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Síndrome do desfiladeiro torácico: uma revisão narrativa.

RESUMO

A Síndrome do Desfiladeiro Torácico (SDT) é causada pela compressão do plexo braquial, artéria subclávia e veia subclávia na região do desfiladeiro torácico. Estas estruturas podem ser comprimidas entre a clavícula e a primeira costela ou por um número de variações anatômicas. A compressão neurológica é a forma mais comum da síndrome do desfiladeiro torácico. Complicações vasculares ocorrem com pouca frequência. Complicações arteriais geralmente resultam da compressão da artéria subclávia por costela cervical completa. As complicações venosas estão muitas vezes relacionadas à compressão muscular da veia subclávia. A forma neurogênica, anteriormente descrita, é a mais comum, constituindo mais de 95% dos casos. Já a forma venosa representa 2% a 3% e, a arterial, cerca de 1% dos casos. Fatores de risco incluem biótipo e variações individuais, como genética, idade e sexo. No Brasil, não há dados acerca da epidemiologia da SDT. Diante da suspeita de SDT é necessária uma avaliação clínica detalhada, seguida de exames complementares para elucidação da causa. O tratamento é direcionado de acordo com a etiologia e a presença ou não de complicações. A proposta do presente trabalho foi realizar uma revisão narrativa sobre a SDT, versando sobre sua etiologia, fisiopatologia, epidemiologia, avaliação clínica, exames complementares, diagnósticos diferenciais e tratamento.

Descritores:
Síndrome do Desfiladeiro Torácico; Artéria Subclávia; Veia Subclávia; Plexo Braquial; Revisão.

ABSTRACT

The Thoracic Outlet Syndrome (TOS) results from compression of the brachial plexus, the subclavian artery and the subclavian vein in the thoracic outlet region. This compression may take place between the clavicle and the first rib or by a number of anatomical variations. Neurological compression is the most common form of thoracic outlet syndrome. Vascular complications occur infrequently. Arterial complications usually result from compression of the subclavian artery by a complete cervical rib. Venous complications are often related to muscle compression of the subclavian vein. The neurogenic form, previously described, is the most common, constituting more than 95% of cases, while the venous represents 2% to 3%, and the arterial, about 1%. Risk factors include biotype and individual variations such as genetics, age and gender. In Brazil, there are no data on the epidemiology of TOS. Given the suspicion of TOS, a detailed clinical evaluation is necessary, followed by complementary exams to elucidate the cause. The treatment is directed according to the etiology and the presence or absence of complications. The purpose of this study was to perform a narrative review on TOS, focusing on its etiology, pathophysiology, epidemiology, clinical evaluation, complementary exams, differential diagnoses, and treatment.

Keywords:
Thoracic Outlet Syndrome; Subclavian Artery; Subclavian Vein; Brachial Plexus; Review.

INTRODUÇÃO

Em 1956, Peet et al.11 Peet RM, Henriksen JD, Anderson TP, Martin GM. Thoracic-outlet syndrome: evaluation of a therapeutic exercise program. Proc Staff Meet Mayo Clin. 1956;31(9):281-7. usaram pela primeira vez o termo Síndrome do Desfiladeiro Torácico (SDT) para descrever uma constelação de sintomas causados pela compressão de estruturas neurovasculares na região do desfiladeiro torácico. As estruturas geralmente envolvidas são a primeira costela e o músculo escaleno anterior, cuja impressão local afeta, sobretudo, o plexo braquial e os vasos subclávios22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5..

Tipicamente, podemos distinguir três formas diferentes de SDT, cujo diagnóstico depende primariamente da estrutura acometida. São eles: a forma neurogênica, a forma venosa e a forma arterial. Ocasionalmente é possível manifestar mais de um tipo no mesmo contexto clínico22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. Os sintomas da forma neurogênica incluem fraqueza, adormecimento, parestesia e dor no membro superior acometido. A forma venosa habitualmente se apresenta com edema e dor intensa. A forma arterial, por sua vez, cursa com dor não radicular, frialdade do membro e palidez33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32..

A SDT é uma síndrome rara e potencialmente grave que atinge comumente adultos jovens entre 20 e 40 anos de idade, com uma proporção homem-mulher de 1:4, que resulta em morbidade significativa se não tratada33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32.

4 Chavhan GB, Vaishnavi B, Muthusami P, Towbin AJ, Borschel GH. MRI of thoracic outlet syndrome in children. Pediatr Radiol. 2017;47(10):1222-34.
-55 Daniels B, Michaud L, Sease F Jr, Cassas KJ, Gray BH. Arterial thoracic outlet syndrome. Curr Sports Med Rep. 2014;13(2):75-80.. A abordagem terapêutica é, majoritariamente, não cirúrgica33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32..

A proposta do presente trabalho foi realizar uma revisão narrativa sobre a SDT, versando sobre sua etiologia, fisiopatologia, epidemiologia, avaliação clínica, exames complementares, diagnósticos diferenciais e tratamento.

REVISÃO DA LITERATURA

Foi realizada revisão de artigos científicos nas bases de dados PubMed, utilizando-se o MeSH term: "thoracic outlet syndrome". Os critérios de inclusão foram publicações entre 2012 e 2017 e os tipos de estudos aceitos foram: revisão, revisão sistemática, meta-análise, ensaios clínicos e estudos observacionais. Após levantamento, encontramos 47 artigos, dos quais selecionamos oito para realização deste trabalho.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Etiologia e fisiopatologia

A SDT ocorre devido a uma variação anatômica ou muscular que comprime os vasos subclávio-axilares e/ou o plexo braquial na região do desfiladeiro torácico33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32.. A compressão ocorre principalmente em três espaços: no triângulo intercosto-escalênico, costo-clavicular e retro-coraco-peitoral. As regiões vasculares e neurais passam por esses espaços e, devido ao seu pequeno tamanho, qualquer deformidade óssea ou muscular pode exercer compressão e ocasionar sintomas clínicos neurogênicos e/ou vasculares66 Czihal M, Banafsche R, Hoffmann U, Koeppel T. Vascular compression syndromes. Vasa. 2015;44(6):419-34..

A compressão do feixe neurovascular, na medida em que atravessa o desfiladeiro torácico, pode resultar de uma combinação de anormalidades de desenvolvimento, lesões e atividades físicas, que predispõem à compressão local55 Daniels B, Michaud L, Sease F Jr, Cassas KJ, Gray BH. Arterial thoracic outlet syndrome. Curr Sports Med Rep. 2014;13(2):75-80.. As variantes da anatomia do desfiladeiro torácico, tanto congênitas quanto adquiridas, são comuns e incluem principalmente variações na anatomia óssea e muscular. Alterações na anatomia do plexo braquial e na histologia muscular também podem contribuir. As causas anatômicas de SDT podem ser organizadas em categorias de tecido mole e ósseo. As causas dos tecidos moles são associadas a até 70% dos casos da SDT, enquanto que as anormalidades ósseas abrangem os outros 30%.

A forma mais comum para o desenvolvimento da SDT é através de algum tipo de trauma22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. Este pode ocasionar alguma deformação das costelas ou do plexo cervical, desencadeando a compressão das estruturas. A síndrome também pode surgir a partir de movimentos de repetição durante um longo período de tempo, por exercícios realizados de forma errônea em centros de musculação ou até mesmo no trabalho, por movimentos repetitivos. Acredita-se que se deva a pequenos traumas durante um longo período de tempo e pelo processo inflamatório que se forma na região. Somado a isso, a pré-existência de anormalidades congênitas ósseas e musculares, que antes não manifestavam sintomatologia típica do quadro clínico da SDT, podem deflagrar sintomas após a ocorrência de um trauma44 Chavhan GB, Vaishnavi B, Muthusami P, Towbin AJ, Borschel GH. MRI of thoracic outlet syndrome in children. Pediatr Radiol. 2017;47(10):1222-34..

Os achados anátomo-morfológicos associados à SDT incluem a presença ectópica de costelas cervicais, processos transversais C7 proeminentes, tumor na região ou sequelas de trauma prévio33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32. (Figura 1). Embora a presença de costelas cervicais possa causar sintomas de SDT na ausência de traumatismo, 80% dos pacientes com SDT e costelas cervicais mostram o desenvolvimento dos sintomas somente após a lesão. Esses pacientes geralmente têm uma grande costela cervical fundida à primeira costela.

Figura 1
Anatomia do desfiladeiro torácico. Os círculos na figura representam os pontos de compressão. Ellepigrafica/Shutterstock.

Epidemiologia

Os dados epidemiológicos da SDT devem ser interpretados com cautela, pois os casos são raramente relatados devido à falta de acordo nos critérios diagnósticos para a doença33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32.,66 Czihal M, Banafsche R, Hoffmann U, Koeppel T. Vascular compression syndromes. Vasa. 2015;44(6):419-34.. Em média, a incidência varia de três a 80 casos por 1.000 pessoas. A forma neurogênica representa mais de 90% dos casos de SDT. Cerca de 3% a 5% manifestam a forma venosa e menos de 1% a forma arterial. A incidência da forma venosa é de 1:100.000 pessoas por ano77 Moore R, Wei Lum Y. Venous thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(2):182-9.. A idade típica de acometimento é entre 20 e 30 anos para as formas vasculares e entre 20 e 40 anos para a forma neurogênica22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. A prevalência da forma neurogênica é mais comum em mulheres, numa proporção de 3,5:1. A forma venosa, por sua vez, parece ser mais comum em homens. A forma arterial não apresenta prevalência quanto ao sexo.

Avaliação clínica

A sintomatologia do paciente com SDT depende, primariamente, do mecanismo fisiopatológico envolvido na síndrome33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32.. Daniels et al.55 Daniels B, Michaud L, Sease F Jr, Cassas KJ, Gray BH. Arterial thoracic outlet syndrome. Curr Sports Med Rep. 2014;13(2):75-80. descrevem que o paciente com a forma arterial da SDT pode se queixar inicialmente de dor não radicular persistente, adormecimento ou desconforto na extremidade afetada, tornando-se pior com a prática de exercícios físicos e melhorando com o descanso. Não há, no entanto, sinais e sintomas patognomônicos da forma arterial. Ao exame físico, é comum encontrar frialdade e palidez dos membros33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32.. A palidez é mais comum na parte superior do membro, sendo que alterações cutâneas na parte distal do membro, ulcerações e sinais de eventos microembólicos são raros33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32..

Para Grunebach et al.22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5., o primeiro sintoma típico da forma venosa é o edema da parte superior do membro, podendo eventualmente ser precedido, alguns dias antes, por dor intensa. Ao exame físico, o paciente pode apresentar coloração cianótica da extremidade superior33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32.. As veias superficiais tornam-se dilatadas na parte superior do braço, pescoço e tórax77 Moore R, Wei Lum Y. Venous thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(2):182-9..

Para Franklin et al.88 Franklin GM. Work-related neurogenic thoracic outlet syndrome diagnosis and treatment. Phys Med Rehabil Clin N Am. 2015;26(3):551-61., os sintomas clássicos da forma neurogênica incluem dor, parestesia nos dedos e fraqueza na parte superior da extremidade. Ao exame físico, é comum encontrar dor à palpação acima do plexo braquial, nos músculos trapézio e escaleno e na parede anterior do tórax, não sendo, entretanto, patognomônico da síndrome. Os sintomas costumam piorar com atividades que envolvam sobrecarga, como pegar um objeto numa prateleira alta, ou que envolvam extensão pronunciada do membro22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. Numa revisão sistemática, encontrou-se cefaleia occipital presente em 76% dos pacientes33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32..

Algumas manobras provocativas para a SDT têm sido descritas na literatura55 Daniels B, Michaud L, Sease F Jr, Cassas KJ, Gray BH. Arterial thoracic outlet syndrome. Curr Sports Med Rep. 2014;13(2):75-80.. A manobra de Adson é realizada por meio da palpação do pulso radial, extensão dos cotovelos, elevação do membro superior e rotação ipsilateral da cabeça enquanto o paciente realiza inspiração profunda22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. O teste pode produzir parestesia pela distribuição do plexo braquial e, frequentemente, obliteração do pulso radial do lado afetado55 Daniels B, Michaud L, Sease F Jr, Cassas KJ, Gray BH. Arterial thoracic outlet syndrome. Curr Sports Med Rep. 2014;13(2):75-80.. O teste sozinho não confirma o diagnóstico de SDT, uma vez que 40% das pessoas sem sintomas podem ter desaparecimento do pulso apenas movendo o braço para longe do corpo, e não deve impactar no diagnóstico da forma venosa da SDT77 Moore R, Wei Lum Y. Venous thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(2):182-9.. A manobra de Elvey é realizada com a extensão do membro superior afetado e rotação contralateral da cabeça. Ela verifica a presença de compressão nervosa no desfiladeiro torácico, podendo deflagrar parestesia e dor. Também é uma manobra pouco sensível e pouco específica66 Czihal M, Banafsche R, Hoffmann U, Koeppel T. Vascular compression syndromes. Vasa. 2015;44(6):419-34.. O teste de Ross é realizado com o membro afetado em abdução de 90º e flexão do cotovelo a a 90º enquanto o paciente realiza movimentos de abrir e fechar as mãos lentamente por três minutos. O teste constringe o espaço costo-clavicular, fazendo com que o paciente se torne incapaz de realizá-lo no tempo mínimo88 Franklin GM. Work-related neurogenic thoracic outlet syndrome diagnosis and treatment. Phys Med Rehabil Clin N Am. 2015;26(3):551-61.. O teste de Wright, por sua vez, é realizado pela hiperabdução e rotação externa do membro afetado, enquanto o paciente rotaciona a cabeça para o lado contralateral, sendo positivo com a obliteração total ou parcial do pulso radial. O teste, no entanto, oblitera o pulso radial em mais de 7% da população normal33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32..

Não há ainda um consenso sobre a utilização e acurácia diagnóstica das manobras clínicas como padrão ouro no diagnóstico da SDT66 Czihal M, Banafsche R, Hoffmann U, Koeppel T. Vascular compression syndromes. Vasa. 2015;44(6):419-34.. Isso se justifica pelo baixo valor preditivo positivo das manobras. Não obstante, uma abordagem que combine a história clínica do paciente com a avaliação cautelosa das manobras ainda é recomendada.

Exames complementares

Pacientes com sintomas de SDT são frequentemente submetidos a diversos exames complementares, como estudos de ressonância magnética nuclear (RMN), tomografia computadorizada (TC), eletroneuromiografia (ENM), estudos de condução nervosa sensitiva e motora (ECN) e ultrassonografia (USG)22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. Os exames de imagem são úteis no diagnóstico das formas vasculares da SDT, podendo ter, contudo, resultados normais em pacientes com a forma neurogênica. Para Chavhan et al.44 Chavhan GB, Vaishnavi B, Muthusami P, Towbin AJ, Borschel GH. MRI of thoracic outlet syndrome in children. Pediatr Radiol. 2017;47(10):1222-34. os exames de imagem têm papel importante no diagnóstico e manejo da SDT.

A USG é o exame de imagem inicial escolhido para avaliação das formas vasculares da SDT, por ser de fácil acesso e não invasivo22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. Segundo Moore et al.77 Moore R, Wei Lum Y. Venous thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(2):182-9., o duplex-scan apresenta alta sensibilidade e especificidade para detectar estenoses ou oclusões venosas, quando feitas por profissional experiente. Para Chavhan et al.44 Chavhan GB, Vaishnavi B, Muthusami P, Towbin AJ, Borschel GH. MRI of thoracic outlet syndrome in children. Pediatr Radiol. 2017;47(10):1222-34., a RNM é preferida por sua capacidade de mostrar ossos, tecidos moles, anormalidades vasculares e nervosas com seu contraste e resolução superiores. A angio-RNM do membro permite uma excelente obtenção de imagem dos vasos e pode ser uma excelente ferramenta diagnóstica. Ainda, a neurografia por RNM pode detectar a compressão do plexo braquial, contribuindo com o diagnóstico da forma neurogênica da SDT. Czihal et al.66 Czihal M, Banafsche R, Hoffmann U, Koeppel T. Vascular compression syndromes. Vasa. 2015;44(6):419-34. afirmam que a TC demonstra bom realce de estruturas vasculares nos arredores de ossos e músculos. A angio-TC e a venografia produzem imagens em reconstrução tridimensional de alta qualidade da vasculatura central e extremidades de vasos, o que facilita a identificação do ponto de compressão vascular e extensão da patologia.

Segundo Kuhn et al.33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32., os estudos de neurofisiologia podem demonstrar anormalidades da atividade nervosa, quando comparados aos demais nervos da coluna cervical e torácica. Essas manifestações podem ocorrer por anormalidades na velocidade de condução no nervo cutâneo medial do antebraço e na parte motora do nervo mediano do músculo abdutor curto do polegar. A ENM pode mostrar fibrilações nas distribuições de C8 e T1, apesar de não mostrar alteração na velocidade de condução.

Diagnóstico diferencial

A apresentação clínica da SDT é bastante diversa, variando desde desconforto leve a sintomas intensos33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32.. Além disso, os pacientes podem apresentar sinais ou sintomas unilaterais ou bilaterais relacionados à compressão de uma combinação de componentes neurológicos e vasculares22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. As formas vasculares isoladas da SDT são mais facilmente diagnosticadas, mas também são mais raras. Assim, o examinador deve distinguir quais sintomas estão relacionados à compressão do plexo braquial, quais são de natureza vascular e quais não têm relação com a patologia do desfiladeiro torácico66 Czihal M, Banafsche R, Hoffmann U, Koeppel T. Vascular compression syndromes. Vasa. 2015;44(6):419-34..

Kuhn et al.33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32. defendem que os problemas da coluna vertebral cervical são mais frequentemente caracterizados por dor constante no pescoço e ombro e, dependendo da posição do pescoço, pode ocorrer um agravamento da dor. Algumas vezes ocorre irradiação dessa dor para os membros superiores. A posição do ombro e a palpação direta nas estruturas articulares agravam os sintomas. As neuropatias de compressão distal, como a síndrome do túnel do carpo, apresentam sintomas isolados, previsíveis em relação à distribuições de nervos e são agravados mais pela posição do punho e do cotovelo do que pela posição do ombro ou pescoço.

Os diagnósticos diferenciais importantes para a forma neurogênica da SDT incluem: doença musculoesquelética (como artrite ou tendinite) da coluna cervical, cintura escapular ou braço, radiculopatia cervical ou compressão nervosa das extremidades superiores, inflamação idiopática do plexo braquial (também conhecida como síndrome de Parsonage-Turner) e compressão do plexo braquial devido a um processo infiltrativo ou massa como tumor de Pancoast do vértice pulmonar88 Franklin GM. Work-related neurogenic thoracic outlet syndrome diagnosis and treatment. Phys Med Rehabil Clin N Am. 2015;26(3):551-61.. A tabela 1 resume os principais diagnósticos diferenciais da SDT.

Tabela 1
Principais diagnósticos diferenciais para a síndrome do desfiladeiro torácico, segundo Daniels et al.55 Daniels B, Michaud L, Sease F Jr, Cassas KJ, Gray BH. Arterial thoracic outlet syndrome. Curr Sports Med Rep. 2014;13(2):75-80.

Tratamento

O tratamento da SDT tem dois objetivos: aliviar os sintomas dos pacientes e prevenir complicações66 Czihal M, Banafsche R, Hoffmann U, Koeppel T. Vascular compression syndromes. Vasa. 2015;44(6):419-34.. Kuhn et al.33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32. defendem que o tratamento deve ser iniciado clinicamente e torna-se cirúrgico apenas em caso de falha terapêutica. O tipo de SDT e as estruturas envolvidas influenciam diretamente no tipo de tratamento. O tratamento clínico inicial busca aliviar os sintomas utilizando-se analgésicos, anti-inflamatórios e mudanças de hábito de vida.

A forma neurogênica da SDT é inicialmente tratada com fisioterapia, mudanças posturais e uso de anti-inflamatórios22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5.. Muitos pacientes sentem alívio da dor sem abordagem cirúrgica. Injeção de toxina botulínica nos músculos escalenos tem sido relatada, com melhora dos sintomas, apesar de estudos randomizados de alta qualidade não indicarem eficácia desta abordagem88 Franklin GM. Work-related neurogenic thoracic outlet syndrome diagnosis and treatment. Phys Med Rehabil Clin N Am. 2015;26(3):551-61.. A descompressão cirúrgica pode ser uma opção, caso os tratamentos menos invasivos sejam ineficazes22 Grunebach H, Arnold MW, Lum YW. Thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(5):493-5..

O tratamento da forma venosa da SDT historicamente baseia-se em anticoagulantes e sintomáticos77 Moore R, Wei Lum Y. Venous thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(2):182-9.. Os estudos, porém, demonstram diversas complicações com esse tratamento, como a persistência da dor, eventos recorrentes de trombose e restrições no movimento dos braços, o que ocasiona prejuízos às atividades diárias do paciente. A trombólise com infusão contínua de ativador de plasminogênio é a terapia mais usual e com melhores resultados nestes casos. As taxas de sucesso para o restabelecimento da permeabilidade da veia subclávia são de quase 100%, desde que a trombólise seja realizada dentro de duas semanas após o início dos sintomas.

O tratamento da forma arterial da SDT vai depender da estrutura acometida e o tratamento mais resolutivo é o cirúrgico, embora passível de complicações55 Daniels B, Michaud L, Sease F Jr, Cassas KJ, Gray BH. Arterial thoracic outlet syndrome. Curr Sports Med Rep. 2014;13(2):75-80.. Para pacientes com graus leves de isquemia arterial aguda devido à embolização, a trombólise dirigida por cateter pode ser apropriada antes do tratamento cirúrgico. No entanto, a presença de isquemia mais grave geralmente requer embolectomia (com ou sem trombólise intraoperatória) em conjunto com a descompressão do desfiladeiro torácico.

O tratamento cirúrgico, em geral, ocorre na minoria dos casos e está relacionado à anomalias ósseas sintomáticas, complicações vasculares, traumas, perda sensitiva com aumento da dor, o que pode evoluir para uma parestesia do membro superior e falha no tratamento convencional33 Kuhn JE, Lebus V GF, Bible JE. Thoracic outlet syndrome. J Am Acad Orthop Surg. 2015;23(4):222-32.. A intervenção cirúrgica consiste na descompressão vascular e/ou nervosa feita por diversas técnicas de acesso, como a transaxilar, supraclavicular, infraclavicular e toracoplastia anterior e posterior. A escolha de como proceder depende da região anatômica acometida e da preferência pelo cirurgião.

A abordagem transaxilar é vantajosa porque permite uma excelente exposição da parte anterior da primeira costela, onde a compressão ocorre77 Moore R, Wei Lum Y. Venous thoracic outlet syndrome. Vasc Med. 2015;20(2):182-9.. Toda a costela pode ser ressecada e a sua porção mais medial pode ser completamente desarticulada e removida do manúbrio. Essa incisão é a mais cosmeticamente aceitável, mas não permite reconstrução venosa. Daniels et al.55 Daniels B, Michaud L, Sease F Jr, Cassas KJ, Gray BH. Arterial thoracic outlet syndrome. Curr Sports Med Rep. 2014;13(2):75-80. defendem a abordagem supraclavicular, que proporciona uma exposição mais ampla das costelas. Além disso, permite que o local da compressão possa ser diretamente identificado e a reconstrução arterial realizada, conforme necessário. Os músculos escalenos anterior e médio podem ser completamente ressecados com esse acesso, além de ser possível também a realização da neurólise do plexo braquial. O método cirúrgico infraclavicular é muito pouco utilizado, apenas quando é necessária uma reconstrução maior na forma venosa da STD.

CONCLUSÃO

Nossa revisão demonstra que, diante de um quadro suspeito de SDT, faz-se necessária uma semiologia clínica e radiológica detalhada, visando ao diagnóstico etiológico correto para que se possa avaliar a melhor opção terapêutica para cada caso.

  • Fonte de financiamento: nenhuma.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    18 Maio 2019
  • Aceito
    15 Jul 2019
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