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Desempenho dos Índices de Gravidade na Predição de Complicações Pós-Operatórias de Revascularização Miocárdica

Doenças Cardiovasculares/cirurgia; Revascularização Miocárdica; Procedimentos Cirúrgicos Cardíacos; Cuidados Pós-Operatórios; Escores da Disfunção Orgânica; Mortalidade

No Brasil não existem grandes estudos que relatam a experiência cirúrgica dos serviços de saúde associando à predição de eventos. Nesse contexto, o estudo “Desempenho dos índices de gravidade na predição de complicações pós-operatórias de revascularização miocárdica” traz uma informação relevante ao que se refere à literatura nacional. Esse estudo apresentado vem de maneira detalhada expor dados relevantes à ocorrência ou não de complicações perioperatórias em pacientes submetidos à cirurgia de revascularização miocárdica (CRM), correlacionando as mesmas com escores de predição de risco. Trata-se de tema extremamente relevante e que gera inúmeras incertezas frente ao paciente.11. Franzotti SAS, Sloboda DA, Silva JR, Souza EAS, Reboreda JZ, Ferretti-Rebustini REL, et al. Performance of Severity Indices to Estimate Postoperative Complications of Myocardial Revascularization. Arq Bras Cardiol. 2020; 115(3):452-459.

A cirurgia cardíaca ainda representa um enorme campo no arsenal terapêutico dentro da cardiologia. Apesar de todos os avanços nas intervenções percutâneas coronarianas ou valvares, muitos casos permanecem ainda voltados à abordagem cirúrgica convencional. Hoje a cirurgia cardíaca convencional tem atuado cada vez mais com casos altamente complexos. Essa situação faz com que pacientes progressivamente de mais alto risco e complexidade anatômica coronariana sejam encaminhados à CRM. Dessa forma, predizer risco operatório adequadamente antes de um procedimento trata-se de uma etapa fundamental e obrigatória. Vale ressaltar que a maioria dos escores como EuroScore I e II ou the Society of Thoracic Surgeons (STS) risk score foram desenvolvidos para predizer mortalidade. EuroScore é um sistema de pontuação prognóstica desenvolvido na Europa para pacientes submetidos à cirurgia cardíaca. O que esse estudo nos traz é uma avaliação complementar e diferenciada de morbidade e disfunção orgânica em diferentes sistemas, como cardiovascular, neurológica, respiratória e renal.11. Franzotti SAS, Sloboda DA, Silva JR, Souza EAS, Reboreda JZ, Ferretti-Rebustini REL, et al. Performance of Severity Indices to Estimate Postoperative Complications of Myocardial Revascularization. Arq Bras Cardiol. 2020; 115(3):452-459.

2. Siregar S, Groenwold RH, de Heer F, Bots ML, van der Graaf Y, van Herwerden LA. Performance of the original EuroSCORE. Eur J Cardiothorac Surg. 2012 Apr;41(4):746-54.

3. Kofler M, Reinstadler SJ, Stastny L, Dumfarth J, Reindl M, Wachter K, et al. EuroSCORE II and the STS score are more accurate in transapical than in transfemoral transcatheter aortic valve implantation. Interact Cardiovasc Thorac Surg. 2018 Mar 1;26(3):413-9.

4. Wendt D, Thielmann M, Kahlert P, Kastner S, Price V, Al-Rashid F, et al. Comparison Between Different Risk Scoring Algorithms on Isolated Conventional or Transcatheter Aortic Valve Replacement. Ann Thorac Surg. 2014 Mar;97(3):796-802.
-55. Gogbashian A, Sedrakyan A, Treasure T. EuroSCORE: a systematic review of international performance. Eur J Cardiothorac Surg. 2004 May;25(5):695-700.

Estudo publicado em 2016 por Ad et al.,66. Ad N, Holmes SD, Patel J, Pritchard G, Shuman DJ, Halpin L, et al. Comparison of EuroSCORE II, Original EuroSCORE, and The Society of Thoracic Surgeons Risk Score in Cardiac Surgery Patients. Ann Thorac Surg. 2016 Aug;102(2):573-9. comparou em 11.788 pacientes durante 15 anos de cirurgias cardíacas à capacidade de predição de mortalidade entre os escores EuroScore I, EuroScore II e o STS risk score. Com mortalidade total de apenas 1,8% a área sob a curva encontrada foi respectivamente de 0,819, 0,844 e 0,846. Todos os escores provaram em larga casuística terem utilidade nessa população quando aplicados à prática clínica.66. Ad N, Holmes SD, Patel J, Pritchard G, Shuman DJ, Halpin L, et al. Comparison of EuroSCORE II, Original EuroSCORE, and The Society of Thoracic Surgeons Risk Score in Cardiac Surgery Patients. Ann Thorac Surg. 2016 Aug;102(2):573-9.

Uma metanálise publicada também em 2016 incluiu 22 estudos que avaliaram o EuroScore e o STS risk score na predição de cirurgias valvares realizadas entre 2012 e 2015. O estudo concluiu mais uma vez que os escores eram similares na predição de mortalidade em 30 dias. No entanto, somente 3 dos estudos avaliados possuíam mais de 200 eventos documentados no seguimento, resultado esse considerado como fundamental pelos autores para predição adequada de eventos. Além disso, mais uma vez não foram avaliadas disfunções orgânicas imediatas do pós-operatório, ressaltando a importância desse tipo de dado no cenário atual.77. Sullivan PG, Wallach JD, Ioannidis JPA. Meta-Analysis Comparing Established Risk Prediction Models (EuroSCORE II, STS Score, and ACEF Score) for Perioperative Mortality During Cardiac Surgery. Am J Cardiol. 2016 Nov 15;118(10):1574-82.

Outra metanálise recente com 145.492 pacientes incluídos submetidos à cirurgia cardíaca, analisou a performance do EuroScore II na predição de mortalidade. Na casuística estudada, a mortalidade real foi de 2,95%, tendo sido predita pelo EuroScore II de 3,3%. A área sob a curva na predição de morte foi de 0,792. Dessa forma, novamente o EuroScore II mostrou-se um bom preditor de eventos perioperatórios em cirurgia cardíaca.88. Guida P, Mastro F, Scrascia G, Whitlock R, Paparella D. Performance of the European System for Cardiac Operative Risk Evaluation II: A Meta-Analysis of 22 Studies Involving 145,592 Cardiac Surgery Procedures. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014 Dec;148(6):3049-57.e1.

Apesar de toda a validação do EuroScore na predição de mortalidade, especificamente em relação à disfunções orgânicas sistêmicas, ele carece de avaliação. Já em relação aos outros escores, a utilização do SOFA foi avaliada em pós-operatório de cirurgia cardíaca, mostrando-se um bom índice novamente em avaliação de mortalidade.99. Howitt SH, Caiado C, McCollum C, Goldstein M, Malagon I, Venkateswaran R, et al. Validation of Three Postoperative Risk Prediction Models for Intensive Care Unit Mortality After Cardiac Surgery. Thorac Cardiovasc Surg. 2018 Nov;66(8):651-60.,1010. Tsaousi GG, Pitsis AA, Ioannidis GD, Pourzitaki CK, Yannacou-Peftoulidou MN, Vasilakos DG, et al. Implementation of EuroSCORE II as an Adjunct to APACHE II Model and SOFA Score, for Refining the Prognostic Accuracy in Cardiac Surgical Patients. J Cardiovasc Surg. (Torino). 2015 Dec;56(6):919-27. Estudo prospectivo com 1.058 pacientes em pós-operatório de cirurgia cardíaca avaliou a performance de diferentes escores em relação à mortalidade intra-hospitalar. A área sob a curva do escore SOFA foi de 0,929 para o valor médio e 0,927 para o valor máximo. Já o valor da área sob a curva para EuroScore II foi de 0,906.1010. Tsaousi GG, Pitsis AA, Ioannidis GD, Pourzitaki CK, Yannacou-Peftoulidou MN, Vasilakos DG, et al. Implementation of EuroSCORE II as an Adjunct to APACHE II Model and SOFA Score, for Refining the Prognostic Accuracy in Cardiac Surgical Patients. J Cardiovasc Surg. (Torino). 2015 Dec;56(6):919-27.

Por último, outro estudo avaliou em uma coorte de 36.632 pacientes os escores SOFA, APACHE-II e SAPS-II n predição de mortalidade em pós-operatório de cirurgia cardíaca. As áreas sob curva ROC foram de 0,809, 0,892 e 0,912, respectivamente. Nesse estudo, o escore SOFA mostrou o pior resultado comparativo, e mais uma vez não houve descrição específica de disfunções orgânicas individualmente.1111. Schoe A, Bakhshi-Raiez F, Keizer N, Dissel JT, Jonge E. Mortality Prediction by SOFA Score in ICU-patients After Cardiac Surgery; Comparison With Traditional Prognostic-Models. BMC Anesthesiol. 2020 Mar 13;20(1):65.doi: 10.1186/s12871-020-00975-2.
https://doi.org/10.1186/s12871-020-00975...

Dessa forma, a avaliação na população brasileira de escores nessa população após CRM torna-se importante. A capacidade de predizer disfunções orgânicas separadamente trata-se de algo pouco explorado e com relevância significativa agregando morbidade e tempo de internação.

Referências

  • 1
    Franzotti SAS, Sloboda DA, Silva JR, Souza EAS, Reboreda JZ, Ferretti-Rebustini REL, et al. Performance of Severity Indices to Estimate Postoperative Complications of Myocardial Revascularization. Arq Bras Cardiol. 2020; 115(3):452-459.
  • 2
    Siregar S, Groenwold RH, de Heer F, Bots ML, van der Graaf Y, van Herwerden LA. Performance of the original EuroSCORE. Eur J Cardiothorac Surg. 2012 Apr;41(4):746-54.
  • 3
    Kofler M, Reinstadler SJ, Stastny L, Dumfarth J, Reindl M, Wachter K, et al. EuroSCORE II and the STS score are more accurate in transapical than in transfemoral transcatheter aortic valve implantation. Interact Cardiovasc Thorac Surg. 2018 Mar 1;26(3):413-9.
  • 4
    Wendt D, Thielmann M, Kahlert P, Kastner S, Price V, Al-Rashid F, et al. Comparison Between Different Risk Scoring Algorithms on Isolated Conventional or Transcatheter Aortic Valve Replacement. Ann Thorac Surg. 2014 Mar;97(3):796-802.
  • 5
    Gogbashian A, Sedrakyan A, Treasure T. EuroSCORE: a systematic review of international performance. Eur J Cardiothorac Surg. 2004 May;25(5):695-700.
  • 6
    Ad N, Holmes SD, Patel J, Pritchard G, Shuman DJ, Halpin L, et al. Comparison of EuroSCORE II, Original EuroSCORE, and The Society of Thoracic Surgeons Risk Score in Cardiac Surgery Patients. Ann Thorac Surg. 2016 Aug;102(2):573-9.
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    Sullivan PG, Wallach JD, Ioannidis JPA. Meta-Analysis Comparing Established Risk Prediction Models (EuroSCORE II, STS Score, and ACEF Score) for Perioperative Mortality During Cardiac Surgery. Am J Cardiol. 2016 Nov 15;118(10):1574-82.
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    Guida P, Mastro F, Scrascia G, Whitlock R, Paparella D. Performance of the European System for Cardiac Operative Risk Evaluation II: A Meta-Analysis of 22 Studies Involving 145,592 Cardiac Surgery Procedures. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014 Dec;148(6):3049-57.e1.
  • 9
    Howitt SH, Caiado C, McCollum C, Goldstein M, Malagon I, Venkateswaran R, et al. Validation of Three Postoperative Risk Prediction Models for Intensive Care Unit Mortality After Cardiac Surgery. Thorac Cardiovasc Surg. 2018 Nov;66(8):651-60.
  • 10
    Tsaousi GG, Pitsis AA, Ioannidis GD, Pourzitaki CK, Yannacou-Peftoulidou MN, Vasilakos DG, et al. Implementation of EuroSCORE II as an Adjunct to APACHE II Model and SOFA Score, for Refining the Prognostic Accuracy in Cardiac Surgical Patients. J Cardiovasc Surg. (Torino). 2015 Dec;56(6):919-27.
  • 11
    Schoe A, Bakhshi-Raiez F, Keizer N, Dissel JT, Jonge E. Mortality Prediction by SOFA Score in ICU-patients After Cardiac Surgery; Comparison With Traditional Prognostic-Models. BMC Anesthesiol. 2020 Mar 13;20(1):65.doi: 10.1186/s12871-020-00975-2.
    » https://doi.org/10.1186/s12871-020-00975-2
  • Minieditorial referente ao artigo: Desempenho dos índices de gravidade na predição de complicações pós-operatórias de revascularização miocárdica

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Set 2020
  • Data do Fascículo
    Set 2020
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