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Cirurgia não ginecológica em pacientes com câncer de ovário

Nongynecologic surgery in patients with ovarian cancer

Resumos

OBJETIVO: avaliar a freqüência da utilização de procedimentos cirúrgicos não ginecológicos no tratamento do câncer de ovário, assim como descrever as suas complicações. MÉTODOS: foram incluídas retrospectivamente 82 pacientes, atendidas no período de fevereiro de 1999 a outubro de 2003, e que haviam sido submetidas a laparotomia para tratamento cirúrgico do câncer de ovário. Foram incluídas no estudo apenas pacientes com adenocarcinoma epitelial de ovário. A média de idade foi de 54,1±15,1 anos, variando de 22 a 89 anos. O estadiamento (FIGO) mostrou 5 pacientes no estádio I (6,1%), 18 pacientes no II (21,9%), 40 pacientes no III (48,8%) e 19 pacientes no IV (23,2%). As pacientes foram divididas em 2 grupos: aquelas em que foram realizados exclusivamente procedimentos ginecológicos e aquelas com realização de procedimentos não ginecológicos. As diferenças entre as médias foram analisadas pelo teste t de Student. As comparações entre grupos independentes foram feitas pelo teste do chi2. RESULTADOS: em 35 pacientes (42,7%) foram realizados procedimentos cirúrgicos não ginecológicos, incluindo: 17 colostomias, 16 enterectomias, oito peritonectomias pélvicas, sete colectomias, cinco ressecções parciais de cúpula frênica, quatro cistectomias parciais, quatro esplenectomias, duas ileostomias e uma hepatectomia parcial. Todas as pacientes submetidas a procedimentos não ginecológicos apresentavam-se nos estádios III e IV. Esse grupo apresentou maior tempo cirúrgico (5,3±1,4 versus 3,1±0,9 horas); p<0,001). Os grupos não mostraram diferenças significativas em relação à necessidade de hemotransfusão (42,2 versus 40%; p=0,512) e tempo de internação (11,5±7,2 versus 10±9,9 dias; p=0,454). A realização de procedimentos cirúrgicos não ginecológicos associou-se a maior taxa de complicações pós-operatórias 37% versus (17,1%; p=0,042), sendo que duas pacientes desse grupo (2,4%) evoluíram para o óbito. CONCLUSÕES: os procedimentos cirúrgicos não ginecológicos são freqüentemente empregados no tratamento de pacientes com câncer de ovário. A realização dessas cirurgias está associada a maior tempo cirúrgico e maior taxa de complicações pós-operatórias.

Câncer de ovário; Citorredução; Complicações da cirurgia


OBJECTIVE: to evaluate the incidence of non-gynecological surgical procedures used in the treatment of ovarian cancer, as well to describe their complications. METHODS: eighty-two patients with ages from 22 to 89 (mean = 54.1 ± 15.1 years), submitted to laparotomy for surgical treatment of ovarian cancer from February 1999 to October 2003 were retrospectively evaluated. This study included only patients with epithelial ovary carcinoma. The patients were divided into 2 groups, patients submitted exclusively to gynecological procedures and patients submitted to non-gynecological procedures. Statistical analysis was made with the Student's t-test or the chi-square test. RESULTS: 5 patients (6.1%) were in stage (FIGO) I, 18 (21.9%) in stage II, 40 (48.8%) in stage III, and 19 (23.2%) in stage IV. Non-gynecological procedures were done in 35 cases (42.7%), including: 17 colostomies, 16 enterectomies, 8 peritonectomies, 7 colectomies, 5 partial diaphragm resections, 4 partial cystectomies, 4 splenectomies, 2 ileostomies, and 1 hepatectomy. All patients submitted to non-gynecological procedures were included in stages III and IV. This group of patients underwent longer-lasting surgeries (5.3 ± 1.4 versus 3.1 + 0,0 h; p < 0.001). There was no significant difference between these two groups regarding hemotransfusion requirement (42,2 versus 40%; p = 0.512) and hospitalization time (11.5 ± 7.2 versus 10 ± 9.9 days; p = 0.454). Patients submitted to non-gynecological surgeries developed higher rates of postoperative complications (37 versus 17.1%; p = 0.042), and two of them (2.4%) died. CONCLUSION: non-gynecological surgical procedures are frequently used in the treatment of patients with ovarian cancer. These procedures are associated with a longer-lasting surgery and higher rates of postoperative complications.

Ovarian cancer; Cytoreduction; Surgical complications


TRABALHOS ORIGINAIS

Cirurgia não ginecológica em pacientes com câncer de ovário

Nongynecologic surgery in patients with ovarian cancer

Agnaldo Lopes da Silva-FilhoI; Eduardo Batista CândidoI; Maurício Bechara NovielloI; Admário Silva Santos-FilhoI; Paulo TraimanII; Sérgio Augusto TriginelliI; José Renan Cunha-Melo

IDepartamentos de Ginecologia e Obstetrícia e Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais

IIDepartamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Agnaldo Lopes da Silva Filho Avenida Pasteur 89/1310 Bairro Santa Efigênia 30 150 290 - Belo Horizonte - MG Telefone: (31) 3236-6103. Fax: (31) 3296-5490 e-mail: agsilvaf@terra.com.br

RESUMO

OBJETIVO: avaliar a freqüência da utilização de procedimentos cirúrgicos não ginecológicos no tratamento do câncer de ovário, assim como descrever as suas complicações.

MÉTODOS: foram incluídas retrospectivamente 82 pacientes, atendidas no período de fevereiro de 1999 a outubro de 2003, e que haviam sido submetidas a laparotomia para tratamento cirúrgico do câncer de ovário. Foram incluídas no estudo apenas pacientes com adenocarcinoma epitelial de ovário. A média de idade foi de 54,1±15,1 anos, variando de 22 a 89 anos. O estadiamento (FIGO) mostrou 5 pacientes no estádio I (6,1%), 18 pacientes no II (21,9%), 40 pacientes no III (48,8%) e 19 pacientes no IV (23,2%). As pacientes foram divididas em 2 grupos: aquelas em que foram realizados exclusivamente procedimentos ginecológicos e aquelas com realização de procedimentos não ginecológicos. As diferenças entre as médias foram analisadas pelo teste t de Student. As comparações entre grupos independentes foram feitas pelo teste do c2.

RESULTADOS: em 35 pacientes (42,7%) foram realizados procedimentos cirúrgicos não ginecológicos, incluindo: 17 colostomias, 16 enterectomias, oito peritonectomias pélvicas, sete colectomias, cinco ressecções parciais de cúpula frênica, quatro cistectomias parciais, quatro esplenectomias, duas ileostomias e uma hepatectomia parcial. Todas as pacientes submetidas a procedimentos não ginecológicos apresentavam-se nos estádios III e IV. Esse grupo apresentou maior tempo cirúrgico (5,3±1,4 versus 3,1±0,9 horas); p<0,001). Os grupos não mostraram diferenças significativas em relação à necessidade de hemotransfusão (42,2 versus 40%; p=0,512) e tempo de internação (11,5±7,2 versus 10±9,9 dias; p=0,454). A realização de procedimentos cirúrgicos não ginecológicos associou-se a maior taxa de complicações pós-operatórias 37% versus (17,1%; p=0,042), sendo que duas pacientes desse grupo (2,4%) evoluíram para o óbito.

CONCLUSÕES: os procedimentos cirúrgicos não ginecológicos são freqüentemente empregados no tratamento de pacientes com câncer de ovário. A realização dessas cirurgias está associada a maior tempo cirúrgico e maior taxa de complicações pós-operatórias.

Palavras-chave: Câncer de ovário. Citorredução. Complicações da cirurgia.

ABSTRACT

OBJECTIVE: to evaluate the incidence of non-gynecological surgical procedures used in the treatment of ovarian cancer, as well to describe their complications.

METHODS: eighty-two patients with ages from 22 to 89 (mean = 54.1 ± 15.1 years), submitted to laparotomy for surgical treatment of ovarian cancer from February 1999 to October 2003 were retrospectively evaluated. This study included only patients with epithelial ovary carcinoma. The patients were divided into 2 groups, patients submitted exclusively to gynecological procedures and patients submitted to non-gynecological procedures. Statistical analysis was made with the Student's t-test or the chi-square test.

RESULTS: 5 patients (6.1%) were in stage (FIGO) I, 18 (21.9%) in stage II, 40 (48.8%) in stage III, and 19 (23.2%) in stage IV. Non-gynecological procedures were done in 35 cases (42.7%), including: 17 colostomies, 16 enterectomies, 8 peritonectomies, 7 colectomies, 5 partial diaphragm resections, 4 partial cystectomies, 4 splenectomies, 2 ileostomies, and 1 hepatectomy. All patients submitted to non-gynecological procedures were included in stages III and IV. This group of patients underwent longer-lasting surgeries (5.3 ± 1.4 versus 3.1 + 0,0 h; p < 0.001). There was no significant difference between these two groups regarding hemotransfusion requirement (42,2 versus 40%; p = 0.512) and hospitalization time (11.5 ± 7.2 versus 10 ± 9.9 days; p = 0.454). Patients submitted to non-gynecological surgeries developed higher rates of postoperative complications (37 versus 17.1%; p = 0.042), and two of them (2.4%) died.

CONCLUSION: non-gynecological surgical procedures are frequently used in the treatment of patients with ovarian cancer. These procedures are associated with a longer-lasting surgery and higher rates of postoperative complications.

Keywords: Ovarian cancer. Cytoreduction. Surgical complications.

Introdução

O câncer de ovário é a oitava neoplasia maligna mais diagnosticada em mulheres no Brasil e a quinta causa de morte por câncer nas mulheres americanas1. Corresponde a 1,8% dos cânceres ginecológicos e apresenta a mais elevada mortalidade entre eles2. A neoplasia maligna de ovário representa grande desafio, pois apesar dos avanços da terapia oncológica, a sobrevida das pacientes não se alterou nas últimas décadas1,2.

O estadiamento no momento do diagnóstico tem importante valor prognóstico3,4. Cerca de 60% das pacientes são diagnosticadas nos estádios III e IV, com pior prognóstico e expectativa de vida em cinco anos de apenas 10 a 20%3. Outro fator prognóstico, que pode ser influenciado diretamente pelo cirurgião, é a extensão da doença residual após a cirurgia primária5.

A citorredução, descrita por Meigs6 em 1935, constitui um dos princípios do tratamento cirúrgico do câncer de ovário. Pacientes submetidas à excisão completa do tumor apresentam maior sobrevida em relação àquelas cuja massa tumoral foi retirada parcialmente7. Considera-se uma citorredução satisfatória quando persiste doença residual com diâmetro inferior a um centímetro8-10. Pacientes submetidas a uma citorredução ótima apresentam sobrevida global média de 35 meses, ao passo que aquelas com doença residual maior que um centímetro sobrevivem, em média, 18 meses11. Uma metanálise, envolvendo 81 estudos e 6885 pacientes, mostrou a citorredução satisfatória como determinante da sobrevida em pacientes com carcinoma de ovário nos estádios III ou IV, mesmo após controle de outros fatores prognósticos12.

A disseminação do câncer de ovário na superfície peritoneal não respeita os limites anatômicos dos órgãos e vísceras abdominais e pélvicas13. Essa característica biológica implica a necessidade de se realizarem procedimentos cirúrgicos em alças intestinais, bexiga, reto e estruturas extrapélvicas, como baço, fígado e diafragma, para a obtenção de uma citorredução satisfatória14. As cirurgias do trato gastrintestinal também podem ser empregadas em procedimentos paliativos e no reparo de lesões ocorridas durante a citorredução15. Dessa forma, é fundamental que o cirurgião que se propõe a tratar o câncer de ovário tenha domínio técnico de diversos procedimentos cirúrgicos, que freqüentemente extrapolam a cirurgia ginecológica propriamente dita15. A realização desses procedimentos associa-se a um aumento da morbidade, restringindo as suas indicações para os casos com possibilidade de citorredução ótima8,9. Esse estudo tem como objetivo avaliar a freqüência da utilização de procedimentos cirúrgicos não ginecológicos no tratamento do câncer de ovário, assim como descrever as suas complicações.

Pacientes e Métodos

Foram incluídas retrospectivamente 82 pacientes, atendidas no período de fevereiro de 1999 a outubro de 2003, submetidas a laparotomia para tratamento cirúrgico do câncer de ovário. A média de idade foi de 54,1±15,1 anos, variando de 22 a 89 anos. Todos os procedimentos cirúrgicos foram feitos pela equipe de cirurgia pélvica do Hospital das Clínicas da UFMG. Esse estudo foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa da referida instituição.

A laparotomia em estudo constituiu o tratamento primário em 51 pacientes (62,2%). Quimioterapia prévia já havia sido realizada em 22 pacientes (26,8%). Das 25 pacientes (30,5%) que haviam sido operadas previamente, 19 (23,2%) foram submetidas a histerectomia total e anexectomia bilateral e 6 (7,3%) foram submetidas à ooforectomia.

Foram incluídas no estudo apenas pacientes com adenocarcinoma epitelial de ovário. As pacientes foram estadiadas conforme as orientações da Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO), por laparotomia mediana, histerectomia total com anexectomia bilateral, omentectomia, biópsias peritoneais nos locais suspeitos, citologia oncótica do líquido peritoneal e linfadenectomia retroperitoneal, quando indicadas16.

As pacientes foram divididas em dois grupos: aquelas em que foram realizados exclusivamente procedimentos ginecológicos e aquelas com realização de procedimentos não ginecológicos.

Foram considerados procedimentos cirúrgicos ginecológicos: laparotomia para biópsia, ooforectomia, histerectomia, omentectomia e linfadenectomia retroperitoneal. Não ginecológicos foram considerados os procedimentos que, antes da existência de uma equipe de cirurgia pélvica, usualmente necessitavam da participação do cirurgião geral, coloproctologista ou urologista, para a sua realização. Dessa forma, foram considerados procedimentos cirúrgicos não ginecológicos: enterectomias, ressecções de cúpula frênica, esplenectomias, hepatectomias, colectomias, colostomias, ileostomias, peritonectomias pélvicas e cistectomias. A apendicectomia e colecistectomia não foram consideradas procedimentos não ginecológicos, por nem sempre serem indicadas para o tratamento específico do câncer de ovário.

As fichas preenchidas foram revisadas, sendo as informações codificadas e digitadas em banco de dados no programa SPSS para Windows versão 10.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, USA). Esse banco de dados foi empregado também para o desenvolvimento dos cálculos estatísticos. A idade foi descrita por meio de sua média, valor mínimo, máximo e desvio padrão. As análises das diferenças entre as médias foram feitas pelo teste t de Student. As comparações entre grupos independentes foram feitas pelo teste do c2. As diferenças ou correlações com valor de p<0,05 foram consideradas significativas.

Resultados

Segundo o estadiamento (FIGO), 5 pacientes apresentavam-se no estádio I (6,1%), 18 pacientes no estádio II (21,9%), 40 pacientes no estádio III (48,8%) e 19 pacientes no estádio IV (23,2%). O tempo cirúrgico médio foi de 4,3±1,6 horas, variando de 1 a 9 horas. Houve necessidade de hemotransfusão em 33 pacientes (40,2%). O tempo de internação hospitalar variou de 3 a 37 dias (10,9±8,4 dias). Complicações pós-operatórias foram observadas em 20 pacientes (24,4%), estando as principais descritas na Tabela 1. Duas pacientes (2,4%) evoluíram para o óbito devido à embolia pulmonar.

Em 47 pacientes (57,3%) foram realizados exclusivamente procedimentos ginecológicos e em 35 casos (42,7%) realizaram-se procedimentos não ginecológicos. Os procedimentos não ginecológicos incluíram: 17 colostomias, 16 enterectomias, 8 peritonectomias pélvicas, 7 colectomias, 5 ressecções parciais de cúpula frênica, 4 cistectomias parciais, 4 esplenectomias, 2 ileostomias e 1 hepatectomia parcial.

Como ilustra a Figura 1, todas as pacientes submetidas a procedimentos não ginecológicos apresentavam estadiamentos III e IV, ao passo que apenas 34,3% das pacientes submetidas a procedimentos ginecológicos apresentavam estadiamentos III e IV (p<0,001).


O tempo cirúrgico médio foi superior no grupo de pacientes submetidas a procedimentos não ginecológicos (5,3±1,4 versus 3,1±0,9; p<0,001). Os grupos não apresentaram diferenças significativas em relação à necessidade de hemotransfusão (42,2 versus 40%; p=0,512). A realização de procedimentos cirúrgicos não ginecológicos associou-se a maior taxa de complicações pós-operatórias (37 versus 17,1%; p=0,042) (Tabela 2). As duas pacientes que evoluíram para o óbito no pós-operatório pertenciam ao grupo dos procedimentos cirúrgicos não ginecológicos (Tabela 1). Os grupos não apresentaram diferenças estatisticamente significativas em relação ao tempo de internação médio (11,5±7,2 versus 10±9,9 dias; p=0,454) (Tabela 2).

Discussão

Esse estudo avaliou a utilização de procedimentos cirúrgicos não ginecológicos no tratamento do câncer de ovário em um centro terciário de tratamento com uma alta incidência de pacientes apresentando doença avançada ao diagnóstico. Para a obtenção de citorredução satisfatória foram utilizados procedimentos cirúrgicos não ginecológicos em 42,7% das pacientes. Isso pode ser justificado pelo estadiamento das pacientes operadas, pois 72% das pacientes apresentavam-se nos estádios III e IV, e pelo fato de que 37,2% das pacientes já haviam sido submetidas à cirurgia e/ou quimioterapia prévias.

A maior complexidade dos procedimentos cirúrgicos não ginecológicos aumentou o tempo operatório e a incidência de complicações pós-operatórias. Estudos avaliando pacientes submetidas a procedimentos cirúrgicos não ginecológicos em câncer de ovário mostram taxas de complicações de 29,8 a 59% e mortalidade pós-operatória de até 6% (Tabela 3).

A maior parte dos procedimentos não ginecológicos dessa casuística envolveu o trato gastrintestinal, especialmente a realização de colostomias e enterectomias. Um trabalho, com 364 pacientes com câncer de ovário, mostrou que as cirurgias gastrintestinais são freqüentes, tendo a citorredução como principal indicação, seguida pelos quadros de obstrução intestinal15. A exenteração pélvica posterior foi descrita, em pacientes nos estádios III e IV, como alternativa para a obtenção de uma citorredução satisfatória15. Um estudo retrospectivo, com 105 pacientes portadoras de câncer de ovário nos estádios III e IV, mostrou a citorredução primária como causa de 92% das cirurgias sobre o trato gastrintestinal17.

Foram realizadas quatro esplenectomias devido à presença de implantes tumorais no hilo esplênico (3 casos) ou metástases parenquimatosas (1 caso). A indicação de esplenectomia para se obter uma citorredução satisfatória é controversa. Tal procedimento foi associado a uma alta morbidade pós-operatória em pacientes com câncer de ovário18. As complicações relacionadas a esplenectomia incluem lesão pancreática, pesudocisto de pâncreas, derrame pleural e atelectasia19. Um estudo avaliou 258 pacientes com câncer de ovário nas quais foram realizadas 13 esplenectomias. Esse procedimento foi considerado adequado e seguro, porém indicado apenas naquelas pacientes com possibilidade de citorredução ótima20.

A peritonectomia pélvica foi realizada em 8 pacientes (9,5%). A ressecção em bloco dos ovários, útero e peritônio pélvico constitui uma alternativa cirúrgica para a obtenção de citorredução efetiva21,22. Nos casos de carcinomatose peritoneal, a peritonectomia associada à quimioterapia intraperitoneal possibilita alta concentração local de drogas citostáticas23.

Foi demonstrado que a sobrevida de pacientes com câncer de ovário operadas por um oncologista ginecológico é superior à daquelas operadas por outro especialista22. O presente estudo mostrou a alta freqüência na realização de procedimentos não ginecológicos no tratamento do câncer de ovário, sendo imprescindível ao oncologista ginecológico a realização de cirurgias gastrintestinais, proctológicas e urológicas. O domínio dessas cirurgias pode alterar, inclusive, os critérios de ressecabilidade dos tumores, propiciando à paciente maior chance de citorredução satisfatória.

Concluímos que os procedimentos cirúrgicos não ginecológicos são freqüentemente empregados no tratamento de pacientes com câncer de ovário. A realização dessas cirurgias está associada a maior tempo cirúrgico e maior taxa de complicações pós-operatórias.

Recebido em: 5/2/2004

Aceito com modificações em: 3/5/2004

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  • Endereço para correspondência
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Ago 2004
    • Data do Fascículo
      Jun 2004

    Histórico

    • Aceito
      03 Maio 2004
    • Recebido
      05 Fev 2004
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