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Estrutura argumentativa em textos de alunos brasileiros

La structure argumentative dans des textes d’élèves brésiliens

Estructura argumentativa em textos de alumnos brasileños

RESUMO

O artigo mostra a ocorrência de encadeamentos argumentativos em textos redigidos por alunos do ensino fundamental I em uma escola pública brasileira. A pesquisa, de caráter longitudinal, foi norteada por três questões: 1) Quais encadeamentos argumentativos ocorrem? 2) Quais conjunções são empregadas para criar encadeamentos argumentativos? 3) Em que medida a habilidade de usar encadeamentos argumentativos muda ao longo do fundamental I? O corpus analisado compreendeu 123 textos escritos por nove participantes no período em que cursavam do 2º ao 5º ano do ensino fundamental. Análises quantitativas e qualitativas foram feitas. O estudo mostrou que os participantes conseguiram empregar encadeamentos argumentativos desde o início, com predominância dos normativos. Ademais, verificou-se um acréscimo no número de blocos semânticos nos textos dos participantes. Os achados apontam para mudanças na pesquisa a respeito da argumentação e nos currículos escolares.

Palavras-chave:
Escrita; Argumentação; Currículo; Desenvolvimento

RÉSUMÉ

Cet article concerne la présence d’enchaînements argumentatifs dans des textes écrits par des élèves de primaire d’une école publique brésilienne. La recherche se base sur trois questions: 1) quels types d’enchaînements argumentatifs sont produits? 2) quels connecteurs logiques sont employés pour créer ces enchaînements? 3) et dans quelle mesure la capacité d’utiliser des enchaînements argumentatifs évolue-t-elle au long du primaire? Le corpus analysé comprend 123 textes rédigés par neuf participants, allant du CE1 au CM2. Des analyses quantitatives et qualitatives ont été effectuées. L’analyse a montré que les participants étaient en mesure d’employer des enchaînements argumentatifs dès le début, principalement ceux de type normatif. En outre, une augmentation du nombre de blocs sémantiques a été observée dans les textes des participants. Ces résultats indiquent que des changements devraient être apportés à la recherche concernant l’argumentation et les programmes scolaires.

Mots-clés:
Écriture; Argumentation; Curriculum; Développement

RESUMEN

El artículo muestra la situación de los encadenamientos argumentativos en textos redactados por alumnos de la Enseñanza fundamental I en una escuela pública brasileña. La investigación fue orientada por 3 preguntas: 1) ¿Qué encadenamientos argumentativos ocurren? 2) ¿Qué conjunciones se emplean para crear encadenamientos argumentativos? 3) ¿En qué medida la habilidad de usar encadenamientos argumentativos cambia a lo largo de la Enseñanza Fundamental I? El corpus analizado comprendió 123 textos escritos por nueve participantes estudiando del 2º al 5º año de la escolarización. Se realizaron análisis cuantitativos y cualitativos. El análisis mostró que los participantes lograron emplear encadenamientos argumentativos desde el principio, con predominio de los normativos. Además, se verificó un aumento en el número de bloques semánticos en los textos de los participantes. Los hallazgos muestran cambios en la investigación acerca de la argumentación y en los currículos escolares.

Palabras-Claves:
Escritura; Argumentación; Curriculum; Desarrollo

ABSTRACT

This paper aims at showing that argumentative structures are present in texts written by students of a public primary school in Brazil. Our research was guided by three questions: 1) What argumentative chains are present in texts? 2) What conjunctions do students employ to create argumentative chains? 3) To what extent does the ability to use argumentative chains change along primary school? The corpus analysed comprises 123 texts written by a group of nine students attending from second to fifth school year. Both quantitative and qualitative analyses were conducted. The analysis showed that participants were able to use argumentative chains in their texts since the beginning of the research, with predominance of normative chains. Moreover, it was possible to verify an increase in the number of semantic blocks in participants’ texts. These findings point to changes in both school curricula and language teaching classes.

Keywords:
Writing; Argumentation; Curriculum; Development

Este artigo toma como objeto de estudo os recursos linguísticos escolhidos por crianças ao escrever textos argumentativos. Objetiva evidenciar a presença de estruturas argumentativas em textos escritos por crianças de uma escola pública do Brasil, país onde a habilidade de utilizá-las não é ensinada no ensino fundamental I. Considera-se que essa questão é importante, pois, só para dar um exemplo, a escrita de textos argumentativos é um dos pré-requisitos para o acesso a uma universidade conceituada.

A argumentação na escrita de crianças do ensino fundamental já foi objeto de pesquisas descritivas ou pedagógicas. Em sua maioria, as primeiras descrevem as propriedades da escrita argumentativa em diferentes etapas da escolarização (KNUDSON, 1992KNUDSON, Ruth E. The development of written argumentation: an analysis and comparison of argumentative writing at four grade levels. Child Study Journal, v. 22, n. 3, p. 167-184, 1992.; LEITÃO; ALMEIDA, 2000LEITÃO, Selma; ALMEIDA, Eliana G. da S. A produção de contra-argumentos na escrita infantil. Psicologia: Reflexão e Crítica, v. 13, n. 3, p. 351-361, 2000. Disponível em: <Disponível em: https://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722000000300004 >. Acesso em: 13 out. 2017.
https://dx.doi.org/10.1590/S0102-7972200...
), faixas etárias diversas (COIRIER; GOLDER, 1993COIRIER, Pierre; GOLDER, Caroline. Writing argumentative text: a developmental study of the acquisition of supporting structures. European Journal of Psychology of Education , v. 8, n. 2, p. 169-181, jun. 1993.; POUIT; GOLDER, 2002POUIT, Delphine; GOLDER, Caroline. Idea retrieval in argumentative text writing by 11-18 year old students. European Journal of Psychology of Education , v. 17, n. 4, p. 309-320, dez. 2002.) e até mesmo etapas de desenvolvimento cognitivo (PINHEIRO; LEITÃO, 2007PINHEIRO, Regina; LEITÃO, Selma. Consciência da “estrutura argumentativa” e produção textual. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 23, n. 4, p. 423-431, out./dez. 2007. Disponível em: <Disponível em: https://dx.doi.org/10.1590/S0102-37722007000400008 >. Acesso em: 13 out. 2017.
https://dx.doi.org/10.1590/S0102-3772200...
). Por sua vez, as pesquisas de caráter descritivo caracterizam, linguística ou discursivamente, os textos argumentativos produzidos por crianças (FERRO, 1997FERRO, Regina Torquato. Discurso argumentativo: identificação de marcas argumentativas na produção escrita de alunos da 4a. serie. 1997. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 1997.; BARROS, 2004BARROS, Genize Molina Zilio. Gênero argumentativo no ensino fundamental I: análise de produções de alunos participantes do prêmio Escrevendo o Futuro. 2004. Dissertação (Mestrado) − Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil, 2004.; AGUIAR, 2005AGUIAR, Heloísa Helena da Cruz. A capacidade de argumentação nos alunos de 5ª e 6ª séries. Cadernos do CNLF, v. 9, n. 10, 2005. Disponível em: <Disponível em: http://www.filologia.org.br/ixcnlf/10/02.htm >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://www.filologia.org.br/ixcnlf/10/02...
; CAMPOS, 2005CAMPOS, Claudia Mendes. Efeitos argumentativos na escrita infantil ou ilusão da argumentação. 2005. Tese (Doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2005. ; RIOLFI; COSTA, 2011RIOLFI, Claudia R.; COSTA, Renata de O. Marcas de argumentação em textos escritos por crianças. Zetetiké: Revista de Educação Matemática, Campinas, v. 18, p. 295-324, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://ojs.fe.unicamp.br/ged/zetetike/article/view/2758 >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://ojs.fe.unicamp.br/ged/zetetike/ar...
).

Em contrapartida, os estudos de caráter pedagógico discutem possíveis estratégias para auxiliar crianças a melhorar suas habilidades de escrita argumentativa. Parte deles propõe seu ensino por meio de debates e simulações (AURIAC-PEYRONNET, 2001AURIAC-PEYRONNET, Emmanuèle. The impact of oral training on argumentative texts produced by ten-and eleven-year-old children: exploring the relation between narration and argumentation. European Journal of Psychology of Education, v. 16, n. 2, p. 1143-1144, jun. 2001.; REZNITSKAYA; ANDERSON; KUO, 2007REZNITSKAYA, Alina; ANDERSON, Richard C.; KUO, Li-Jen. Teaching and learning argumentation. Elementary School Journal, v. 107, n. 5, p. 449-472, maio 2007.). Já outros consideram que não é necessário privilegiar somente o conteúdo ou os objetivos da audiência, uma vez que ambos dariam melhores resultados do que favorecer objetivos gerais

(MIDGETTE; HARIA; MACARTHUR, 2008MIDGETTE, Ekaterina; HARIA, Priti; MACARTHUR, Charles. The effects of content and audience awareness goals for revision on the persuasive essays of fifth-and eighth-grade students. Reading and Writing, v. 21, n. 1-2, p. 131-151, fev. 2008.).

Independentemente das diferenças, esse conjunto de estudos mostra que há um aprofundamento nos modos por meio dos quais crianças argumentam conforme crescem ou são expostas a melhores métodos de ensino. Esses estudos sinalizam, ainda, que mesmo alunos da primeira etapa do ensino fundamental são capazes de argumentar, utilizando tanto argumentos relevantes quanto marcas linguísticas de argumentação.

Apesar desses resultados, poucos estudos investigaram a natureza das marcas linguísticas da argumentação utilizadas por crianças. Assim, a presente pesquisa visa a contribuir para as discussões em curso a respeito do assunto, articulando as perspectivas pedagógicas e as descritivas. Adotando essa abordagem, este estudo centra-se na aprendizagem de estratégias argumentativas, assim o fazendo por meio da análise dos modos por meio dos quais os participantes da pesquisa relacionam argumentos e conclusões. Em outras palavras, volta-se a como eles produzem blocos semânticos (CAREL; DUCROT, 1999CAREL, Marion; DUCROT, Oswald. Le problème du paradoxe dans une sémantique argumentative. Langue Française, v. 123, n. 1, p. 6-26, 1999.).

A importância do presente estudo deve-se ao seu caráter inédito, uma vez que investiga a presença de encadeamentos argumentativos (CAREL; DUCROT, 1999CAREL, Marion; DUCROT, Oswald. Le problème du paradoxe dans une sémantique argumentative. Langue Française, v. 123, n. 1, p. 6-26, 1999.) em textos escritos por crianças, no período entre o 2º e o 5º ano do ensino fundamental, antes de serem ensinadas a respeito das características formais dessa tipologia textual.

APRENDENDO A ARGUMENTAR

Argumentar não é uma habilidade aprendida a partir do ingresso à escola. Tão logo as crianças aprendem a falar, elas tentam persuadir seus interlocutores (PEREIRA DE CASTRO, 2001PEREIRA DE CASTRO, Maria Fausta. A argumentação na fala da criança: entre fatos de língua e de discurso. Linguística, São Paulo, v. 13, p. 61-80, 2001.). Dado que a escrita pressupõe habilidades diversas da oralidade, leva um tempo considerável até que crianças aprendam como produzir textos argumentativos, apesar de argumentarem em suas interações cotidianas para obter o que querem. Por essa razão, é muito difícil para crianças do ensino fundamental anteciparem o leitor projetado nos textos que produzem.

De acordo com Riolfi (2004RIOLFI, Claudia Rosa. Criando o novo com as mesmas velhas palavras. In: COLÓQUIO DO LEPSI, 5., 2004, São Paulo. Proceedings... Psicanálise, Instituições e Infância. São Paulo: USP/IP/FE, 2004. Disponível em: <Disponível em: http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=MSC0000000032004000 100001&lng=en&nrm=abn >. Acesso em: 13 out. 2017.
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), ao ingressar no sistema escolar, as crianças tendem a esquecer-se do quanto gostam de brincar com as palavras. Em vez disso, ao escrever, elas escolhem utilizar a linguagem como um mero dispositivo para a comunicação. Em outras palavras, elas ignoram o fato de que é possível utilizar a linguagem tanto para colocar um problema quanto para resolvê-lo.

As crianças tendem a dizer exatamente o que estão pensando porque ainda não são capazes de calcular a maior parte do que pode ou não pode ser dito de acordo com as convenções sociais. Elas ainda não aprenderam que, na vida em sociedade, a preservação da própria face é necessária para resolver seus problemas da forma mais adequada Não tendem, portanto, a ser bons escritores de textos argumentativos, já que, nesse momento inicial, geralmente privilegiam a função referencial da linguagem, centrada no contexto da interação verbal (JAKOBSON, 1960JAKOBSON, Roman. Closing statements: linguistics and poetics. In: SEBEOK, Thomas Albert. Style in language. Cambridge, MA: MIT Press, 1960.).

É necessário algum tempo para que as crianças consigam compreender, em textos escritos, as outras funções da linguagem (JAKOBSON, 1960JAKOBSON, Roman. Closing statements: linguistics and poetics. In: SEBEOK, Thomas Albert. Style in language. Cambridge, MA: MIT Press, 1960.), a saber: emotiva, centrada no locutor, visando a suscitar algum tipo de emoção; conativa, voltada para o destinatário e expressa através de imperativos e vocativos; fática, centrada no contato, prolongando ou interrompendo a comunicação para verificar se o canal funciona; metalinguística, voltada ao código linguístico; e poética, centrada na mensagem, presente na exploração das figuras de linguagem e combinações sonoras. Ao ler textos escritos por crianças, é muito raro encontrar, por exemplo, figuras de linguagem ou estratégias retóricas (RIOLFI; MAGALHÃES, 2008RIOLFI, Claudia R.; MAGALHÃES, Mical. Modalizações nas posições subjetivas durante o ato de escrever. Estilos da Clínica, v. 13, n. 24, p. 98-121, 2008. DOI: http://dx.doi.org/10.11606/1981-1624.v13i24p98-121. Disponível em: <Disponível em: http://www.revistas.usp.br/estic/article/view/68524 >. Acesso em: 13 out. 2017.
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).

Para investigar e explicar como as crianças aprendem progressivamente a influenciar seu leitor por meio da escrita, este estudo adota a perspectiva do psicólogo russo Lev Semenovich Vygotsky (1930/1978VYGOTSKY, Lev S. Mind and society: the development of higher psychological processes. Cambridge-MA: Harvard University Press, 1978. Trabalho original publicado em 1930). Ele sustenta que aprendizagem e desenvolvimento são inter-relacionados desde os primeiro dia de vida da criança (VYGOTSKY, 1930/1978VYGOTSKY, Lev S. Mind and society: the development of higher psychological processes. Cambridge-MA: Harvard University Press, 1978. Trabalho original publicado em 1930).

É importante ressaltar que, para Vygostky (1930/1978VYGOTSKY, Lev S. Mind and society: the development of higher psychological processes. Cambridge-MA: Harvard University Press, 1978. Trabalho original publicado em 1930), a noção de desenvolvimento não é biológica. Para além disso, o autor relacionou o desenvolvimento humano com a qualidade das relações sociais nas quais as crianças estão inseridas. Para Vygotsky (1930/1978VYGOTSKY, Lev S. Mind and society: the development of higher psychological processes. Cambridge-MA: Harvard University Press, 1978. Trabalho original publicado em 1930), o ato de ensinar algo a uma criança compõe um ciclo, de modo que, quanto mais uma criança aprende, mais ela se desenvolve cognitivamente e vice-versa.

A internalização de conceitos, ou seja, a reconstrução interna de uma operação externa pelo autor, é considerada pelo autor como sendo o processo de aprendizagem (VYGOTSKY, 1930/1978VYGOTSKY, Lev S. Mind and society: the development of higher psychological processes. Cambridge-MA: Harvard University Press, 1978. Trabalho original publicado em 1930). O processo de internalização compreende uma transformação significativa proporcionada pelos sujeitos envolvidos nas relações sociais. A princípio, o sujeito recorre a reguladores externos para saber o que fazer; posteriormente, será capaz de controlar o próprio comportamento recorrendo a processos puramente internos.

Para Vygotsky (1930/1978VYGOTSKY, Lev S. Mind and society: the development of higher psychological processes. Cambridge-MA: Harvard University Press, 1978. Trabalho original publicado em 1930), o gesto de apontar é um exemplo de internalização. Ele sugere que uma criança “aprende” como apontar através da tentativa frustrada de alcançar um determinado objeto. Observando que sua mãe lhe deu o objeto que tentou, em vão, alcançar, a criança descobre a função social daquele gesto, qual seja, apontar. Assim, apontar torna-se uma ação realizada com fins persuasivos.

O adulto, assim, exerce um papel importante no desenvolvimento infantil. De acordo com Luria e Yodovich (1971LURIA, Alexander Romanovich; YODOVICH, F. Speech and the development of mental processes in the child. Harmondsworth: Penguin, 1971.), uma das funções mais importantes do adulto para o desenvolvimento de uma criança é nomear os objetos do mundo e esclarecer quais são seus predicados, por exemplo, “copo” (nome) e “beber” (predicado). Os autores enfatizam que essas ações são muito importantes para a formação dos processos mentais infantis. A esse respeito, tais ações servem para isolar os elementos essenciais e, portanto, relegar o que é menos importante para segundo plano. Segundo os autores,

Todo processo de transmissão de conhecimento e de formação de conceitos, que é o modo básico por meio do qual o adulto influencia a criança, constitui o processo central do desenvolvimento intelectual da criança. 1 1 No original: “This whole process of the transmission of knowledge and the formation of concepts, which is the basic way the adult influences the child, constitutes the central process of the child’s intellectual development.” ( LURIA; YODOVICH, 1971 LURIA, Alexander Romanovich; YODOVICH, F. Speech and the development of mental processes in the child. Harmondsworth: Penguin, 1971. , p. 22)

Pode-se inferir, assim, que os seres humanos dependem de um auxílio externo para internalizar o conhecimento. As crianças precisam da ajuda de um parceiro mais experiente (ou um professor), que pode motivá-las a ir além da sua zona de conforto e atingir sua “zona de desenvolvimento potencial” (VYGOTSKY, 1930/1978VYGOTSKY, Lev S. Mind and society: the development of higher psychological processes. Cambridge-MA: Harvard University Press, 1978. Trabalho original publicado em 1930).

O ENSINO DA ESTRUTURA ARGUMENTATIVA NO SISTEMA DE ENSINO PÚBLICO BRASILEIRO

No Brasil, o acesso à educação é obrigatório dos 4 aos 17 anos. Todas as escolas do país têm de oferecer aos seus alunos igual acesso ao currículo nacional (BRASIL, 1996BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 1996. Disponível em: <Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm >. Acesso em: 13 out. 2017.
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).

No período de coleta de dados para esta pesquisa, o ensino fundamental durava oito anos. No momento de publicação do texto, os alunos concluem essa etapa da escolarização em nove anos (BRASIL, 1996BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 1996. Disponível em: <Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
, 2006BRASIL. Ministério da Educação. Lei n. 11.274, de 6 de fevereiro de 2006. Diário Oficial da República Federativa do Brasil , Brasília, DF, 7 fev. 2006. Seção 1. Disponível em: <Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2006/lei-11274-6fevereiro-2006-540875-publicacaooriginal-42341-pl.html >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/...
). É esperado que as crianças estejam alfabetizadas ao final do segundo ano (BRASIL, 2007BRASIL. Ministério da Educação. Plano de Desenvolvimento da Educação: razões, princípios e programas. Brasília, DF: MEC, 2007. Disponível em: <Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/livro/ >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://portal.mec.gov.br/arquivos/livro/...
), o que normalmente ocorre, em média, aos oito anos de idade.

Entre os outros conteúdos escolares, a habilidade de escrever textos dissertativos é exigida dos candidatos que concorrem a uma vaga na universidade pública. Essa prova de redação representa uma barreira significante para alunos de escolas públicas (CAMPOS, 2011CAMPOS, Maria Inês Batista. Textos argumentativos em materiais didáticos: que proposta seguir?. DELTA, São Paulo, v. 27, n. 2, p. 219-234, 2011.).

Os Parâmetros curriculares nacionais (BRASIL, 1997BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa. Brasília, DF: MEC/SEF, 1997. Disponível em: <Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro02.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pd...
) não trazem nenhuma menção ao trabalho com textos argumentativos ou com a estrutura argumentativa no ensino fundamental. O documento sugere exclusivamente o estudo de textos narrativos e descritivos. No capítulo que orienta os quatro anos finais do ensino fundamental, a palavra argumentação ocorre apenas duas vezes: considerada como uma ferramenta para o exercício pleno da cidadania (BRASIL, 1998aBRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes curriculares nacionais para o ensino fundamental. Brasília, DF: MEC/SEF , 1998a. Disponível em: <Disponível em: http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/resolucao_ceb_0298.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/res...
). Mesmo no documento dedicado ao ensino médio, a estrutura argumentativa não aparece em um tópico específico (BRASIL, 2000BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros curriculares nacionais. Ensino médio: linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília, DF: MEC/SEF , 2000. Disponível em: <Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/14_24.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pd...
).

É necessário mencionar que, por razões culturais e históricas, há uma divisão no sistema escolar brasileiro desde o século XIX. Enquanto as famílias mais abastadas procuravam seus próprios meios para educar as crianças, as famílias menos privilegiadas recorriam ao sistema público de ensino, que foi originalmente destinado aos pobres, negros e mestiços (VEIGA, 2008VEIGA, Cynthia Greive. Escola pública para os negros e os pobres no Brasil: uma invenção imperial. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 13, n. 39, p. 502-516, set./dez. 2008. Disponível em: <Disponível em: http://uaslp.redalyc.org/articulo.oa?id=27503907 >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://uaslp.redalyc.org/articulo.oa?id=...
). Durante a ditadura militar (1964-1985), houve um processo de sucateamento do sistema público de ensino. Nesse período, houve uma queda no tempo de duração das aulas, que passaram a ser de três horas por dia (BITTAR; BITTAR, 2012BITTAR, Marisa; BITTAR, Mariluce. História da educação no Brasil: a escola pública no processo de democratização da sociedade. Acta Scientiarum. Education, Maringá, v. 34, n. 2, p. 157-168, jul./dez. 2012. Disponível em: <Disponível em: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/ActaSciEduc/article/view/17497 >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/A...
). Atualmente, ainda há uma grande diferença entre os índices socioeconômicos das escolas púbicas e privadas (ALVES; SOARES; XAVIER , 2014ALVES, Maria Teresa Gonzaga; SOARES, José Francisco; XAVIER, Flavia Pereira. Índice Socioeconômico das Escolas de Educação Básica Brasileiras. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, Rio de Janeiro, v. 22, n. 84, p. 671-704, jul./set. 2014. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ensaio/v22n84/a05v22n84.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://www.scielo.br/pdf/ensaio/v22n84/a...
).

Em relação às práticas de linguagem em sala de aula, as escolas privadas são livres para seguir suas próprias metodologias, enquanto as públicas são orientadas a seguir uma abordagem na qual a reflexão sobre a linguagem em uso é considerada mais importante do que o ensino de uma metalinguagem e das categorias da gramática dita tradicional (COSSON, 2007COSSON, Rildo. Mother tongue education in Brazil: a battle of two worlds. L1-Educational Studies in Language and Literature , v. 7, n. 1, p. 37-52, 2007. Disponível em: <Disponível em: https://doi.org/10.17239/L1ESLL-2007.07.01.04 >. Acesso em: 13 out. 2017.
https://doi.org/10.17239/L1ESLL-2007.07....
).

Analisando diários de campo de estudantes de Letras, Riolfi e Igreja (2010RIOLFI, Claudia R.; IGREJA, Suelen G. Ensinar a escrever no ensino médio: cadê a dissertação?. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 36, n. 1, p. 311-324, 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ep/v36n1/a08v36n1.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://www.scielo.br/pdf/ep/v36n1/a08v36...
) verificaram que apenas 15% do tempo das aulas de Língua Portuguesa em escolas públicas é empregado em aulas de redação, a menor parte desse tempo, discutindo o texto dissertativo. Portanto, a maior parte dos alunos advindos de escolas públicas não aprende os conteúdos básicos exigidos para serem aprovados nos exames vestibulares das universidades renomadas, que, no Brasil, são públicas em sua maioria. Como consequência, nas universidades públicas brasileiras, em média, apenas 40% dos estudantes são advindos do sistema público de ensino (PEROSA; LEBARON; LEITE, 2015PEROSA, Graziela Serroni; LEBARON, Frédéric; LEITE, Cristiane Kerches da Silva. O espaço das desigualdades educativas no município de São Paulo. Pro-Posições, Campinas, v. 26, n. 2, maio/ago. 2015. Disponível em: <Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/0103-7307201507705 >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://dx.doi.org/10.1590/0103-730720150...
).

TEORIAS DE ARGUMENTAÇÃO

Há, pelo menos, duas maneiras de compreender a argumentação. A primeira é conhecida por “nova retórica”. De acordo com os pesquisadores que adotam essa perspectiva, argumentar compreende “as técnicas discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesão dos espíritos às teses que se lhes apresentam ao assentimento” (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 1969PERELMAN, Chaïm; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. The new rhetoric: a treatise on argumentation. Notre Dame: University of Notre Dame Press, 1969., p. 4). Consequentemente, para ser bem-sucedido, o orador deve, em primeiro lugar, analisar como o auditório pensa e age, de modo a, linguisticamente, criar uma presença digna de conseguir adeptos.

A segunda perspectiva agrega os autores que consideram a argumentação uma característica constitutiva da linguagem. Para eles, argumentar é um tipo de relação discursiva que conecta um ou mais argumentos a uma conclusão (ASCOMBRE; DUCROT, 1983ASCOMBRE, Jean-Claude; DUCROT, Oswald. L´argumentation dans la langue. Bruxelles: Mardaga, 1983.). Nesta pesquisa, compartilhamos dessa perspectiva, a qual considera os trabalhos de Ducrot (1987DUCROT, Oswald. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987.), para quem a argumentação está na linguagem. Ducrot (1981DUCROT, Oswald. Provar e dizer: linguagem e lógica. São Paulo: Global, 1981., 1987DUCROT, Oswald. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987., 1989DUCROT, Oswald. Argumentação e “topoi” argumentativos. In: GUIMARÃES, Eduardo (Ed.). História e sentido na linguagem. Campinas: Pontes , 1989.) advoga que o valor argumentativo das palavras é responsável pela direção argumentativa do discurso.

De acordo com Carel e Ducrot (1999CAREL, Marion; DUCROT, Oswald. Le problème du paradoxe dans une sémantique argumentative. Langue Française, v. 123, n. 1, p. 6-26, 1999.), a perspectiva mais operacional para analisar textos argumentativos é a adoção do conceito de “encadeamento discursivo”, segundo o qual há uma interdependência entre argumento e conclusão, o que os torna mutualmente constitutivos. Nessa linha, o encadeamento argumentativo é o que caracteriza um bloco semântico, composto por duas partes de um discurso ligadas por um conectivo.

Para o autor, há dois tipos de conectivos: normativos e transgressivos. Os normativos têm o mesmo valor que a conjunção portanto em português e ligam duas partes de um discurso orientado para a mesma conclusão. Os transgressivos têm o mesmo valor da conjunção no entanto em português e relacionam duas partes de um discurso orientado para diferentes conclusões.

Nessa teoria, considera-se que as partes que compõem um período composto não têm sentido independente, ou seja, a mesma conclusão pode ser obtida a partir de dois enunciados muito diferentes. Portanto, a unidade de análise é formada pelos encadeamentos argumentativos que apresentam uma estrutura do tipo “X CONECTIVO Y”, em vez de segmentos isolados.

Os exemplos dados por Carel (2001CAREL, Marion. Argumentation interne et argumentation externe au lexique: des proprietés différentes. Langages, v. 35, n. 142, p. 10-21, 2001.) são pertinentes para compreender a diferença entre os conectivos normativos e transgressivos. Por exemplo, um segmento como “Pedro é prudente, portanto, não se envolveu em uma acidente” é normativo. A frase ilustra a consequência do fato de Pedro ser cauteloso. O enunciado poderia ser reduzido à seguinte fórmula: “prudência PORTANTO negação acidente”. Por outro lado, um segmento como “Pedro é prudente, no entanto, envolveu-se em um acidente” é transgressivo, porque ilustra uma oposição. Carel (2001CAREL, Marion. Argumentation interne et argumentation externe au lexique: des proprietés différentes. Langages, v. 35, n. 142, p. 10-21, 2001.) assevera que a natureza transgressiva advém do fato de que, normalmente, prudência não resulta em acidente. O enunciado poderia ser reduzido à seguinte fórmula: “prudência NO ENTANTO acidente”.

O efeito argumentativo ocorre nos eixos metafórico e metonímico da linguagem (JAKOBSON, 1960JAKOBSON, Roman. Closing statements: linguistics and poetics. In: SEBEOK, Thomas Albert. Style in language. Cambridge, MA: MIT Press, 1960.). Nessa base, certas palavras, os operadores argumentativos (DUCROT, 1987DUCROT, Oswald. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987.), tais como porque, então, mas, quando etc., são responsáveis por indicar a orientação argumentativa de uma enunciação. Portanto, o conhecimento que um sujeito tem a respeito do arranjo das palavras é mais importante do que o domínio do seu conteúdo (MEYER, 1998MEYER, Michel. Questões de retórica: linguagem, razão e sedução. Lisboa: Edições 70, 1998.).

Meyer (1998MEYER, Michel. Questões de retórica: linguagem, razão e sedução. Lisboa: Edições 70, 1998.) sugere que, na argumentação, o arranjo das palavras deveria ser analisado a partir de três premissas. A primeira sustenta que um raciocínio não pode tomar uma proposição como sua unidade fundamental, sua unidade deve ser o problema e a lógica deve ser subordinada a uma questão. A segunda postula que o par pergunta/ resposta é a unidade fundamental da linguagem. A última, finalmente, supõe que a linguagem, por sua natureza, tem por função responder perguntas. Portanto, torna-se evidente que esta pesquisa volta-se para o processo que permite às crianças aprender como colocar problemas e resolvê-los por meio da escrita.

Esta pesquisa foi conduzida de modo a construir respostas para as seguintes questões: 1) Quais encadeamentos argumentativos estão presentes em textos escritos por alunos do ensino fundamental I de uma escola pública? 2) Quais conjunções são empregadas com mais frequência pelos participantes da pesquisa para criar encadeamentos argumentativos? 3) Em que medida a habilidade de utilizar encadeamentos argumentativos muda ao longo do ensino fundamental I?

MATERIAIS E MÉTODOS

PARTICIPANTES

A coleta de dados para a presente pesquisa iniciou-se quando as crianças começavam a escrever seus primeiros textos com autonomia, no segundo ano do ensino fundamental. Pretendíamos compor o grupo de participantes da pesquisa com alunos que estivessem na mesma turma ao longo do ensino fundamental I. Do grupo inicial de 20 crianças, nove permaneceram na mesma turma. Esse fato já era esperado, uma vez que a evasão escolar é maior entre os alunos menos favorecidos socialmente (LEON; MENEZES-FILHO, 2002LEON, Fernanda Leite Lopez de; MENEZES-FILHO, Naércio Aquino. Reprovação, avanço e evasão escolar no Brasil. Pesquisa e Planejamento Econômico, v. 32, n. 3, dez. 2002. Disponível em: <Disponível em: http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/4286/1/PPE_v32_n03_Reprovacao.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream...
). No segundo e terceiro anos da pesquisa, trabalhamos com um grupo de cinco crianças, dado que os outros quatro participantes foram transferidos para outras escolas.

Assim, os participantes da pesquisa eram um grupo de nove crianças, composto por dois meninos e sete meninas, todos alunos da mesma escola estadual localizada na cidade de São Paulo. Todos eram advindos de famílias de nível socioeconômico baixo. No contexto daquela comunidade escolar, todos eram considerados bons alunos, uma vez que estavam lendo e escrevendo com fluência ao final do segundo ano. Cabe mencionar que, no Brasil, 30% dos alunos ainda não são capazes de formular uma frase completa por escrito ao final do 3º ano do ensino fundamental (BRASIL, 2015BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - Inep. Índice de Desenvolvimento da Educação Básica: resultados e metas. Brasília, DF: Inep, 2015. Disponível em: <Disponível em: http://ideb.inep.gov.br/resultado/resultado/resultadoBrasil.seam >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://ideb.inep.gov.br/resultado/result...
).

Para preservar a identidade dos participantes envolvidos neste estudo, os nomes das crianças foram trocados. O Quadro 1, a seguir, lista os participantes da pesquisa, sua idade e o nome fictício atribuído a cada sujeito da pesquisa. A idade dos participantes varia um pouco, dado que toda criança deve ser matriculada no 1º ano no ano em que vai completar sete anos. O grupo étnico do qual os participantes fazem parte não foi considerado nesta pesquisa, pois algumas famílias não concordaram em declarar essa informação ou não puderam determinar o grupo étnico a que pertencem.

QUADRO 1:
PARTICIPANTES DA PESQUISA

INSTRUMENTOS/TAREFAS

Os participantes da pesquisa foram solicitados a escrever ao menos cinco textos argumentativos a cada ano. Nas tarefas dadas, era esperado que tentassem persuadir o interlocutor do texto para gerar diferentes efeitos. O Quadro 2, a seguir, detalha as tarefas solicitadas.

QUADRO 2:
TAREFAS SOLICITADAS AOS PARTICIPANTES

Ao desenvolver as tarefas, levamos em consideração que a escrita é mais proveitosa quando as propostas são motivadoras, interessantes e propriamente desafiadoras (CHAPMAN, 2006CHAPMAN, Marilyn. Research in writing: preschool through elementary, 1983-2003. L1-Educational Studies in Language and Literature, v. 6, n. 2, p. 7-27, 2006. Disponível em: <Disponível em: https://doi.org/10.17239/L1ESLL-2006.06.02.04 >. Acesso em: 13 out. 2017.
https://doi.org/10.17239/L1ESLL-2006.06....
, p. 19). Ainda, é necessário mencionar que as tarefas solicitadas no 4º e 5º anos foram as mesmas. Essa escolha foi feita para verificar as diferentes estratégias argumentativas empregadas na mesma tarefa após um ano. Essa questão não foi considerada nesta pesquisa, mas foi discutida em Costa (2014COSTA, Renata de Oliveira. Pequenos publicitários: a persuasão na escrita de crianças. 2014. Dissertação (Mestrado em Educação) − Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.).

COLETA DE DADOS

Os textos foram coletados entre 2008 e 2011. Para os propósitos da coleta de dados, as pesquisadoras reuniram-se com a professora regente das turmas a cada dois meses aproximadamente, para dar instruções em relação aos procedimentos de coleta de dados.

Em relação à extensão, os participantes estavam livres para escrever o quanto quisessem. Os textos foram manuscritos em folhas pautadas. Foi destinada aproximadamente uma hora para o desenvolvimento de cada tarefa.

Ao final do processo, as pesquisadoras puderam compor um corpus constituído por 123 textos argumentativos, que foram agrupados de acordo com o período escolar em que foram escritos. A única tarefa realizada durante o segundo ano foi alocada juntamente com aquelas produzidas durante o terceiro ano.

Em média, os textos tinham de oito a dez linhas de extensão. Alguns participantes incluíram desenhos em seus trabalhos. Seus pais foram informados a respeito da pesquisa e assinaram uma autorização para o uso dos textos das crianças.

ANÁLISE DE DADOS

Conduzimos tanto análises quantitativas quanto qualitativas do corpus. Os 123 manuscritos que compuseram o corpus foram catalogados para prover uma visão panorâmica de como crianças produzem blocos semânticos em textos argumentativos. Para a análise, baseamo- nos na teoria dos blocos semânticos (CAREL; DUCROT, 1999CAREL, Marion; DUCROT, Oswald. Le problème du paradoxe dans une sémantique argumentative. Langue Française, v. 123, n. 1, p. 6-26, 1999.). Contamos e transcrevemos os conectivos normativos “a PORTANTO b (ou não b)” e os transgressivos “a NO ENTANTO b (ou não b)” para cumprir esse objetivo.

Como a relação entre os termos poderia ser implícita, foi necessário incluir no levantamento, para analisar como as crianças produziram blocos semânticos, aqueles blocos que não foram separados por um conectivo. A sentença que se segue ilustra esse achado: “A nossa quadra da escola está esburacada e com muita sujeira no chão algumas crianças podem se machucar muito fácil”. Embora não haja conjunção entre as sentenças, é possível inferir a existência de uma relação normativa entre elas. Então, o bloco semântico inferido seria: “quadra da escola esburacada com muita sujeira no chão PORTANTO crianças podem se machucar”.

Com relação aos procedimentos efetuados para validar os procedimentos analíticos efetuados pelas autoras, dois diferentes pesquisadores, com ampla experiência no campo da investigação em linguagem e educação, leram as análises e discutiram os achados antes da submissão deste artigo.

RESULTADOS

Realizamos um levantamento dos blocos semânticos empregados pelas crianças em cada ano escolar para determinar quais encadeamentos argumentativos estão presentes em textos escritos por estudantes brasileiros do ensino fundamental I.

Primeiramente, contamos os encadeamentos argumentativos. Nessa contagem, consideramos tanto os encadeamentos explícitos quanto os implícitos. Em segundo lugar, separamos os encadeamentos argumentativos em normativos e transgressivos. Para a análise, como havia diferenças relativas ao número de participantes e de textos produzidos a cada ano, consideramos a média dos encadeamentos argumentativos, por participante e por texto. As tabelas 1a, 1b e 1c mostram o resultado desse esforço.

TABELA 1A
ENCADEAMENTOS ARGUMENTATIVOS PRODUZIDOS DURANTE O 3º ANO ESCOLAR
TABELA 1B
ENCADEAMENTOS ARGUMENTATIVOS PRODUZIDOS DURANTE O 4º ANO
TABELA 1C
ENCADEAMENTOS ARGUMENTATIVOS PRODUZIDOS DURANTE O 5O ANO ESCOLAR

Lendo as tabelas 1a, b e c, podemos observar que tanto os encadeamentos normativos quanto transgressivos estão presentes nos textos escritos pelos participantes desde o terceiro ano escolar. Desde os primeiros textos do corpus, os encadeamentos normativos são mais frequentes.

Longitudinalmente, houve um acréscimo em todas as modalidades de encadeamentos argumentativos. Do 3º ao 4º ano, o crescimento não foi homogêneo: houve um aumento na presença de encadeamentos transgressivos e um decréscimo discreto na dos encadeamentos normativos.

Do 4º ao 5º ano, houve uma ampliação significativa na presença de encadeamentos explícitos normativos por texto. Durante o 4o. ano, a média de encadeamentos normativos era de 0,52 por texto, enquanto, durante o próximo ano, ela alcançou a média de 4,75.

O Gráfico 1, a seguir, ilustra a extensão na qual a habilidade de utilizar encadeamentos argumentativos por parte dos alunos do fundamental I mudou ao longo de três anos.

GRÁFICO 1:
PROGRESSO DOS ENCADEAMENTOS ARGUMENTATIVOS EMPREGADOS PELOS PARTICIPANTES

O Gráfico 1 foi construído a partir das médias previamente apresentadas ao leitor nas tabelas 1a, 1b e 1c. Ele expressa a média de ocorrência de encadeamentos argumentativos por participantes por ano.

É necessário frisar que todos os participantes produziram encadeamentos argumentativos. A Tabela 2, que se segue, mostra a porcentagem de textos nos quais eles estão presentes.

TABELA 2:
EVENTOS DE ENCADEAMENTOS ARGUMENTATIVOS EM TEXTOS PRODUZIDOS PELOS PARTICIPANTES NO PERÍODO ANALISADO

Em cada ano, a maioria dos participantes empregou encadeamentos argumentativos em mais de 80% de seus textos. Aqueles que usaram menos encadeamentos argumentativos em seus escritos utilizaram- nos em pelo menos 40% de suas produções. Apenas uma das crianças empregou menos de 40% de encadeamentos argumentativos em seus textos, e isso apenas no primeiro ano da pesquisa.

Para que se tornasse possível estimar o conhecimento dos participantes a respeito dos operadores argumentativos (DUCROT, 1987DUCROT, Oswald. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987.), bem como especular a respeito de estratégias pedagógicas que consideram o aprendizado da escrita argumentativa, esta pesquisa também se interessou em catalogar a variedade de conjunções usada pelos participantes.

O Gráfico 2, que se segue, mostra o emprego dos encadeamentos normativos e transgressivos durante os três anos da investigação:

GRÁFICO 2:
EMPREGO DE ENCADEAMENTOS ARGUMENTATIVOS NORMATIVOS E TRANSGRESSIVOS

Vale mencionar que a ocorrência de encadeamentos argumentativos sem conjunções foi frequente. Considerando os encadeamentos normativos, é possível verificar que, durante os três anos da pesquisa, as conjunções implícitas ocorreram em, pelo menos, 45% dos acontecimentos no corpus. Entretanto, o uso de operadores argumentativos em encadeamentos normativos cresceu ao longo dos anos, alcançando um ápice de 52,7% de ocorrências no 5º ano.

Os encadeamentos transgressivos não foram tão frequentemente usados quanto os normativos. Esse fato pode indicar que as crianças são mais capazes de usar encadeamentos normativos em sua escrita argumentativa. Diferentemente dos achados relativos ao uso das conjunções nos encadeamentos normativos, quando empregando encadeamentos transgressivos, os participantes tenderam a usar operadores argumentativos. Essa tendência foi observada desde o primeiro ano da pesquisa, momento em que a ocorrência de encadeamentos transgressivos explícitos alcançou 75% do total dos usos. Encadeamentos transgressivos implícitos não apareceram durante toda a pesquisa.

Para estimar quais são as conjunções mais frequentemente empregadas pelos participantes ao longo da pesquisa, suas aparições foram contadas e agrupadas. Os resultados estão apresentados nos gráficos 3a e 3b, que se seguem:

GRÁFICO 3A:
CONJUNÇÕES UTILIZADAS EM ENCADEAMENTOS NORMATIVOS

GRÁFICO 3B:
CONJUNÇÕES USADAS EM ENCADEAMENTOS TRANSGRESSIVOS

Observando o Gráfico 3a, é possível verificar que os participantes produziram uma grande variedade de conjunções relacionadas ao uso dos encadeamentos normativos: seis. Paralelamente, ocorreram apenas três diferentes tipos de conjunções nos encadeamentos transgressivos.

A conjunção porque apareceu mais frequentemente nos textos dos participantes, com 51,9% do total de ocorrências. Foi seguida por e, encontrada em 17,3% das ocorrências. Então (15,3%), por causa que (9,6%), pois (3,8%) e portanto (1,9%) foram menos frequentemente utilizadas.

Com relação aos encadeamentos transgressivos, a conjunção mais empregada foi mas, tendo aparecido em 66,6% das ocorrências totais. Foi seguida por e, encontrada em 28,5% dos encadeamentos transgressivos. Vale mencionar que a conjunção e foi usada tanto nos encadeamentos transgressivos quanto nos normativos. Aliás foi menos frequentemente usada, aparecendo em 4,76% das ocorrências.

Objetivando prover um panorama do modo como os participantes empregaram blocos semânticos em seus textos ao leitor, no que segue, nós apresentaremos dois manuscritos produzidos por um dos sujeitos.

Atribuímos o nome Bianca para a criança cujos textos serão discutidos nesta seção, visando a manter seu anonimato. Nós acreditamos que os textos de Bianca são ilustrativos para nossos propósitos, porque ela participou de todas as atividades relacionadas com a pesquisa. Além disso, foi a participante que, entre todas, produziu mais encadeamentos transgressivos.

O primeiro texto que Bianca escreveu no contexto da pesquisa é o Texto 1, reproduzido na sequência. Quando ela tinha 7 anos e 11 meses, solicitamos que ela escrevesse para Papai Noel ou para qualquer outra pessoa que ela julgasse poder lhe dar um presente de Natal. Bianca escolheu Jesus como interlocutor de seu texto, no qual ela pediu por um brinquedo, especificamente uma “casa da Barbie”.

TEXTO 1:
TRANSCRIÇÃO DIPLOMÁTICA DE TEXTO PRODUZIDO POR BIANCA (7 ANOS E 11 MESES)

Precedido pela localidade e data, o primeiro texto redigido pela participante é formado por uma única sentença sem pontuação. Bianca produziu um encadeamento argumentativo transgressivo por meio do emprego de dois segmentos (desejar adquirir um brinquedo e a falta de dinheiro da mãe) articulados com o conectivo MAS. Isso revela a seguinte sequência: “desejo de ganhar um presente NO ENTANTO falta de dinheiro”. O efeito de sentido produzido pelo encadeamento transgressivo é potencialmente persuasivo, porque reflete a tristeza da criança que quer um brinquedo, mas não pode comprá-lo.

O Texto 2, a seguir, foi produzido quando ela estava no 5º ano.

TEXTO 2:
TRANSCRIÇÃO DIPLOMÁTICA DE TEXTO PRODUZIDO POR BIANCA (9 ANOS E 11 MESES)

Bianca escreveu o Texto 2 em outubro de 2010, o último ano de coleta de dados da pesquisa. A escrita foi em resposta a uma tarefa cuja solicitação era produzir um anúncio de brinquedos para um feira de produtos usados.

Tem um cabeçalho (linha 1) e é formado por três grandes blocos. O primeiro (linhas 2-5) introduz o tópico do texto, tornando seu propósito explícito: anunciar dois itens. O segundo (linhas 6-10) consiste na descrição do primeiro item, e o último (linhas 11-13) é a descrição do segundo item.

Foi possível encontrar três blocos semânticos nessa produção: um composto por encadeamentos normativos (linhas 11-12), e dois outros (linhas 9-10 e linhas 12-13) compostos por encadeamentos transgressivos.

O encadeamento normativo foi empregado para enfatizar as características e utilidade do ursinho de pelúcia. Então, a fórmula produzida foi “fofura ENTÃO dormir agarradinho”. Vale mencionar que esse encadeamento normativo foi implícito, já que o operador argumentativo não está presente entre os termos. O encadeamento transgressivo ocorreu na descrição dos brinquedos que Bianca deveria anunciar. Ambas as ocorrências foram utilizadas para relacionar as qualidades dos brinquedos anunciados e seus preços. Assim, os aspectos produzidos foram: “novinha NO ENTANTO custa apenas R$ 5.00”; e “fofura NO ENTANTO custa apenas R$ 7,00”.

O Quadro 3, que se segue, traz os textos que acabamos de analisar reproduzidos lado a lado, de maneira a facilitar a apreensão do desenvolvimento da escrita por parte de Bianca.

QUADRO 3:
COMPARAÇÃO ENTRE O PRIMEIRO E O PENÚLTIMO TEXTO PRODUZIDO POR UM PARTICIPANTE

Antes de começarmos a comparação, cumpre recordar que os dois textos foram ilustrados pela participante, como se vê nas versões manuscritas previamente apresentadas. O primeiro manuscrito mostra uma menina, talvez representando Bianca de pé, perto de uma versão esquemática do presépio natalino, com o menino Jesus sobre a manjedoura. O segundo, por sua vez, traz as ilustrações dos produtos à venda: o ursinho de pelúcia e a boneca.

Após três anos, a menina foi capaz de produzir um texto quatro vezes mais longo do que o primeiro. No começo do percurso, ela só conseguia utilizar letras caixa alta; aprendeu a escrita cursiva no final do terceiro ano. Aprendeu também a diagramar seus textos. No primeiro, por exemplo, a necessária separação entre “Querido Jesus” (o vocativo) e a primeira linha do texto não está presente. Ela também não parecia se dar conta da necessidade de usar pontuação e de fazer o recuo para o início de um parágrafo. Essas inexatidões desapareceram ao fim do processo.

Os seguintes sinais podem apontar para o desenvolvimento da participante com relação à estrutura argumentativa. Nos textos produzidos ao final do quinto ano, a participante foi capaz de: 1) construir um locutor separado da pessoa empírica do autor do texto, responsável por criar, no texto, efeitos argumentativos; 2) construir elementos linguísticos (tais quais adjetivos e advérbios) para descrever o item a ser vendido como sendo desejável; 3) planejar e cumprir um projeto enunciativo composto de partes articuladas diferentes, todas voltadas ao mesmo objetivo.

DISCUSSÃO

A importância de prover um ambiente educacional onde os alunos possam avaliar processos relevantes de leitura, escrita e oralidade já foi destacada por autores como Rijlaarsdam et al. (2008RIJLAARSDAM, Gert; BRAAKSMA, Martine; COUZIJN, Michel; JANSSEN, Tanja; RAEDTS, Mariet; VAN STEENDAM, Elke; TOORENAAR, Anne; VAN DEN BERGH, Huub. Observation of peers in learning to write: practice and research. Journal of Writing Research, v. 1, n. 1, p. 53-83, 2008. Disponível em: <Disponível em: https://pure.uva.nl/ws/files/4252745/62153_300305.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
https://pure.uva.nl/ws/files/4252745/621...
). Outros, como Graham e Perin (2007GRAHAM, Steve; PERIN, Dolores. A meta-analysis of writing instruction for adolescent students. Journal of Educational Psychology, v. 99, n. 3, p. 445-476, 2007. Disponível em: <Disponível em: http://psycnet.apa.org/fulltext/2007-11761-001.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
http://psycnet.apa.org/fulltext/2007-117...
), que conduziram uma extensa metanálise da literatura a respeito das intervenções na escrita, concluíram que o ensino das estratégias, do resumo e da assistência em pares são as intervenções mais promissoras em termos de resultados pedagógicos.

Considerando esses achados e dando sequência aos seus objetivos, este estudo privilegiou os recursos linguísticos utilizados por alunos do fundamental I escrevendo textos argumentativos do 2º ao 5º ano. Esta pesquisa, que foi conduzida por aproximadamente três anos, objetivou mostrar que a estrutura argumentativa está presente em textos escritos por jovens alunos de uma escola pública no Brasil.

A habilidade de utilizar encadeamentos argumentativos muda substancialmente ao longo do nível fundamental I. A pesquisa revelou mudanças quantitativas e qualitativas, relativas, por exemplo, ao uso de adjetivos e advérbios. Esses achados são particularmente interessantes dado o fato de que os participantes não receberam qualquer instrução formal a respeito de técnicas argumentativas.

Com relação à natureza dos encadeamentos argumentativos em textos, a análise linguística dos blocos semânticos revelou a predominância dos encadeamentos normativos. Deve ser destacado que não houve perda de sentido, mesmo nos blocos semânticos construídos sem conectivos, isto é, nos implícitos.

Os encadeamentos normativos foram expressos por uma maior variedade de conjunções do que os transgressivos. Essa característica poderia indicar os tipos de operadores argumentativos mais utilizados por crianças com a mesma média de idade que os participantes da pesquisa. Então, a respeito do ensino da escrita, esse achado poderia ajudar professores e outros educadores a planejar currículos adequados para satisfazer as reais necessidades educacionais dos estudantes.

Parece que, por um período de mais de três anos, como os participantes foram repetidamente convidados a convencer alguém a respeito de algo, eles foram solicitados a se engajar em um processo contínuo de tomada de decisões. Para ser bem-sucedidos em suas tarefas, eles foram requisitados a escolher recursos linguísticos que produziriam melhores efeitos de sentido ao argumentar. Assim sendo, para atingir os objetivos, foram compelidos a isolar os elementos essenciais dos secundários. À luz de Vygotsky (1930/1978VYGOTSKY, Lev S. Mind and society: the development of higher psychological processes. Cambridge-MA: Harvard University Press, 1978. Trabalho original publicado em 1930), é então possível dizer que a qualidade das relações sociais ofertada pelas atividades da pesquisa influenciou o desenvolvimento dos participantes.

Também é possível que os resultados alcançados pelas crianças sejam correlacionados com as instruções recebidas. Para cumprir com as tarefas assinaladas, as crianças precisaram, embora sem estarem conscientes do fato, aproveitar-se de uma habilidade que elas já usavam, qual seja: argumentar no dia a dia. Tendo sido solicitadas a escrever textos argumentativos, as crianças precisaram fazer esforços deliberados para realizar algo que estavam acostumadas a executar intuitivamente. Portanto, é possível concluir que as tarefas da pesquisa também tiveram um papel pedagógico para o grupo de alunos envolvidos. Nesse contexto, nós podemos supor que sua professora de língua materna, como parceira mais experiente, tendo oferecido aos alunos a oportunidade de executar tarefas desafiadoras, colaborou para o desenvolvimento das habilidades linguísticas das crianças.

É importante frisar que a análise dos recursos linguísticos empregados pelas crianças ao escrever textos argumentativos abre novos caminhos para futuras pesquisas. Particularmente, nós podemos citar três: a primeira volta-se à investigação a respeito de quais tarefas argumentativas podem produzir melhores resultados educacionais ao ser oferecidas às crianças; a segunda consiste em acompanhar longitudinalmente as crianças que foram prematuramente ensinadas a respeito da escrita argumentativa para verificar se, mais tarde, alcançam melhores resultados ao escrever artigos acadêmicos; e, finalmente, a terceira área de interesse concerne às possíveis semelhanças entre as estratégias linguísticas usadas por alunos do ensino fundamental I e calouros universitários escrevendo textos acadêmicos pela primeira vez. Embora esse aspecto já tenha sido previamente estudado por outros autores, ainda não foi profundamente estudado e merece investigações subsequentes.

Para resumir, nós precisamos dizer que os resultados desta pesquisa implicam mudanças curriculares em países onde a estrutura argumentativa de textos não é ensinada nos primeiros anos escolares. Especificamente no Brasil, uma mudança como essa poderia dar oportunidade para crianças pouco privilegiadas de continuarem seus estudos em universidades renomadas, onde, como previamente mencionado, uma dissertação é solicitada como parte do processo de seleção.

CONCLUSÕES

No Brasil, há uma lacuna entre o currículo, inclusive traduzido nas práticas escolares, e o que é solicitado dos alunos para prosseguir seus estudos. Paralelamente, o domínio da estrutura argumentativa é exigido nos exames admissionais das universidades. Entretanto, o ensino da argumentação não ocorre até o décimo ano. Costuma-se pensar que as crianças não estariam emocionalmente maduras para aprender como escrever dissertações.

Tendo acompanhado, desde que eles aprenderam a escrever, participantes oriundos de populações socioeconomicamente desprivilegiadas, a pesquisa mostrou que essa linha de argumentação é falaciosa. Mesmo que as crianças não tenham recebido instrução formal, ainda assim usaram a estrutura argumentativa em seus textos desde os primeiros anos da escolaridade.

Uma das consequências do estudo é frisar a importância de ajustes curriculares para incluir o ensino da argumentação desde os primeiros anos da escolarização. Em países como o Brasil, isso poderia resultar no decréscimo da exclusão dos alunos das classes populares da educação superior.

AGRADECIMENTOS

Como sua generosidade foi fundamental para o desenvolvimento da pesquisa, agradecemos ao grupo de professores da escola onde o corpus foi coletado. Paralelamente, e sempre, agradecemos às crianças que deram vida a esta pesquisa em forma de cartas. Somos profunda mente gratas a Tanja Janssen, pesquisadora da Universidade de Amsterdam, pelas numerosas sugestões e revisão cuidadosa na primeira versão deste artigo. Esta pesquisa não recebeu qualquer auxílio específico dos setores público, comerciais ou não lucrativos.

REFERÊNCIAS

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    » http://www.filologia.org.br/ixcnlf/10/02.htm
  • ALVES, Maria Teresa Gonzaga; SOARES, José Francisco; XAVIER, Flavia Pereira. Índice Socioeconômico das Escolas de Educação Básica Brasileiras. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, Rio de Janeiro, v. 22, n. 84, p. 671-704, jul./set. 2014. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ensaio/v22n84/a05v22n84.pdf >. Acesso em: 13 out. 2017.
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  • ASCOMBRE, Jean-Claude; DUCROT, Oswald. L´argumentation dans la langue Bruxelles: Mardaga, 1983.
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Notas

  • 1
    No original: “This whole process of the transmission of knowledge and the formation of concepts, which is the basic way the adult influences the child, constitutes the central process of the child’s intellectual development.”

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    14 Nov 2017
  • Aceito
    14 Maio 2018
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