Acessibilidade / Reportar erro

Associação entre hipertensão arterial e excesso de peso em adultos, Belém, Pará, 2005

Resumos

FUNDAMENTO: A hipertensão arterial constitui um grave problema de saúde pública, atingindo 20% a 25% da população adulta mundial e 12% a 35% da população brasileira. OBJETIVO: Avaliar associação entre hipertensão arterial e excesso de peso. MÉTODOS: Estudo transversal desenvolvido em 2005, com uma amostra probabilística da população >18 anos de Belém (PA), pelo SIMTEL (monitoramento de doenças crônicas por telefone). Considerou-se como variável desfecho: hipertensão; como variável explanatória: excesso de peso; como variáveis de confusão: idade, escolaridade e características de estilo de vida. As variáveis associadas com hipertensão arterial foram analisadas por regressão logística para cálculo de risco. RESULTADOS: A hipertensão arterial atingiu 16,2% dos homens e 18,3% das mulheres, e o excesso de peso, 49,3% e 34,0%, respectivamente. A prevalência de hipertensão arterial se associou diretamente com idade e com excesso de peso em ambos os sexos. Para os homens, se associou com consumo de frutas e hortaliças e baixo consumo de feijão; para as mulheres, com estado civil viúva ou separada e, inversamente, com escolaridade. O risco de hipertensão arterial aumentou com o peso em ambos os sexos (p<0,001), sendo na obesidade 6,33 vezes maior para os homens e 3,33 para as mulheres, comparativamente ao peso normal. CONCLUSÃO: O excesso de peso se associou com maior prevalência de hipertensão arterial, porém variáveis como idade, escolaridade e consumo alimentar interferem nessa associação, de modo a configurar contextos favoráveis à diminuição ou ao aumento desse risco.

Hipertensão; obesidade; adultos


BACKGROUND: Hypertension is a major public health issue affecting 20 to 25% of the global population of adults, and 12 to 35 % of Brazilians. OBJECTIVE: To evaluate the association between hypertension and overweight. METHODS: A cross-sectional study was conducted in 2005 with a probabilistic sampling of the population >18 years of age in Belém, capital of the state of Pará, in the Northern region of Brazil, using the telephone surveillance system for chronic diseases (SIMTEL). The dependent variable was hypertension, the explanatory variable was overweight and the confounding variables were age, level of education and lifestyle characteristics. The variables associated with hypertension were run through the regression logistic model and odds ratios were calculated for each variable. RESULTS: Hypertension affected 16.2% of men and 18.3% of women, and overweight affected 49.2% of men and 34.1% of women. The prevalence of hypertension was directly associated with age and overweight in both genders. Among men, hypertension was associated with intake of vegetables and low intake of beans (similar to kidney- and pinto-type beans); as for women, hypertension was associated with marital status (widow or separated), and inversely to education level. The risk of hypertension increased directly with weight for both genders (p<0.001), and it was 6.33 times higher among obese men and 3.33 among obese women as compared to normal-weight subjects. CONCLUSION: Overweight was associated with hypertension. However, variables such as age, education, and food consumption interfere in this relationship, creating circumstances favorable to reducing or increasing that risk.

Hipertension; obesity; adults


ARTIGO ORIGINAL

HIPERTENSÃO ARTERIAL

Associação entre hipertensão arterial e excesso de peso em adultos, Belém, Pará, 2005

Hilma Paixão BorgesI; Nilma do Carmo CruzI; Erly Catarina MouraI,II,III

IFaculdade de Nutrição - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, PA - Brasil

IICentro Colaborador em Alimentação e Nutrição da Região Norte (CECAN-Norte), UFPA, Belém, PA - Brasil

IIINúcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (NUPENS) - Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP - Brasil

Correspondência Correspondência: Erly Catarina de Moura Avenida Generalíssimo Deodoro, 565/1103 66.055-240 - Belém, PA - Brasil E-mail: erly@ufpa.br

RESUMO

FUNDAMENTO: A hipertensão arterial constitui um grave problema de saúde pública, atingindo 20% a 25% da população adulta mundial e 12% a 35% da população brasileira.

OBJETIVO: Avaliar associação entre hipertensão arterial e excesso de peso.

MÉTODOS: Estudo transversal desenvolvido em 2005, com uma amostra probabilística da população >18 anos de Belém (PA), pelo SIMTEL (monitoramento de doenças crônicas por telefone). Considerou-se como variável desfecho: hipertensão; como variável explanatória: excesso de peso; como variáveis de confusão: idade, escolaridade e características de estilo de vida. As variáveis associadas com hipertensão arterial foram analisadas por regressão logística para cálculo de risco.

RESULTADOS: A hipertensão arterial atingiu 16,2% dos homens e 18,3% das mulheres, e o excesso de peso, 49,3% e 34,0%, respectivamente. A prevalência de hipertensão arterial se associou diretamente com idade e com excesso de peso em ambos os sexos. Para os homens, se associou com consumo de frutas e hortaliças e baixo consumo de feijão; para as mulheres, com estado civil viúva ou separada e, inversamente, com escolaridade. O risco de hipertensão arterial aumentou com o peso em ambos os sexos (p<0,001), sendo na obesidade 6,33 vezes maior para os homens e 3,33 para as mulheres, comparativamente ao peso normal.

CONCLUSÃO: O excesso de peso se associou com maior prevalência de hipertensão arterial, porém variáveis como idade, escolaridade e consumo alimentar interferem nessa associação, de modo a configurar contextos favoráveis à diminuição ou ao aumento desse risco.

Palavras-chave: Hipertensão, obesidade, adultos.

Introdução

É conhecida a crescente prevalência de doenças crônicas não-transmissíveis nas populações, especialmente obesidade e hipertensão arterial. A hipertensão arterial (HA) é uma doença crônica, considerada um grave problema de saúde pública em todos os estratos sócioeconômicos1. Estima-se que pelo menos 50 milhões de norte-americanos sejam hipertensos, e estudos brasileiros têm mostrado no país prevalências entre 12% e 35%2. A HA é uma das mais importantes causas de morbidade e mortalidade universais, e um dos mais prevalentes fatores de risco para o desenvolvimento de doença arterial coronariana, acidente vascular cerebral, doença vascular periférica, insuficiência renal e insuficiência cardíaca, assim como a obesidade3.

A HA possui natureza multicausal e seus principais fatores de risco são classificados como modificáveis (estilo de vida, tabagismo, sedentarismo, alimentação inadequada e outros), entre eles se evidencia a associação direta com a obesidade e com o excesso de peso4. O sexo, a idade e algumas variáveis socioeconômicas são potenciais confundidores da relação entre excesso de peso e pressão arterial, pois essas variáveis estão associadas à massa corporal5.

Estudo realizado em 2006, junto à população adulta das capitais de Estados brasileiros e do Distrito Federal, apontou 44,1% de excesso de peso, sendo 11,4% de obesidade, e que 21,6% da população referiram diagnóstico médico prévio de hipertensão arterial6.

Neste artigo, estudamos a associação entre presença de diagnóstico médico prévio de hipertensão arterial e excesso de peso, levando-se em conta variáveis sociodemográficas e de estilo de vida, na população adulta masculina e feminina de Belém (PA).

Métodos

Trata-se de estudo transversal, a partir dos dados obtidos pelo SIMTEL (sistema de monitoramento de fatores de risco e proteção para doenças crônicas não transmissíveis por meio de inquérito telefônico) no ano de 2005. O SIMTEL foi realizado em cinco capitais das macrorregiões brasileiras e Belém foi escolhida para representar a Região Norte. Os procedimentos de amostragem empregados pelo SIMTEL-BELÉM foram os mesmos das outras capitais, que visaram obter amostra probabilística da população de indivíduos com 18 ou mais anos de idade residentes em domicílios servidos por pelo menos uma linha telefônica fixa. Foi estabelecido o número mínimo de duas mil entrevistas para se estimar com coeficiente de confiança de 95% e erro máximo de cerca de dois pontos porcentuais a freqüência de qualquer fator de risco na população estudada, seguindo a mesma metodologia do SIMTEL-2003, realizado em São Paulo7.

A primeira etapa da amostragemconsistiu no sorteio de sete mil linhas telefônicas do cadastro eletrônico das linhas residenciais fixas existentes no município de Belém, as quais foram re-sorteadas e divididas em 20 réplicas de 350 linhas ordenadas de 1 a 20, cada réplica reproduzindo a mesma proporção de linhas por região da cidade. A segunda etapa da amostragem consistiu no sorteio dos indivíduos - um por linha telefônica - que seriam entrevistados pelo sistema, identificando previamente, dentre as linhas sorteadas, as que eram efetivamente residenciais e que estavam ativas (linhas elegíveis) e a obtenção da aquiescência dos usuários dessas linhas em participar do sistema. Foram realizadas até dez chamadas para cada número na primeira etapa, sendo duas em dia de semana no período da manhã, duas no período da tarde, duas no período noturno (até 21 horas), uma no sábado de manhã, uma no sábado à tarde, uma no domingo ou feriado de manhã, e outra no período da tarde. Na segunda etapa também foram realizadas até dez chamadas em dias e horários pré-agendados na primeira etapa ou nos contatos posteriores. Foram consideradas perdas: os números chamados até dez vezes em que não se conseguiu contato para confirmação da residência e sorteio de um morador na primeira etapa ou não-contato com o sorteado na segunda etapa. No total foram chamados 3.500 números, sendo 2.918 elegíveis (residências confirmadas, não atende, ocupado, fax ou secretária eletrônica), houve 205 recusas em participar do estudo e foram concluídas 2.620 entrevistas, perfazendo 89,9% de taxa de sucesso e 7,0% de recusa.

A amostra total do banco de dados do SIMTEL-BELÉM foi constituída de 2.620 indivíduos; no entanto, para o presente artigo, por se tratar de estudo de associação, foram excluídas as mulheres grávidas (23 casos), as pessoas que desconheciam o peso e a altura (27 casos), as que desconheciam o peso (39 casos) e as que desconheciam a altura (179 casos), restando 2.352 casos válidos.

A entrevista do SIMTEL é baseada num questionário com perguntas sobre características demográficas e socioeconômicas, padrão de alimentação e de atividade física, peso e altura auto-referidos, consumo de cigarros e de bebidas alcoólicas, presença ou ausência de hipertensão arterial, entre outras.

Para essa investigação, a hipertensão arterial foi considerada como variável desfecho e o excesso de peso, como variável explanatória. A hipertensão arterial foi categorizada em sim ou não em referência à existência de diagnóstico médico prévio; o excesso de peso em não-excesso de peso, pré-obesidade e obesidade, conforme os valores do índice de massa corporal (IMC), calculados a partir do peso em metros dividido pela altura ao quadrado, respectivamente < 25 kg/m2, 25 a 29 kg/m2 e 30 kg/m2 ou mais8.

As demais variáveis independentes, consideradas potencialmente de confusão, foram: idade (categorizada em seis faixas: 18 a 24, 25 a 34, 35 a 44, 45 a 54, 55 a 64 ou 65 e mais anos), cor (categorizada em dois grupos: branca e amarela ou parda, morena e negra), escolaridade (categorizada em quatro faixas: 0 a 4, 5 a 8, 9 a 11 ou 12 e mais anos de estudo), estado civil (categorizado em três grupos: solteiro, casado ou viúvo e separado), consumo regular de frutas e hortaliças (considerado > 5 dias na semana), de feijão (considerado > 5 dias na semana), de refrigerante (considerado > 3 dias na semana), hábito de consumo de carne com gordura ou frango com pele, consumo abusivo de bebidas alcoólicas (considerado > 5 doses para o homem e > 4 doses para a mulher numa única ocasião nos últimos 30 dias) e referência a realizar atividade física no lazer (considerado > 1 dia na semana) foram categorizadas em sim ou não, e hábito de fumar em três categorias: nunca fumou, fumante atual ou ex-fumante.

Estimativas da prevalência da hipertensão arterial segundo as variáveis independentes foram calculadas separadamente para homens e mulheres. As variáveis associadas com a ocorrência de hipertensão arterial ao nível de p<0,05 foram selecionadas para o cálculo da razão de chance (odds ratio bruto) da ocorrência de hipertensão arterial em cada categoria, por regressão logística. A seguir, análise multivariada foi executada para cada variável com ajuste para as demais variáveis, objetivando identificar as variáveis preditoras da hipertensão arterial. Apenas as variáveis com p<0,05 após ajuste foram introduzidas no modelo final para determinar a razão de chance ajustada de hipertensão arterial, considerando-se intervalo de confiança de 95%.

Neste estudo, por se tratar de entrevista por telefone, o consentimento livre e esclarecido foi substituído pelo consentimento verbal obtido por ocasião dos contatos telefônicos com os entrevistados. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

Resultados

A população de estudo foi composta na sua maioria (60,2%) por indivíduos do sexo feminino (tab. 1). Observa-se maior porcentagem de homens na faixa etária mais jovem e menor porcentagem de viúvos ou separados. Os homens apresentaram maior freqüência de excesso de peso, consumo não-regular de frutas e hortaliças, consumo regular de refrigerante, hábito de consumo de carne com gordura ou frango com pele e consumo abusivo de bebidas alcoólicas. As mulheres, por sua vez, apresentaram maior freqüência de consumo não-regular de feijão e não referência à atividade física no lazer. Não se encontrou diferença entre os sexos para cor, escolaridade e referência a hipertensão arterial. A hipertensão arterial atingiu cerca de 17,5% da população estudada e a pré-obesidade e a obesidade, 29,9% e 10,2%, respectivamente, totalizando 40,1% da população com excesso de peso.

A tabela 2 mostra, para os homens, que a prevalência de hipertensão arterial aumenta diretamente com a idade; é maior na faixa de menor escolaridade, diminui com o aumento da escolaridade até a faixa correspondente ao segundo grau, e volta a aumentar na faixa de maior escolaridade; e com o aumento do peso, chegando a atingir 42,5% dos obesos. A hipertensão arterial é maior entre os viúvos e separados do que entre os casados, e maior entre esses do que entre os solteiros. Quanto ao padrão de alimentação, verifica-se que a hipertensão arterial foi maior para os que consumiam regularmente frutas e hortaliças e para os que não consumiam regularmente feijão, nem refrigerantes. Foi maior também para os que já experimentaram o hábito de fumar, especialmente os ex-fumantes. Para as mulheres, a hipertensão arterial também aumentou com o aumento da idade, diminuiu com o aumento da escolaridade e, também, aumentou com o aumento do peso, chegando a atingir 41,0% entre as obesas. Foi maior entre as viúvas e separadas do que entre as casadas, e maior entre as casadas do que entre as solteiras. Foi maior com consumo regular de frutas e hortaliças, não-hábito de consumo de carne com gordura ou frango com pele, não-consumo abusivo de bebidas alcoólicas e hábito de fumar, especialmente ex-fumantes.

A regressão logística mostrou, para os homens, que apenas a idade, o excesso de peso, o consumo de frutas e hortaliças e o consumo de feijão mantiveram-se associadas à hipertensão arterial, após ajuste para as demais variáveis (tab. 3). Para as mulheres, as variáveis que se mantiveram no modelo foram: idade, estado civil e excesso de peso (tab. 4).

A análise multivariada apenas com as variáveis anteriormente associadas apontou, para os homens, aumento do risco de hipertensão arterial com o aumento da idade, a partir de 35 anos, aumento do risco em 80% para os com Índice de Massa Corporal (IMC) entre 25 e 29 kg/m2, e em 533% para aqueles com IMC igual ou maior a 30 kg/m2, redução de 40% para os que não consumiam regularmente frutas e hortaliças, e aumento de 69% para os que não consumiam regularmente feijão (tab. 5). Para as mulheres, o risco de hipertensão arterial aumenta com a idade após os 45 anos, aumentou para as viúvas ou separadas em 27%, e aumentou com o aumento do IMC em 78% para as mulheres com IMC entre 25 e 29 kg/m2 e em 114% para as com IMC igual ou maior a 30 kg/m2 (tab. 6). Em ambos os sexos, o excesso de peso mostrou-se o melhor preditor, com potencial de modificação, da hipertensão arterial.

Discussão

Este estudo teve por objetivo avaliar a associação entre HA e excesso de peso, e 17,5% da população do estudo referiram diagnóstico médico prévio de HA. Em estudo de base populacional, realizado em 2003 em Belém, por visita domiciliar, 18% da população com 25 anos e mais de idade referiram diagnóstico de HA, sendo 15% em homens e 19% em mulheres9. Já em 2006, dados obtidos por telefone, também de base populacional, mostraram 16,1% de HA em homens e 21,2% em mulheres, em Belém6. Nosso estudo apontou, respectivamente, 16,2 e 18,3% em homens e mulheres, valores semelhantes aos dois estudos citados, considerando-se o intervalo de confiança.

No que se refere à idade, observamos associação direta entre prevalência de hipertensão arterial e idade, em conformidade com outros estudos5,10-15. Quanto à escolaridade, a associação com prevalência de hipertensão arterial foi inversa, o que concorda com resultados obtidos em alguns trabalhos12,15-17.

O estado civil também se mostrou associado à prevalência de hipertensão arterial, em que os indivíduos que se disseram viúvos ou separados e os casados apresentaram prevalências maiores quando comparados aos solteiros. Dado semelhante pode ser observado em outro estudo15, no qual as solteiras apresentaram menor prevalência de hipertensão. Segundo Sawyer e cols.18, a presença de companheiro ou de laços familiares estáveis está relacionada com acesso aos serviços de saúde e, conseqüentemente, a uma maior possibilidade diagnóstica de hipertensão, o que justificaria o achado de maior prevalência de hipertensão nessas classes civis. O estado civil se associa também com a idade, que por sua vez se associa com a hipertensão arterial, isto é, as pessoas viúvas ou separadas são mais velhas e também têm mais hipertensão, de modo que estado civil se configura como variável de confusão. Após ajuste para a idade, o estado civil perdeu a associação com hipertensão arterial para os homens, mas manteve a associação para as mulheres.

Neste artigo, foi possível verificar aumento significativo da prevalência de HA nos indivíduos que estavam acima do peso, assim como já comprovado por outros estudos5,19-21.

Quanto ao hábito alimentar, é conhecida sua associação com o excesso de peso22, conseqüente e possivelmente também com a hipertensão. Neste estudo, para os homens, o não-consumo regular de feijão se associou com HA, assim como o consumo regular de frutas e hortaliças. Na comunidade estudada, o consumo de feijão faz parte da dieta domiciliar, mostrando um maior cuidado com a saúde, enquanto o consumo de frutas e hortaliças atinge apenas 15% dos homens, podendo se configurar como uma variável de causalidade reversa, isto é os hipertensos passaram a consumir esses alimentos em maior quantidade na tentativa de melhorar seu estado de saúde. Sabe-se que uma das recomendações ao hipertenso é a dieta equilibrada, a qual inclui frutas e hortaliças em maior quantidade do que a usualmente consumida.

Com relação ao hábito de fumar verificou-se associação indireta com a HA, na qual os ex-fumantes apresentaram maior prevalência de hipertensão arterial em relação aos fumantes ou aos que nunca fumaram. Costa e cols.23 também constataram prevalência maior de HA nos ex-fumantes. Estudo realizado por Jardim e cols.24 verificou associação positiva entre HA e abandono do fumo (ex-fumantes), porém a maior prevalência de HA foi verificada entre os não-fumantes. Em estudo realizado por Barreto e cols.25, maior prevalência de hipertensão foi encontrada na classe dos que nunca fumaram, seguidos pelos fumantes e ex-fumantes, respectivamente. Lessa e cols.12 mostraram maior prevalência de hipertensão arterial entre os não-fumantes em relação aos fumantes.

Após ajuste para as variáveis em estudo, observamos que a idade e o excesso de peso se mantiveram associados com hipertensão em ambos os sexos; consumo de frutas, hortaliças e feijão apenas para os homens e estado civil apenas para as mulheres. Considerando-se o excesso de peso como variável explanatória e as demais como variáveis de confusão, encontramos risco de hipertensão arterial igual a 1,80 em homens e 2,49 em mulheres na pré-obesidade e 6,33 e 3,33, respectivamente, para os mesmos sexos na obesidade. Na população de Fortaleza encontrou-se risco igual a 2,04 e 4,08, respectivamente, nos mesmos estratos antropométricos, independentemente do sexo5. Em Bambuí, MG, o odds ratio de hipertensão arterial para indivíduos com sobrepeso foi de 2,82, e para os obesos, 4,29, após ajuste para sexo, idade, escolaridade, renda familiar, hábito de fumar e atividade física25.

De acordo com os dados do National Health and Examination Survey, a prevalência de hipertensão, em indivíduos com excesso de peso, é 2,9 vezes maior quando comparada a de indivíduos eutróficos26. Considerando ambos os sexos, nossos dados apontam para um odds ratio de 2,16 na pré-obesidade, e 4,26 na obesidade, semelhante aos descritos anteriormente. Cumpre salientar que o odds ratio foi utilizado como proxy da razão de prevalência, que é a medida mais adequada para estudos do tipo transversal, como o nosso, apesar do risco de superestimação dos valores, a significância e a direção das associações normalmente são mantidas.

Vale ressaltar que apesar de o instrumento de coleta de dados (inquérito telefônico) do presente levantamento não ter sido o mesmo utilizado nos estudos discutidos, pode-se dizer que ele possui confiabilidade, visto que a cobertura telefônica atinge um porcentual elevado da população de Belém6, levando-se a considerar a amostra utilizada como representativa. Todavia, os valores encontrados para HA precisam ser analisados com cuidado, pois refletem principalmente o acesso aos serviços de saúde e não a prevalência da doença.

Conclui-se que a população estudada apresenta uma alta prevalência de excesso de peso e de hipertensão arterial (ainda que possivelmente subestimada), sendo evidente a forte associação entre ambos. Observa-se que o excesso de peso constitui um importante fator de risco para o desenvolvimento de hipertensão arterial em ambos os sexos, e, embora algumas variáveis interfiram nesta relação, o excesso de peso mostra-se determinante. Desse modo, o controle do peso mostra-se como principal medida para a redução dos índices de hipertensão arterial e, conseqüentemente, para a promoção da saúde.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo foi parcialmente financiado por Edital CT-Saúde/MCT/MS/CNPq nº 30/2004.

Vinculação Acadêmica

Este artigo é parte de trabalho de conclusão de curso de Hilma Paixão Borges e Nilma do Carmo Cruz pela Faculdade de Nutrição do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará.

Artigo recebido em 10/10/07; revisado recebido em 08/01/08; aceito em 15/01/08.

  • 1
    World Health Organization. Diet, nutrition and prevention of chronic diseases. Report FAO/WHO Expert Consulation. Geneva: WHO; 2003. (WHO Technical Report Series 916).
  • 2. Brandão AP, Brandão AA, Magalhães MEC, Pozzan R. Epidemiologia da hipertensão arterial. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo. 2003; 13 (1): 7-19.
  • 3. Andrade JP, Vilas-Boas F,Chagas H, Andrade M. Aspectos epidemiológicos da aderência ao tratamento da hipertensão arterial sistêmica. Arq Bras Cardiol. 2002; 79 (4): 375-83.
  • 4. Gus M, Fuchs SC, Moreira LB, Wiehe M, Silva AF, Albers F, et al. Association between different measurements of obesity and the incidence of hypertension. Am J Hypertens. 2004; 17: 50-3.
  • 5. Feijão AMM, Gadelha FV, Bezerra AA, Oliveira AM de, Silva MSS, Lima JWO. Prevalência de excesso de peso e hipertensão arterial, em população urbana de baixa renda. Arq Bras Cardiol. 2005; 84 (1): 29-33.
  • 6. Ministério da Saúde. Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasília, 2007.
  • 7. Monteiro CA, Moura EC, Jaime PC, Lucca A, Florindo AA, Figueiredo ICR, et al. Monitoramento de fatores de risco para doenças crônicas por entrevistas telefônicas. Rev Saúde Pública. 2005; 39 (1): 47-57.
  • 8. World Health Organization [WHO]. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO Consultation on Obesity. Geneva: WHO; 2000. (WHO Technical Report Series 894).
  • 9. Ministério da Saúde. Inquérito domiciliar sobre comportamentos de risco e morbidade referida de doenças e agravos não transmissíveis: Brasil, 15 capitais e Distrito Federal, 2002-2003. Rio de Janeiro: INCA, 2004.
  • 10. Gus I, Fischmann A, Medina C. Prevalência dos fatores de risco da doença arterial coronariana no Estado do Rio Grande do Sul. Arq Bras Cardiol. 2002; 78 (5): 478-83.
  • 11. Sabry MOD, Sampaio HAC, Silva MGC. Hipertensão e obesidade em um grupo populacional no Nordeste do Brasil. Rev Nutr. 2002; 15 (2): 139-47.
  • 12. Lessa I, Magalhães L, Araújo MJ, Almeida Fş N, Aquino E, Oliveira MMC. Hipertensão arterial na população adulta de Salvador (BA). Arq Bras Cardiol. 2006; 87 (6): 747-56.
  • 13. Wang W, Lee ET, Fabsitz RR, Devereux R, Best L, Welty TK, et al. A longitudinal study of hypertension risk factors and their ralation to cardiovascular disease: the strong heart study. Hypertension. 2006; 47: 403-9.
  • 14. Drukteinis JS, Roman MJ, Fabsitz RR, Lee ET, Best LG, Russel M, et al. Cardiac and systemic hemodinamic characteristics of hypertension and prehypertension in adolescents and young adults: the strong heart study. Circulation. 2007; 16: 221-7.
  • 15. Hartmann M, Dias-da-Costa JS, Olinto MTA, Pattussi MP, Tramontini A. Prevalência de hipertensão arterial sistêmica e fatores associados: um estudo de base populacional em mulheres no sul do Brasil. Cad Saúde Pública. 2007; 23 (8): 1857-66.
  • 16. Santos ZMSA, Silva RM, Becker SLM. Avaliação do índice de massa corporal (IMC) em mulheres hipertensas. RBPS. 2003; 16 (1/2): 34-8.
  • 17. Gus I, Harzheim E, Zaslavsky C, Medina C, Gus M. Prevalência, reconhecimento e controle da hipertensão arterial sistêmica no Estado do Rio Grande do Sul. Arq Bras Cardiol. 2004; 83: 424-8.
  • 18. Sawyer DO, Leite IC. Alexandrino R. Perfis de utilização de serviços de saúde no Brasil. Cadernos Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 2002; 71: 757-76.
  • 19. Lerario DDG, Gimeno SG, Franco LJ, Iunes M, Ferreira SRG e Grupo de Estudo de Diabetes na Comunidade Nipo-Brasileira, São Paulo, Brasil. Excesso de peso e gordura abdominal para a síndrome metabólica em nipo-brasileiros. Rev Saúde Pública. 2002; 36 (1): 4-11.
  • 20. Carneiro G, Faria NA, Ribeiro Fş F, Guimarães A, Lerario D, Ferreira SRG, et al. Influência da distribuição da gordura corporal sobre a prevalência de hipertensão arterial e outros fatores de risco cardiovascular em indivíduos obesos. Rev Assoc Med Bras. 2003; 49 (3): 306-11.
  • 21. Souza ARA, Costa A, Nakamura D, Mocheti LN, Stevenato Fş PR, Ovando LA. Um estudo sobre hipertensão arterial sistêmica na cidade de Campo Grande, MS. Arq Bras Cardiol. 2007; 88 (4): 441-6.
  • 22. Sichieri R. Dietary patterns and their associations with obesity en the Brazilian city of Rio de Janeiro. Obesity Research. 2002; 10 (1): 42-9.
  • 23. Costa JSD, Barcellos FC, Sclowitz ML, Sclowitz IKT, Castanheira M, Olinto MT, et al. Prevalência de hipertensão arterial em adultos e fatores associados: um estudo de base populacional urbana em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. Arq Bras Cardiol. 2007; 88 (1): 59-65.
  • 24. Jardim PCBV, Gondim MRP, Monego ET, Moreira HG, Vitorino PVO, Souza WKSB, et al. Hipertensão arterial e alguns fatores de risco em uma capital brasileira. Arq Bras Cardiol. 2007; 88 (4): 452-7.
  • 25. Barreto SM, Passos VMA, Firmo JOA, Guerra HL, Vidigal PG, Lima-Costa MFF. Hypertension and clustering of cardiovascular risk factors in a community in southeast Brazil-The Bambui Health and Ageing Study. Arq Bras Cardiol. 2001; 77: 576-81.
  • 26. Van Itallie TB. Health implications of overweight and obesity in the United States. Ann Int Med. 1985; 103: 983-8.
  • Correspondência:
    Erly Catarina de Moura
    Avenida Generalíssimo Deodoro, 565/1103
    66.055-240 - Belém, PA - Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      Ago 2008

    Histórico

    • Aceito
      15 Jan 2008
    • Revisado
      08 Jan 2008
    • Recebido
      10 Out 2007
    Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@cardiol.br