Acessibilidade / Reportar erro

Estrutura da vegetação arbustivo-arbórea colonizadora de uma área degradada por mineração de caulim, Brás Pires, MG

Structure of the shrub and tree vegetation colonizing an area degraded by kaolin mining, in Brás Pires, MG, Brazil

Resumos

O presente estudo teve por objetivo conhecer a estrutura fitossociológica da vegetação arbustivo-arbórea colonizadora em uma área degradada por mineração de caulim no Município de Brás Pires (20°55'S e 43°09'W), MG, visando selecionar e indicar espécies mais adaptadas para recuperação de áreas degradadas semelhantes. A amostragem fitossociológica contou com 50 parcelas contíguas de 10 m X 10 m, totalizando 0,5 ha. Estiveram passíveis de inclusão todos os indivíduos com circunferência do tronco a 1,30 m do solo (CAP) igual ou superior a 10 cm. O levantamento resultou em 1.010 indivíduos pertencentes a 47 espécies, distribuídos em 39 gêneros e 23 famílias. Destacaram-se em valor de importância Piptadenia gonoacantha, Luehea grandiflora, Anadenanthera peregrina, Cecropia glaziovii, Cecropia hololeuca e Xylopia brasiliensis. A análise da distribuição dos indivíduos em classes de diâmetro revelou uma comunidade em plena regeneração, com representação em todas as classes diamétricas.

Fitossociologia; restauração de áreas degradadas; mineração; regeneração natural


The objective of this work was to study the phytosociological structure of a shrub and tree vegetation colonizing an area degraded by kaolin mining in Brás Pires, SE, Brazil, in order to select and indicate more adapted species for restoration of similar degraded areas. The phytosociological sampling used 50 grid with 10x10m plots each totalizing 0.5ha. The survey included all individuals with breast high > 10cm circumference. A total of 1010 sampled individuals belonged to 47 species distributed into 39 genera and 23 families. The highest VI values were obtained for Piptadenia gonoacantha, Luehea grandiflora, Anadenanthera peregrina, Cecropia glaziovii, Cecropia hololeuca e Xylopia brasiliensis. The analysis of trunk diameter distribution showed that the community was in a stage of full regeneration with individuals distributed over all diameter classes.

Phytosociology; restoration of degraded areas; mining; natural regeneration


Estrutura da vegetação arbustivo-arbórea colonizadora de uma área degradada por mineração de caulim, Brás Pires, MG

Structure of the shrub and tree vegetation colonizing an area degraded by kaolin mining, in Brás Pires, MG, Brazil

Fernanda Sguizzatto de AraújoI; Sebastião Venâncio MartinsII; João Augusto Alves Meira NetoIII; João Luiz LaniIV; Ismael Eleotério PiresII

IPrograma de Pós-Graduação em Ciência Florestal da UFV. E-mail:<sguizzatto@yahoo.com.br>

IIDepartamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa. E-mail: <venancio@ufv.br>

IIIDepartamento de Biologia Vegetal da UFV

IVDepartamento de Solos da UFV

RESUMO

O presente estudo teve por objetivo conhecer a estrutura fitossociológica da vegetação arbustivo-arbórea colonizadora em uma área degradada por mineração de caulim no Município de Brás Pires (20°55'S e 43°09'W), MG, visando selecionar e indicar espécies mais adaptadas para recuperação de áreas degradadas semelhantes. A amostragem fitossociológica contou com 50 parcelas contíguas de 10 m X 10 m, totalizando 0,5 ha. Estiveram passíveis de inclusão todos os indivíduos com circunferência do tronco a 1,30 m do solo (CAP) igual ou superior a 10 cm. O levantamento resultou em 1.010 indivíduos pertencentes a 47 espécies, distribuídos em 39 gêneros e 23 famílias. Destacaram-se em valor de importância Piptadenia gonoacantha, Luehea grandiflora, Anadenanthera peregrina, Cecropia glaziovii, Cecropia hololeuca e Xylopia brasiliensis. A análise da distribuição dos indivíduos em classes de diâmetro revelou uma comunidade em plena regeneração, com representação em todas as classes diamétricas.

Palavras-chave: Fitossociologia, restauração de áreas degradadas, mineração e regeneração natural.

ABSTRACT

The objective of this work was to study the phytosociological structure of a shrub and tree vegetation colonizing an area degraded by kaolin mining in Brás Pires, SE, Brazil, in order to select and indicate more adapted species for restoration of similar degraded areas. The phytosociological sampling used 50 grid with 10x10m plots each totalizing 0.5ha. The survey included all individuals with breast high > 10cm circumference. A total of 1010 sampled individuals belonged to 47 species distributed into 39 genera and 23 families. The highest VI values were obtained for Piptadenia gonoacantha, Luehea grandiflora, Anadenanthera peregrina, Cecropia glaziovii, Cecropia hololeuca e Xylopia brasiliensis. The analysis of trunk diameter distribution showed that the community was in a stage of full regeneration with individuals distributed over all diameter classes.

Keywords: Phytosociology, restoration of degraded areas, mining and natural regeneration.

1. INTRODUÇÃO

A restauração de florestas em terras tropicais degradadas é considerada dependente do entendimento do funcionamento dos ecossistemas florestais e dos meios para manejar os processos de sucessão ecológica envolvidos (LUGO, 1997). Nesse contexto, a fitossociologia destaca-se como ferramenta indispensável, pois permite inferir sobre o padrão de distribuição espacial de cada espécie, dado fundamental no planejamento de recuperação de áreas degradadas (RODRIGUES e GANDOLFI, 1998). Reproduzir esse padrão natural, identificado nas comunidades, significa aumentar as chances de sucesso na recuperação do ambiente, bem como reduzir os custos dos projetos, conferindo às áreas degradadas uma condição ecológica mais próxima da original, ou seja, a restauração ecológica. Além disso, o conhecimento de como as plantas se regeneram naturalmente num local degradado, pode reduzir ao mínimo os efeitos sobre o solo e aumentar o processo natural de sua recuperação (LORENZO et al., 1994). Aliado ao conhecimento da estrutura das comunidades, a noção do número e distribuição das espécies nos diferentes grupos sucessionais é imprescindível em projetos de recuperação de fragmentos florestais (RODRIGUES et al., 2000).

Os estudos básicos sobre a composição florística, a estrutura da comunidade colonizadora e da sucessão em áreas que se encontram abandonadas depois de ter paralisado o processo de mineração são ferramentas importantes a serem utilizadas para nortear estratégias para o planejamento de recuperação de áreas mineradas (JOHNSON et al., 1982; BARTH, 1989; LORENZO, 1994; SKOUSEN et al., 1994; PARROTA et al., 1997). No entanto, tais estudos abordando áreas degradadas por mineração de caulim ainda são raros no Brasil. Dessa forma, este trabalho apresenta a estrutura fitossociológica da vegetação arbustivo-arbórea colonizadora de uma área degradada por mineração de caulim em Brás Pires, MG, visando indicar espécies mais adaptadas para recuperação de áreas degradadas semelhantes e identificar fatores responsáveis pela facilitação da regeneração florestal nessa área.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

O estudo foi desenvolvido na Fazenda Boa Esperança, situada à margem esquerda do rio Turvo, Município de Brás Pires (20° 54' 25" S e 43° 10' 41"W), distante 60 km de Viçosa, MG. A área da propriedade é de 12,5 ha e a encosta, área-alvo do estudo, ocupa aproximadamente 2 ha. Apresenta declividade de 35% e altitude que varia de 825 m no terço superior a 745 m no terço inferior. A atividade minerária, extração de caulim, foi iniciada em 1980 e finalizada em 1985. Nos 20 anos subseqüentes, a encosta onde foi depositado o estéril da mineração de caulim, anteriormente utilizada como pastagem, foi isolada, e o processo de regeneração natural iniciou-se, estando atualmente ocupada por vegetação florestal secundária. No topo da encosta, percebe-se a exposição do horizonte C, devido à intensa erosão e à própria mineração. Ao longo da encosta, pela deposição do estéril sobre o horizonte A da pastagem que havia no local, desenvolveu-se um horizonte A pouco espesso, advindo da vegetação colonizadora, havendo, então, horizontes enterrados. O solo da área foi caracterizado, através de observações em campo, como Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico, sendo o horizonte Bw pouco espesso.

Conforme a classificação de Köppen, o clima da região é Cwb, apresentando verões quentes e úmidos, com pluviosidade anual de 1.200 a 1.500 mm, estação seca curta no inverno e temperatura média anual entre 19,5 e 21,8 °C (NATALI et al., 1997).

A amostragem fitossociológica contou com 50 parcelas contíguas de 10 m x 10 m, totalizando 0,5 ha. Estiveram passíveis de inclusão todos os indivíduos com circunferência do tronco a 1,30 m do solo (CAP) igual ou superior a 10 cm. De cada indivíduo foram anotados o CAP e a altura total e coletadas amostras de material botânico. A identificação foi realizada por meio de comparação com exsicatas do herbário VIC da UFV e consultas a especialistas quando necessário. Adotou-se o sistema de classificação de Cronquist (1988) para a apresentação das espécies, com exceção da família Leguminosae, que seguiu o sistema de Engler (1894) apud Joly (1977). A validação dos nomes das espécies foi feita utilizando a base de dados fornecida pelo Missouri Botanical Garden (www.mobot.org).

A partir dos dados coletados, estimaram-se o índice de diversidade de Shannon (H'), na base logarítmica natural, a equabilidade (J') (PIELOU, 1975) e os parâmetros de densidade, dominância, freqüência absolutas e relativas, valor de importância e cobertura, utilizando o programa Fitopac 1 (SHEPHERD, 1996). Tais parâmetros foram considerados de acordo com Mueller-Dombois e Ellenberg (1974) e Martins (1993).

As espécies foram agrupadas em categorias sucessionais: pioneiras, secundárias iniciais e secundárias tardias, conforme a classificação proposta por Gandolfi et al. (1995) e utilizando-se como base os trabalhos de Martins e Rodrigues (2002) e Martins et al. (2002). Com relação às espécies não encontradas na literatura, a classificação baseou-se, quando possível, em observações de campo sobre sua ocorrência em diferentes ambientes das florestas da região.

Elaboraram-se histogramas de freqüência das classes de diâmetro para o conjunto de indivíduos vivos amostrados e para as seis espécies com maior valor de importância. O intervalo de classe ideal (IC) para cada situação foi calculado conforme as fórmulas apresentadas por Spiegel (1976).

IC = A / NC; NC = 1+3,3 log N, sendo A = amplitude de diâmetros; NC = nº de classes; e N = Nºde indivíduos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

No estrato arbustivo-arbóreo foram encontrados 969 indivíduos vivos e 41 mortos. Os vivos perfizeram 47 espécies, distribuídas em 39 gêneros e 23 famílias, resultando em uma densidade de 2.020 indivíduos/ha e uma área basal total de 6,57 m2. O diâmetro máximo encontrado foi de 29,30 cm e a altura máxima estimada, 20 m.

O índice de diversidade de Shannon (H') obtido foi de 2,75 nats/indivíduo, representando uma diversidade baixa quando comparada com florestas pouco perturbadas da região (MEIRA NETO et al., 1997; SEVILHA et al., 2001; IRSIGLER, 2002). Entretanto, a comparação torna-se mais confiável com áreas que apresentam histórico de degradação semelhante (MARTINS et al., 2002). Em áreas de mineração de bauxita recuperadas há 10 anos na Amazônia, o índice de diversidade (H') variou de 0,65 a 0,85 (PARROTA et al., 1997). Resultados semelhantes foram encontrados em área de mineração de ferro em Mariana, MG, onde os índices variaram de 0,91 a 1,17, de acordo com a idade do sítio (7 a 17 anos) e as espécies utilizadas para recuperação (ÂNGELO et al., 2002). Assim, o índice alcançado neste trabalho pode ser considerado alto, levando-se em conta que a única intervenção antrópica de recuperação foi o isolamento da área. Corrobora esse fato a tendência de distribuição eqüitativa dos indivíduos pelas espécies, expressa pelo valor de equabilidade (J = 0,71). Entretanto, apesar de esse valor ser considerado relativamente alto, três espécies (Piptadenia gonoacantha, Luehea grandiflora e Anadenanthera peregrina) respondem por 53,7% dos indivíduos vivos da área.

Pode-se considerar, contudo, que a área detém heterogeneidade florística considerável, composta pelas 44 espécies restantes, que estão representadas por poucos indivíduos jovens. Isso pode ser comprovado mais adiante, quando se comparam o número de espécies e a densidade com que elas ocorrem. Nesse aspecto, pode-se sugerir que a recuperação da vegetação na área está ocorrendo de forma a propiciar o ingresso de novas espécies.

As famílias com maior número de indivíduos foram Leguminosae, com 424 (Mimosoideae, 315; Papilionoideae, 107; Caesalpinioideae, 2), Tiliaceae (209), Annonaceae (104) e Cecropiaceae (67). As três subfamílias de Leguminosae juntas foram as mais ricas, com 11 espécies e nove gêneros. Completam a seqüência Annonaceae, Melastomataceae, Bignoniaceae, Euphorbiaceae e Lauraceae, com três espécies cada. As famílias restantes foram representadas por apenas uma espécie (Quadro 2). A riqueza observada na área pode ser explicada pela presença de muitas espécies ocorrendo em baixas densidades, o que, segundo Hartshorn (1980), é uma característica de florestas tropicais. Esse aspecto já vem sendo estudado e incorporado em modelos de restauração (KAGEYAMA et al., 1994).


O destaque das leguminosas na área é mais um fato que comprova o papel importante que exercem em ambientes degradados, por atuarem como ativadoras e reguladoras dos recursos disponíveis, permitindo o estabelecimento de espécies mais exigentes (CAMPELLO, 1998). Assim, a presença dessa família entre as mais importantes pode estar contribuindo não só para a regeneração natural da vegetação, mas também para a melhora das condições edáficas, particularmente através da fixação biológica de nitrogênio.

As espécies amostradas com os respectivos parâmetros fitossociológicos e categorias sucessionais estão representadas no Quadro 1. Foram excluídos da amostragem dois indivíduos remanescentes de grande porte de P. gonoacantha e dois de A. peregrina, por já existirem na área (pastagem) anteriormente à deposição do estéril. Apesar da importância desses quatro indivíduos no processo de regeneração florestal, como fonte de diásporas e sombra e por servirem de poleiro para a avifauna, sua inclusão nas análises poderia mascarar a interpretação dos resultados de estrutura da vegetação colonizadora pós-degradação.


Piptadenia gonoacantha, Luehea grandiflora e Anadenanthera peregrina foram as espécies mais expressivas em termos de valor de importância (VI), detendo juntas 44,8% desse valor. Na seqüência, as espécies que completaram as 10 com maior VI foram: Cecropia glaziovii, C. hololeuca, Xylopia brasiliensis, Dalbergia nigra, Machaerium nyctitans, Casearia sylvestris e Xylopia sericea que perfazem 29,3% do VI. As 10 espécies mais importantes são as mesmas que ocuparam as primeiras posições de valor de cobertura (VC). O restante das espécies contribuiu com 25,9% do VI.

P. gonoacantha ocupou a primeira posição em VI, em virtude da combinação dos elevados valores de densidade (20,50%), freqüência (10,05%) e dominância (34,26%). Apesar de L. grandiflora apresentar densidade ligeiramente maior (20,69%), sua segunda posição em VI deve-se aos valores de freqüência (9,35%) e, principalmente, à dominância (14,21%), cujo valor foi menor que a metade da primeira colocada. A. peregrina ocupa a terceira posição em VI, por apresentar valores díspares e intermediários entre as duas primeiras espécies, principalmente na densidade (10,40%) e na freqüência (8,88%), já que sua dominância (6,08%) é baixa. Em seguida, verificam-se valores menores e menos contrastantes, com os quais as espécies se alternam. Uma ligeira exceção é percebida para X. brasiliensis, sexta em VI, cuja densidade (5,94%) excede a das demais, entretanto sua dominância é baixa (3,45%). Fato inverso ocorre com C. hololeuca, quinto VI, destacando-se pela baixa densidade (2,48%) e por exibir a terceira maior dominância (8,78%).

Em um estudo sobre a sucessão em área de Mata Atlântica sobre solos calcários, Alto Ribeira, SP, Piptadenia gonoacantha foi também a espécie mais importante, sendo considerada um competidor superior naquele tipo de ambiente, deslocando Tibouchina pulchra, que é geralmente encontrada na sucessão inicial da floresta Atlântica em solos ácidos (AIDAR et al., 2001).

Na distribuição das espécies em categorias sucessionais, as secundárias iniciais predominaram em número de indivíduos e espécies, ficando as pioneiras um pouco abaixo (Figura 1). As espécies secundárias tardias contribuíram com baixos valores porcentuais, tanto para espécies quanto para indivíduos.


A concentração de indivíduos e espécies nos estádios iniciais de sucessão, 98,14% e 85,10%, respectivamente, indica que a comunidade estudada se encontra em uma etapa seral pioneira. Esse fato é também comprovado pela presença das famílias Cecropiaceae e Melastomataceae, ocupando as primeiras posições em VI. A relação do predomínio de espécies pioneiras com o desenvolvimento da estrutura da floresta vem confirmar algumas das características mais marcantes desse grupo ecológico, como o rápido crescimento e o ciclo de vida curto (BUDOWSKI, 1965). No entanto, o sombreamento proporcionado pelo dossel já está possibilitando a regeneração de espécies de etapas serais mais avançadas, como Siparuna guianensis e Coutarea hexandra, aproximamdo-se do modelo de facilitação (CONNEL e SLATYER, 1977). Esse avanço da sucessão também pode ser demonstrado pela presença da família Lauraceae dentre as mais representativas, considerada indicativa da passagem da floresta pioneira para um estádio sucessional mais avançado no domínio da Floresta Atlântica (TABARELLI et al., 1994), juntamente com Meliaceae, que neste trabalho apresentou apenas um indivíduo.

Resultados semelhantes foram obtidos em outros estudos de florestas jovens, com histórico de regeneração florestal em pastagens degradadas (MARTINS et al., 2002; RIBAS et al., 2003).

A distribuição dos indivíduos em classes de diâmetros, considerando todas as espécies, apresentou-se na forma de "j"-invertido, de acordo com a descrição feita por Meyer (1952) (Figura 2). Observa-se, nessa figura, uma concentração de indivíduos na primeira classe diamétrica, reunindo 44% do número total. Esse contingente reúne a regeneração das espécies presentes nos estratos superiores da floresta, beneficiadas pelas alterações ambientais decorrentes do avanço da sucessão secundária (SEVILHA et al., 2001). Há um decréscimo gradual no número de indivíduos em direção às classes superiores, refletindo um estande florestal composto, em sua maioria, por populações jovens, em pleno desenvolvimento, visto que o critério de inclusão adotado (CAP >10 cm) permitiu a amostragem também do estrato de regeneração avançada.


A distribuição das classes diamétricas das seis espécies de maior VI é apresentada na Figura 3. Luehea grandiflora, Piptadenia gonoacantha e Cecropia glaziovii foram as únicas espécies, dentre as seis, que apresentaram distribuição gradual entre as classes de diâmetro, evidenciando que suas populações estão aparentemente sem problemas de regeneração e conservação na floresta.


Anadenanthera peregrina e Xylopia brasiliensis apresentaram distribuições desbalanceadas, com grande concentração de indivíduos nas classes menores. Isso pode estar relacionado a diversos fatores, incluindo o ingresso mais tardio na comunidade, crescimento mais lento e dificuldade de recrutamento de adultos. No entanto, pode-se sugerir que essas espécies terão suas participações garantidas ao longo da dinâmica sucessional dessa vegetação, por apresentar mais indivíduos nas classes diamétricas menores.

Um comportamento distinto foi encontrado em Cecropia hololeuca, que apresentou distribuição normal, comportamento típico de pioneira, o que pode indicar sua substituição no processo sucessional. Espécies de Cecropia são dependentes de alta relação vermelho/vermelho extremo da luz espectral para a germinação das sementes (VÁLIO e JOLY, 1979; VAZQUEZ-YANES e OROZCO-SEGOVIA, 1987). Com o sombreamento produzido pelo dossel, essa condição não deve estar sendo atingida, o que explicaria o baixo recrutamento de C. hololeuca.

A regeneração natural como medida de restauração de áreas degradadas é indicada por Gandolfi e Rodrigues (1996), para áreas pouco perturbadas. A intervenção antrópica nesse caso é o isolamento da área, adotada em conjunto com práticas de controle de espécies de lianas ou pioneiras agressivas, como gramíneas. No caso da área de estudo, a regeneração florestal ocorreu mesmo a área apresentando alterações em suas características bióticas e edáficas, fato verificado também em área degradada por mineração de ouro em Matupá, MT (RODRIGUES et al., 2004).

O avanço da regeneração natural na área de estudo pode ser, atribuído dessa forma, a um conjunto de fatores e suas interações, que foram decisivos para a recuperação da área. A presença de quatro indivíduos remanescentes de grande porte de P. gonoacantha e A. peregrina, que possivelmente serviram de poleiros para aves e também como fontes de diásporas, contribuiu para a chuva de sementes no local. Árvores remanescentes em paisagens degradadas funcionam como locais de pouso durante o deslocamento de pássaros entre fragmentos do entorno, podendo contribuir com a sucessão secundária nessas áreas (GUEVARA et al., 1986).

Aliado a isso, devem-se considerar também a existência de fragmentos de Floresta Estacional Semidecidual próximos à área e a sua exposição voltada para o leste, recebendo, assim, insolação direta apenas pela manhã e, conseqüentemente, mantendo o solo mais úmido. A proximidade de fontes de diásporas tem sido considerada fator-chave para o processo de colonização vegetal de áreas degradadas (RODRIGUES et al., 2004).

4. CONCLUSÕES

As espécies mais adaptadas a esse tipo de ambiente, considerando-se os valores de importância mais altos, e que podem ser indicadas para recuperação de áreas degradadas semelhantes são Piptadenia gonoacantha, Luehea grandiflora, Anadenanthera peregrina, Xylopia brasiliensis, Dalbergia nigra e Machaerium nyctitans.

O isolamento da área dos fatores de degradação, como entrada de gado bovino, extração de lenha e ocorrência de fogo, bem como a proximidade de fontes de diásporas, auxiliou a recuperação da área degradada.

5. AGRADECIMENTOS

À FAPEMIG, pelo financiamento do projeto (Processo: EDT-2186/2003), ao CNPq, pela bolsa de Produtividade em Pesquisa de Sebastião Venâncio Martins e a CAPES pela concessão da bolsa de mestrado.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em 21.12.2004 e aceito para publicação em 10.11.2005.

  • AIDAR, M. P. M. et al. Atlântic Forest succession over calcareous soil, Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira PETAR, SP. Revista Brasileira de Botânica, v.24, n.4, p.455-469, 2001.
  • ÂNGELO, J.G.M. et al. Diversidade vegetal em áreas em reabilitação de mineração de ferro, na mina de alegria, em Mariana, MG. Revista Árvore, v.26, n.2, p.183-192, 2002.
  • BARTH, R. C. Avaliação da recuperação de áreas mineradas no Brasil Viçosa: UFV, 1989. 41p. (Boletim Técnico SIF, 1).
  • BUDOWSKI, G. Distribution of tropical american rain forest species in the Light of successional processes. Turrialba, v.15, n.1, p.40-42, 1965.
  • CAMPELLO, E. F. C. Sucessão vegetal na recuperação de áreas degradadas. In: DIAS, L.E.; MELLO. J,W. (Ed.). Recuperação de áreas degradadas Viçosa, MG: UFV, SOBRADE, 1998. p.184-196.
  • CONNEL, J.H.; SLATYER, R.O. Mechanisms of succession in natural communities and their role in community stability and organization. The Americam Naturalist, v. 111, n.982, p. 1119-1144, 1977.
  • CRONQUIST, A. The evolution and classification of flowering plants New York: The New York Botanocal Garden, 1988. 555p.
  • GANDOLFI, S.; RODRIGUES, R.R. Recomposição de Florestas: Algumas Perspectivas Metdológicas para o Estado de São Paulo. In: CURSO DE ATUALIZAÇÃO, 3.,1996, Curitiba. Recuperação de Áreas Degradadas Curitiba: 1996. p.83-100, 1996.
  • GANDOLFI, S.; LEITÃO FILHO, H. F.; BEZERRA, C. L. F. Levantamento florístico e caráter sucessional das espécies arbustivo-arbóreas de uma floresta semidecídua no município de Guarulhos, SP. Revista Brasileira de Biologia, v. 55, p.753-767, 1995.
  • GUEVARA, S.; PORATA, S. E.; van der MAAREL, E. The role of remnant forest trees in tropical secondary succession. Vegetation, v.66, p.77-84, 1986.
  • HARTSHORN, G. S. Neotropical forest dynamics. Biotropica, v.12, p.23-30, 1980. (Suplemento).
  • IRSIGLER, D. T. Composição florística e estrutura de um trecho primitivo de Floresta Estacional Semidecidual em Viçosa, MG 2002. 64f. Dissertação (Mestrado em Botânica) Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2002.
  • JOHNSON, F. L.; GIBSON, D. J.; RISSER, P. G. Revegetation of unreclaimed coal strip-mines in Oklahoma. Journal of Applied Ecology, v.19, p. 453-463, 1982.
  • JOLY, A.B. Botânica: introdução à taxonomia vegetal. 6. ed. São Paulo: Nacional, 1983. 777p.
  • KAGEYAMA, P.Y., et al. Revegetação de áreas degradadas: modelos de consorciação com alta diversidade. In: SIMPÓSIO SUL-AMAREICANO, 1., SIMPÓSIO NACIONAL, 2.,1994, Curitiba. Recuperação de Áreas Degradadas, Foz do Iguaçu Curitiba: FUPEF, 1994. p.569-576.
  • LORENZO, J. S. Regeneração natural de uma área minerada de bauxita em Poços de Caldas, Minas Gerais 1991. 151f. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 1991.
  • LORENZO, J. S. et al. A fitosociologia para recuperar área de lavra. Revista Ambiente, v.8, n.1, p.26-34, 1994.
  • LUGO, A. E. The apparent paradox of reestablishing species richness on degraded lands with tree monocultures. Forest Ecology and Management, v.99, p.09-19, 1997.
  • MARTINS, F. R. Estrutura de uma floresta mesófila Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 1993. 246p.
  • MARTINS, S. V.; RODRIGUES R. R. Gap-phase regeneration in semideciduous mesophytic forest, south-eastern Brazil. Plant Ecology, v.163, p.51-62, 2002.
  • MARTINS, S. V.;COUTINHO, M. P.; MARANGON, L. C. Composição florística e estrutura de uma floresta secundária no município de Cruzeiro, SP. Revista Árvore, v.26, n. 1, p.35-41, 2002.
  • MEIRA NETO, J. A. A. et al. Estrutura de uma floresta estacional semidecidual submontana em área diretamente afetada pela usina hidrelétrica de Pilar, Ponte Nova, Zona da Mata de Minas Gerais. Revista Árvore, v.21, n.3, p.338-344, 1997.
  • MEYER, H.A. Structure, growth and drain in balanced ineven-aged forest. Journal of Forest, n.50, p.85-92, 1952.
  • MUELLERDOMBOIS, D.; ELLENBERG, H. Aims and methods of vegetation ecology New York: John Wiley & Sons, 1974. 547p.
  • NATALI, P. P.; VIANA, R. F.; FORTES, V. M. Proposta para recuperação ambiental da área de cava e adjacências da mineração de caulim na fazenda Boa Esperança, em Brás Pires MG. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS, 3.,1997,Ouro Preto. Anais Viçosa, MG: UFV, 1997. p. 214-224.
  • PARROTA, J. A.; KNOWLES, O. H.; WUNDERLEJR, J. M. Development of floristic diversity in 10-year-old restoration Forest on a bauxite mined site in Amazônia. Forest Ecology and Management, v.99, p.21-42, 1997.
  • PIELOU, E. C. Ecological diversity New York: John Wiley & Sons, 1975. 165p.
  • RIBAS, R.F. et al. Composição florística de dois trechos em diferentes estapas serais de uma floresta estacional semidecidual em Viçosa, Minas Gerais. Revista Árvore, v.27, n.6, p.821-830, 2003.
  • RODRIGUES, R. R.; GANDOLFI, S. Restauração de florestas tropicais: subsídios para uma definição metodológica e indicadores de avaliação e monitoramento. In: DIAS, L.E.; MELLO. J,W. (Ed.). Recuperação de áreas degradadas. Viçosa, MG: UFV, SOBRADE, 1998. p.203-215.
  • RODRIGUES, R. R.; MARTINS, S. V.; NAPPO, M. E. Recuperação de fragmentos florestais degradados. Ação Ambiental, v.2, n. 10, p. 21-23, 2000.
  • RODRIGUES, R. R.; MARTINS, S. V.; BARROS, L. C. Tropical rain Forest regeneretion in area degraded by mining in Mato Grosso State, Brazil. Forest Ecology and Management, v.190, p. 323-333, 2004.
  • SEVILHA, A. C. et al. Fitossociologia do estrato arbóreo de um trecho de Floresta Estacional no jardim botânico da Universidade Federal de Viçosa (face sudoeste), Viçosa, MG. Revista Árvore, v.25, n. 4, p.431- 443, 2001.
  • SHEPHERD, G. J. Fitopac 1, manual do usuário Campinas: UNICAMP, 1996. 96p.
  • SKOUSEN, J. G.; JOHNSON, C. D.; GARBUTT, K. Natural revegetation of 15 abandoned mine land sites in west Virginia. Journal Environmental Quality, v. 23, p. 1224-1230, 1994.
  • SPIEGEL, M. R. Estatística São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1976. 580p.
  • TABARELLI, M.; VILLANI, J.P.; MANTOVANI, W. Estudo comparativo da vegetação de dois trechos de floresta secundária no Núcleo Santa Virgínia, Parque Estadual da Serra do Mar, SP. Revista do Instituto Florestal, v.6, p.1-11, 1994.
  • VÁLIO, I.F.M.; JOLY, C.A. Light sensitivity of the seeds on the distribuition of Cecropia glaziovii Sneth Lage (Moraceae). Z.Pflanzenphysil, v.91, p. 371-376, 1979.
  • VAZQUEZ-YANES, C.; OROZCO SEGOVIA, A. Ligth gap detection by the photoblastic sedes of Cecropia obtusifolia and Piper auritum, two tropical rain forest trees. Biological Plantarum, v. 29, p. 234-236, 1987.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Abr 2006
  • Data do Fascículo
    Fev 2006

Histórico

  • Recebido
    21 Dez 2004
  • Aceito
    10 Nov 2005
Sociedade de Investigações Florestais Universidade Federal de Viçosa, CEP: 36570-900 - Viçosa - Minas Gerais - Brazil, Tel: (55 31) 3612-3959 - Viçosa - MG - Brazil
E-mail: rarvore@sif.org.br