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Cinética dos anticorpos de origem colostral contra a toxina épsilon de Clostridium perfringens tipo D em cordeiros

Kinetics of colostral antibodies against epsilon toxin produced by Clostridium perfringens type D in lambs

Resumos

Enterotoxemia, uma das mais importantes enfermidades que acomete os pequenos ruminantes domésticos, é causada principalmente pela toxina épsilon de Clostridium perfringens tipo D. O presente estudo avaliou a cinética de anticorpos colostrais antitoxina épsilon em cordeiros nascidos de ovelhas submetidas a dois diferentes tipos de manejo sanitário. Um grupo de ovelhas prenhes (n=6) foi vacinado com uma dose única de vacina comercial polivalente contra clostridioses contendo toxóide épsilon na sua formulação cerca de 30 dias antes da data prevista para a parição. Outro grupo de ovelhas (n=6) de mesma idade gestacional não foi vacinado. Imediatamente após o parto, antes da ingestão do colostro, foram colhidas amostras sanguíneas dos respectivos cordeiros, bem como aos 30 e 60 dias de idade e submetidas à avaliação sorológica pelo teste de ELISA indireto. Os resultados encontrados permitem concluir que a vacinação de ovelhas prenhes 30 dias antes do parto contra a enterotoxemia causada pela toxina épsilon, com dose única de produto comercial, induz imunidade passiva em níveis considerados protetores (>0,5UI/ml) aos cordeiros por, no mínimo, 60 dias de idade.

Enterotoxemia ovina; vacinação; imunidade colostral


Enterotoxemia, a disease that affect small ruminants, is caused mainly by the epsilon toxin from Clostridium perfringens type D. This study evaluated the kinetics of epsilon antitoxin colostral antibodies in lambs born to ewes submitted to two different types of health management. A group of pregnant ewes (n=6) was vaccinated with a single dose of commercial vaccine against polyvalent clostridial toxoid containing epsilon in its formulation some 30 days before the expected date of birth. Another group of ewes (n=6) of the same gestational age were not vaccinated. Immediately after birth, before intake of colostrum, blood samples were collected from their lambs as well as 30 and 60 days of age for serum evaluation by ELISA. The results allow to conclude that vaccination of pregnant ewes 30 days before parturition allowed the transfer of colostral antibodies specific enough to guarantee the immunity considered protective (0,5UI/ml) of the newborn lamb against enterotoxemia until its entry into the feedlot, with 60 days of age.

Ovine enterotoxaemia; vaccination; colostral immunity


ANIMAIS DE PRODUÇÃO

Cinética dos anticorpos de origem colostral contra a toxina épsilon de Clostridium perfringens tipo D em cordeiros

Kinetics of colostral antibodies against epsilon toxin produced by Clostridium perfringens type D in lambs

Heni F. CostaI; Selene D. BabboniI; Carlos F.C. RodriguesII; Carlos R. PadovaniIII; Iveraldo S. DutraIV; José R. ModoloI,* * Autor para correspondência: jrmodolo@fmvz.unesp.br

IDepartamento de Higiene Veterinária e Saúde Pública, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade Estadual Paulista (Unesp), Distrito de Rubião Júnior s/n, Cx.Postal 524, Botucatu, SP 18618-970, Brasil

IIDepartamento de Bioestatística, Instituto de Biociências, Unesp, Botucatu, SP

IIIUnidade de Pesquisa e Desenvolvimento, Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), Rodov. Gladys Bernardes Minhoto Km 62, Itapetininga, SP 18200-970, Brasil

IVDepartamento de Apoio, Produção e Saúde Animal, Faculdade de Medicina Veterinária, Unesp, Rua Clóvis Pestana 793, Araçatuba, SP 16050- 680, Brasil

RESUMO

Enterotoxemia, uma das mais importantes enfermidades que acomete os pequenos ruminantes domésticos, é causada principalmente pela toxina épsilon de Clostridium perfringens tipo D. O presente estudo avaliou a cinética de anticorpos colostrais antitoxina épsilon em cordeiros nascidos de ovelhas submetidas a dois diferentes tipos de manejo sanitário. Um grupo de ovelhas prenhes (n=6) foi vacinado com uma dose única de vacina comercial polivalente contra clostridioses contendo toxóide épsilon na sua formulação cerca de 30 dias antes da data prevista para a parição. Outro grupo de ovelhas (n=6) de mesma idade gestacional não foi vacinado. Imediatamente após o parto, antes da ingestão do colostro, foram colhidas amostras sanguíneas dos respectivos cordeiros, bem como aos 30 e 60 dias de idade e submetidas à avaliação sorológica pelo teste de ELISA indireto. Os resultados encontrados permitem concluir que a vacinação de ovelhas prenhes 30 dias antes do parto contra a enterotoxemia causada pela toxina épsilon, com dose única de produto comercial, induz imunidade passiva em níveis considerados protetores (>0,5UI/ml) aos cordeiros por, no mínimo, 60 dias de idade.

Termos de indexação: Enterotoxemia ovina, vacinação, imunidade colostral.

ABSTRACT

Enterotoxemia, a disease that affect small ruminants, is caused mainly by the epsilon toxin from Clostridium perfringens type D. This study evaluated the kinetics of epsilon antitoxin colostral antibodies in lambs born to ewes submitted to two different types of health management. A group of pregnant ewes (n=6) was vaccinated with a single dose of commercial vaccine against polyvalent clostridial toxoid containing epsilon in its formulation some 30 days before the expected date of birth. Another group of ewes (n=6) of the same gestational age were not vaccinated. Immediately after birth, before intake of colostrum, blood samples were collected from their lambs as well as 30 and 60 days of age for serum evaluation by ELISA. The results allow to conclude that vaccination of pregnant ewes 30 days before parturition allowed the transfer of colostral antibodies specific enough to guarantee the immunity considered protective (0,5UI/ml) of the newborn lamb against enterotoxemia until its entry into the feedlot, with 60 days of age.

Index terms: Ovine enterotoxaemia, vaccination, colostral immunity.

INTRODUÇÃO

Clostridium perfringens consiste em um grupo de bactérias anaeróbias obrigatórias e extremamente patogênicas ao homem e animais (Hatheway 1990). É classificado em cinco tipos (A, B, C, D e E), baseados na produção de uma ou mais de quatro principais toxinas (Nillo 1980).

A exotoxina épsilon (ETX), produzida pelo C.perfringens tipos B e D, é uma das mais potentes toxinas de origem microbiana (Uzal & Songer 2008). Ela é responsável por quadros de enterotoxemia, uma das mais importantes enfermidades entéricas que acomete os ruminantes domésticos (Songer 2010), principalmente caprinos e ovinos (Van Metre et al. 2000, Uzal, 2004).

A erradicação da enfermidade é virtualmente impraticável, uma vez que o agente é ubiquitário do trato intestinal dos animais e do solo (Songer 2010). Sendo assim, o controle e a profilaxia tornam-se medidas de extrema importância baseadas no manejo e vacinação sistemática dos rebanhos com toxóide épsilon (Kriek et al. 2004).

Embora nas vacinas comerciais contra esta clostridiose sejam mencionadas as quantidades mínimas de toxóides e a Portaria No. 49/1997 do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento tem exigência específica sobre os critérios de aprovação (em quantidade de anticorpos em coelhos - 5UI/ml de antitoxina épsilon) dos produtos para a comercialização, há uma escassez de estudos que confrontem a quantidade mínima de toxóide, a eficácia de tais vacinas a campo e a resposta sorológica na espécie ovina.

Nos programas de vacinação e imunização adequadas dos cordeiros contra a enterotoxemia causada pela ETX, é importante conhecer a amplitude e duração da resposta sorológica desencadeada pela transferência de anticorpos colostrais frente às condições adversas de práticas de manejo das ovelhas a campo.

O presente estudo objetivou avaliar, em diferentes momentos, a presença e a cinética de anticorpos passivos contra a toxina épsilon de origem colostral em cordeiros filhos de matrizes não-vacinadas e vacinadas com toxóide épsilon comercial 30 dias antes da parição.

MATERIAL E MÉTODOS

Animais e vacinação

O emprego de animais neste estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP (Botucatu), sob o protocolo nº57/2008.

A partir de um rebanho comercial composto por ovelhas da raça Texel, sabidamente prenhes, com escrituração zootécnica e sem histórico de vacinação contra clostridioses nos últimos 24 meses, selecionou-se e distribuiu-se aleatoriamente 12 ovelhas multíparas em dois grupos de seis animais cada.

Trinta dias antes da data prevista para a parição, um grupo de ovelhas foi vacinado com uma única dose de vacina comercial polivalente contra clostridioses contendo toxóide épsilon na sua formulação, enquanto o outro grupo não foi vacinado.

A vacina comercial escolhida foi aquela mais empregada pelos ovinocultores da região centro-sul do estado de São Paulo, que representa por sua vez uma das vacinas mais comercializadas no Brasil. Para garantir os propósitos do trabalho, manter o sigilo comercial e considerar as questões éticas em relação a experimentos dessa natureza, a vacina utilizada foi identificada com a letra X. A vacina era composta por bacterina a toxóides de Clostridium chauvoei, Clostridium septicum, Clostridium perfringens B, C e D, Clostridium novyi, Clostridium sordellii e Clostridium tetani. A concentração mencionada de toxóide épsilon por dose da vacina era a necessária para induzir o título sérico de pelo menos 0,5UI/ml em coelhos. Imediatamente após a parição colheu-se por venopunção (veia jugular) uma amostra sanguínea das ovelhas que compunham os dois lotes (vacinadas e não-vacinadas) e de seus respectivos cordeiros antes que estes ingerissem o colostro. Repetiu-se o procedimento de colheita de sangue das ovelhas e cordeiro 30 e 60 dias após o nascimento.

As amostras colhidas foram centrifugadas e os soros obtidos foram aliquotados e armazenados a -20ºC até a realização da avaliação sorológica.

Detecção e quantificação de anticorpos antitoxina épsilon

As amostras sorológicas, tanto das ovelhas quanto dos cordeiros, foram submetidas individualmente e em duplicatas à titulação de anticorpos antitoxina épsilon pelo ELISA Indireto (Enzyme-linked immunosorbent assay), segundo adaptações da metodologia descrita por Uzal et al. (1997).

A prototoxina épsilon utilizada como antígeno no ELISA Indireto, cedida pelo Laboratório de Enfermidades Infecciosas dos Animais da Faculdade de Medicina Veterinária de Araçatuba, UNESP Araçatuba, SP, produzida in house (Veschi 2006) teve sua toxigenicidade avaliada pela observação de sintomatologia de camundongos Balb-c (peso médio 17-20g) inoculados via endovenosa com diferentes diluições da prototoxina ativada com tripsina 0,05% (Miyata et al. 2001), por eletroforese em gel de poliacrilamida 12 % (SDS-PAGE) para caracterização da fração protéica (Asubel et al. 1994) e pela neutralização com antitoxina homóloga.

O soro controle positivo homólogo (contendo 180UI/mL de antitoxina épsilon de Clostridium perfringens tipo D) foi gentilmente cedido pelo Laboratório de Produção de Materiais de Referência - Laboratório Nacional Agropecuário - LANAGRO/ Pedro Leopoldo, MG, e o negativo foi obtido de cordeiros recém-nascidos privados de colostro ao nascimento.

Um volume de 100µl de solução de antígeno (toxina) diluída em tampão carbonato-bicarbonato (TCB) 0,06M (pH 9,6), foi adicionada em cada poço de placas de microtitulação (NUNC®Maxisorp-Demarck). As placas permaneceram overnight a 4ºC em câmara úmida. Entre as etapas as placas foram lavadas, por quatro vezes, com tampão fosfato salino (0,01 M) acrescido de 0,05% (v/v) Tween-20®, pH 7,4 (PBST), em lavadora de placas automática Multiskan Wash®. O bloqueio foi realizado com 200 µl de tampão (tampão carbonato-bicarbonato acrescido de 5% de leite em pó desnatado), visando evitar reações inespecíficas. Após incubação durante 60 minutos a 37ºC, 100µl de amostras de soro controle positivo e negativo, homólogos, e as amostras testes diluídas em PBS-T 0,05% na proporção 1/200 foram adicionadas em cada orifício. Seis orifícios da placa não receberam soro, sendo que dois orifícios receberam somente tampão, e foram utilizados como controle da placa (branco), dois foram o controle do bloqueio utilizado, e outros dois orifícios como controle do conjugado. As placas foram incubadas a 37ºC, por 60 minutos. Posteriormente, adicionaram-se 100 µl/orifício do conjugado imunoenzimático comercial (Sigma® A-3415) correspondente a soro de muar produzido contra IgG ovina, conjugado com peroxidase previamente diluído a 1/8000 em PBS-T 0,05% e incubou-se a 37ºC, por 60 minutos. A seguir adicionaram-se 100 µl/orifício de substrato 2,2'-azino-bis (3-ethylbenzthiazoline-6-sulfonic acid) (Sigma®-A3219), sendo a reação interrompida após 10 minutos com lauryl sodium dodecyl sulfate, 98,5% GC (Sigma® L-3771) a 1% (100 µl/orifício) e avaliada em leitora de microplacas de ELI-SA (Labsystem Multiskan MCC/330®) com filtro de 405 nm.

Para interpretação do teste foi utilizada a seguinte fórmula: A/P = (XA - XN) / (XP - XN); onde, A/P é o valor final em absorbância da amostra teste, XA é a média da densidade óptica (DO) do soro teste e XN e XP são, respectivamente, as médias das DOs dos soros controles negativos e positivos. Os valores de absorbância em DO, convertidos para UI/ml, foram calculados a partir da curva regressão linear construída com os resultados do teste de ELISA de cinco diluições do soro controle positivo com UI/mL previamente conhecida (180 UI/ml). Animais com títulos de anticorpos iguais ou superiores a 0,2 UI/mL foram considerados protegidos (Blackwell et al. 1991).

Análise estatística

No presente estudo considerou-se para comparação de anticorpos séricos nos dois grupos (cordeiros e ovelhas) avaliados em três momentos consecutivos pós-parto (0, 30 e 60 dias) a técnica da análise de variância não-paramétrica (ANOVAP) envolvendo duas fontes de variação (grupo e momento de avaliação), sendo a primeira com níveis independentes (vacinada e não vacinada) e a segunda, dependentes (sequência longitudinal de dias), complementadas com o teste de Dunn (Zar, 2009) considerando o nível de significância 5% na discussão dos resultados.

RESULTADOS

A identidade antigênica da toxina épsilon empregada no teste de ELISA foi confirmada pela neutralização em camundongos, complementadas pelas características da eletroforese com identificação de uma banda com peso molecular de aproximadamente 32kDa.

A avaliação sorológica das ovelhas no momento do parto não revelou diferenças entre os dois grupos de animais (Quadro 1) por ocasião da vacinação 30 dias antes do parto, no dia do parto e nas duas avaliações subsequentes, aos 30 e 60 dias.


A avaliação sorológica dos cordeiros dos dois grupos antes da ingestão de colostro não revelou diferenças significativas quanto à presença de imunoglobulinas (IgG) contra a toxina épsilon (Quadro 2). Assim, a média de anticorpos antitoxina épsilon do grupo de cordeiros filhos de ovelhas vacinadas (0,076±0,082UI/ml) não diferiu significativamente (p>0,05) da média do grupo de cordeiros filhos de matrizes não-vacinadas (0,121±0,041). No entanto, nos outros dois momentos de avaliação (30 e 60 dias de idade), houve diferença significativa (p<0,05) entre os grupos de cordeiros. Aos 30 e 60 dias de idade, cordeiros filhos de ovelhas vacinadas apresentaram médias de anticorpos neutralizantes de 0,249 e 0,278 UI/mL, respectivamente (Quadro 1, Fig.1).



Avaliando-se o comportamento sorológico dentro de um mesmo grupo, respostas de anticorpos antitoxina épsilon dos cordeiros filhos de ovelhas não-vacinadas antes da parição não diferiram entre si nos três momentos estudados (p>0,05). Porém, no grupo de cordeiros filhos de matrizes vacinadas, constatou-se diferença significativa (p<0,05) entre o momento inicial e demais (30 e 60 dias), os quais diferiram entre si (Quadro 1, Fig.1).

DISCUSSÃO

Quadros de enterotoxemia provocados pela ação da toxina épsilon do Clostridium perfringens tipo D acarretam severas perdas econômicas nas criações de ovinos. Sabe-se que, em pequenos ruminantes, a proteção contra a ETX é conferida por anticorpos (Uzal & Kelly 1999) de origem vacinal ou colostral, sendo a vacinação a principal medida profilática adotada para reduzir perdas e minimizar a severidade da enfermidade.

No presente estudo, ficou efetivamente constatado que a administração de dose única de vacina polivalente contra clostridioses contendo toxóide épsilon na sua formulação em um dos grupos de ovelhas 30 dias antes da parição conferiu valores médios de anticorpos neutralizantes antitoxina épsilon transferidos via colostro aos seus cordeiros significativamente maior (p<0,05) quando comparado com os valores médios de cordeiros filhos de matrizes não-vacinadas antes do parto. Em caprinos, Veschi et al. (2006) evidenciaram que a oferta de colostro heterológo de vacas imunizadas aos sete meses de gestação e reforço da dose 28 dias antes da parição não induziu a imunização passiva de cabritos nos primeiros dias de vida.

A mensuração da eficiência e da eficácia das vacinas contra a enterotoxemia ovina causada pela toxina épsilon pode ser estabelecida pela redução do número de mortes e sinais clínicos no rebanho. Este é melhor indicador dessa medida profilática. Embora nas vacinas comerciais contra esta clostridiose sejam mencionadas a quantidade mínima de toxóides e a portaria do MAPA (nº 49/1997) tem exigência específica sobre os critérios mínimos para a aprovação (em quantidade de anticorpos em coelhos) dos produtos comerciais, é desconhecida a relação entre a quantidade mínima de toxóide a resposta dos ovinos. Concentrações séricas de anticorpos antitoxina épsilon de 0,2 UI/ml tem sido reportadas como protetoras nos ovinos (Blackwell et al. 1991). Assim, as características do produto comercial, empregado com o propósito específico do trabalho, induziram a transferência passiva de anticorpos passivos aos cordeiros. Essa imunidade dos cordeiros, filhos de mães vacinadas, permaneceu por pelo menos 60 dias (Quadro 1).

Dentre os aspectos epidemiológicos da enterotoxemia ovina pelo tipo D deve-se considerar que, mesmo sendo uma enfermidade que acomete animais em todas as idades, os jovens, em boas condições corporais e nas primeiras semanas de vida, são particularmente os mais suscetíveis (Kriek et al. 1994). Dessa forma, a estratégia de emprego da imunização via colostro materno deve ser sempre considerada em programas de controle. De Rosa et al. (1997) evidenciaram que a vacinação de ovelhas prenhes quatro semanas antes da parição conferiu título sérico considerado protetor aos seus cordeiros via ingestão de colostro. Diversos estudos relatam a eficiência de diferentes protocolos de vacinação contra clostridioses em ruminantes (Troxel et al. 1997, Araújo et al. 2010, Curci et al. 2010). No entanto, são escassas as informações sobre as características objetivas dos produtos comerciais e como empregá-los em protocolos que possam ser conciliados com práticas de manejo.

Embora a recomendação técnica dos laboratórios fabricantes de vacina seja a aplicação de dose aos 120 dias de gestação e reforço 30 dias após em animais primovacinados (Sindan 2010), a aplicação de dose única nas ovelhas prenhes procurou simular o uso comum nos sistemas de produção de ovinos. De acordo com as informações, as ovelhas não haviam recebido qualquer vacina contra clostridioses nos dois anos que antecederam o experimento. Mesmo assim, quando receberam apenas uma dose de vacina, induziram a formação de anticorpos em níveis suficientes para garantir uma transferência de anticorpos passivos induzindo uma proteção considerada satisfatória nos cordeiros. Isto tem valor prático, mesmo que não se tenha a informação de qual foi o desafio natural ao qual foram expostos.

A dose única de vacina, quando as ovelhas foram avaliadas imediatamente após o parto, não determinou diferença significativa entre os dois grupos (vacinado e não-vacinado) (Quadro 2). No entanto, a cinética dos anticorpos antitoxina épsilon revelou que, naturalmente os títulos de anticorpos oscilaram nos animais não-vacinados cerca de 30 dias antes da parição (Quadro 2). Este fenômeno pode ser explicado pela possibilidade da ocorrência de quadros de infecções subclínicas com a toxina épsilon produzida pelo Clostridium perfringens tipo D ao longo da vida (Uzal et al. 2002).

Assim, a vacinação de ovelhas prenhes contra a enterotoxemia causada pela toxina épsilon, com dose única de produto comercial, induziu e assegurou a transferência de anticorpos passivos considerados protetores aos cordeiros, que permaneceram com esse status sorológico por pelo menos 60 dias.

Agradecimentos.- Ao CNPq (550806/2008-3), Fapesp (2008/10957-2) e aos professores Drª Cáris Maroni Nunes e Dr. Guilherme de Paula Nogueira da Faculdade de Medicina Veterinária de Araçatuba, Unesp, ao pesquisador Dr. Mariano Fernandez-Miykawa INTA, Bariloche, Argentina e aos ovinocultores Gian Carlo Cilento Filho, Walter Gavião e Rubem Osta.

Recebido em 6 de julho de 2011.

Aceito para publicação em 15 de setembro de 2011.

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  • *
    Autor para correspondência:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Fev 2012
    • Data do Fascículo
      Jan 2012

    Histórico

    • Recebido
      06 Jul 2011
    • Aceito
      15 Set 2011
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