser lido como fonte.11 11 Sobre a transformação de um texto em fonte por Capistrano, cf. OLIVEIRA, 2006, capítulo 3. A autora discute, com muita profundidade, como Capistrano, ao editar documentos, já os interpretava e lia enquanto fonte, produzindo história ao fazê-lo. Maria da Glória de Oliveira analisa, em particular, as edições da História do Brasil de frei Vicente do Salvador.

Destarte, o procedimento da biografia do autor possui também a função de habilitar o texto enquanto depositário de informações úteis a seus leitores, sobre os variados campos de estudo a que se dedicassem, e da obra enquanto digna de leitura; uma obra que se eleve no gênero, o que se explica em parte pelas características pessoais e de vida de seu autor. A contextualização histórica existente fornece ao leitor conhecimentos que não dispõe sobre o autor e a época da obra, mas também lhe permite aferir que o autor tinha tais e tais condições de reunir as informações que reuniu.12 12 Certamente, a concepção de autor aqui utilizada por Capistrano pode ser lida como aquela da qual Foucault comunica a morte em 1969; FOUCAULT, 1992. As considerações de Foucault sobre a unidade que se constitui na figura do autor, ligada à sua biografia, são particularmente interessantes para o nosso caso. Hans Ulrich Gumbrecht oferece um contraponto, defendendo o uso deste "autor histórico" pelos editores, inclusive por aumentar sua comunicabilidade com os leitores, habituados a este autor (MOST, 1998, p.242). No caso de Capistrano, acreditamos ser necessário destacar a presença de uma forte concepção oitocentista, que liga o homem, a arte e seus produtos à sociedade e à época da qual fazem parte; Raymond Williams a aponta. Estudando John Ruskin (1819-1900), Williams observa sua transição de crítico de arte para crítico social, atentando para o "contexto de uma transição geral do pensamento acêrca da arte para a reflexão a propósito da sociedade - transição que é marcada, na complexidade de suas referências, pelas alterações de sentido da palavra cultura"; que passa a significar "sociedade orgânica", "sistema geral de vida" (WILLIAMS, 1969, p.153). Nesta "transição geral", seria marco A cultura do renascimento na Itália (1860), de Jacob Burckhardt, que analisa a arte renascentista após uma profunda investigação da sociedade italiana e daquela época. Outros autores importantes na formação de Capistrano, como Taine, também defendiam esta forte ligação entre homem, arte, sociedade e momento histórico. Escrevendo o artigo que serviria de introdução aos Diálogos das Grandezas do Brasil, Capistrano relata, em carta de 17/08/1901, a Mário de Alencar: "Hoje meu principal objeto será aplicar o método de Taine, descobrir a sensação original do autor" (grifo de Capistrano); ABREU (d), 1977, p.204. Sobre a autoria em Capistrano, cf. também OLIVEIRA, 2006, pp.109-114.

A preocupação com o autor, parcialmente sob o ângulo da validação de sua obra enquanto banco de dados para determinados estudos, também aparece, no final do século XIX, como atribuição do trabalho bibliográfico, se tomarmos como representativa, novamente, a descrição de Henry Harrisse do tratamento dispensado ao autor pela bibliografia. Esta descrição é em muito condizente com o trabalho que Capistrano realiza com os autores:

Whatever may be the natural impartiality of an author's mind, his works must always bear the impress of the circumstances which surround him, and of his times. It is necessary, therefore, to study his personal history as well as that of his epoch, and of the social center in which he lived, that we may form a correct estimate of the credence to which he is entitled. In fact, we know of no better means to ascertain to what extent his views may have been modified by such external influences; and no historian will fail to appreciate the facilities offered him by the bibliographer who groups around each title references to all the works in which information in regard to these illustrative subjects may be found. (...) Nor should the bibliographer limit this class of researches to the life of the author of each work which comes under his notice. He must also contribute towards elucidating the history of the principal characters who figure in the books, by adding such authorities as may have escaped the notice of the writer himself, or as may have come to light subsequently to the publication of his work (HARRISSE, 1866, p.I, grifos nossos).

Portanto, na seara dos trabalhos de bibliografia do final do século XIX (pelo menos), temos a enunciação e prática desta visão em relação ao autor: da necessidade do estudo das circunstâncias que cercaram a realização de sua obra, das influências externas que poderiam interferir no crédito a ser conferido ao escrito. O estudo dos "principal characters who figure in the books" fará parte dos prolegômenos de Capistrano, na edição de 1918 de frei Vicente.13 13 Não estudaremos em particular esta notável edição porque mereceria uma atenção que tornaria este artigo consideravelmente maior. Optamos aqui por enfeixar aspectos gerais do trabalho de editor de Capistrano, mobilizando várias de suas edições. Para uma análise da edição de 1918 da História da Brasil, ver nossa dissertação de mestrado, SANTOS, 2009, p.156-174. O historiador apreciará, diz Harrisse, o trabalho do bibliógrafo que lhe disponibiliza as referências necessárias ao estudo daquelas circunstâncias, daquilo que efetivamente cerca um autor quando se põe a escrever. "Whatever may be the natural impartiality of an author's mind, his works must always bear the impress of the circumstances which surround him, and of his times"; e cabe àquele que apresenta o texto colocar em evidência essas circunstâncias e esse tempo - daí a necessidade de uma apreciação da época em que os textos foram escritos, e da posição do autor naquela sociedade. Desse modo, pode o leitor avaliar melhor as informações e juízos contidos na obra. Harrisse refere-se ao historiador (vimos que sua bibliografia, a Bibliotheca Americana Vetustissima, foi elaborada visando a escrita de uma história da ascensão e queda do Império espanhol na América); Capistrano escreve pensando também em geógrafos e etnógrafos, notadamente; mas tendo similarmente em vista o aproveitamento mais adequado do texto que edita para os estudos.

A respeito da biografia dos autores, há ainda dois casos notáveis: no prefácio às Denunciações da Bahia (1925), da Série Eduardo Prado, Capistrano faz uma biografia do visitador do Santo Ofício, Heitor Furtado de Mendonça. As Confissões e as Denunciações não têm, evidentemente, autor, no sentido de que frei Vicente é o autor da História do Brasil, por exemplo. Ainda assim, Capistrano julgou de relevo biografar o visitador que colheu os depoimentos, como fizera com os outros "autores"; o faz no segundo volume editado, talvez como complemento à introdução que fez ao primeiro, que contém uma breve história da Inquisição em Portugal e no Brasil. O segundo caso o qual merece menção especial é uma curta biografia de Varnhagen que Capistrano inclui no seu prefácio ao Diário de Pero Lopes de Sousa (1927, edição também da Série Eduardo Prado). Varnhagen fora o descobridor e primeiro editor da obra; suas pesquisas quanto ao Diário não haviam sido superadas, dado que a edição da qual participa Capistrano valia-se de seu texto. A obra tinha, ainda, significado especial na vida do Visconde de Porto Seguro, segundo Capistrano: "O Diário de Pero Lopes desviou o jovem erudito da geografia para a história do Brasil" (ABREU (b), 1976, p.239). Neste caso, cremos que a biografia aparece como tributo ao importante pesquisador, e mostra aquela que seria uma das motivações das edições dessas obras: o fato de que o editor acaba tendo seu nome permanentemente associado ao do tesouro literário que divulga. Varnhagen tornara-se, nesse sentido, uma espécie de "co-autor" do Diário; como ocorreria com Capistrano em relação, principalmente, à História do Brasil de frei Vicente do Salvador, até hoje associada ao historiador cearense.14 14 Glenn W. Most coloca esta como uma das motivações dos editores em seus trabalhos; MOST, 1998, pp.V-VI. Em carta de 08/03/1893, a Lino de Assunção, Capistrano escreve, a respeito da História do Brasil: "Tanto no prólogo de nossa edição, que ficou nos dois primeiros livros, porque na esperança de dar a obra completa não quis ir adiante [refere-se à edição em volume, pela Imprensa Nacional, de 1887], como no da edição [dos Anais] da Biblioteca Nacional [vol. XIII, 1889] citei agradecido teu nome [na verdade, cita também na edição pelo Diário Oficial]. Estás, pois, associado tão indissoluvelmente como eu ao venerando Fr. Vicente do Salvador. Zela esta honra e junta-lhe novos títulos [queria estimular Lino a manter a procura pelas partes faltantes da obra]" (ABREU (f), 1977, p.354-355, grifo nosso).

3.5 As introduções

A biografia do autor e a bibliografia (a que teria baseado o texto apresentado e a indicada para o leitor que quisesse prosseguir nos estudos, tanto monografias como fontes primárias) não esgotam as introduções aos textos. Como os textos editados eram apresentados ao leitor? O que seu editor destacava antes que o leitor passasse ao texto em si?

A parte da bibliografia também compreende, vale dizer, a história da obra que se edita, o levantamento de outras edições e exemplares existentes, e a história da própria edição que se faz, onde são prestados os devidos agradecimentos, e, caso necessário, expurgados os conflitos e aspectos menos edificantes da história.15 15 Caso da omissão, nas edições de frei Vicente, das brigas com Saldanha da Gama, diretor da Biblioteca Nacional, nos anos 1880, que não queria que os editores da Materiais e Achegas usassem o exemplar da B. N. da História do Brasil; e do fato do Marquês de Olinda, Pedro de Araújo Lima (político eminente do período monárquico, regente de 1837 até a Maioridade de D. Pedro II) ter "bifado" (isto é, roubado, surrupiado) o exemplar que mais tarde caiu em mãos do livreiro João Martins Ribeiro, e foi, por este, doado à Biblioteca Nacional, como Capistrano relatou em carta de 25/04/1885 a Lino de Assunção (ABREU (f), 1977, p.312). Aliás, se esta última anedota não veio a público nas edições, parece ter corrido à boca pequena na época, pois Manoel Bomfim se refere ao fato em O Brazil na Historia (1930). Segundo Bomfim, a origem daquele exemplar está em cópias que o governo brasileiro mandou fazer na Torre do Tombo: "As copias foram levadas ao Ministerio do Imperio (Interior), cujo titular, o Marquez de Olinda, sem mais cerimonias, mandou tudo para a casa, como cousa sua. Naquelles tempos, havia absoluta honestidade nos homens publicos, mas entendia-se que a honestidade se referia, apenas, a negocios de dinheiro: não se roubava em especie..." (BOMFIM, 1930, p.119, nota 1). A mais, as introduções contêm basicamente as indicações do editor a respeito do valor do texto para diversas áreas de estudo; panoramas histórico-sociológicos da época do documento16 16 O que Daniel M. Pereira chama, em alguns momentos de sua tese, de "descrição sociológica"; cf. PEREIRA, 2002, p.111. - por vezes casos de uso imediato do documento enquanto fonte, como na introdução aos Diálogos das Grandezas do Brasil; uma determinada avaliação, ainda, do lugar dos autores na história das letras "brasileiras", a que fizemos breve menção acima, além das justificativas das opções editoriais, como as relativas ao texto (grafia, pontuação, parágrafos etc.).

As diferenças de suporte devem ser notadas aqui. As edições em periódicos continham introduções mais curtas, apresentando o texto ao leitor, isto é, dizendo do que se trata, contando brevemente sua história até aquela edição, e dando os devidos créditos. Capistrano também explicava a procedência do texto usado para aquela edição. Igualmente parte destas breves apresentações é destacar o valor do texto publicado.17 17 Caso da apresentação da História do Brasil no Diário Oficial, de 23 de julho de 1886, onde Capistrano e Vale Cabral afirmam a importância "capital" da obra, "que d'ora em diante será como o manual do periodo que abraça" (reprodução fac-similar apud CARMO, 1942, entre as páginas 90 e 91); ou a apresentação da narração da bandeira de Francisco de Mello Palheta ao Madeira, publicada em 1884 na Gazeta Literária, que, "embora noticiada por muitos escritores, não era conhecida em suas particularidades. Daí a importância do seguinte documento que não consta haver sido publicado". "Este é material para um capítulo" da biografia de Palheta, o "introdutor do café no Brasil" - café que fazia a riqueza do país naquele momento (ABREU (g), 1988, p.119).

Nas edições em volume, as introduções ganham outra dimensão. Interessa-nos, em particular, o quanto revelam da leitura documental de Capistrano: o que buscava nas fontes, que conceitos aplicava e que interpretações formulava a partir delas. Capistrano parecia ter expectativas quanto às fontes,18 18 "Expectativas" talvez em sentido próximo ao hermenêutico (GADAMER, 1997), do qual Thompson aproxima-se bastante (THOMPSON, 1981), ou seja, como pré-concepções inescapáveis ao historiador, mas postas à prova pelo contato com a evidência histórica, que prevalece sobre aquela ideia inicial, retificando-a. No caso, o conjunto de informações dos textos era o objeto da expectativa: a presença ou não destas informações, de forma mais fácil ou mais difícil de extrair, corrigia a expectativa inicial. que transpareciam nas apresentações que fazia aos textos: que elas fossem minimamente imparciais (ou seja, não corrompessem fatos por caprichos), que informassem o máximo possível e, entre outras qualidades, que fossem úteis à aplicação de conceitos e a áreas importantes de pesquisa. As considerações de Capistrano sobre os documentos ele próprio as definiu como "juízos". Referindo-se a Das cousas mais notáveis do Brasil, de 1591, escreveu que, pelo documento ter saído em "pedacinhos" era "difícil formar juízo" sobre ele (SALVADOR, 1975, p.213). E esse juízo dependia, em suma, da quantidade e precisão das informações contidas nos documentos, e era de certa forma orientado pelas expectativas do historiador. Essa fica patente na relativa decepção com o Diário de Pero Lopes de Sousa, irmão de Martim Afonso: "Para a história o Diário fornece menos do que fora de se esperar. Dos diversos encontros navais apenas indica a duração e o desenlace" (ABREU (b), 1976, p.242); esse juízo deve ser relativizado com base nas mutilações do documento que o próprio Capistrano relata (história do manuscrito faz parte de seu trabalho crítico). Comparando, porém, com relatos de batalhas dos prolegômenos ao livro V da edição de 1918 da História do Brasil, de frei Vicente do Salvador, em que números de participantes são especulados, bem como rotas e a natureza dos conflitos, o Diário deixaria realmente a desejar, se nada mais fornecer. Outra expectativa desfeita por Pero Lopes de Sousa é quanto à etnografia: "Como observador etnográfico Pero Lopes revela capacidade somenos" (ABREU (b), 1976, p.246), porque teria dedicado pouco espaço aos índios, embora Eugênio de Castro, o anotador desta edição, elogie o texto de Pero Lopes por suas informações etnográficas (CASTRO, 1927, p.465). Elogios ao texto deste documento são demonstrados quanto às informações sobre o Prata e sobre os "aborígenes", dos quais encontramos "notícias apreciáveis", como o uso de "guarani" para designar um idioma (ABREU (b), 1976, p.245 e 246), mesmo que o autor não fosse bom etnógrafo.

Nos prefácios das edições destes documentos, Capistrano de Abreu de certa forma indicava como a obra poderia ser usada enquanto fonte, mostrando o que ali tinha de geografia ou etnografia. Pero de Magalhães Gandavo, por exemplo, tinha "instinto geográfico" (ABREU (b), 1976, p.201), na História que escreveu (Capistrano analisa a História e o Tratado de Gandavo). Fernão Cardim, por sua vez, tinha "temperamento vibrátil" (ABREU (b), 1976, p.225), retratava a natureza em sua vivacidade. Registrou ainda informações sobre alimentação nos engenhos baianos, retratados como auto-suficientes e fartos em comidas e bebidas (o que Capistrano compara com a "questão de açougue" de São Paulo, presente nas Atas da Câmara, outra série de documentos que estava começando a vir à tona; ABREU (b), 1976, p.228).

É característico também de Capistrano apontar situações históricas em que conceitos teóricos se encaixam. Por exemplo: "há nele [em Gandavo] um bom observador das coisas sociais, e quem estiver a par dos estudos feitos sobre as primitivas fases econômicas, a economia caseira de Büecher, o meneio singular de Sembart [Sombart], em uma palavra a economia natural, encontrará elementos muito indistintivos" (ABREU (b), 1976, p.203). Nesse caso, há para Capistrano uma clara demonstração de teses da economia política alemã, o que exige, no entanto, do leitor, uma familiaridade com essas teorias; demanda estar a par desses estudos, como destacado na citação. Assim, existe uma indicação também teórica de Capistrano, reivindicando o domínio de um certo conhecimento pelos "especialistas". Ainda em Gandavo, o historiador faz uma espécie de aplicação da relação entre geografia e psicologia para o povo brasileiro, observando a relação inicial homem - meio, que ele supõe ter sido difícil. "Como se deu a conciliação entre o homem e a terra, e se transformou em entusiasmo [que era o estado de espírito descrito por Gandavo]? Quem primeiro se sentiu bem no novo meio?". Em seguida, Capistrano transcreve um trecho do Tratado de Gandavo em que, segundo este, a terra apeteceu mais aos velhos, inicialmente, que aos jovens: "Assim os temores da velhice precederam aos ardores da mocidade" (ABREU (b), 1976, p.204). Capistrano termina sua introdução com um esboço de análise psicológica do povo brasileiro, baseado em sua relação com o meio.19 19 Análise que parte de tese da formação da nacionalidade brasileira desenvolvida por Capistrano. Tal esquema aparece proposto desde os primeiros textos publicados por Capistrano (como "A Literatura Brasileira Contemporânea", de 1875, em ABREU, (a), 1975, pp.35-70). PEREIRA, 2002, trabalha esta questão.

No caso da edição dos papéis da Inquisição, uma maior contextualização histórica foi lançada. O prefácio às Confissões da Bahia, dividido em duas seções, compõe-se, na realidade, de cinco partes: 1) uma breve história da implantação da Inquisição em Portugal e no Brasil, com os casos ocorridos no Brasil antes da primeira visitação; 2) A inquisição no Brasil, da primeira visitação (a que se publica) até o século XIX; 3) a 1ª Visitação em si; 4) o uso do documento, quase como pretexto, para destacar determinados aspectos históricos e, principalmente, geográficos (relativo aos sertões); 5) a edição em si. Desse modo, acreditamos, Capistrano estaria fornecendo os elementos para "conhecimento e inteligência" do texto, como colocou Cândido Mendes, isto é, sua compreensão, inclusive transcrevendo documento que ajudaria a entender os procedimentos da Inquisição; descrevendo o documento que segue publicado; utilizando-o para afirmar aspectos de suas reflexões e investigações históricas particulares; e realizando seu trabalho de editor, de uma forma geral, não só com as partes anteriores, mas também com as explicações e justificativas (bem como reconhecimento de créditos devidos) necessárias à edição que se apresenta.

Na quarta parte da divisão acima, Capistrano usa o documento para extrair dados da "sociabilidade baiana" (ABREU (b), 1976, p.181). O principal, porém, é a história que faz das entradas para o sertão, dividindo-as pelos seus núcleos de partida: Pernambuco e Bahia. Neste momento, lê o documento com as expectativas relacionadas ao problema que coloca. As Confissões traziam informações sobre a origem familiar dos confessos, alguns deles homens dessas expedições para o sertão. Para Capistrano, porém, "De bom grado trocaríamos os pormenores meramente biográficos dos sertanistas adiante apontados [nas Confissões] por um pouco mais de precisão quanto à geografia" (ABREU (b), 1976, p.182). A própria leitura é orientada para o discernimento de informações relativas às entradas para o sertão: "Portanto, Frios grandes, Palmeiras compridas, Sertão dos ninhos das garças e outras localidades vagamente nomeadas nas confissões seguintes, devem procurar-se aquém do Real, entre este e o Paraguaçu" (ABREU (b), 1976, p.183).

Em termos de observar o trabalho de Capistrano de Abreu diante de documentos, o prefácio à Primeira Visitação do Santo Ofício às Partes do Brasil - Denunciações da Bahia (1591-1593) é sem dúvida dos mais surpreendentes. A partir dos relatos feitos pelo visitador da Inquisição Heitor Furtado de Mendonça (e, certamente, dos demais documentos e obras que conhecia do período), Capistrano extrai uma série de apontamentos sobre a sociedade baiana do final do século XVI, destacando temas que o documento pode ajudar a esclarecer. Além das considerações sobre a cidade de Salvador e o recôncavo, que reproduzimos acima, Capistrano faz uma breve descrição da administração e da própria cidade. Nela, destaca vários assuntos, como a vida das mulheres:

Entre as mulheres contavam-se bordadeiras, costureiras, adelas [aquela que compra e vende trastes usados], padeiras etc. Havia mulheres do mundo; havia as feiticeiras, feiticeiras operativas, segundo a classificação de Margaret Murray, bem diversas das bruxas rituais da Europa, com seus esbats e sabbats.

Para as bruxas, Capistrano possivelmente utilizou o livro da referida Margaret A. Murray de 1921, Witch Cult in Western Europe, publicado em Oxford, novamente aplicando uma classificação genérica ao caso que encontrava nas fontes da história brasileira. O tema é pertinente; segundo ele, "A atmosfera da cidade pedia bruxas de verdade" (ABREU (b), 1976, p.211). Além das mulheres e da administração, o documento revelado possibilita estudar a Igreja, ofícios de trabalhadores (a economia urbana de Büecher, como visto acima), comércio, vida familiar, casas, características da cidade (como as ruas, a distribuição das casas, a falta de iluminação, de água encanada, de esgotos), festas públicas, ostentações de luxo, banquete das festas, e, entre outros aspectos, o jogo (um "derivativo benéfico" em uma sociedade de forte censura religiosa e política, onde "quanto menos se pensava e discorria, melhor para todos"). "Entre as palestras que não comprometiam avultavam as práticas pornográficas, vindas da metrópole", que, de acordo com Capistrano, sobreviveram em versos "colhidos por curiosos que nunca afrontaram os prelos". Capistrano ordena tudo isto com vistas a uma visão geral da sociedade da época, que pode ser resumida nesta citação:

Solenidades eclesiásticas, festas profanas, jogos, conversações livres emprestavam um verniz de sociabilidade rudimentar a um agregado em que dominavam os elementos centrífugos. Havia os indígenas de três continentes, em contato forçado mas irredutíveis; havia a mistura e as combinações múltiplas de três fatores, aferidos nas mínimas cambiantes por uma docimasia [o inquérito do Inquisidor, nesta expressão originada do inquérito sobre as aptidões morais dos candidatos a uma função pública na Grécia antiga] inflexível (ABREU (b), 1976, p.213).

Ou seja, a investigação do visitador do Santo Ofício permitiria ao estudioso chegar a uma noção de como era a sociedade baiana do fim do século XVI, noção que Capistrano já adianta, apontando que as práticas sociais davam um sentido de convívio (mesmo que aparente) a povos muito distintos unidos naquela situação, em sociedade de forte censura e repressão. Vale destacar que o historiador chama de "indígenas" também a africanos e portugueses, nativos de seus continentes.

Nesse caso, o historiador apontou vários temas que podem ser extraídos do documento, ou que este pode ajudar a enriquecer, para daí partir para uma visão geral da sociedade em questão. Em carta a João Lúcio de Azevedo, de 15 de abril de 1917, Capistrano conta esperar dos "depoimentos [as confissões e denunciações colhidas pelo Santo Ofício] (...) sobretudo sidelights para a situação do Brasil donatarial. Encontrei alguma cousa; espero mais quando proceder ao que meu amigo Derby chamava geologia da lama" (ABREU (e), 1977, p.46). Sidelights seriam informações subsidiárias, obtidas por acaso. Ou seja, as mulheres, as casas, a cidade, os trabalhadores de diversos ofícios, e, principalmente, as festas e divertimentos (tratados como espaços de sociabilidade) eram aspectos que, pela expectativa de Capistrano, apareceriam quase que de forma colateral naquelas fontes. Serviram-lhe para formular uma interpretação da sociedade de então. Nesses casos, a recuperação e leitura de documentos aparecem ainda mais claramente como o trabalho indispensável para a elaboração de uma interpretação da história do Brasil, isto é, "para aqueles que aspiram melhor conhecer o Brasil".

As introduções serviam, portanto, para indicar a importância do texto que se editava dentro dos estudos sobre o país (e, por conseguinte, para uma classe específica de leitores - aqueles que realizavam esses estudos), e também seguiam o propósito de fornecer subsídios para o entendimento do texto, descrevendo a sociedade à época em que foi escrito o texto, fenômenos históricos relevantes para sua compreensão (como a Inquisição, nas Confissões e Denunciações), e acrescentando a biografia do autor - contendo, ainda, justificativas e explicações editoriais.

3.6 A divulgação de fontes e a escrita da história

A divulgação de documentos na obra de Capistrano de Abreu afigura-se uma historiografia, uma escrita da história. Ao incluir documentos no corpo de textos seus, como a tese sobre o Descobrimento, de 1883, ou de artigos em periódicos, expõe um tipo de escrita particular, fortemente identificado ao século XIX (negativamente, no caso de alguns autores, como Melo Morais, de leitura difícil para nós hoje, pelo excesso de transcrições e quase ausência de análise do processo histórico, ou mesmo narrativa). Produz determinada relação entre seu texto e os documentos; mormente esses permitiam ao leitor ler o que Capistrano leu neles, entendendo o que havia escrito - relação, por exemplo, do artigo "Os primeiros descobridores de minas", saído originalmente na Revista do Arquivo Público Mineiro, Ano VI (fascículos II e IV), de 1901, e reproduzido em Caminhos antigos e povoamento do Brasil (ABREU (g), 1988, pp.91-117). Mas também estavam ali para serem divulgados, em alguns casos mais claramente, como na tese de 1883 - onde aparecem como apêndices ao texto. Inserem-se num tipo de publicação que permitiria ao documento ser citado, posteriormente, através do texto de Capistrano de Abreu em que saiu, como ele mesmo fazia, por exemplo, com documentos presentes na História Geral de Varnhagen.

Também as anotações constituem um tipo específico de escrita. O regime das introduções e notas configura-se um código para especialistas, versados em áreas como a bibliografia. Praticando-a, Capistrano inseriu-se em um mundo de autores e obras que concorreram, no século XIX e no começo do XX, para maior acesso às fontes primárias, que enxergavam como o material a partir do qual fazer história. Concorreu para o cenário que descreve Anthony Grafton:

In the late nineteenth and twentieth centuries, finally, the sources needed to produce footnotes became readily accessible to young men - and women - who did not come from families rich enough to provide them with private research libraries. The archives of the major European states opened reading rooms where scholars could work regularly, making all - or almost all - of their documents available to accredited readers. National libraries, similarly, made the published collections of primary sources available in their domed, public reading rooms to men and women of letters who would never have had the money or the social credentials to use them in the private libraries of previous centuries. Eminent professors used persuasion, blackmail, and offers of positions elsewhere to make their governments cough up the money for working collections where their students could read the printed sources, primary and secondary, in one place (GRAFTON, 1998, p. 226-227).

Se tendemos a enxergar as publicações de documentos, como as que participou Capistrano de Abreu, como voltadas para um público restrito, por sua baixa tiragem (ou limitada circulação, como no caso dos periódicos),20 20 Os documentos editados em volume por Capistrano, tanto na Materiais, como na Série Eduardo Prado, devem ter chegado no máximo a 500 exemplares por volume. Na correspondência, observamos a atenção que deu Capistrano a sua distribuição entre um público pessoal, de seus amigos e conhecidos, em geral estudiosos também - o que talvez ajude a entender o porquê de indicar como os textos poderiam ser aproveitados para estudos diversos, e das discussões de especialistas que traz para as edições. Observamos ali, por outro lado, como Capistrano usava essas edições para permutas com bibliotecas (por exemplo, carta a Paulo Prado, Oitava da Purificação, 1923, ABREU (e), 1977, p.440), para onde enviava alguns exemplares, deixando-os assim, disponíveis para leitura pública. De modo que, para apontar uma obviedade: os 500 exemplares não eram lidos por 500 pessoas apenas. pelo alto nível de analfabetismo no Brasil da época, entre outros fatores, devemos contudo atentar para o que destaca Grafton acima. A existência de grandes bibliotecas, de gabinetes de leitura, e de outras sociedades similares abertas ao público, permitiu o acesso às letras a pessoas que, em outros momentos históricos, jamais o teriam da mesma forma.21 21 Cf., para o caso do Brasil, BESSONE, 1999. Um estudo importante a respeito das limitações do meio intelectual brasileiro no final do século XIX, em especial o público leitor, é GUIMARÃES, 2004. Fernando Amed discute a obra de Capistrano de Abreu a partir de sua inserção em um meio intelectual "rarefeito" (AMED, 2006). Podemos considerar talvez o próprio Capistrano como exemplo, e a maneira como pode estudar inúmeras fontes valendo-se de espaços como a Biblioteca Nacional e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro - muitas destas fontes já impressas. De modo que Capistrano foi praticante de uma historiografia em que a divulgação de documentos, por vários meios, era comum; foi, com isto, partícipe também de um esforço de mais de uma geração para popularizar os meios de estudo da história. Em suas edições, propôs opções editoriais e apresentou um aparato crítico que concorriam para a possibilidade de "vulgarização" dos textos editados, diminuindo a exigência de conhecimentos prévios da parte do leitor para a compreensão do texto. Por outro lado, interessado em difundir os estudos sobre o Brasil, e, particularmente, determinados pontos e temas que julgava relevantes, fazia questão de indicar ao leitor como e para quê aproveitar o texto, muitas vezes, em suas introduções, colocando problemas ao documento editado e mostrando como usá-lo para respondê-los - isto é, como trabalhar os textos enquanto fontes para a história do Brasil.

Agradeço ao CNPq pelo financiamento desta pesquisa.

NOTAS

Artigo recebido em 01/2010.

Aprovado em 04/2010.

  • ABREU, João Capistrano de. Ensaios e Estudos: crítica e história, 1Ş. série, 2Ş. edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1975.
  • ______. Ensaios e Estudos: crítica e história, 2ª série, 2ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1976.
  • ______. Ensaios e Estudos: crítica e história, 4ª série. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1976.
  • ______. Correspondência de Capistrano de Abreu, volume 1, edição organizada e prefaciada por José Honório Rodrigues. 2Ş edição. Rio de Janeiro: Civilização brasileira; Brasília: INL, 1977.
  • ______. Correspondência de Capistrano de Abreu, volume 2, edição organizada e prefaciada por José Honório Rodrigues. 2Ş edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1977.
  • ______. Correspondência de Capistrano de Abreu, volume 3, edição organizada e prefaciada por José Honório Rodrigues. 2Ş edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1977.
  • ______. Caminhos antigos e povoamento do Brasil Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1988.
  • AMED, Fernando. As cartas de Capistrano de Abreu: sociabilidade e vida literária na belle époque carioca. São Paulo: Alameda, 2006.
  • ANDRADE, Luiz Cristiano Oliveira de. A narrativa da vontade de Deus: a História do Brasil de frei Vicente do Salvador (c. 1630). 2004. Dissertação (Mestrado em História) - IFCS - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2004.
  • Annaes da Bibliotheca Nacional, vol. II, 1876-1877.
  • BESSONE, Tânia Maria. Palácios de destinos cruzados: bibliotecas homens e livros no Rio de Janeiro, 1870-1920. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1999.
  • BOMFIM, Manoel. O Brazil na Historia. Deturpação das tradições. Degradação política. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1930.
  • CÂMARA, José Aurélio Saraiva. Capistrano de Abreu: tentativa biobibliográfica. Rio de Janeiro: Livraria J. Olympio Editôra, 1969.
  • CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1980.
  • CARMO, José Arimatéia Pinto. Bibliografia de Capistrano de Abreu Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1942.
  • CASTRO, Eugênio de. Diário de Navegação de Pero Lopes de Sousa. 1530-32. Rio de Janeiro: Tip. Leuzinger, 1927.
  • Catálogo da exposição de história do Brasil / introdução de José Honório Rodrigues; apresentação de B.F. Ramiz Galvão. Ed. fac-similada. Brasília, Distrito Federal: Editora Universidade de Brasília, c. 1981.
  • CERTEAU, Michel de. A operação historiográfica. In: A escrita da História Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1982, p. 65-114.
  • FOUCAULT, Michel. O que é um autor? S.l.: Passagens, 1992.
  • GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Petrópolis, Vozes, 1997.
  • GUIMARÃES, Hélio de Seixas. Os leitores de Machado de Assis: o romance machadiano e o público no século 19. São Paulo: Nankin: EDUSP, 2004.
  • HARRISSE, Henry. Bibliotheca Americana Vetustissima, a description of works relating to America published between 1492 and 1551 Nova Iorque: Geo. P. Philes Publisher, 1866. Obtivemos fac-símile da obra em pdf a partir de <http://www.archive.org/search.php?query=creator%3A%22Harrisse%2C%20Henry%2C%201829-1910%22>. Acesso em 16 de setembro de 2008.
  • Informações e fragmentos historicos do padre Joseph de Anchieta, S. J. (1584-1586). Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1886.
  • MOST, Glenn W. (ed.). Editing texts: Texte edieren. Göttingen: Vandenhoeck und Ruprecht, 1998.
  • PEREIRA, Daniel Mesquita. Descobrimentos de Capistrano. A História do Brasil "a grandes traços e largas malhas". 2002. Tese (Doutorado em História) - PUC-Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2002.
  • Revista do Arquivo Público Mineiro, Ano VI (fascículos II e IV), 1901.
  • RODRIGUES, José Honório. A pesquisa histórica no Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1969.
  • SALVADOR, Frei Vicente do. História do Brasil Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1887.
  • ______. História do Brasil Rio de Janeiro: Tip. Leuzinger & Filhos, 1889.
  • ______. História do Brasil São Paulo e Rio: Weiszflog Irmãos, 1918.
  • ______. História do Brasil São Paulo: Edições Melhoramentos, 1975.
  • SANTOS, Pedro Afonso Cristovão dos. História erudita e popular: edição de textos na obra de Capistrano de Abreu. 2009. Dissertação (Mestrado em História) - FFLCH - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.
  • THOMPSON, E. P. A miséria da teoria (ou um planetário de erros): uma crítica ao pensamento de Althusser. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981.
  • VIANA, Hélio. Capistrano de Abreu: ensaio biobiliográfico. Rio de Janeiro: MEC, 1955.
  • WILLIAMS, Raymond. Cultura e sociedade: 1780-1950. São Paulo: Editora Nacional, 1969.
  • 1
    Bolsista CNPq durante a pesquisa que resultou neste artigo. Este artigo procede de uma re-elaboração de parte do segundo capítulo de nossa dissertação de mestrado,
    História erudita e popular: edição de documentos históricos na obra de Capistrano de Abreu. FFLCH-USP, 2009.
  • 2
    Sobre o "bibliófilo", cf. BESSONE, 1999, p.143. A si próprio, Capistrano definiu-se, em carta do dia das Treze mil virgens (provavelmente "Onze mil virgens", dia 21/10, segundo o antigo calendário católico) de 1922 a Paulo Prado, como "
    bookmanger"; ao falar da imensa biblioteca de Rui Barbosa a João Lúcio de Azevedo (carta de 26/03/1919), disse que aquele tinha "verdadeiro amor de bibliófilo aos livros" (ABREU (e), 1977, p.423 e 118, respectivamente).
  • 3
    No segundo volume dos
    Anais, 1876-77, Alfredo do Vale Cabral se refere à publicação como "revista bibliographica".
    Annaes da Bibliohteca Nacional do Rio de Janeiro, vol. II, Fascículo I, 1876-1877, p.201.
  • 4
    Segundo José Honório Rodrigues, um "inventário das cópias mandadas fazer por Antônio Gonçalves Dias e João Francisco Lisboa, utilíssima lista que compendia os esforços dos dois pesquisadores" (RODRIGUES, 1969, p.95). Capistrano demonstrou largo conhecimento destas pesquisas oitocentistas, indicando muitas de suas deficiências. Este catálogo pode ser corolário direto de suas pesquisas nos anos 1880 e 1890, quando mergulhou nas consultas do Conselho Ultramarino, conforme diz em carta a Rio Branco, de 17/04/1890; ABREU (d), 1977, p.130. O "Catálogo" divide-se em: Torre do Tombo, Academia Real das Ciências, Biblioteca de Évora, Conselho Ultramarino - Registos e Conselho Ultramarino - Papéis Vários, de acordo com a procedência das cópias mandadas fazer pelo Imperador. Capistrano ainda indica quais documentos já haviam sido publicados (ou "impressos", na sua terminologia), e onde o foram, e publica regimentos e relatos de viagem após o "Catálogo". Cf.
    Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo LXVII, parte I, vol. 109, 1904 (1906). O "Catálogo" foi publicado anonimamente; Vieira Fazenda atribuiu-o a Capistrano (VIANA, 1955, p.50).
  • 5
    Capistrano escreveu no
    Suplemento do catálogo texto que está reproduzido em ABREU (b), 1976, pp.129-139. Sobre Ramos Paz, cf. BESSONE, 1999, capítulo 3. Capistrano começou o trabalho de catalogação do acervo de Ramos Paz, mas teve de abandoná-lo; cf. BESSONE, 1999, p.165. Outra bibliografia com a elaboração da qual teria colaborado Capistrano é a
    Biblioteca Brasiliense, de José Carlos Rodrigues, o catálogo de sua muito reputada brasiliana (publicado no Rio, em 1907), várias vezes citada por Capistrano nos "Prolegômenos" da edição de 1918 da
    História do Brasil de frei Vicente do Salvador. Segundo dois biógrafos de Capistrano, Hélio Viana (que remete a informação a Afonso Taunay) e José Aurélio Saraiva Câmara, Capistrano teria participado anonimamente da confecção deste catálogo. Cf. VIANA, 1955, p.51, e CÂMARA, 1969, p.159.
  • 6
    Tânia Bessone mostra os perigos de desmembramento dos acervos quando estes iam a leilões, após a morte de seus proprietários. Capistrano, no texto saído no
    Suplemento do catálogo, demonstra o alívio sentido quando a biblioteca de Paz foi adquirida, na íntegra, por Arnaldo Guinle, que ainda "doou o espólio [...] à Biblioteca Nacional e destinou uma verba para continuar e completar as coleções" (ABREU (b), 1976, p.139).
  • 7
    Lugar no sentido dado por Michel de Certeau, como um dos componentes da "operação historiográfica" (CERTEAU, 1982, p.65-114).
  • 8
    Henry Harrisse (1823-1910) nasceu em Paris, mas mudou-se ainda menino para os Estados Unidos. Sua intenção, como chega a expor na introdução à
    Bibliotheca Americana Vetustissima, era escrever uma história da ascensão e queda do Império Espanhol na América; como condição preliminar, dispôs-se a elaborar uma bibliografia sobre a América, que é esta obra. Harrisse, que em função da pouca repercussão da obra nos EUA mudou-se de volta para a França, publicou diversos escritos sobre a época da descoberta da América, que parecem ter sido altamente estimados no fim do século XIX, começo do XX. Capistrano de Abreu cita alguns nos prolegômenos à
    História do Brasil, de frei Vicente do Salvador, edição de 1918.
  • 9
    As edições e traduções de textos de Capistrano contavam, regularmente, com colaboradores melhor versados que ele em áreas específicas, como o estudo de determinadas línguas indígenas. O caráter de suas notas parece atestar uma concepção progressiva e cumulativa do conhecimento histórico, envolvendo revisão, retificação e correção destes conhecimentos. Remetemos à nossa dissertação de mestrado, SANTOS, 2009, para uma análise destas edições.
  • 10
    Na primeira de suas edições da
    História do Brasil, que saiu nas páginas do
    Diário Oficial (entre julho de 1886 e fevereiro de 1887), Capistrano e Alfredo do Vale Cabral assinam breve introdução em que realçam o valor do texto "às letras e à história do Brasil, permitindo que enfim seja ouvido o primeiro brasileiro que se ocupou de escrever os anais de sua pátria" (Apud CARMO, 1942, pp.89-90). No "Aviso Preliminar" da edição da
    Materiais e Achegas para a História e Geografia do Brasil (1887), Capistrano afirma tratar-se o dia em que frei Vicente concluiu sua obra (20 de dezembro) "um dos maiores de nossa litteratura colonial" (SALVADOR, 1887, p.I). Na edição da Biblioteca Nacional, que sai em separata (1888-89), Capistrano aponta esta data como "tão importante em nossa historiographia" (SALVADOR, 1889, p.IV) - caso raro de uso seu deste termo. Na "Nota Preliminar" da edição de 1918, a
    História de frei Vicente aparece como "modelo" (SALVADOR, 1975, p.39). Tais colocações deveriam ressoar nos debates sobre a história da literatura brasileira de fins do século XIX, pois Capistrano chega a reivindicar para frei Vicente o reconhecimento como "o mais antigo de nossos prosadores" (SALVADOR, 1887, p.I), conferindo, por conseguinte, à Bahia a honra de ser o berço de nossa prosa. Uma crítica da visão que Capistrano constrói da
    História do Brasil encontra-se em ANDRADE, 2004.
  • 11
    Sobre a transformação de um texto em fonte por Capistrano, cf. OLIVEIRA, 2006, capítulo 3. A autora discute, com muita profundidade, como Capistrano, ao editar documentos, já os interpretava e lia enquanto fonte, produzindo história ao fazê-lo. Maria da Glória de Oliveira analisa, em particular, as edições da
    História do Brasil de frei Vicente do Salvador.
  • 12
    Certamente, a concepção de autor aqui utilizada por Capistrano pode ser lida como aquela da qual Foucault comunica a morte em 1969; FOUCAULT, 1992. As considerações de Foucault sobre a unidade que se constitui na figura do autor, ligada à sua biografia, são particularmente interessantes para o nosso caso. Hans Ulrich Gumbrecht oferece um contraponto, defendendo o uso deste "autor histórico" pelos editores, inclusive por aumentar sua comunicabilidade com os leitores, habituados a este autor (MOST, 1998, p.242). No caso de Capistrano, acreditamos ser necessário destacar a presença de uma forte concepção oitocentista, que liga o homem, a arte e seus produtos à sociedade e à época da qual fazem parte; Raymond Williams a aponta. Estudando John Ruskin (1819-1900), Williams observa sua transição de crítico de arte para crítico social, atentando para o "contexto de uma transição
    geral do pensamento acêrca da arte para a reflexão a propósito da sociedade - transição que é marcada, na complexidade de suas referências, pelas alterações de sentido da palavra
    cultura"; que passa a significar "sociedade orgânica", "sistema geral de vida" (WILLIAMS, 1969, p.153). Nesta "transição
    geral", seria marco
    A cultura do renascimento na Itália (1860), de Jacob Burckhardt, que analisa a arte renascentista após uma profunda investigação da sociedade italiana e daquela época. Outros autores importantes na formação de Capistrano, como Taine, também defendiam esta forte ligação entre homem, arte, sociedade e momento histórico. Escrevendo o artigo que serviria de introdução aos
    Diálogos das Grandezas do Brasil, Capistrano relata, em carta de 17/08/1901, a Mário de Alencar: "Hoje meu principal objeto será aplicar o método de Taine, descobrir a
    sensação original do autor" (grifo de Capistrano); ABREU (d), 1977, p.204. Sobre a autoria em Capistrano, cf. também OLIVEIRA, 2006, pp.109-114.
  • 13
    Não estudaremos em particular esta notável edição porque mereceria uma atenção que tornaria este artigo consideravelmente maior. Optamos aqui por enfeixar aspectos gerais do trabalho de editor de Capistrano, mobilizando várias de suas edições. Para uma análise da edição de 1918 da
    História da Brasil, ver nossa dissertação de mestrado, SANTOS, 2009, p.156-174.
  • 14
    Glenn W. Most coloca esta como uma das motivações dos editores em seus trabalhos; MOST, 1998, pp.V-VI. Em carta de 08/03/1893, a Lino de Assunção, Capistrano escreve, a respeito da
    História do Brasil: "Tanto no prólogo de nossa edição, que ficou nos dois primeiros livros, porque na esperança de dar a obra completa não quis ir adiante [refere-se à edição em volume, pela Imprensa Nacional, de 1887], como no da edição [dos
    Anais] da Biblioteca Nacional [vol. XIII, 1889] citei agradecido teu nome [na verdade, cita também na edição pelo
    Diário Oficial].
    Estás, pois, associado tão indissoluvelmente como eu ao venerando Fr. Vicente do Salvador. Zela esta honra e junta-lhe novos títulos [queria estimular Lino a manter a procura pelas partes faltantes da obra]" (ABREU (f), 1977, p.354-355, grifo nosso).
  • 15
    Caso da omissão, nas edições de frei Vicente, das brigas com Saldanha da Gama, diretor da Biblioteca Nacional, nos anos 1880, que não queria que os editores da
    Materiais e Achegas usassem o exemplar da B. N. da
    História do Brasil; e do fato do Marquês de Olinda, Pedro de Araújo Lima (político eminente do período monárquico, regente de 1837 até a Maioridade de D. Pedro II) ter "bifado" (isto é, roubado, surrupiado) o exemplar que mais tarde caiu em mãos do livreiro João Martins Ribeiro, e foi, por este, doado à Biblioteca Nacional, como Capistrano relatou em carta de 25/04/1885 a Lino de Assunção (ABREU (f), 1977, p.312). Aliás, se esta última anedota não veio a público nas edições, parece ter corrido à boca pequena na época, pois Manoel Bomfim se refere ao fato em
    O Brazil na Historia (1930). Segundo Bomfim, a origem daquele exemplar está em cópias que o governo brasileiro mandou fazer na Torre do Tombo: "As copias foram levadas ao Ministerio do Imperio (Interior), cujo titular, o Marquez de Olinda, sem mais cerimonias, mandou tudo para a casa, como cousa sua. Naquelles tempos, havia absoluta
    honestidade nos homens publicos, mas entendia-se que a honestidade se referia, apenas, a negocios de dinheiro: não se roubava em especie..." (BOMFIM, 1930, p.119, nota 1).
  • 16
    O que Daniel M. Pereira chama, em alguns momentos de sua tese, de "descrição sociológica"; cf. PEREIRA, 2002, p.111.
  • 17
    Caso da apresentação da
    História do Brasil no
    Diário Oficial, de 23 de julho de 1886, onde Capistrano e Vale Cabral afirmam a importância "capital" da obra, "que d'ora em diante será como o manual do periodo que abraça" (reprodução fac-similar apud CARMO, 1942, entre as páginas 90 e 91); ou a apresentação da narração da bandeira de Francisco de Mello Palheta ao Madeira, publicada em 1884 na
    Gazeta Literária, que, "embora noticiada por muitos escritores, não era conhecida em suas particularidades. Daí a importância do seguinte documento que não consta haver sido publicado". "Este é material para um capítulo" da biografia de Palheta, o "introdutor do café no Brasil" - café que fazia a riqueza do país naquele momento (ABREU (g), 1988, p.119).
  • 18
    "Expectativas" talvez em sentido próximo ao hermenêutico (GADAMER, 1997), do qual Thompson aproxima-se bastante (THOMPSON, 1981), ou seja, como pré-concepções inescapáveis ao historiador, mas postas à prova pelo contato com a evidência histórica, que prevalece sobre aquela ideia inicial, retificando-a. No caso, o conjunto de informações dos textos era o objeto da expectativa: a presença ou não destas informações, de forma mais fácil ou mais difícil de extrair, corrigia a expectativa inicial.
  • 19
    Análise que parte de tese da formação da nacionalidade brasileira desenvolvida por Capistrano. Tal esquema aparece proposto desde os primeiros textos publicados por Capistrano (como "A Literatura Brasileira Contemporânea", de 1875, em ABREU, (a), 1975, pp.35-70). PEREIRA, 2002, trabalha esta questão.
  • 20
    Os documentos editados em volume por Capistrano, tanto na
    Materiais, como na
    Série Eduardo Prado, devem ter chegado no máximo a 500 exemplares por volume. Na correspondência, observamos a atenção que deu Capistrano a sua distribuição entre um público
    pessoal, de seus amigos e conhecidos, em geral estudiosos também - o que talvez ajude a entender o porquê de indicar como os textos poderiam ser aproveitados para estudos diversos, e das discussões de especialistas que traz para as edições. Observamos ali, por outro lado, como Capistrano usava essas edições para permutas com bibliotecas (por exemplo, carta a Paulo Prado, Oitava da Purificação, 1923, ABREU (e), 1977, p.440), para onde enviava alguns exemplares, deixando-os assim, disponíveis para leitura pública. De modo que, para apontar uma obviedade: os 500 exemplares não eram lidos por 500 pessoas apenas.
  • 21
    Cf., para o caso do Brasil, BESSONE, 1999. Um estudo importante a respeito das limitações do meio intelectual brasileiro no final do século XIX, em especial o público leitor, é GUIMARÃES, 2004. Fernando Amed discute a obra de Capistrano de Abreu a partir de sua inserção em um meio intelectual "rarefeito" (AMED, 2006).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Set 2010
    • Data do Fascículo
      2010

    Histórico

    • Recebido
      Jan 2010
    • Aceito
      Abr 2010
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