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Tratamento percutâneo de angina refratária secundária a estenose de artéria subclávia esquerda em paciente revascularizado

RELATO DE CASO

Tratamento percutâneo de angina refratária secundária a estenose de artéria subclávia esquerda em paciente revascularizado

Ernesto Misael Cintra OsterneI; Evandro Cesar Vidal OsterneI; Vicente Paulo Motta1; Paulo Antonio Marra da MottaI; Cecilio Kassem SalameII; Thomas Edson Cintra OsterneIII

IHospital Anchieta - Instituto do Coração de Taguatinga, São Paulo, SP - Brasil

IIHospital Anchieta - Carddio, São Paulo, SP - Brasil

IIIHospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo, São Paulo, SP - Brasil

Correspondência Correspondência: Ernesto Misael Cintra Osterne SMBD, conjunto 11, lote 1, casa B – Lago Sul CEP 71680-110, Brasília, DF – Brasil E-mail: ernestoosterne@yahoo.com.br, osterneernesto@gmail.com

Palavras-chave: Síndrome de Roubo Subclávio, Revascularização Miocárdica, Angioplastia Coronária com Balão.

Introdução

Dor precordial anginosa em geral está relacionada à insuficiência coronariana aterosclerótica, e sua apresentação clínica difere em função dos aspectos anatomopatológicos das lesões.

Estenose de Artéria Subclávia Esquerda (EAS) como causa de angina pectoris (AP) é citada quase sempre em pacientes com história de revascularização do miocárdio por Artéria Mamária Interna Esquerda (AME) envolvida no processo de estenose de subclávia1. Muitas vezes esse diagnóstico pode passar despercebido principalmente quando os pacientes são assintomáticos e com alteração isquêmica em exame cintilográfico. A estenose de subclávia pode também estar associada a sintomas neurológicos em virtude da reversão do fluxo por meio da artéria vertebral devido à hipotensão subclávia.

Descreve-se caso de paciente revascularizado com AME para Artéria Descendente Anterior (ADA), não envolvida na estenose de subclávia e dor anginosa típica em crescendo relacionada a esforços físicos com os membros superiores ou com envolvimento predominante dos mesmos. A correção percutânea por stent da suboclusão ostial e subtotal de Artéria Subclávia Esquerda (ASE) tornou o paciente assintomático.

Relato do caso

Paciente do sexo masculino, 72 anos, taxista, diabético do tipo 2, ex-tabagista e com antecedentes de revascularização cirúrgica do miocárdio há 4 anos. Assintomático até quatro meses atrás. A partir daí, dor anginosa aos esforços que se precipitava ou acentuava quando utilizava os membros superiores, associada a cansaço fácil no braço esquerdo. A dor anginosa adquiriu características de instabilidade com o passar do tempo, sendo encaminhado para coronariografia de emergência com quadro de angina em repouso.

A injeção seletiva de contraste na coronária esquerda opacificava a Artéria Subclávia Esquerda por meio de fluxo retrógrado de contraste pela Artéria Mamária ipsilateral, bem como fluxo lento com discreta opacificação distal do ramo Descendente Anterior após a anastomose.

A injeção de contraste no terço proximal da subclávia esquerda ou em aorta transversa mostrou lesão subtotal e ulcerada do óstio da ASE com discreto fluxo através da mesma. (Figura 1). Chamou atenção a ausência de opacificação da Artéria Mamária Interna Esquerda.


Após implante de stent no óstio da ASE, restabeleceu-se o fluxo de contraste bem como a anatomia do segmento (Figura 2). Observou-se agora o fluxo normal de contraste pela Artéria Mamária Interna Esquerda, opacificando completamente o leito distal da Artéria Descendente Anterior. Uma nova injeção de contraste no tronco de coronária esquerda nativo mostrou a ausência de fluxo retrógrado através da AME no sentido da ASE.


Discussão

A EAS é relativamente frequente e, de maneira geral, doença de natureza aterosclerótica sendo mais incidente em diabéticos, fumantes e nos acometidos de doença arterial periférica. A correlação de acidente vascular cerebral e doença arterial coronariana com EAS tem recebido pouca atenção2. No entanto, Reivichi e cols.3 relataram, em 1961, dois pacientes com sinais clínicos de insuficiência vascular cerebral associada à reversão do fluxo através da artéria vertebral, secundariamente à obstrução subclávia. O termo síndrome do roubo da subclávia foi introduzido por Fisher, em 1962, tendo sido posteriormente alguns casos relatados na literatura4, em virtude da pouca incidência desta na população geral. Outro aspecto anatômico que também caracteriza uma síndrome de roubo de fluxo nestes pacientes ocorre quando ramos intercostais de grande importância e que se originam da artéria mamária esquerda e não sofrem ligadura durante o ato cirúrgico de revascularização do miocárdio.

Os sintomas de EAS nos braços são a claudicação, referida pelo paciente, cianose digital e nos casos mais graves, necrose distal por embolia. As manifestações mais chamativas, embora raras, no entanto, são as cerebrais e cardíacas. Os sintomas neurológicos em geral configuram síndrome vertebrobasilar e a manifestação mais comum é a vertigem. Os sintomas de isquemia miocárdica citados, em geral, se manifestam em pacientes revascularizados quando há envolvimento da artéria mamária interna no processo de EAS. No nosso caso, muito embora sem envolvimento da artéria mamária na EAS, o fluxo coronariano distal na artéria descendente anterior suprido pela artéria mamária ficava comprometido em função do desvio do fluxo sanguíneo para a artéria subclávia esquerda5,6. Assim sendo, o aumento do consumo de oxigênio determinado por esforços no membro superior esquerdo estimulava o fluxo retrógrado pela mamária, reduzindo a perfusão distal da artéria descendente anterior. Daí a concomitância de angina e claudicação do braço esquerdo.

Em relação à EAS, a medida indireta da pressão arterial em ambos os braços tem importância fundamental, sendo procedimento imprescindível para a suspeita clínica. A diferença de pressão arterial sistólica entre os membros superiores acima de 15 mmhg apresenta boa correlação com a positividade da angiografia, padrão ouro para o diagnóstico de EAS. Isso é real, muito embora a sensibilidade seja bastante inferior à especificidade. Tal fato se atribui em geral aos casos de acometimento bilateral ou estenose não significativa unilateral5-7. Como a maioria dos pacientes com EAS é assintomática, a mensuração da pressão arterial com manguito em apenas um braço poderá determinar medida incorreta da pressão arterial não controlando uma possível hipertensão arterial e deixando de fazer suspeita diagnóstica importante. No presente caso o achado de diferença pressórica só foi constatado após o diagnóstico angiográfico dado a urgência do caso.

O nosso paciente é taxista, 72 anos, e foi encaminhado para coronariografia de emergência com quadro clínico de angina em repouso de difícil controle.

Como fatores de risco para EAS apresentava diabetes mellitus tipo II em uso de insulina, história de tabagismo durante 50 anos e dislipidemia. Há quatro anos foi submetido à revascularização cirúrgica do miocárdio com implante de duas pontes de safena e anastomose da Artéria Mamária Interna Esquerda para a Artéria Descendente Anterior no terço médio. Evoluía assintomático até quatro meses atrás, embora com controle clínico irregular.

Na história clínica chamava a atenção o desencadeamento ou agravamento da dor anginosa precordial com esforços envolvendo os membros superiores principalmente o esquerdo. Este último também cansava com facilidade.

A injeção seletiva de contraste no Tronco de Coronária Esquerda evidenciou a opacificação da Artéria Subclávia Esquerda feita retrogradamente pela Artéria Mamária Interna Esquerda, com redução do fluxo distal para a Artéria Descendente Anterior. Não se observava o "aspecto de competição de fluxo" comum entre AME e ADA proximal.

A injeção de contraste no terço proximal da ASE e aorta transversa demonstrou suboclusão ostial desse ramo sem quase nenhum fluxo através do mesmo. Destacou-se a ausência de opacificação da AME atribuído à inversão de fluxo.

O paciente foi submetido de imediato à angioplastia por balão, seguida de implante de stent (6,0 x 12 mm Palmaz Genesis - Cordis, USA) no segmento estenosado com sucesso e sem intercorrências.

No seguimento imediato e de oito semanas, permanece assintomático mesmo quando submetido a esforços envolvendo os membros superiores que se apresentam agora com medidas pressóricas equalizadas.

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa, Obtenção de dados, Análise e interpretação dos dados e Redação do manuscrito: Osterne EMC, Osterne ECV, Motta VP, Motta PAM, Salame CK, Osterne TEC; Análise estatística, Obtenção de financiamento e Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual: Osterne EMC, Osterne ECV, Osterne TEC.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Artigo recebido em 9/7/12; revisado em 14/8/12; aceito em 8/3/13.

  • 1. Shadman R, Criqui MH, Bundens WP, Fronek A, Denenberg JO, Gamst AC. Subclavian artery stenosis: prevalence, risk factors, and association with cardiovascular diseases. J Am Coll Cardiol. 2004;44(3):618-23.
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  • Correspondência:

    Ernesto Misael Cintra Osterne
    SMBD, conjunto 11, lote 1, casa B – Lago Sul
    CEP 71680-110, Brasília, DF – Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Set 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013
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