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A IMPORTÂNCIA CLÍNICA DOS ACHADOS DO EXAME FÍSICO DO APARELHO CARDIOVASCULAR

Resumo:

Este trabalho verificou, através de uma revisão bibliográfica, a credibilidade e a importância clínica dos achados de exame físico do aparelho cardiovascular. Detectando, inclusive, a etiologia e as estratégias para minimizar ou previnir a discordância clínica.

Observa-se a espantosa acurácia do exame físico em certas ocasiões; e, em outras, a pobre correlação dos achados de exame físico com os estudos de imagem.

Summary:

This work related, through a bibliographic review, the credibility and clinic importance of the findings of physique exam of the cardiovascular system. Detecting including the etiology and strategies to minimize or forewarm the clinic disagreement.

It observes the remarkable accuracy of the physique exam in some occasions; and in another opportunities, the poor correlation of the fidings of physique exam with the findings of image studies.

1. Introdução

Os nossos primeiros momentos com um paciente são cheios de informações visuais, auditivas e táteis, que determinam tanto a eficácia, como os custos do tratamento subseqüente. De todos os diagnósticos que podem ser feitos, uma parte é feita durante a história e outra durante o exame físico. Por exemplo, Crombie44 ) CROMBIE, D.L. Diagnostic process. J. Coll. Gen. Pract., 6: 579-89, 1983 documentou que 88% dos diagnósticos na primeira consulta são estabelecidos ao final de uma breve anamnese e algumas sub-rotinas de exame físico. Igualmente, Sandler4444 ) SANDLER, G. - The importance of the history in the medical clinic and the cost of unnecessary tests, Am. Heart J. , 100 (part1): 928-31, 1980. concluiu que 56% dos pacientes em clínicas médicas gerais estão sendo avaliados com diagnósticos corretos ao final de suas histórias e esse número aumenta para 73% no final do exame físico.

Não é de estranhar que obter uma história clínica precisa e realizar um exame físico apropriado são elementos venerados na arte da Medicina; constituindo a melhor série de “testes” diagnósticos que possuímos. Além disso, um novo gênero de texto médico evoluiu, documentando a precisão, sensibilidade e especificidade, não apenas das análises químicas, microbiológicas mas, também, de achados de exame físico e de imagens diagnósticas. Se o exame clínico está para ser usado, deve ser avaliado com o mesmo rigor que são testadas as técnicas de laboratório, mas existem dificuldades4343 ) SACKETT, D.L. The science of the art the clinical examinationJAMA , 267: 2650-2, 1992.. Primeiro, as investigações sobre precisão e exatidão da história médica e do exame físico são desafiadores no planejamento e difíceis na execução. Em segundo lugar, um diagnóstico clínico raramente reside em um só sintoma, ou sinal, mas emerge da configuração de vários sintomas ou sinais. Em terceiro lugar, a grande variabilidade de respostas intra-observador. Quarto, existem muitos incentivos financeiros que recompensam o clinico que usa alta tecnologia, especialmente na confirmação de diagnósticos já bem estabelecidos pelo exame clínico. Quinto, a rápida evolução da tecnologia pode levar a uma confiança excessiva nas novas técnicas diagnósticas, conduzindo a muitos erros.

Apesar das dificuldades acima citadas, o papel do diagnóstico clínico tem sido avaliado. Qual o papel do diagnóstico através do exame clínico em uma era em que os diagnósticos laboratoriais, ultra-sonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética estão em plena expansão? O exame físico tem ainda valor na indumentária do médico moderno? A maioria dos médicos ainda acredita que a história e o exame físico tem valor no diagnóstico1111 ) FITZGERALD, F.T. Physical diagnosis versus modem technology - A review. West. J. Med. 152: 377-82; 1990.),(1717 ) HAMPTON J.R., HARRISON M.J., MITCHELL J.R, et al. Relative contributions of history - talking, physical examination and laboratory investigation to diagnosis and management of medical out patients - Brit. Med. J. 2: 486-9, 1975.),(2727 ) LEVIN B.E. - The Clinical significance of spontaneous pulsations of the retinal vein. Arch Neurol., 35: 37-40, 1978.),(3939 ) RICH, E.C.; CROWBON, T.W.; HARRIS, I.B. - The diagnostic value of the medical history - Perceptions of internal medicine physicians. Arch Intern Med., 147: 1957-60, 1987.),(4343 ) SACKETT, D.L. The science of the art the clinical examinationJAMA , 267: 2650-2, 1992.),(4444 ) SANDLER, G. - The importance of the history in the medical clinic and the cost of unnecessary tests, Am. Heart J. , 100 (part1): 928-31, 1980..

Além disso, os avanços tecnológicos têm aumentado enormemente as capacidades diagnósticas. Somente 9% das pessoas com prolapso de válvula mitral, documentados pela ecocardiografia, tem achados físicos da doença4545 ) SAVAGE, D.D.; DEVEREUX, R.B.; GARRISON, R.J; et al. - Mitral Valve prolapse in the general population. 2 Clinical features: the framingham study. Am. Heart. J. 106: 577-81, 1983.

As habilidades do médico para o diagnóstico através do exame físico está abaixo do ideal e isto preocupa as instituições de ensino médico em todo o mundo, levando a mudanças curriculares3535 ) NOEL G.L.; HERBERS J.E. JR . et al. How Well do internal medicine faculty members evaluate the clinical skill of residents? Ann Intern. Med 117: 757-65 , 1992),(4444 ) SANDLER, G. - The importance of the history in the medical clinic and the cost of unnecessary tests, Am. Heart J. , 100 (part1): 928-31, 1980.. St. Lair et al4949 ) ST. CLAIR, E.W.; ODDONE, E.Z. et al. - Assessing Housestaff diagnostic skills using a cardiology patient simulator. Ann. Intrn. Med. 117: 751-6, 1992 . usando um simulador cardiológico “Harvey” para avaliar as habilidades quanto ao exame físico cardiológico de 63 “staffs” verificaram que o total de respostas corretas para três comuns doenças valvulares foram: 52% para regurgitação mitral, 37% para estenose mitral e 54% para regurgitação aórtica.

Os médicos dedicam grande parte de seu limita do tempo com novos testes diagnósticos: conhecendo-os, pedindo-os, seguindo os resultados e entendendo o que significam. Cabe aos educadores da área médica se atentarem para esse tema e buscarem a formação de uma nova geração de médicos que saiba utilizar de forma criteriosa as novas técnicas diagnósticas.

Este trabalho tem como objetivo, através de uma revisão bibliográfica, verificar a credibilidade e a importância clínica dos achados de exame físico do aparelho cardiovascular. Este estudo também pretende detectar a etiologia e as estratégias para prevenir ou minimizar a discordância clínica.

2. Discussão

2.1. Inspeção e Pressão Arterial

Os bens conhecidos achados de insuficiência cardíaca congestiva(ICC): galope ventricular, edema periférico, refluxo hepatojugular, cardiomelagia, edema pulmonar e distensão venosa jugular, embora sejam específicos (91 a 97%)tem uma percentagem de 10 a 31% de falsos negativos na detecção de disfunção sistólica do Ventrículo Esquerdo (VE). A baixa sensibilidade desses achados do exame físico na disfunção do VE vem sendo relatada5252 ) ZEMA, M.J.; RESTIVO, B., SOS, T. et al. - Left ventricular dysfunction - bedside valsalva maneuver revisited. Brit. Heart J., 44: 560-9, 1980.),(5353 ) ZEMA M.J. Heart failure and the bedside valsalva maneuver. Chest. 97: 772-3, 1990..

A combinação de pressão arterial diastólica, maior ou igual 105 mmHg, e a ausência de distensão venosa jugular tem uma especificidade próxima a 100% na identificação de pacientes com ICC com preservada função sistólica do VE, embora a sensibilidade da associação seja de 30%1414 ) GHALI, J.K., KADARIA, S., COOPER , R.S., LIAO, Y. Bedside diagnosis of preserved versus impaired left ventricular systolic in heart failure Am. J. Cardiol. 67: 1002-6, 1991..

O valor preditivo positivo dos achados clínicos (ortopnéia, edema periférico, B3, “Estertores Crepitantes”, distenção venosa jugular) e radiográficos (cardiomegalia, redistribuição do fluxo pulmonar, edema intersticial e derrame pleural) da insuficiência cardíaca congestiva foi alto, indicando que a presença desses sinais está associada com pressão capilar pulmonar elevada (> 20 mmHg). Entretanto, o valor preditivo negativo é pobre, e a ausência desses achados não garante uma pressão capilar pulmonar normal.22 ) CHAKKO, S., WOSKA, D. et al. Clinical, radiographic, and hemodynamic correlations in Chronic congestive heart failure: conflicting results may lead to inappropriate care. Am. J. Med. 90: 353 -9, 1991.

Esse estudo e outros demonstram que um significante número de pacientes com "insuficiência cardíaca controlada" tem elevadas pressões capilares pulmonares sem manifestações clínicas de congestão22 ) CHAKKO, S., WOSKA, D. et al. Clinical, radiographic, and hemodynamic correlations in Chronic congestive heart failure: conflicting results may lead to inappropriate care. Am. J. Med. 90: 353 -9, 1991.),(5050 ) STEVENSON, L.W.; PERLOFF, J.K. The limited reliability of physical sings for estimating hemodynamics in chronic heart feilure. JAMA , 261: 884-9, 1989..

Mais estudos são necessários para determinar se pacientes sem evidência clínica e radiológica de congestão, apesar de pressão capilar pulmonar elevada, têm um diferente prognóstico, e se a normalização da pressão capilar pulmonar traria algum benefício a esses pacientes.

Dimmittt et al66 ) DIMMITT, S.B., EAMES, S.M. et al Usefulness of ophthamoscopy in mild to moderate hipertension Lancet, 8647: 1103-6, 1989 . sugerem que a microalbumina urinária possa ser um indicador mais sensível do efeito vascular do aumento da pressão arterial que o exame de fundo de olho em hipertensos leves a moderados.

Vários estudos têm indicado que a prega do lobo da orelha possa ser uma marca de doença coronariana, Frank1313 ) FRANK, S.T. Aural sing of coronary artery disease. N. Engl. J. Med. 289: 327-8, 1973 foi o primeiro a sugerir. Outros estudos confirmaram1616 ) HAFT, J.I., et al., Correlation of ear cresae sign with coronary arteriographic findings. Cardiovascular Med. 4: 861-7, 1979.),(2525 ) KRISTENSEN, B.O. Earlobe crease and vascular complications in essencial hipertension. Lancet , 1: 265, 1980.),(2828 ) LICHSTEIN E. et al. Diagonal earlobe crease and coronary artery sclerosis. Ann. Intern Med. 85: 337-8, 1976.. Entretanto, certos estudos acharam que a praga do lobo da orelha está relacionada ao avanço da idade, hipertensão, elastose da derme e posição de dormir2525 ) KRISTENSEN, B.O. Earlobe crease and vascular complications in essencial hipertension. Lancet , 1: 265, 1980.),(3333 ) METHA, J; HAMBY, R.I. - Diagonal. earlobe crease as a coronary risk fator. N. Engl. J. Med. 291:260, 1974.),(4747 ) SCOTT, M. Ear. Creases, heart and smoking - N. Engl. J. Med. 290: 1205-6, 1974.

2.2 Palpação e percussão

A percussão do precórdio para detectar cardiomegalia é recomendada nos livros textos de semiótica55 ) DEGOWIN, E.L. DEGOWIN, R. L. Tórax e o aparelho cardiovascular - In: Degowin diagnóstico clínico. 5ª edição, Rio de Janeiro, Editora Médica e Científica, 1990, p.238-41.; entretanto, livros textos de cardiologia99 ) EDDLEMAN, E.E. Exame dos movimentos precordiais. In: Hurst, o coração. 3a edição, Rio de Janeiro , 1977, p. 179 - 83. afirmam que a percussão adiciona pouca informação além do que é conseguida pela palpação precordial (exceto para identificar situs inversus com dextrocardia) ou não mencionam isto ao descreverem o exame cardíaco. Os médicos geralmente não fazem percussão precordial para avaliar tamanho cardíaco, porque eles acreditam que o método é de baixa acurácia.2929 ) LOPEZ, M. Inspeção e palpação da região precodial In: Mário López. Semiologia Médica, 3ª ed. São Paulo, Livraria Atheneu Editora, Livraria Interminas, 1990, p.284.

Com relação à percussão, dentre os pacientes sem deformidades da caixa torácica e sem achados torácicos de doença pulmonar obstrutiva crônica, a percussão do 5° espaço intercostal esquerdo discrimina com alta acuracidade pacientes com ou sem cardiomegalia e adiciona informação além da obtida pela história clínica e do exame físico de outras regiões. Além disso, Meckerling et al concluiram que uma distância do ictus através da palpação à linha médio-esternal maior que 10 cm é acuraz na discriminação de cardiomegalia do coração normal, com uma sensibilidade de 91,7% e uma especificidade de 87,7%2020 ) HECKERLIN G.P.S., WIENER, S.L. et al. Am. J. Med. , 91: 328-34, 1991..

Com relação à palpação, Meade et al3232 ) MEADE, T.W.; GARDNER, M.J.; CANNO N.P.; RICHARDSON, P.C. - Observer variability in recording the peripheral pulsus. Brit Heart J., 30: 661-5, 1968. determinaram que a concordância entre os observadores na palpação dos pulsos periféricos alcançou níveis satisfatórios. E que a variabilidade inter-observador caia com a prática. Sendo um método, portanto, de reprodutividade adequada.

A etiologia da discordância clínica pode estar no examinador, no examinado ou no exame4141 ) SACKETT, D.L. - Clinical disagreement: How often it occurs and why. Can Med. Assoc. J., 123: 499-504, 1980.

Quanto ao examinador:

  1. a variação biológica nos sentidos. Isto tem sido melhor mostrado em estudos, contrastando como a performance médica pode variar quando os médicos estão cansados ou descansados;

  2. tendência a registrar a inferência (dedução) em vez da evidência;

  3. esquemas de classificação;

  4. tendência de encontrar o que nós antecipadamente esperarmos.

Quanto ao exame:

  1. o ambiente em que o exame é feito pode interferir nos sentidos, e a privacidade faz com que o paciente se sinta mais seguro para relatar fatos;

  2. interação entre o médico e o paciente;

  3. uso incorreto ou defeito no aparelho.

As estratégias para previnir ou minimizar a discordância clínica são:1919 ) HAYNES, R.B. Clinical disagreement: How to avoid it and how to learn from one's mistakes. Can Med. Assoc. J., 123: 613-7, 1980.

  • Selecionar um lugar com luz apropriada, calor, silêncio e privacidade para o exame e a coleta da história.

  • Procurar a confirmação dos achados chaves: repetir os elementos chaves do exame; confirmação de importantes achados com dados de prontuário, testemunhas e testes apropriados. Pedir a opinião dos colegas ao examinar seu paciente, exemplo: “ausculte o coração deste paciente e diga-me o que você acha”, ao invés de “eu acho que este homem tem estenose aórtica, ausculte e veja se você concorda”.

  • Avaliação dos dados dos testes laboratoriais omitindo a informação da história e do exame físico. Para evitar os efeitos da expectativa prévia.

  • Registrar as evidências, os resultados e as conclusões.

  • Usar auxílio técnico apropriado.

  • Criar uma agradável relação médico- paciente.

2.3 Ausculta cardíaca

Estudos têm mostrado claramente a precisão da ocorrência simultânea de doença cardíaca e eventos acústicos, isto comprovado por ecocardiografia e fonocardiografia. Por exemplo, B3 pode ser uma indicação de coração saudável quando detectada em um indivíduo jovem e saudável, mas considerada de ruim prognóstico quando auscultada em um paciente doente2222 ) JORDAN, M.D., TAYLOR, C.R., NYHUIS , A.W., TAVEL, M.E. Audibility of the fourth heart sound relationship to presence of disease and examiner experience. Arch Intern. Med., 147: 721-6, 1987..

O método Doppler é aparentemente uma forma ideal de investigar a origem dos murmúrios, pois este depende da velocidade do fluxo, um dos componentes essenciais na gênese do murmúrio. Entretanto, a concordância entre o sinal Doppler e o murmúrio não é total. Regurgitação sem importância clínica pode ser detectada pelo Dopller quando o murmúrio não é audível. Contrariamente, algumas vezes os murmúrios audíveis podem não ser demonstrados devido à incapacidade do médico de posicionar o transdutor no ápice do fluxo.

Jordan et a12222 ) JORDAN, M.D., TAYLOR, C.R., NYHUIS , A.W., TAVEL, M.E. Audibility of the fourth heart sound relationship to presence of disease and examiner experience. Arch Intern. Med., 147: 721-6, 1987. concluiram que o B4 audível determina evidência de cardiopatia e a amplitude, o tamanho e a palpabilidade aumentam com a gravidade da doença cardíaca. A experiência do examinador aumenta a especificidade do achado de B4. Geralmente examinadores menos experientes confundem desdobramento de B1 com a presença de B4.

TABELA 1
AVALIAÇÃO DAS MANOBRAS REALIZADAS POR LEMBO ET AL2626 ) LEMBO, N.J., DELLI'ITALIA, L.J., CRAWFORD, M.H. O'ROURKE, R.A. Bedside diagnosis of systolic murmurs. N. Engl. J. Med. 318: 1572-1578, 1988.

Livros textos de semiótica e de cardiologia, assim como artigos sobre ausculta cardíaca, recomendam o uso de manobras à beira do leito em pacientes com sopros sistólicos, mas não definem a sua acurâcia diagnóstica.

Lembo et al2626 ) LEMBO, N.J., DELLI'ITALIA, L.J., CRAWFORD, M.H. O'ROURKE, R.A. Bedside diagnosis of systolic murmurs. N. Engl. J. Med. 318: 1572-1578, 1988. conduziram um trabalho em que as manobras à beira do leito foram usadas para avaliar 50 pacientes em um estudo duplo-cego. A lesão responsável pelo sopro foi confirmada pela cateterização cardíaca (em 41 pacientes, 82%) e ecocardiografia (9 pacientes, 18%). Os 50 pacientes foram avaliados por dois cardiologistas que não conheciam a identificação do paciente, diagnóstico clínico, localização do estetoscópio na parede torácica, posição do paciente, a manobra que estava sendo feita e os achados do outro cardiologista. Os pacientes eram treinados para fazerem as manobras, e um terceiro médico perguntava aos cardiologistas, para comparar a intensidade do murmúrio, antes e durante a manobra (se diminuia, aumentava ou permanecia igual).

Os murmúrios do lado direito variam com o retorno venoso. A inspiração diminui a pressão intratorácica e aumenta o retorno venoso, resultando em um aumento na intensidade dos murmúrios do lado direito. Em contraste, os murmúrios do lado direito diminuem durante a expiração.

A manobra de Müller não é util na identificação de murmúrios do lado direito.

O murmúrio da cardiomiopatia hipertrófica depende do volume de sangue no ventrículo esquerdo. Quando o volume está reduzido (como na manobra de valsalva e agachamento para posição ereta), o septo e a válvula aproximam-se resultando em um aumento do estreitamento do fluxo para o ventrículo esquerdo e consequente aumento do murmúrio da cardiomiopatia hipertrófica. Quando o volume está aumentado (como na manobra da posição ereta para agachamento, elevação passiva da perna, aperto das mãos), o murmúrio da cardiomiopatia hipertrófica diminui.

O murmúrio da regurgitação mitral e defeito do septo ventricular têm respostas similares a todas as manobras. As manobras mais úteis para distingüir esses dois murmúrios dos outros são: aperto de mão isométrico, oclusão arterial transitória e inalação de nitrato de amila. As duas primeiras manobras aumentam esses murmúrios enquanto a última diminui.

Embora os murmúrios de regurgitação mitral e defeito do septo ventricular não possam ser distinguíveis por essas manobras, a presença de um frêmito sistólico na borda esternal esquerda inferior favorece o diagnóstico de defeito do septo ventricular e urna irradiação do murmúrio para a axila favorece o diagnósticos de regurgitação mitral.

Nenhuma manobra é 100% acuraz no diagnóstico da causa do murmúrio sistólico, mas a combinação de respostas a várias manobras ajuda a estabelecer o diagnóstico acuraz da origem do murmúrio2626 ) LEMBO, N.J., DELLI'ITALIA, L.J., CRAWFORD, M.H. O'ROURKE, R.A. Bedside diagnosis of systolic murmurs. N. Engl. J. Med. 318: 1572-1578, 1988..

Há 20 anos atrás, antes do disseminado uso da alta tecnologia para o diagnóstico de doenças cardíacas, Pestana et al3636 ) PESTANA, C.; WEIDMAM W.H. et al. Accuracy of preoperative diagnosis in congenital heart disease. Am. Heart J. 72: 446-50, 1966. encontraram que, em pacientes com doença cardíaca congênita, 80% dos diagnósticos clínicos foram confirmados na cirurgia. Nos 20% restantes o diagnóstico clínico foi confirmado, mas uma lesão adicional não suspeitada estava presente na cirurgia. E em apenas 3,7% a lesão adicional fez uma diferença importante (mudando o procedimento cirúrgico).

Um estudo sobre a utilidade do M-Mode ecocardiografia, raio X de tórax, e eletrocardiografia na detecção da presença de doença cardíaca em crianças verificou-se que os 3 testes não modificaram o diagnóstico do tipo de cardiopatia feito pelo exame clínico3434 ) NEWBERGER , J. W; ROSENTHAL A. et al. Noninvasive tests in the initial evaluation of heart murmurs in children. N. Engl. J. Med. 308: 61-4, 1983..

O valor do exame clínico não é um valor nostálgico de médicos saudosistas, e sim real. Principalmente em países como o nosso, em que os recursos financeiros se tornam cada vez mais escassos.

Conclusão

A credibilidade de muitos sinais, procedimentos e decisões diagnósticas e terapêuticas nunca foram estudadas. Quanto aos estudos disponíveis, muitos são limitados pelo pequeno e não representativo número de médicos, muitos falham no uso das estatísticas e muitos não revelam a experiência e o treinamento dos participantes.

Está claro que o melhor para o paciente é uma criteriosa combinação de uma história e exame físico cuidadosos com as técnicas laboratoriais. O exame físico tem algumas claras vantagens sobre os estudos laboratoriais, permite uma importante interação médico-paciente, maior autonomia do médico nos procedimentos diagnósticos, e menores gastos de tempo e de dinheiro com exames complementares desnecessários. Ao mesmo tempo, certas técnicas de exame físico, estão sendo questionadas quanto à validade, comparáveis a certas técnicas de diagnóstico tecnológico.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 1994
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