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Preferências de mulheres brasileiras quanto a mudanças na menstruação

Preference of Brazilian women regarding menstrual changes

Resumos

OBJETIVO: avaliar a associação entre a experiência menstrual de mulheres e as mudanças preferidas na menstruação. MÉTODOS: estudo de corte transversal, no qual 420 mulheres foram entrevistadas, alocadas em três grupos de idade (18-20, 25-34 e 45-49 anos), e em dois grupos de escolaridade (<8 séries e >12 séries), que tinham menstruado nos três meses que antecederam a entrevista. As mulheres foram selecionadas em Campinas (SP), em nove serviços de saúde privados e em sete públicos. Para a coleta de dados, foi utilizado um questionário construído com base nos resultados de um estudo piloto prévio realizado com grupos focais. Um banco de dados foi preparado com as informações registradas nos questionários e os dados foram analisados com o software SAS versão 8.2. Para análise estatística, foram utilizados o teste do chi2 de Pearson e o teste exato de Fisher para avaliar a associação entre as variáveis estudadas (p<0,05). RESULTADOS: a maioria das mulheres preferia intervalos entre menstruações maiores que uma vez ao mês. Houve associação dos intervalos característicos da menstruação das mulheres, bem como do grau de interferência da menstruação nas atividades diárias, com o intervalo preferido entre menstruações, que é o maior que uma vez por mês (p=0,0248 e p=0,048, respectivamente). Não houve associação das características da dor: duração, intensidade e uso de medicação com o intervalo preferido pelas mulheres. CONCLUSÕES: os resultados sugerem que as mulheres gostariam de menstruar em intervalos maiores do que um mês ou até gostariam de nunca menstruar.

Menstruação; Ciclo menstrual; Dismenorréia; Amenorréia; Entrevistas; Grupos focais


PURPOSE: to evaluate the association between women's menstrual experience and preferred changes in their menstrual cycles. METHODS: a cross-sectional study design was used. A total of 420 women were interviewed. Participants complied with the following criteria: age (18 to 20, 25 to 34 and 45 to 49 years); schooling (<8 years and >12 years); having menstruated during the three months previous to the study. Subjects were selected in the city of Campinas (SP), in nine private and seven public health services. For data collection, a questionnaire was prepared on the basis of the results of a previous pilot study that consisted of small groups. A data bank was prepared with the information registered in the questionnaires and the analysis was carried out with SAS, version 8.2. For the statistical analysis, the Pearson chi2 test and the Fisher exact test were used to evaluate the association between variables (p<0.05). RESULTS: most subjects preferred greater than once a month intervals between menstruations. There was an association of the typical menstrual intervals experienced by women (p=0.0248) and the degree of interference of menstruation with daily activities (p=0.048) with the preferred interval between menses. However, there was no association between preferred intervals by women and the following characteristics of pain: duration, intensity and use of medication. CONCLUSIONS: the results suggest that women would like intervals longer than one month or to never menstruate.

Menstruation; Menstrual cycle; Dysmenorrhea; Amenorrhea; Interviews; Focal groups


ARTIGOS ORIGINAIS

Preferências de mulheres brasileiras quanto a mudanças na menstruação

Preference of Brazilian women regarding menstrual changes

Carmen Porto RibeiroI; Ellen HardyII, III; Eliana Maria HeblingIII

IPós-graduanda do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil

IIProfessora Associada do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil

IIIPesquisadora do Centro de Pesquisas em Saúde Reprodutiva de Campinas - CEMICAMP – Campinas (SP), Brasil

Correspondência Correspondência: Ellen Hardy Caixa Postal 6181 CEP 13084-971 – Campinas/SP Fone: (19) 3289-2856 Fax: (19) 3289-2440 E-mail: hardy@unicamp.br

RESUMO

OBJETIVO: avaliar a associação entre a experiência menstrual de mulheres e as mudanças preferidas na menstruação.

MÉTODOS: estudo de corte transversal, no qual 420 mulheres foram entrevistadas, alocadas em três grupos de idade (18-20, 25-34 e 45-49 anos), e em dois grupos de escolaridade (<8 séries e >12 séries), que tinham menstruado nos três meses que antecederam a entrevista. As mulheres foram selecionadas em Campinas (SP), em nove serviços de saúde privados e em sete públicos. Para a coleta de dados, foi utilizado um questionário construído com base nos resultados de um estudo piloto prévio realizado com grupos focais. Um banco de dados foi preparado com as informações registradas nos questionários e os dados foram analisados com o software SAS versão 8.2. Para análise estatística, foram utilizados o teste do c2 de Pearson e o teste exato de Fisher para avaliar a associação entre as variáveis estudadas (p<0,05).

RESULTADOS: a maioria das mulheres preferia intervalos entre menstruações maiores que uma vez ao mês. Houve associação dos intervalos característicos da menstruação das mulheres, bem como do grau de interferência da menstruação nas atividades diárias, com o intervalo preferido entre menstruações, que é o maior que uma vez por mês (p=0,0248 e p=0,048, respectivamente). Não houve associação das características da dor: duração, intensidade e uso de medicação com o intervalo preferido pelas mulheres.

CONCLUSÕES: os resultados sugerem que as mulheres gostariam de menstruar em intervalos maiores do que um mês ou até gostariam de nunca menstruar.

Palavras-chaves: Menstruação; Ciclo menstrual; Dismenorréia; Amenorréia; Entrevistas; Grupos focais

ABSTRACT

PURPOSE: to evaluate the association between women's menstrual experience and preferred changes in their menstrual cycles.

METHODS: a cross-sectional study design was used. A total of 420 women were interviewed. Participants complied with the following criteria: age (18 to 20, 25 to 34 and 45 to 49 years); schooling (<8 years and >12 years); having menstruated during the three months previous to the study. Subjects were selected in the city of Campinas (SP), in nine private and seven public health services. For data collection, a questionnaire was prepared on the basis of the results of a previous pilot study that consisted of small groups. A data bank was prepared with the information registered in the questionnaires and the analysis was carried out with SAS, version 8.2. For the statistical analysis, the Pearson c2 test and the Fisher exact test were used to evaluate the association between variables (p<0.05).

RESULTS: most subjects preferred greater than once a month intervals between menstruations. There was an association of the typical menstrual intervals experienced by women (p=0.0248) and the degree of interference of menstruation with daily activities (p=0.048) with the preferred interval between menses. However, there was no association between preferred intervals by women and the following characteristics of pain: duration, intensity and use of medication.

CONCLUSIONS: the results suggest that women would like intervals longer than one month or to never menstruate.

Keywords: Menstruation; Menstrual cycle; Dysmenorrhea; Amenorrhea; Interviews; Focal groups

Introdução

A mulher moderna experimenta mais ciclos menstruais quando comparada às suas antecedentes, que vivenciavam a menarca tardiamente, passavam por múltiplas gestações e longos períodos de amamentação, que suprimem a menstruação1. Desde a década de 70, investiga-se a aceitabilidade do uso dos contraceptivos orais que permitem às mulheres reduzir a freqüência menstrual para intervalos de três meses2. Em um estudo realizado na Holanda em 19993, 72% das mulheres gostariam de menstruar menos do que uma vez ao mês ou mesmo nunca.

A interrupção proposital da menstruação tem sido discutida com base em argumentos históricos e médicos. Dentre eles estão a antiga concepção de que a sangria era benéfica à saúde da mulher; o fato de a mulher hoje menstruar mais vezes; a crença na perda inútil de elementos celulares sangüíneos durante a menstruação, fato que pode levar à anemia; a endometriose, dor, tensão pré-menstrual e outros desconfortos. Assim, justificar-se-ia a intervenção medicamentosa como benéfica em mais um aspecto da vida da mulher4.

A maioria dos métodos hormonais de regulação da fertilidade altera a menstruação, principalmente a sua duração e a quantidade de fluxo5. Alguns métodos hormonais interrompem a menstruação por vários meses (acetato de medroxiprogesterona de depósito)6 ou induzem à amenorréia secundária como o Norplant (cápsulas de progestágeno implantáveis)7 e o DIU com levonorgestrel8. Esta amenorréia nem sempre tem sido bem aceita pelas mulheres e constitui a razão mais comum para descontinuar o uso de contraceptivos9.

Alguns autores têm investigado o interesse das mulheres em alterar seu padrão menstrual, como ter menstruações mais curtas, menos dolorosas e desconfortáveis ou mesmo amenorréia3,10, e também por considerarem a menstruação como algo inconveniente11. Em estudo realizado com mulheres brasileiras, constatou-se que a menstruação foi vista com ambigüidade: é um mal necessário e desagradável, mas parte da natureza da mulher. Além disso, a menstruação foi associada à saúde, feminilidade, fertilidade e juventude. E, em relação às alterações no sangramento menstrual causadas por métodos contraceptivos, foi mais aceita a diminuição em tempo e quantidade de fluxo1.

O objetivo do presente artigo é avaliar a associação entre experiência menstrual de mulheres e as mudanças preferidas por elas na menstruação.

Métodos

Foram analisados dados de um estudo de corte transversal descritivo e transcultural, desenvolvido em Campinas (Brasil), Heidelberg (Alemanha) e Ann Arbor (EUA). Neste artigo, são apresentados somente os resultados obtidos no Brasil. Em Campinas, a pesquisa foi realizada pelo Centro de Pesquisas em Saúde Reprodutiva de Campinas (Cemicamp). Foram incluídas 420 mulheres que cumpriam os seguintes critérios de inclusão: 18-20 anos, 25-34 anos ou 45-49 anos de idade; escolaridade baixa (<8 anos de escolaridade) ou alta (>12 anos de escolaridade), e que tinham menstruado nos últimos três meses anteriores à entrevista. Foram excluídas as mulheres que tiveram um parto nos últimos seis meses e as que referiram ter tido amenorréia ou algum tipo de câncer ginecológico.

As participantes foram selecionadas em Campinas (SP), em nove serviços de saúde privados e em sete serviços públicos. Nos serviços de saúde, foram abordadas mulheres que estavam esperando atendimento. As mulheres que cumpriam os critérios de inclusão e aceitavam participar foram entrevistadas individualmente. Para a seleção das mulheres, foi utilizada uma lista de verificação que permitia identificar as que eram elegíveis para a pesquisa, sendo que essa seleção foi proporcional, de acordo com os grupos de idade e escolaridade.

Para a coleta dos dados, foi utilizado um questionário construído com base nos resultados do estudo de grupos focais realizado antes do início da pesquisa, com mulheres de características semelhantes às que seriam estudadas. O questionário incluiu: características gerais, uso de métodos anticoncepcionais, experiência menstrual, mudanças preferidas no ciclo menstrual. O questionário foi pré-testado; as entrevistadoras foram treinadas para realizar o trabalho de campo e usaram um manual de instruções preparado para este estudo. Foi constituído um banco de dados com as informações registradas nos questionários e os dados foram analisados por meio do software SAS®, versão 8.2.

Foram utilizados o teste de c2 de Pearson e o teste exato de Fisher para avaliar a associação entre as variáveis. O nível de significância foi assumido em 5%. O projeto de pesquisa foi aprovado pela Comissão de Pesquisa do Departamento de Tocoginecologina do Centro de Ação Integrada à Saúde da Mulher DTG/CAISM e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas, ambos da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), parecer 593/2003. Todas as participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.

Resultados

Na Tabela 1 pode-se observar que aproximadamente a metade das mulheres (51,9%) entrevistadas tinha de 25 a 34 anos, e se dividiam em grupos quase iguais entre baixa e alta escolaridade (52 e 48%, respectivamente). Mais de um terço (38,3%) não tinha filhos, quase dois terços exerciam trabalho remunerado (60,2%) e eram brancas (65,5%). Mais da metade se declarou católica (57,7%).

Mais de um quinto declarou que sua menstruação durava seis dias ou mais e 10% menstruavam em intervalos menores de 24 dias, enquanto 20% apresentavam intervalos irregulares. Em torno de dois terços (65,9%) tinham intervalos de 24 a 32 dias entre menstruações. Na amostra estudada, quase dois terços (62%) relataram sentir dor e desconforto durante o período menstrual, sendo que 20,5% tinham dor ou desconforto durante mais de três dias em cada ciclo menstrual. Mais da metade considerou a dor e o desconforto como sendo fortes e a mesma proporção fazia uso de medicação. Mais de um terço (36,2%) das mulheres declararam que a dor ou o desconforto interferia nas suas atividades e mais que a quinta parte informou que a menstruação provocava gastos ou esforços significantes para elas (Tabela 2).

Uma quarta parte das mulheres declarou preferir menstruações mensais (23,5%), em torno de um terço preferiria não menstruar nunca (32,5%) e pouco mais de 40% gostaria de ter menstruações a intervalos maiores que uma vez ao mês ou mais (dados não apresentados em tabela).

Quanto menor o intervalo atual das menstruações das mulheres, menor a porcentagem que manifestou preferência por não menstruar nunca (p=0,0248): 15% entre as com intervalos de até 23 dias, um terço entre as com intervalos de 24 a 32 dias e quase 60% das que tinham intervalos mais prolongados. Não houve associação nem da duração nem da regularidade da menstruação com o intervalo preferido (Tabela 3).

A porcentagem de mulheres que preferiam menstruar em intervalos mensais foi entre sete e oito pontos percentuais maior entre as que não tinham dor do que entre as com dor menstrual de três ou mais dias de duração, ou que declararam que a dor era forte. Da mesma forma, a porcentagem das que preferiam não menstruar nunca foi maior que seis pontos percentuais entre as com dor forte ou de três dias ou mais de duração entre as sem dor menstrual, mas essas diferenças não chegaram a atingir significação estatística. As diferenças de intervalo menstrual preferido segundo uso ou não de medicação foram ainda menores e também não significativas (Tabela 4).

O intervalo preferido esteve associado ao grau de interferência da dor e desconforto nas atividades diárias das mulheres (p<0,05). Quase 30% das mulheres que disseram que a menstruação não interferia nas suas atividades e menos de 20% daquelas em que interferia em três ou mais atividades preferiam menstruar uma vez por mês. No extremo oposto, menos de 30% do primeiro grupo e 45% das que declararam interferência em três ou mais atividades disseram preferir não menstruar nunca. Quanto ao custo e esforço causado pela menstruação não houve associação com o intervalo preferido (Tabela 5).

Discussão

Os resultados apontam que, de acordo com a amostra estudada, menstruar mensalmente não é a preferência da maioria das mulheres. Aproximadamente uma quarta parte delas mostrou preferência por ciclos menstruais com a freqüência habitual na natureza, isto é, mensalmente. A maioria prefere intervalos maiores que uma vez ao mês, e um grupo não desprezível mostrou preferência por nunca menstruar.

Nossos resultados estão de acordo com estudos realizados em outros países, os quais revelam que a mulher moderna tem tendência a preferir intervalos longos e, ainda, a amenorréia, em lugar do intervalo natural entre as menstruações11-13.

Por outro lado, estes resultados parecem estar em oposição aos achados em população semelhante, em estudo qualitativo, desenvolvido por nosso grupo de pesquisa1. Neste estudo, observou-se que as mulheres valorizavam a menstruação, como sinal de saúde e normalidade, e que temiam que a sua falta fosse sinal de algum tipo de anomalia. Entretanto, esse estudo também mostrou que as mulheres apreciariam não ter que passar pelo desconforto da menstruação todos os meses, sempre que tivessem segurança de que nada de anormal estava acontecendo com seu corpo.

O conjunto destas informações sugere que a mulher moderna está se rebelando contra a "escravidão" do desconforto provocado pela menstruação mensal e começa a ver com simpatia a possibilidade de prolongar os intervalos e até mesmo de parar de menstruar, sempre que tenha segurança de não estar grávida nem de estar sofrendo alguma doença. Há estudos que mostram que a maioria das mulheres prefere ciclos longos, porque poderia melhorar sua qualidade de vida12. As mulheres teriam menos queixas menstruais, dores de cabeça e sintomas pré-menstruais, por exemplo12,14.

Chama a atenção em nossos resultados que não são as mulheres com menstruações freqüentes as que mais se interessaram por intervalos longos ou por não menstruar, porém, foram aquelas que já tinham intervalos mais prolongados. É possível especular que aquelas mulheres que já têm intervalos longos entendem que isso não é anormal e, portanto, estariam mais dispostas a aceitar que menstruações espaçadas não significam necessariamente doença.

Contra o esperado, a preferência por não menstruar nunca não foi muito maior entre as mulheres que apresentavam dor por maior número de dias ou naquelas que qualificaram a dor como sendo forte quando comparadas com as que não tinham dor durante a menstruação. Assim mesmo, não houve diferença segundo o custo ou esforço pessoal provocado pela menstruação, sendo significativo apenas para interferência da menstruação sobre as atividades diárias. Entretanto, encontrou-se uma diferença no sentido esperado para todas as variáveis, por isso observando-as em conjunto, não é possível descartar que exista uma associação, ainda que não tão forte como o esperado.

De fato, um dos mais conhecidos proponentes de que as mulheres nunca precisam menstruar4 alega que um importante benefício da amenorréia induzida é eliminar a dor menstrual, e que as mulheres com dismenorréia estariam fortemente motivadas a aceitar procedimentos que as levassem à amenorréia. De acordo com os nossos resultados, esse não parece ser o mais forte motivo para preferir intervalos longos ou total ausência de menstruação. A motivação das mulheres parece corresponder a um processo mais complexo, que forma parte do conceito de que a mulher já não é mais obrigada a cumprir com funções biológicas como engravidar, dar à luz, amamentar e engravidar novamente durante toda sua vida fértil. Liberar-se dessa função biológica, obrigatória para nossas antepassadas, foi uma das grandes conquistas da chamada "liberação feminina". Aparentemente, liberar-se da "obrigação" de menstruar vem a ser como uma segunda etapa dessa liberação de condicionantes biológicos típicos de ser mulher.

Até onde conseguimos buscar na literatura não encontramos outros trabalhos que tentaram verificar se há relação entre as características menstruais das mulheres e o intervalo menstrual de sua preferência. Haverá que esperar novos estudos em diversos ambientes, para confirmar a relativa pouca importância da dor e o do desconforto, como condicionantes da preferência das mulheres por menstruar em longos intervalos ou não menstruar nunca.

De qualquer forma, nossos resultados favorecem a proposta já bastante difundida de oferecer anticoncepção hormonal que prolongue os intervalos menstruais. Uma das características apreciadas do uso da anticoncepção hormonal combinada tradicional é a sua capacidade de regular quase que cronometricamente as menstruações das usuárias, mantendo o ritmo a cada 28 dias15, considerado tipicamente normal. Nossos resultados dão apoio à nova proposta de que regular a menstruação, com outros intervalos, poderia também ser bem aceita por uma parte das potenciais usuárias. Isto se consegue com particular eficácia com a pílula de ciclo longo, habitualmente de três meses16. Provocar amenorréia com métodos anticoncepcionais de longa duração com progestágeno puro já não é tão consistente. Muitas vezes, eles podem inibir totalmente a menstruação, mas, com freqüência, só o conseguem após períodos de sangramentos prolongados e imprevisíveis, que é contrário aos desejos da maioria das mulheres.

Os dados apresentados neste trabalho têm a originalidade de estar entre os primeiros ou eventualmente ser o primeiro que explora a associação entre a experiência menstrual atual das mulheres e sua preferência por intervalo menstrual. Entretanto, temos que reconhecer que nossas conclusões estão longe de poderem ser extrapoladas, considerando que a amostra é exclusiva de uma grande cidade do interior do estado de São Paulo. Isto não permite inferir que seus resultados sejam aplicáveis ao universo das mulheres brasileiras, e muito menos em nível mundial.

Apesar das limitações deste estudo, acreditamos que nossos resultados sirvam como subsídio para a discussão sobre a conveniência ou não de oferecer formas de anticoncepção hormonal que regulem a menstruação com intervalos diferentes dos 28 dias clássicos. Sugerem também que uma alternativa, diferente dos extremos de menstruar mensalmente ou nunca menstruar, pode ser a preferida pela maioria das mulheres, e que não é a dor maior ou menor o que determina essa preferência.

Confiamos que a apresentação destes resultados estimule a realização de estudos semelhantes em outros lugares, com amostras mais abrangentes, que permitam confirmar ou corrigir algumas de nossas conclusões.

Agradecimentos

A Sirlei Siani Morais pelo auxílio na análise estatística, ao Dr. Anibal Faúndes pelas sugestões editoriais e ao apoio institucional do Centro de Pesquisas em Saúde Reprodutiva de Campinas – CEMICAMP – Campinas (SP, Brasil)

Recebido: 24/10/2006

Aceito com modificações: 24/11/2006

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  • Correspondência:

    Ellen Hardy
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Maio 2007
    • Data do Fascículo
      Fev 2007

    Histórico

    • Aceito
      24 Nov 2006
    • Recebido
      24 Out 2006
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