Acessibilidade / Reportar erro

Acurácia da Redução do Segmento-ST Pós-Trombólise como Preditor de Reperfusão Adequada em Estratégia Fármaco-Invasiva

Resumo

Fundamento

A intervenção coronária percutânea primária é considerada o “padrão-ouro” para reperfusão coronária. Entretanto, quando não disponível, a estratégia fármaco-invasiva é método alternativo, e o eletrocardiograma (ECG) tem sido utilizado para identificar sucesso na reperfusão.

Objetivos

Nosso estudo teve como objetivo examinar alterações no segmento-ST pós-lise e seu poder de prever a recanalização, usando os escores angiográficos TIMI e blush miocárdio (MBG) como critério de reperfusão ideal.

Métodos

Foram estudados 2.215 pacientes com infarto agudo do miocárdio com supra-ST submetidos à fibrinólise [(Tenecteplase)-TNK] e encaminhados para angiografia coronária em até 24 h pós-fibrinólise ou imediatamente encaminhados à terapia de resgate. O ECG foi realizado pré-TNK e 60 min-pós. Os pacientes foram categorizados em dois grupos: aqueles com reperfusão ideal (TIMI-3 e MBG-3) e aqueles com reperfusão inadequada (fluxo TIMI <3). Foi definido o critério de reperfusão do ECG pela redução do segmento ST >50%. Consideramos p-valor <0,05 para as análises, com testes bicaudais.

Resultados

O critério de reperfusão pelo ECG apresentou valor preditivo positivo de 56%; valor preditivo negativo de 66%; sensibilidade de 79%; e especificidade de 40%. Houve fraca correlação positiva entre a redução do segmento-ST e os dados angiográficos de reperfusão ideal (r = 0,21; p <0,001) e baixa precisão diagnóstica, com AUC de 0,60 (IC-95%; 0,57-0,62).

Conclusão

Em nossos resultados, a redução do segmento-ST não conseguiu identificar com precisão os pacientes com reperfusão angiográfica apropriada. Portanto, mesmo pacientes com reperfusão aparentemente bem-sucedida devem ser encaminhados à angiografia brevemente, a fim de garantir fluxo coronário macro e microvascular adequados.

Intervenção Coronária Percutânea/métodos; Infarto do Miocárdio; Angiografia Coronária; Terapia Trombolítica; Eletrocardiografia/métodos; Dor no Peito; Reperfusão Miocárdica

Abstract

Background

Primary percutaneous coronary intervention is considered the “gold standard” for coronary reperfusion. However, when not available, the drug-invasive strategy is an alternative method and the electrocardiogram (ECG) has been used to identify reperfusion success.

Objectives

Our study aimed to assess ST-Segment changes in post-thrombolysis and their power to predict recanalization and using the angiographic scores TIMI-flow and Myocardial Blush Grade (MBG) as an ideal reperfusion criterion.

Methods

2,215 patients with ST-Segment Elevation Myocardial Infarction (STEMI) undergoing fibrinolysis [(Tenecteplase)-TNK] and referred to coronary angiography within 24 h post-fibrinolysis or immediately referred to rescue therapy were studied. The ECG was performed pre- and 60 min-post-TNK. The patients were categorized into 2 groups: those with ideal reperfusion (TIMI-3 and MBG-3) and those with inadequate reperfusion (TIMI and MBG <3). The ECG reperfusion criterion was defined by the reduction of the ST-Segment >50%. A p-value <0.05 was considered for the analyses, with bicaudal tests.

Results

The ECG reperfusion criterion showed a positive predictive value of 56%; negative predictive value of 66%; sensitivity of 79%; and specificity of 40%. There was a weak positive correlation between ST-Segment reduction and ideal reperfusion angiographic data (r = 0.21; p <0.001) and low diagnostic accuracy, with an AUC of 0.60 (95%CI: 0.57-0.62).

Conclusion

The ST-Segment reduction was not able to accurately identify patients with adequate angiographic reperfusion. Therefore, even patients with apparently successful reperfusion should be referred to angiography soon, to ensure adequate macro and microvascular coronary flow.

Percutaneous Coronary Intervention; Myocardial Infarction; Coronary Angiography; Thrombolytic Therapy; Electrocardiography/methods; Chest Pain; Myocardial Reperfusion

Introdução

Embora a intervenção coronária percutânea primária (ICP) seja considerada tratamento “padrão-ouro” para o infarto agudo do miocárdio com elevação do segmento-ST (IAMCSST), ela não está suficientemente disponível, principalmente nos países em desenvolvimento.11. Piegas LS, Haddad N. Percutaneous coronary intervention in Brazil: results from the Brazilian Public Health System. Arq Bras Cardiol. 2011;96(4):317-23. Considerando esse cenário, a estratégia fármaco-invasiva, com fibrinólise e encaminhamento para angiografia coronária, provou ser opção viável, como orientado por diretrizes e observado em vários estudos, dentre eles o STREAM, com inquestionável benefício quando aplicada nas primeiras horas do evento.22. Ibanez B, James S, Agewall S, Antunes MJ, Bucciarelli-Ducci C, et al. Document Reviewers; 2017 ESC Guidelines for the management of acute myocardial infarction in patients presenting with ST-segment elevation: The Task Force for the management of acute myocardial infarction in patients resenting with ST-segment elevation of the European Society of Cardiology (ESC). Eur Heart J. 2017;39(2):119-77.

3. Armstrong PW, Gershlick AH, Goldstein P, Wilcox R, Danays T, Lambert Y, et al, STREAM Investigative Team. Fibrinolysis or primary PCI in ST-segment elevation myocardial infarction. N Engl J Med. 2013 Apr 11; 368(15):1379-87.

4. Rawles JM. Quantification of the benefit of earlier thrombolytic therapy: five-year results of the Grampian Region Early Anistreplase Trial (GREAT). J Am Coll Cardiol. 1997;30(5):1181-6.
-55. Danchin N, Popovic B, Puymirat E, Goldstein P, Belle L, Cayla G, et al. The FAST-MI Investigators. Five-year outcomes following timely primary percutaneous intervention, late primary percutaneous intervention, or a pharmaco-invasive strategy in ST-segment elevation myocardial infarction: the FAST-MI programme. Eur Heart J. 2020;41(7):858-66. Desta forma, em projeto iniciado em 2010, a Secretaria Municipal de Saúde, a Universidade Federal de São Paulo e o Serviço Móvel de Assistência Médica organizaram um sistema planejado de trombólise em núcleos periféricos de saúde, com transferência a centro universitário para a realização de angiografia e tratamento da artéria culpada. Dentro deste contexto, o uso de biomarcadores à beira-leito é essencial para a discriminação de pacientes que obtiveram resultados adequados e aqueles que devem ser encaminhados para a angioplastia de resgate.

O eletrocardiograma (ECG) é método acessível na avaliação dos pacientes com dor torácica, não apenas para fins diagnósticos, mas também na avaliação estratificadora. Desta forma, tem sido proposta a observação do comportamento do segmento-ST como preditor de sucesso terapêutico pós-trombólise na aferição da reperfusão.66. Schweitzer P. The electrocardiographic diagnosis of acute myocardial infarction in the thrombolytic era. Am Heart J. 1990;119(3Pt1):642-54.Portanto, nosso estudo teve como objetivo examinar as modificações do segmento ST pós-lise e seu poder preditivo, tendo como variável de desfecho os escores angiográficos Thrombolyis in Myocardial Infarction (TIMI-flow) e o Myocardial Blush Grade (MBG) como critérios de reperfusão macro e microvascular adequados.

Métodos

Estudo transversal, com análise retrospectiva das variáveis de interesse. No período (março de 2010 a janeiro de 2018), 2.215 pacientes foram incluídos consecutivamente e submetidos à terapia trombolítica com tenecteplase (TNK) nos centros primários de saúde, com confirmação eletrocardiográfica do IAMCSST e com encaminhamento para angiografia em até 24 h pós-fibrinólise, ou imediatamente se a terapia de resgate fosse necessária. Dispomos de banco de dados centralizado utilizado para o presente estudo, contendo informações demográficas, clínicas, ECG, tratamentos, intervalos de tempo e eventos hospitalares. O estudo está em conformidade com a Declaração de Helsinque, e o comitê de ética nomeado localmente aprovou o protocolo de pesquisa, sendo o consentimento informado obtido dos pacientes ou de seus representantes legais. O estudo está inscrito e registrado no ClinicalTrials.gov, sob número (NCT02090712). O fluxograma da coorte estudada é mostrado na Figura 1.

Figura 1
– Fluxograma da coorte estudada.

Estratégia fármaco-invasiva

A estratégia fármaco-invasiva foi definida como o uso de trombólise com TNK, em dose ajustada pelo peso, seguida de cateterismo cardíaco em até 24 h.77. Larson DM, McKavanagh P, Henry TD, Cantor WJ. Reperfusion options for ST Elevation myocardial infarction patients with expected delays to percutaneous coronary intervention. Interv Cardiol Clin. 2016 Oct;5(4):439-50.Após os resultados do estudo STREAM,33. Armstrong PW, Gershlick AH, Goldstein P, Wilcox R, Danays T, Lambert Y, et al, STREAM Investigative Team. Fibrinolysis or primary PCI in ST-segment elevation myocardial infarction. N Engl J Med. 2013 Apr 11; 368(15):1379-87.em 2013, pacientes >75 anos de idade receberam meia dose (1/2-TNK). Apenas pacientes com contraindicação absoluta à fibrinólise foram excluídos dessa análise. Os pacientes foram pré-medicados com dose de ataque de ácido acetilsalicílico e de clopidogrel. A angiografia de resgate foi indicada por julgamento da equipe médica local, devido à suspeita de trombólise ineficaz para tratamento da artéria relacionada ao infarto (ARI).

Variável eletrocardiográfica estudada

O critério eletrocardiográfico para reperfusão bem-sucedida foi definido pela redução >50% do supradesnivelamento do segmento ST na derivação com a maior elevação. Os ECG foram realizados pré e 60 min pós-lise e obtidos em 12 derivações (velocidade 25 mm/s; 10 mm/mV). A elevação do ST foi definida como a elevação do ponto J em 2 ou mais derivações contíguas, com limite de ≥0,2 mV nas derivações V1-V3, e ≥0,1mV nas demais derivações. A análise dos segmentos ST foi realizada retrospectivamente e por observadores independentes que desconheciam as características clínicas e angiográficas dos pacientes.

Variáveis angiográficas estudadas

Cardiologistas intervencionistas experientes realizaram as análises angiográficas de acordo com os escores TIMI-fluxo e MBG descritos a seguir:

  1. Thrombolysis in Myocardial Infarction (TIMI-fluxo): grau 0: obstrução completa da ARI; grau 1: o contraste penetra além do ponto de obstrução, não opacificando completamente o vaso; grau 2: opacificação em todo o vaso, porém com fluxo retardado; grau 3: há perfusão plena na ARI, com fluxo normal.

  2. Myocardial Blush Grade (MBG): grau 0: opacificação do miocárdio na região irrigada pela ARI; grau 1: o contraste penetra lentamente na microcirculação e permanece até a injeção de contraste subsequente; grau 2: opacificação do miocárdio e saída lenta do contraste, persistindo até o final da fase de washout, mas não até a próxima injeção; grau 3: fluxo normal na microcirculação, com presença de mínima quantidade ou ausência de contraste na fase de washout.

Os pacientes foram categorizados de acordo com o TIMI-fluxo e MBG em dois grupos: aqueles com reperfusão adequada (fluxo TIMI-3 e MBG-3) e aqueles sem reperfusão ótima (fluxo TIMI <3). Aspectos intrínsecos ao procedimento – tais como via de acesso, administração de inibidores de glicoproteína IIb/IIIa e tromboaspiração – ficaram a critério dos operadores médicos. As análises das angiografias foram realizadas retrospectivamente por investigadores independentes, e que desconheciam as características clínicas e epidemiológicas dos pacientes incluídos no estudo.

Análise estatística

Variáveis contínuas foram descritas como média ± desvio padrão (m ± dp) ou mediana e intervalo interquartil, md (IIQ), conforme normalidade dos dados. Para a avaliação dos pressupostos de normalidade, utilizamos o teste de Kolmogorov-Smirnov e a inspeção dos coeficientes de curtose e assimetria. As variáveis categóricas foram descritas por distribuições de frequência absoluta e relativa. Para as comparações entre os grupos, utilizamos Teste-T de Student não pareado ou Teste-U não paramétrico de Mann-Whitney para variáveis contínuas e teste qui-quadrado (χ2) de Pearson para variáveis categóricas, com correção de Yates. O coeficiente de Kendall-tau, teste de hipótese não paramétrico, foi utilizado para verificar a correlação entre a redução do segmento ST e os padrões angiográficos em variáveis categóricas dicotômicas. Curvas ROC (receiver operating characteristic curve) foram construídas para a inspeção de sensibilidade/especificidade da regressão do segmento ST com base nos escore TIMI-fluxo e MBG. A razão de verossimilhança positiva [(positive likelihood-ratio), RV (+)] foi calculada: RV (+) = sensibilidade / (1- especificidade). Bons testes de diagnóstico têm RV (+) >10, e seu resultado positivo tem contribuição significativa. A razão de verossimilhança para resultados negativos [(negative likelihood-ratio), RV (-)] é um bom indicador para descartar o diagnóstico. Bons testes diagnósticos têm RV (-) <0,1; calculada: RV (-) = (1- sensibilidade) / especificidade. A razão de chance diagnóstica, [(diagnostic odds ratio), RCD] também é uma medida de precisão, usada para estimar o poder discriminativo e a comparação de precisões entre os testes. A RCD foi a razão das chances de positividade no grupo com redução do segmento ST >50% com as chances de positividade no grupo sem redução ST. Consideramos p-valor <0,05 estatisticamente significante a priori para todas as análises, com testes bicaudais. As análises foram realizadas no SPSS-versão-20 (IBM-SPSS Statistics, New York, EUA)®.

Resultados

Foram incluídos pacientes de ambos os sexos, sendo 70,2% do sexo masculino; a mediana da idade foi de 58 anos, IIQ (50-66). O tempo desde o início dos sintomas até o centro de atenção primária foi de 220 min, IIQ (140-345). A prevalência de fatores de risco e as características dos pacientes no período basal são relatadas na Tabela 1. Em resumo, 60,7% eram hipertensos; 29,8% tinham diabetes; 63,1% eram fumantes. Além disso, 11% apresentavam infarto prévio do miocárdio, e 4,3%, acidente vascular encefálico prévio. Os preditores de risco utilizados foram registrados no período basal. Observamos que a maioria dos pacientes apresentava-se em classe funcional baixa pela classificação Killip-Kimball:88. Killip 3rd T, Kimball JT. Treatment of myocardial infarction in a coronary care unit. A two year experience with 250 patients. Am J Cardiol. 1967;20(4):457-64.I (73%), II (16,3%), III (2,2%), IV (8,6%); e com baixo perfil de risco pelos escores de predição, TIMI-Risk:99. Morrow DA, Antman EM, Charlesworth A, Cairns R, Murphy SA, Lemos JA, et al. TIMI risk score for ST-elevation myocardial infarction: a convenient, bedside, clinical score for risk assessment at presentation An intravenous nPA for Treatment of Infarcting Myocardium Early II Trial substudy. Circulation. 2000;102(17):2031-7. 3, IIQ (2-5); GRACE1010. Eagle KA, Lim MJ, Dabbous OH, Pieper KS, Goldberg RJ, Van de Werf F, et al. A validated prediction model for all forms of acute coronary syndrome: estimating the risk of 6-month postdischarge death in an international registry. JAMA. 2004;291(22):2727-33. 136, IIQ (117-161), ou seja, perfil de baixo risco.

Tabela 1
– Características da coorte estudada no período basal

Distribuição do fluxo coronário de acordo com o padrão TIMI/MBG

Na avaliação subjetiva do fluxo TIMI e MBG, a concordância interobservadores foi de 94%. Distribuição da ARI de acordo com o escore TIMI-fluxo (0-3): 21%; 3,6%; 14,4%; 61%, respectivamente. Avaliação do MBG (0-3): 42%; 3,5%; 2,5%; 52%, respectivamente, avaliadas apenas em pacientes com fluxo TIMI-3.

Distribuição das artérias relacionadas ao infarto

Observamos a seguinte distribuição das ARI: artéria descendente anterior esquerda (40,3%); coronária direita (35,3%); coronária circunflexa esquerda (6,8%); e ramos das principais artérias (17,6%). A descrição das ARI e a análise das regiões envolvidas no ECG e sua distribuição, de acordo com o sexo, podem ser vistas na Tabela 2.

Tabela 2
– Descrição da artéria relacionada ao infarto e análise das regiões eletrocardiográficas com elevação do segmento-ST e sua distribuição de acordo com o sexo

Distribuição das medidas pelo critério ECG de acordo com o fluxo TIMI/MBG

A predição de reperfusão coronária adequada utilizando o critério ECG (redução do segmento ST >50%) mostrou valor preditivo positivo de 56% [IC 95% (0,54-0,59)]; valor preditivo negativo de 66% [IC 95% (0,62-0,70)]; sensibilidade de 79% [IC 95% (0,76-0,81)]; e especificidade de 40% [IC 95% (0,38-0,44)]. Razão de verossimilhança positiva (RV +) de 1,32; razão de verossimilhança negativa (RV –) de 0,52. A razão de chance diagnóstica [RCD (diagnostic odds ratio)] foi de 2,55 (razão entre chances de positividade no grupo com redução do segmento ST em relação às chances de positividade no grupo sem redução ST). Assim, observamos correlação positiva fraca entre a redução do segmento ST e o padrão angiográfico de reperfusão, considerando TIMI-3 e MBG-3, (r = 0,21; p <0,001) como observado na Figura 2. Destacamos, ainda, o comportamento do critério ECG para recanalização e sua correspondência com os escores angiográficos, estratificados por sexo, que não foram significativamente diferentes (Tabela 3). A Figura 3 mostra a área sob a curva (AUC) de 0,60 [IC-95% (0,57-0,62)] naqueles com redução do segmento ST e o padrão angiográfico (TIMI-3/MBG-3): [(A-geral; B-feminino; C-masculino)].

Figura 2
– Correlação entre os padrões angiográficos (TIMI-3 e MBG-3) e o critério eletrocardiográfico de reperfusão.

Tabela 3
– Correlação entre redução do segmento ST e os escores TIMI- 3/Blush- 3, estratificados por sexo

Figura 3
– Área sob a curva em pacientes que apresentaram TIMI-fluxo -3/MBG- 3 e redução do segmento ST pós-trombólise. Todos os pacientes, grupo resgate e estratificado pelo sexo.

Características clínicas dos pacientes encaminhados para terapia de resgate

Os pacientes foram encaminhados para a terapia de resgate pelo julgamento da equipe médica local, com taxa de 24,28%. As características clínico-epidemiológicas entre o grupo resgate e o grupo angiografia eletiva podem ser observadas na Tabela 4. No grupo resgate, encontramos sensibilidade e especificidade de 59% e 53%, respectivamente, para a redução do ST na predição de (TIMI-3/MBG-3). A AUC foi de 0,56 [IC-95% (0,51-0,62)] conforme mostrado na Figura 3: [(grupo D-resgate)].

Tabela 4
– Características clínico-epidemiológicas dos pacientes do grupo angiografia eletiva e dos encaminhados para angioplastia de resgate

Discussão

Um aspecto crítico da redução dos danos associados ao infarto do miocárdio é a garantia de acesso à emergência, na qual a identificação dos sintomas e a obtenção de ECG inicial são fundamentais. Com ICP indisponível em unidades básicas de saúde e em muitos hospitais, a estratégia fármaco-invasiva é alternativa recomendada no IAMCSST.22. Ibanez B, James S, Agewall S, Antunes MJ, Bucciarelli-Ducci C, et al. Document Reviewers; 2017 ESC Guidelines for the management of acute myocardial infarction in patients presenting with ST-segment elevation: The Task Force for the management of acute myocardial infarction in patients resenting with ST-segment elevation of the European Society of Cardiology (ESC). Eur Heart J. 2017;39(2):119-77. O melhor método para obtenção da reperfusão tem sido tema de debate, essencialmente enviesado pela percepção competitiva entre as possibilidades de revascularização. Encontra-se bem fundamentada que a melhor estratégia é aquela que está disponível dentro de prazos bem estabelecidos, sendo indiferentes nas primeiras horas de início dos sintomas isquêmicos. O grupo dos trialistas demonstrou que, entre os pacientes com dor dentro de 6 horas, 30 mortes foram prevenidas/1.000; entre 7 a 12 horas, seriam evitadas aproximadamente 20 mortes/1.000.1111. Fibrinolytic Therapy Trialists’ (FTT) Collaborative Group. Indications for fibrinolytic therapy in suspected acute myocardial infarction: collaborative overview of early mortality and major morbidity results from all randomised trials of more than 1000 patients. Lancet. 1994;343(8893):311-22. Destacam-se, portanto, a importância do rápido reconhecimento dos sintomas isquêmicos e a prontidão no tratamento. Desta forma, tanto a ICP primária quanto a fibrinólise são tratamentos bem estabelecidos, e os benefícios são maximizados quando o tratamento ocorre precocemente.1212. Widimský P, Groch L, Zelízko M, Aschermann M, Bednár F, Suryapranata H. Multicentre randomized trial comparing transport to primary angioplasty vs immediate thrombolysis vs combined strategy for patients with acute myocardial infarction presenting to a community hospital without a catheterization laboratory. The PRAGUE study. Eur Heart J. 2000 May;21(10):823-31.Metanálise relatou risco aumentado de insuficiência cardíaca de início recente, com aumento relativo na incidência por hora de atraso nas estratégias de reperfusão.1313. Goel K, Pinto DS, Gibson CM. Association of time to reperfusion with left ventricular function and heart failure in patients with acute myocardial infarction treated with primary percutaneous coronary intervention: A systematic review. Am Heart J. 2013;165(4):451-67.

Nosso estudo foi uma tentativa de fornecer, por meio da interpretação das alterações no ECG pós-fibrinólise à beira-leito, uma estratificação de risco, determinando quais pacientes deveriam ser encaminhados para estudo angiográfico urgenciado e quais poderiam ser encaminhados de maneira eletiva. De fato, o ECG tem papel fundamental na precisão diagnóstica, devendo ser obtido o mais precocemente possível. No cenário das síndromes agudas, biomarcadores de reperfusão, obtidos à beira-leito, são cruciais na estratificação. Assim, a utilidade do critério de redução do segmento ST em prever a reperfusão tem sido empregada como desfecho substituto em alguns ensaios clínicos. Em análise de subgrupo proveniente da coorte DANAMI-2 (DANish trial in Acute Myocardial Infarction-2), a resolução do ST após 4 h associou-se às maiores taxas de reinfarto entre os pacientes que receberam fibrinolítico, enquanto não foi observada nos pacientes que receberam tratamento percutâneo.1414. Sejersten M, Valeur N, Grande P, Nielsen TT, Clemmensen P, DANAMI-2 Investigators. Long-term prognostic value of st-segment resolution in patients treated with fibrinolysis or primary percutaneous coronary intervention: results from the DANAMI-2 (DANish trial in acute myocardial infarction-2). J Am Coll Cardiol. 2009;54(19):1763-9.O tempo para obter ECG pós-fibrinólise é variável. No estudo REACT, foi definida a redução de 50% do ST aos 90 min pós-fibrinólise, já o estudo MERLIN definiu reperfusão coronária usando o mesmo critério aos 60 min. O tempo médio desde o início dos sintomas até o resgate para a ICP foi de 414 min no estudo MERLIN e 327 min no REACT.1515. Shiomi H, Morimoto T, Kitaguchi S, Nakagawa Y, Ishii K, Haruna Y, et al. The ReACT Trial: Randomized Evaluation of Routine Follow-up Coronary Angiography after Percutaneous Coronary Intervention Trial (ReACT), JACC Cardiovasc Interv. 2017 Jan 23;10(2):109-17,1616. Sutton AG, Campbell PG, Graham R, Price DJ, Gray JC, Grech ED, et al. A randomized trial of rescue angioplasty versus a conservative approach for failed fibrinolysis in ST-segment elevation myocardial infarction: the Middlesbrough Early Revascularization to Limit INfarction (MERLIN) trial. J Am Coll Cardiol. 2004;44(2):287-96. A reperfusão bem-sucedida foi considerada quando o fluxo distal esteve restaurado na artéria culpada utilizando-se do escore angiográfico TIMI-fluxo, descrito previamente.

Dentro deste contexo, postulou-se a teoria da “artéria aberta”, indicando impacto prognóstico se a artéria fosse recanalizada.1717. Roe MT, Ohman EM, Maas AC, Christenson RH, Mahaffey KW, Granger CB, et al. Shifting the open-artery hypothesis downstream: the quest for optimal reperfusion. J Am Coll Cardiol. 2001 Jan;37(1):9-18. Nesse amplo espectro, Gibson et al.18 introduziram um refinado método na avaliação da perfusão miocárdica, o TIMI-fluxo, onde a reperfusão era considerada angiograficamente bem-sucedida quando o TIMI-3 fosse alcançado.1919. Hof AWJ. Successful reperfusion therapy: from epicardial to myocardial salvage. Rev Esp Cardiol. 2010;63(7):757-9.,2020. Anderson JL, Karagounis LA, Becker LC, Sorensen SG, Menlove RL. TIMI perfusion grade 3 but not grade 2 results in improved outcome after thrombolysis for acute myocardial infarction. Ventriculographic, enzymatic, and electrocardiographic evidence from the TEAM-3 study. Circulation. 1993;87(6):1829-39. No entanto, mesmo quando alcançado esse escore, alguns pacientes apresentam perfusão tissular inadequada e vários mecanismos têm sido sugeridos – dentre outros, a embolização distal e o fenômeno no-reflow.2121. Fernandes MR, Fish RD, Canales J, Aliota J, Silva GV, Perin EC, et al. Restoration of microcirculatory patency after myocardial infarction. results of current coronary interventional strategies and techniques. Tex Heart Inst J. 2012;39(3):342-50.

22. Stambuk K, Krcmar T, Zeljkovic I. Impact of intracoronary contrast injection pressure on reperfusion during primary percutaneous coronary intervention in acute ST-segment elevation myocardial infarction: A prospective randomized pilot study. Int J Cardiol Heart Vasc. 2019 Aug 20;24:100412.
-2323. Ito H, Maruyama A, Iwakura K, Takiuchi S, Masuyama T, Hori M, et al. Clinical implications of the “no reflow” phenomenon: a predictor of complications and left ventricular remodelling in reperfused anterior wall myocardial infarction. Circulation. 1996;93(2):223-8.Posteriormente, Hoffmann et al.2424. Hoffmann R, Haager P, Lepper W, Franke A, Hanrath P. Relation of coronary flow pattern to myocardial blush grade in patients with first acute myocardial infarction. Heart. 2003;89(10):1147-51.divulgaram o conceito de rubor miocárdio (MBG) como índice angiográfico do fluxo microvascular, posto que pacientes com fluxo TIMI-3 e MBG normal apresentavam menores taxas de mortalidade. A restauração da perviedade vascular coronária não é garantia de perfusão tecidual, portanto, entendemos que a presença de MBG adequado é uma característica prognóstica relevante e deveria ser adicionada à classificação fluxo-TIMI, comumente usada para definir reperfusão angiográfica bem-sucedida.2525. Henriques JPS, Zijlstra F, Hof AWJ, Boer MJ, Dambrink JHE, Gosselink M, et al. Angiographic assessment of reperfusion in acute myocardial infarction by myocardial blush grade. Circulation. 2003;107(16):2115-9.

26. Stone GW, Peterson MA, Lansky AJ, Dangas G, Mehran R, Leon MB. Impact of normalized myocardial perfusion after successful angioplasty in acute myocardial infarction. J Am Coll Cardiol. 2002;39(4):591-7.
-2727. Kampinga MA, Nijsten MW, Gu YL, Dijk WA, de Smet BJ, Heuvel AF, et al. Is the myocardial blush grade scored by the operator during primary percutaneous coronary intervention of prognostic value in patients with ST-elevation myocardial infarction in routine clinical practice? Circ Cardiovasc Interv. 2010 Jun 1;3(3):216-23.Anormalidades avaliadas pelo MBG correlacionam-se com remodelamento ventricular desfavorável, mesmo após ajustes para a presença de fluxo TIMI-3.2828. Prado AP, Fernández-Vázqueza F, Cuellas-Ramóna JC, Gibson CM. Coronary angiography: beyond coronary anatomy. Rev Esp Cardiol. 2006;59(6):596-608.

29. Dibra A, Mehilli J, Dirschinger J, Pache J, Neverve J, Schwaiger M, et al. Thrombolysis in myocardial infarction myocardial perfusion grade in angiography correlates with myocardial salvage in patients with acute myocardial infarction treated with stenting or thrombolysis. J Am Coll Cardiol. 2003;41(6):925-9.

30. Angeja BG, Gunda M, Murphy SA, Sobel BE, Rundle AC, Syed M, et al. TIMI myocardial perfusion grade and ST segment resolution: association with infarct size as assessed by single photon emission computed tomography imaging. Circulation. 2002;105(3):282-5.
-3131. Rezkalla SH, Kloner RA. Coronary no-reflow phenomenon: from the experimental laboratory to the cardiac catheterization laboratory. Catheter Cardiovasc Interv. 2008;72(7):950-7.

Utilizada como critério de reperfusão, identificamos ensaios associando a persistência da elevação do segmento ST com prognósticos. Em interessante estudo, foi observado que, em pacientes submetidos a ICP-primária, a redução do ST não previu mortalidade a longo prazo.3232. Ndrepepa G, Alger P, Kufner S, Mehilli J, Schömig A, Kastrati A. ST-segment resolution after primary percutaneous coronary intervention in patients with acute ST-segment elevation myocardial infarction. Cardiol J. 2012;19(1):61-9. Outro estudo não encontrou alteração no valor prognóstico da redução de ST pós-ICP em acompanhamento de longo prazo para os principais desfechos.3333. Zwaan HB, Stoel MG, Roos-Hesselink JW, Veen G, Boersma E, Birgelen C. Early versus late ST-segment resolution and clinical outcomes after percutaneous coronary intervention for acute myocardial infarction. Neth Heart J. 2010 Sep;18(9):416-22.Por sua vez, o comportamento do segmento-ST dentro de 60 minutos após ICP-primária bem-sucedida também foi avaliado por sua associação com menores taxas de mortalidade em curto e longo prazo, com gradação da redução do ST (>70%; 30-70%; <30%). Neste estudo, na ausência de redução do segmento ST, foram identificados pacientes com menor probabilidade de benefício da restauração precoce do fluxo na ARI, provavelmente devido a danos microvasculares e subsequente menor preservação miocárdica.3434. Matetzky S, Novikov M, Gruberg L, Freimark D, Feinberg M, Elian D, et al. The significance of persistent ST elevation versus early resolution of ST segment elevation after primary PTCA. J Am Coll Cardiol. 1999;34(7):1932-8.Todavia, grande parte destes estudos contemplou pacientes submetidos à ICP-primária, e não pós-trombólise, além de não consideraram o padrão MBG como definidor de melhor padrão angiográfico de reperfusão. A presença de resolução precoce da elevação do segmento ST pós ICP-primária angiograficamente bem-sucedida identifica pacientes com maior probabilidade de se beneficiar da restauração precoce do fluxo na ARI. Destaca-se, ainda, que as medidas TIMI-fluxo superestimam muito o sucesso na ICP-primária. Nos estudos pós-fibrinólise, a definição de sucesso angiográfico era caracterizada pela presença de TIMI 2 e 3. Entretanto, pacientes com TIMI-fluxo <3 apresentam pior evolução clínica, sobretudo a médio e longo prazo, quando comparados ao grupo de pacientes com TIMI-fluxo-3.

A medição exata da elevação do segmento ST é complexa e poderia prejudicar a simplicidade do modelo, sobretudo na sala de emergência. No entanto, na maioria dos casos, mensurações precisas não são necessárias, pois podem ser facilmente obtidas em comparação visual dos ECG.3535. Kaluzay J, Vandenberghe K, Fontaine D, Ganame J, Anné W, Merwe N, et al. Importance of measurements at or after the j-point for evaluation of ST-segment deviation and resolution during treatment for acute myocardial infarction. Int J Cardiol. 2005 Feb 28;98(3):431-7.Vários métodos para avaliar a resolução de ST são descritos, a maior parte deles inclui a resolução porcentual; alguns utilizam uma única derivação, enquanto outros mensuram a somatória de desvios em múltiplos canais. Em nossos apontamentos, a detecção da reperfusão usando critérios mais rigorosos, como a resolução completa do segmento ST ou redução >70%, apresentou melhor especificidade, porém com baixa sensibilidade e pouca capacidade preditiva. A acurácia prognóstica de distintos métodos na avaliação do segmento ST pós ICP foi analisada no estudo Controlled Abciximab and Device Investigation to Lower Late Angioplasty Complications (CADILLAC), demonstrando que a análise do ST em valores absolutos em derivação única no ECG pós-intervenção foi ao menos equivalente, do ponto de vista prognóstico, a algoritmos mais complexos.3636. McLaughlin MG, Stone GW, Aymong E, Gardner G, Mehran R, Lansky AJ, et al. Prognostic utility of comparative methods for assessment of ST-segment resolution after primary angioplasty for acute myocardial infarction: the Controlled Abciximab and Device Investigation to Lower Late Angioplasty Complications (CADILLAC) trial. J Am Coll Cardiol. 2004;44(6):1215-23. A avaliação da reperfusão angiográfica pode ser prevista por alterações no segmento ST e foi descrita em nossa coorte. Quando aplicamos o índice de correlação entre o critério TIMI-3 e MBG-3 e reperfusão, pelo critério de ECG, obtivemos valor semelhante ao observado quando consideramos apenas a classificação angiográfica fluxo TIMI-3. Mesmo agrupando e comparando pacientes com alterações isquêmicas em parede anterior versus infarto “não anterior”, a redução do segmento ST >50% não previu de forma acurada os melhores padrões angiográficos.

Embora existam terapias eficazes, ainda há carência de informações qualitativas disponíveis para a estratificação, notadamente no modelo de estratégia fármaco-invasiva, em que a avaliação preliminar em centros e unidades básicas de saúde pode ser impactante a um melhor prognóstico. A utilização de modelos multivariados na forma de escores representa uma forma interessante na predição, superior à obtida de maneira subjetiva apenas pela impressão clínica. Ferramentas que auxiliem a capacidade médica em avaliar rápida e precisamente o risco são, portanto, de grande interesse. Não obstante a existência de preditores bem caracterizados, a estimativa de risco é desafiadora, em virtude de perfis complexos que demandam integração de variáveis e com calibração para populações locais.3737. Yan AT, Yan RT, Tan M, Casanova A, Labinaz M, Sridhar K, et al. Risk scores for risk stratification in acute coronary syndromes: useful but simpler is not necessarily better. Eur Heart J. 2007;28(9):1072-8.

Em nossa coorte, registramos 116 óbitos (5,3%) e de maneira esperada, com maior incidência no grupo resgate (11,5% vs. 2,4%). Complicações como choque cardiogênico e instabilidades elétricas graves foram as principais causas de mortalidade, com os pacientes pertencentes à classificação funcional IV (Killip-Kimball) com as maiores taxas de letalidade. No modelo de regresão multivariável, a classe Killip-Kimball foi o preditor mais poderoso, com risco crescente de mortalidade a cada piora de categoria. Outro importante ponto a se destacar é que menores taxas de mortalidade foram observadas no grupo que recebeu a trombólise mais cedo, reforçando o conceito de que reperfusão precoce atenua o risco de complicações, pelo menos em curto prazo.

Idealmente, um indicador de reperfusão deve ser prontamente obtido e aplicável principalmente à beira-leito. Em nossa coorte, o encaminhamento para o estudo angiográfico precoce deveu-se possivelmente frente às modificações no segmento ST, pois pacientes que não apresentaram redução pós-trombólise foram referenciados à terapia de resgate mais rapidamente. No grupo com redução do ST >50%, o tempo mediano entre a trombólise e o laboratório de cateterismo foi de 960 min versus 410 min no grupo sem redução do ST. Entretanto, essa pode ter sido uma opção equivocada, pois 24,5% apresentavam TIMI-3/MBG-3 caracterizando diagnóstico de gravidade falso-positivo. Além disso, 38,5% do grupo que apresentou redução >50% apresentava padrão angiográfico TIMI-fluxo <3, subestimando o risco real. Em recente estudo de nosso grupo, com a inclusão de 104 pacientes e análise da mensuração do intervalo QT e sua dispersão nas 12 derivações, e também apenas na região com supradesnivelamento do segmento ST (nominada dispersão regional do intervalo QT) pré e 60 min pós-lise, observamos aumento da dispersão regional do intervalo QT (dQT-Reg) pós-lise em infartos de parede anterior nos casos fluxo TIMI-3/MBG-3, com sensibilidade e especificidade de 93% e 71%, respectivamente. Embora com número pequeno de pacientes avaliados, estes dados sugerem a dQT-Reg um instrumento promissor na identificação não invasiva de reperfusão.3838. Dotta G, Fonseca FAH, Izar MCO, Souza MT, Moreira FT, Pinheiro LFM, et al. Regional QT interval dispersion as an early predictor of reperfusion in patients with acute myocardial infarction after fibrinolytic therapy. Arq Bras Cardiol. 2019 Jan;112(1):20-9.

É clinicamente reconhecida a capacidade em predição do alívio dos sintomas isquêmicos durante a reperfusão.3939. Califf RM, O’Neil W, Stack RS, Aronson L, Mark DB, Mantell S, et al. Failure of simple clinical measurements to predict perfusion status after intravenous thrombolysis. Ann Intern Med. 1988 May;108(5):658-62. No entanto, este relato fica sujeito às influências idiossincráticas, assim como possível mascaramento dos sintomas pela utilização de fármacos (nitratos, analgesia, sedação). Um grave problema identificado em alguns centros é a fibrinólise inadvertida pela leitura incorreta dos ECG, com reportagem de que 5,7% a 11,0% dos pacientes tratados como IAMCSST não apresentavam infarto do miocárdio.4040. Khoury NE, Borzak S, Gokli A, Havstad S, Smith ST, Jones M. “Inadvertent” thrombolytic administration in patients without myocardial infarction: clinical features and outcome. Ann Emerg Med. 1996;28(3):289-93. Em nossa coorte, identificamos sete casos que, inadvertidamente, receberam trombolíticos pelas seguintes causas: pericardite aguda, anormalidades não isquêmicas da repolarização ventricular e dissecção da aorta.

A instituição da terapia trombolítica precoce continua sendo pedra angular para melhorar a sobrevida pós-IAMCSST. No entanto, como evidenciado em nossas anotações, o atraso, entre o início dos sintomas até a admissão nas unidades de saúde foi prolongado, não havendo, entretanto, diferenças quanto ao comportamento do segmento ST pós-trombólise. No modelo de regressão multinomial, nossos dados sinalizam para os melhores resultados angiográficos aos pacientes encaminhados precocemente ao estudo hemodinâmico, de forma independente do comportamento do segmento ST. Portanto, acreditamos que a melhor estratégia pós-trombólise é a rápida condução ao centro de angiografia referenciado.4141. Bär F, Vainer J, Stevenhagen J, Neven K, Aalbregt R, Ophuis TO, et al. Ten-year experience with early angioplasty in 759 patients with acute myocardial infarction. J Am Coll Cardiol. 2000 Jul;36(1):51-8. No entanto e desafortunadamente, o tempo disponível para esses pacientes permanece inadequado, possivelmente devido aos sérios problemas logísticos enfrentados nas grandes cidades. Por esse motivo, reduzir esses tempos continua sendo um desafio em projetos de saúde pública.4242. Bradley EH, Herrin J, Wang Y, Barton BA, Webster TR, Mattera JA, et al. Strategies for reducing the door-to-balloon time in acute myocardial infarction. N Engl J Med. 2006;355(22):2308-20.

Limitações do estudo

Limitações do presente estudo devem ser declaradas. Esta foi uma análise exploratória e de centro único. Além disso, os ECG e as angiografias foram analisadas de forma retrospectiva. Nas redes clínicas, a estratificação de risco é apenas um dos parâmetros que determinam atraso para a angiografia. No estudo STREAM,33. Armstrong PW, Gershlick AH, Goldstein P, Wilcox R, Danays T, Lambert Y, et al, STREAM Investigative Team. Fibrinolysis or primary PCI in ST-segment elevation myocardial infarction. N Engl J Med. 2013 Apr 11; 368(15):1379-87. citado previamente, o tempo médio para angiografia foi de 2,2 h para pacientes que necessitaram de intervenção urgente, e 17 h para os 64% restantes. No entanto, nossos achados apontam para tempos mais altos, sobretudo para o grupo-resgate, presumivelmente face às dificuldades na transferência para o centro de hemodinâmica (ambulância não disponível imediatamente). Todavia, indicam a expressão pragmática do atendimento público em uma grande cidade. Como último ponto a ser destacado, nosso estudo não testou especificamente o desempenho do ECG para reperfusão, mas analisou o critério de ECG recomendado por diretrizes.

Conclusão

Nossos resultados sugerem que a redução do segmento ST, analisada conforme recomendado, não conseguiu identificar com precisão os pacientes com reperfusão angiográfica adequada, com base nos escores TIMI-fluxo e MBG. Acreditamos, portanto, que o estudo angiográfico precoce oferece a oportunidade na identificação de falhas na fibrinólise. Desta forma, na ausência de melhores biomarcadores, mesmo pacientes com reperfusão aparentemente bem-sucedida devem ser encaminhados para o laboratório de hemodinâmica o mais breve possível, vislumbrando garantir fluxo coronário adequado, considerando os aspectos macro e microvasculares.

Agradecimentos

Os autores agradecem aos médicos, enfermeiros e técnicos dos laboratórios de hemodinâmica, unidades coronárias e serviços médicos regionais de emergência. Ainda neste espaço, gostaríamos de expressar nossa homenagem e reverência ao professor Antonio Carlos de Camargo Carvalho, idealizador deste projeto temático, que nos deixou tão cedo (*1947-2019).

Referências

  • 1
    Piegas LS, Haddad N. Percutaneous coronary intervention in Brazil: results from the Brazilian Public Health System. Arq Bras Cardiol. 2011;96(4):317-23.
  • 2
    Ibanez B, James S, Agewall S, Antunes MJ, Bucciarelli-Ducci C, et al. Document Reviewers; 2017 ESC Guidelines for the management of acute myocardial infarction in patients presenting with ST-segment elevation: The Task Force for the management of acute myocardial infarction in patients resenting with ST-segment elevation of the European Society of Cardiology (ESC). Eur Heart J. 2017;39(2):119-77.
  • 3
    Armstrong PW, Gershlick AH, Goldstein P, Wilcox R, Danays T, Lambert Y, et al, STREAM Investigative Team. Fibrinolysis or primary PCI in ST-segment elevation myocardial infarction. N Engl J Med. 2013 Apr 11; 368(15):1379-87.
  • 4
    Rawles JM. Quantification of the benefit of earlier thrombolytic therapy: five-year results of the Grampian Region Early Anistreplase Trial (GREAT). J Am Coll Cardiol. 1997;30(5):1181-6.
  • 5
    Danchin N, Popovic B, Puymirat E, Goldstein P, Belle L, Cayla G, et al. The FAST-MI Investigators. Five-year outcomes following timely primary percutaneous intervention, late primary percutaneous intervention, or a pharmaco-invasive strategy in ST-segment elevation myocardial infarction: the FAST-MI programme. Eur Heart J. 2020;41(7):858-66.
  • 6
    Schweitzer P. The electrocardiographic diagnosis of acute myocardial infarction in the thrombolytic era. Am Heart J. 1990;119(3Pt1):642-54.
  • 7
    Larson DM, McKavanagh P, Henry TD, Cantor WJ. Reperfusion options for ST Elevation myocardial infarction patients with expected delays to percutaneous coronary intervention. Interv Cardiol Clin. 2016 Oct;5(4):439-50.
  • 8
    Killip 3rd T, Kimball JT. Treatment of myocardial infarction in a coronary care unit. A two year experience with 250 patients. Am J Cardiol. 1967;20(4):457-64.
  • 9
    Morrow DA, Antman EM, Charlesworth A, Cairns R, Murphy SA, Lemos JA, et al. TIMI risk score for ST-elevation myocardial infarction: a convenient, bedside, clinical score for risk assessment at presentation An intravenous nPA for Treatment of Infarcting Myocardium Early II Trial substudy. Circulation. 2000;102(17):2031-7.
  • 10
    Eagle KA, Lim MJ, Dabbous OH, Pieper KS, Goldberg RJ, Van de Werf F, et al. A validated prediction model for all forms of acute coronary syndrome: estimating the risk of 6-month postdischarge death in an international registry. JAMA. 2004;291(22):2727-33.
  • 11
    Fibrinolytic Therapy Trialists’ (FTT) Collaborative Group. Indications for fibrinolytic therapy in suspected acute myocardial infarction: collaborative overview of early mortality and major morbidity results from all randomised trials of more than 1000 patients. Lancet. 1994;343(8893):311-22.
  • 12
    Widimský P, Groch L, Zelízko M, Aschermann M, Bednár F, Suryapranata H. Multicentre randomized trial comparing transport to primary angioplasty vs immediate thrombolysis vs combined strategy for patients with acute myocardial infarction presenting to a community hospital without a catheterization laboratory. The PRAGUE study. Eur Heart J. 2000 May;21(10):823-31.
  • 13
    Goel K, Pinto DS, Gibson CM. Association of time to reperfusion with left ventricular function and heart failure in patients with acute myocardial infarction treated with primary percutaneous coronary intervention: A systematic review. Am Heart J. 2013;165(4):451-67.
  • 14
    Sejersten M, Valeur N, Grande P, Nielsen TT, Clemmensen P, DANAMI-2 Investigators. Long-term prognostic value of st-segment resolution in patients treated with fibrinolysis or primary percutaneous coronary intervention: results from the DANAMI-2 (DANish trial in acute myocardial infarction-2). J Am Coll Cardiol. 2009;54(19):1763-9.
  • 15
    Shiomi H, Morimoto T, Kitaguchi S, Nakagawa Y, Ishii K, Haruna Y, et al. The ReACT Trial: Randomized Evaluation of Routine Follow-up Coronary Angiography after Percutaneous Coronary Intervention Trial (ReACT), JACC Cardiovasc Interv. 2017 Jan 23;10(2):109-17
  • 16
    Sutton AG, Campbell PG, Graham R, Price DJ, Gray JC, Grech ED, et al. A randomized trial of rescue angioplasty versus a conservative approach for failed fibrinolysis in ST-segment elevation myocardial infarction: the Middlesbrough Early Revascularization to Limit INfarction (MERLIN) trial. J Am Coll Cardiol. 2004;44(2):287-96.
  • 17
    Roe MT, Ohman EM, Maas AC, Christenson RH, Mahaffey KW, Granger CB, et al. Shifting the open-artery hypothesis downstream: the quest for optimal reperfusion. J Am Coll Cardiol. 2001 Jan;37(1):9-18.
  • 18
    Gibson CM, Cannon CP, Daley WL, Dodge Jr JT, Alexander Jr B, Marble SJ, et al. TIMI frame count: a quantitative method of assessing coronary artery flow. Circulation. 1996 Mar 1;93(5):879-88.
  • 19
    Hof AWJ. Successful reperfusion therapy: from epicardial to myocardial salvage. Rev Esp Cardiol. 2010;63(7):757-9.
  • 20
    Anderson JL, Karagounis LA, Becker LC, Sorensen SG, Menlove RL. TIMI perfusion grade 3 but not grade 2 results in improved outcome after thrombolysis for acute myocardial infarction. Ventriculographic, enzymatic, and electrocardiographic evidence from the TEAM-3 study. Circulation. 1993;87(6):1829-39.
  • 21
    Fernandes MR, Fish RD, Canales J, Aliota J, Silva GV, Perin EC, et al. Restoration of microcirculatory patency after myocardial infarction. results of current coronary interventional strategies and techniques. Tex Heart Inst J. 2012;39(3):342-50.
  • 22
    Stambuk K, Krcmar T, Zeljkovic I. Impact of intracoronary contrast injection pressure on reperfusion during primary percutaneous coronary intervention in acute ST-segment elevation myocardial infarction: A prospective randomized pilot study. Int J Cardiol Heart Vasc. 2019 Aug 20;24:100412.
  • 23
    Ito H, Maruyama A, Iwakura K, Takiuchi S, Masuyama T, Hori M, et al. Clinical implications of the “no reflow” phenomenon: a predictor of complications and left ventricular remodelling in reperfused anterior wall myocardial infarction. Circulation. 1996;93(2):223-8.
  • 24
    Hoffmann R, Haager P, Lepper W, Franke A, Hanrath P. Relation of coronary flow pattern to myocardial blush grade in patients with first acute myocardial infarction. Heart. 2003;89(10):1147-51.
  • 25
    Henriques JPS, Zijlstra F, Hof AWJ, Boer MJ, Dambrink JHE, Gosselink M, et al. Angiographic assessment of reperfusion in acute myocardial infarction by myocardial blush grade. Circulation. 2003;107(16):2115-9.
  • 26
    Stone GW, Peterson MA, Lansky AJ, Dangas G, Mehran R, Leon MB. Impact of normalized myocardial perfusion after successful angioplasty in acute myocardial infarction. J Am Coll Cardiol. 2002;39(4):591-7.
  • 27
    Kampinga MA, Nijsten MW, Gu YL, Dijk WA, de Smet BJ, Heuvel AF, et al. Is the myocardial blush grade scored by the operator during primary percutaneous coronary intervention of prognostic value in patients with ST-elevation myocardial infarction in routine clinical practice? Circ Cardiovasc Interv. 2010 Jun 1;3(3):216-23.
  • 28
    Prado AP, Fernández-Vázqueza F, Cuellas-Ramóna JC, Gibson CM. Coronary angiography: beyond coronary anatomy. Rev Esp Cardiol. 2006;59(6):596-608.
  • 29
    Dibra A, Mehilli J, Dirschinger J, Pache J, Neverve J, Schwaiger M, et al. Thrombolysis in myocardial infarction myocardial perfusion grade in angiography correlates with myocardial salvage in patients with acute myocardial infarction treated with stenting or thrombolysis. J Am Coll Cardiol. 2003;41(6):925-9.
  • 30
    Angeja BG, Gunda M, Murphy SA, Sobel BE, Rundle AC, Syed M, et al. TIMI myocardial perfusion grade and ST segment resolution: association with infarct size as assessed by single photon emission computed tomography imaging. Circulation. 2002;105(3):282-5.
  • 31
    Rezkalla SH, Kloner RA. Coronary no-reflow phenomenon: from the experimental laboratory to the cardiac catheterization laboratory. Catheter Cardiovasc Interv. 2008;72(7):950-7.
  • 32
    Ndrepepa G, Alger P, Kufner S, Mehilli J, Schömig A, Kastrati A. ST-segment resolution after primary percutaneous coronary intervention in patients with acute ST-segment elevation myocardial infarction. Cardiol J. 2012;19(1):61-9.
  • 33
    Zwaan HB, Stoel MG, Roos-Hesselink JW, Veen G, Boersma E, Birgelen C. Early versus late ST-segment resolution and clinical outcomes after percutaneous coronary intervention for acute myocardial infarction. Neth Heart J. 2010 Sep;18(9):416-22.
  • 34
    Matetzky S, Novikov M, Gruberg L, Freimark D, Feinberg M, Elian D, et al. The significance of persistent ST elevation versus early resolution of ST segment elevation after primary PTCA. J Am Coll Cardiol. 1999;34(7):1932-8.
  • 35
    Kaluzay J, Vandenberghe K, Fontaine D, Ganame J, Anné W, Merwe N, et al. Importance of measurements at or after the j-point for evaluation of ST-segment deviation and resolution during treatment for acute myocardial infarction. Int J Cardiol. 2005 Feb 28;98(3):431-7.
  • 36
    McLaughlin MG, Stone GW, Aymong E, Gardner G, Mehran R, Lansky AJ, et al. Prognostic utility of comparative methods for assessment of ST-segment resolution after primary angioplasty for acute myocardial infarction: the Controlled Abciximab and Device Investigation to Lower Late Angioplasty Complications (CADILLAC) trial. J Am Coll Cardiol. 2004;44(6):1215-23.
  • 37
    Yan AT, Yan RT, Tan M, Casanova A, Labinaz M, Sridhar K, et al. Risk scores for risk stratification in acute coronary syndromes: useful but simpler is not necessarily better. Eur Heart J. 2007;28(9):1072-8.
  • 38
    Dotta G, Fonseca FAH, Izar MCO, Souza MT, Moreira FT, Pinheiro LFM, et al. Regional QT interval dispersion as an early predictor of reperfusion in patients with acute myocardial infarction after fibrinolytic therapy. Arq Bras Cardiol. 2019 Jan;112(1):20-9.
  • 39
    Califf RM, O’Neil W, Stack RS, Aronson L, Mark DB, Mantell S, et al. Failure of simple clinical measurements to predict perfusion status after intravenous thrombolysis. Ann Intern Med. 1988 May;108(5):658-62.
  • 40
    Khoury NE, Borzak S, Gokli A, Havstad S, Smith ST, Jones M. “Inadvertent” thrombolytic administration in patients without myocardial infarction: clinical features and outcome. Ann Emerg Med. 1996;28(3):289-93.
  • 41
    Bär F, Vainer J, Stevenhagen J, Neven K, Aalbregt R, Ophuis TO, et al. Ten-year experience with early angioplasty in 759 patients with acute myocardial infarction. J Am Coll Cardiol. 2000 Jul;36(1):51-8.
  • 42
    Bradley EH, Herrin J, Wang Y, Barton BA, Webster TR, Mattera JA, et al. Strategies for reducing the door-to-balloon time in acute myocardial infarction. N Engl J Med. 2006;355(22):2308-20.
  • Vinculação acadêmica
    Este artigo é parte de tese de pós-doutorado de Henrique Tria Bianco pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
  • Fontes de financiamento: O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    Jul 2021

Histórico

  • Recebido
    24 Mar 2020
  • Revisado
    19 Jun 2020
  • Aceito
    29 Jul 2020
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br