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QUAL O SEU DIAGNÓSTICO? WHICH IS YOUR DIAGNOSIS?

Adriana Dias BarranhasI; Monica Silva Costa Janson NeyII; Marcelo AlvesIII; Alair Augusto Sarmet Moreira Damas dos SantosIV; Marcelo Souto NacifIV

IMestrado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Médica Radiologista do Hospital de Clínicas de Niterói, Niterói, RJ, Brasil

IIChefe do Serviço de Radiodiagnóstico do Hospital Naval Marcílio Dias (HNMD), Rio de Janeiro, RJ, Brasil

IIIChefe do Departamento de Radiologia do Hospital Naval Marcílio Dias (HNMD), Rio de Janeiro, RJ, Brasil

IVProfessores Doutores do Departamento de Radiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dra. Adriana Dias Barranhas. Travessa Olavo Bastos, 62, ap. 301, São Francisco. Niterói, RJ, Brasil, 24360-240. E-mail: diasbarranhas@gmail.com.

Paciente do sexo masculino, 40 anos de idade, deu entrada na emergência com queixa de hematúria macroscópica. História de nefrolitíase de repetição e de tomografia computadorizada (TC) prévia, em outra instituição, que demonstrou cálculos sem outros achados específicos. Foi encaminhado para realização de nova TC, que evidenciou a nefrolitíase bilateral e leve dilatação do sistema coletor à esquerda (Figura 1).


Descrição das imagens

Figura 1(A–E). Tomografia computadorizada após a administração do meio de contraste intravenoso. A: Veia cava inferior posicionada à esquerda recebendo a veia renal esquerda. B: Veia cava inferior se posicionando da esquerda para a direita anteriormente à aorta. C: Veia cava inferior posicionada à direita após recebimento da veia renal direita. D: Veia gonadal direita ectasiada. E: Nefrolitíase à esquerda.

Diagnóstico: Veia cava inferior esquerda com leve compressão do ureter propiciando a estase e formação de cálculo.

COMENTÁRIOS

Anomalias da veia cava inferior (VCI) e suas tributárias são conhecidas dos anatomistas desde 1793(1). VCI à esquerda tem prevalência de 0,2% a 0,5%, que pode estar subestimada, visto ser frequentemente assintomática(2). Habitualmente, é achado em exames de imagem, no entanto, apresenta significado clínico quando é confundida com linfadenomegalia para-aórtica ou com a veia renal esquerda, principalmente com o aumento dos procedimentos minimamente invasivos.

Os métodos não invasivos são extremamente importantes para o diagnóstico pré-procedimento, visto que algumas situações clínicas e terapêuticas podem ocasionar hemorragia iatrogênica, principalmente em manipulação videolaparoscópica ou em procedimentos sem o conhecimento prévio desta variante anatômica. Outra situação clínica importante é no acesso transjugular para colocação de filtro da VCI, pois este pode ser extremamente difícil na presença destas variantes(4).

O segmento infra-hepático da VCI se desenvolve entre a sexta e oitava semanas de vida embrionária como uma estrutura formada pela anastomose e reabsorção parcial, não simultânea, de três veias embrionárias pareadas(5). A VCI à esquerda resulta da regressão da veia supracardinal direita com persistência da veia supracardinal esquerda. De modo característico, como no caso apresentado, a veia renal esquerda drena para a VCI à esquerda que cruza a aorta anteriormente, unindo-se à veia renal direita para formar a porção suprarrenal da VCI à direita(5).

Para avaliação da VCI, pode-se utilizar a ultrassonografia, a TC ou a ressonância magnética (RM), de acordo com a disponibilidade ou contraindicações para cada paciente. A fase ideal do estudo da VCI é de aproximadamente 40–60 segundos após a administração do meio de contraste intravenoso, dependendo das condições clínicas de cada paciente. Um possível achado de imagem no caso de uma VCI à esquerda é a maior atenuação da veia renal direita comparativamente à esquerda, em função da menor diluição de um retorno venoso dos membros inferiores relativamente sem contraste(5). No entanto, torna-se extremamente importante a busca ativa por estas variantes mesmo nas TCs feitas sem contraste e às vezes por causas abdominais diversas. Achamos isto necessário, pois provavelmente este exame será o único capaz de fazer o diagnóstico e prevenir qualquer tipo de iatrogenia em um procedimento futuro.

Alguns autores acreditam que malformações da VCI, por si só, estão associadas a trombose venosa profunda (TVP)(6), no entanto, a ocorrência de malformações que seguem assintomáticas por toda a vida sugerem que a doença trombótica nesses pacientes possa ser multifatorial. A incidência de anomalias de VCI em pacientes com TVP é de 5% a 7%, sendo maior em jovens e nas TVPs bilaterais(6). Alterações anatômicas da VCI podem não ser visualizadas por flebografia ou eco-Doppler colorido, exames de primeira escolha durante um episódio de TVP(6). Nos casos de TVP envolvendo a região ilíaca ou femoral é importante que o estudo vascular seja feito por TC ou RM, especialmente em pacientes jovens(2), para melhor definição terapêutica. No nosso caso, a variação anatômica causou compressão do ureter, propiciando a estase e formação de cálculos (Figura 2).


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A familiaridade com esta variante anatômica da VCI é importante para se evitar erros diagnósticos como massas ou linfonodomegalias retroperitoneais. O diagnóstico, mesmo nos exames sem contraste, é fundamental para evitar qualquer iatrogenia e erros de interpretação, ou mesmo retardo diagnóstico na presença de compressão vascular. A sua maior associação com TVP torna imprescindível o estudo vascular por TC ou RM nos casos de trombose na região ilíaca ou femoral.

Trabalho realizado no Hospital Naval Marcílio Dias (HNMD), Rio de Janeiro, RJ, e na Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ, Brasil.

  • 1. Abernethy J. Account of two instances of uncommon formation in the viscera of the human body. Phil Trans R Soc Lond. 1793;83:5966.
  • 2. Onzi RR, Costa LF, Angnes RF, et al. Malformação de veia cava inferior e trombose venosa profunda: fator de risco de trombose venosa em jovens. J Vasc Bras. 2007;6:1869.
  • 3. Bass JE, Redwine MD, Kramer LA, et al. Spectrum of congenital anomalies of the inferior vena cava: cross-sectional imaging findings. Radiographics. 2000;20:63952.
  • 4. Obernosterer A, Aschauer M, Schnedl W, et al. Anomalies of the inferior vena cava in patients with iliac venous thrombosis. Ann Intern Med. 2002; 136:3741.
  • 5. Kandpal H, Sharma R, Gamangatti S, et al. Imaging the inferior vena cava: a road less traveled. Radiographics. 2008;28:66989.
  • 6. Tiesenhausen K, Amann W, Thalhammer M, et al. Aplasia of the vena cava inferior as a cause for recurring thrombosis of the lower extremities and pelvic veins. Vasa. 1999;28:28992.
  • Endereço para correspondência:

    Dra. Adriana Dias Barranhas.
    Travessa Olavo Bastos, 62, ap. 301, São Francisco.
    Niterói, RJ, Brasil, 24360-240.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Maio 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 2013
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