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Efeitos do carvedilol (bloqueador <FONT FACE=Symbol>b1,b2,a</FONT>1) na insuficiência cardíaca refratária

Effects of carvedilol (beta1,beta2,alpha1-blocker) on refractory congestive heart failure

Resumos

OBJETIVO: Os efeitos dos beta-bloqueadores na insuficiência cardíaca (IC) refratária não têm sido adequadamente estudados. Investigamos os efeitos do carvedilol (bloqueador <FONT FACE=Symbol>b1,b2,a1</FONT>) nos sintomas e na função ventricular de portadores de IC refratária. MÉTODOS: Foram estudados 21 pacientes, idade média de 56±10 anos, 9 em classe funcional (CF) IV, e 12 em CF III intermitente com IV. A dose inicial de carvedilol foi de 6,25mg e, se tolerada, aumentada progressivamente. A dose média final foi 42±11mg. Os pacientes foram submetidos a avaliações clínicas e eletrocardiográficas seriadas. Realizaram-se, antes e com 196±60 dias de evolução, ecocardiograma e ventriculografia radioisotópica. RESULTADOS: O medicamento foi tolerado em 16 (76%) pacientes. Um paciente está em fase de titulação em CF II. Com 196±60 dias de evolução observaram-se 8 pacientes em CF I e 7 em II; redução da freqüência cardíaca de 96±15 para 67±10bpm (p<0,0001); redução do diâmetro diastólico final de ventrículo esquerdo (VE) de 73±13 para 66±12mm (ecocardiograma) (p<0,009); e aumento da fração de ejeção de VE de 0,21±0,06 para 0,34±0,12 (p<0,0003). CONCLUSÃO: O carvedilol devido aos seus efeitos benéficos na função ventricular, remodelamento e CF é, se tolerado, uma potencial alternativa terapêutica no tratamento medicamentoso da IC refratária. Entretanto, estudos adicionais são necessários para definição do efeito a longo prazo neste específico subgrupo de pacientes.

insuficiência cardíaca congestiva; antagonistas beta-adrenérgicos; transplante


PURPOSE: The effects of beta-blockers on severe heart failure are not well known. We investigated the effects of carvedilol (<FONT FACE=Symbol>b1,b2,a1</FONT>-blocker) on symptoms, functional class (FC), and left ventricular function in patients with refractory heart failure. METHODS: We studied 21 patients, mean age 56±10 years, 9 in FC IV, e 12 in FC III (intermittently with class IV). The initial dosage was 6.25mg, and it was increased progressively as tolerated. The mean dose was 42±11mg. The patients were submitted to routine clinical evaluation, and electrocardiogram. We determined after 196±60 days of follow-up the left ventricular end diastolic dimension (by echocardiogram), and left ventricular ejection fraction (using MUGA). RESULTS: Carvedilol was well tolerated by 16 (76%) patients. One patient is in FC II during increment of the dosage. Eight patients were in FC I, and 7 in FC II at 196±60 days of follow-up. Heart rate decreased from 96±15 to 67±10bpm (p<0.0001), left ventricular end diastolic diameter from 73±13 to 66±12mm (p<0.009), and the left ventricular ejection fraction increased from 0.21±0.06 to 0.34±0.12 (p<0.0003). CONCLUSION: Carvedilol may have beneficial effects on cardiac function, remodeling process, and FC. If tolerated, it seems to be a potential alternative option in the medical treatment of refractory heart failure. However, investigations are still necessary to clarify the long-term effects of carvedilol on this specific subgroup of patients.

congestive heart failure; adrenergic beta-antagonists; transplantation


Ensaio Terapêutico

Efeitos do Carvedilol (Bloqueador b1,b2,a1) na Insuficiência Cardíaca Refratária

Edimar Alcides Bocchi, Fernando Bacal, Giovanni Bellotti, Dirceu Carrara, José Antonio Franchini Ramires

São Paulo, SP

OBJETIVO: Os efeitos dos b-bloqueadores na insuficiência cardíaca (IC) refratária não têm sido adequadamente estudados. Investigamos os efeitos do carvedilol (bloqueador b1,b2,a1) nos sintomas e na função ventricular de portadores de IC refratária.

MÉTODOS: Foram estudados 21 pacientes, idade média de 56±10 anos, 9 em classe funcional (CF) IV, e 12 em CF III intermitente com IV. A dose inicial de carvedilol foi de 6,25mg e, se tolerada, aumentada progressivamente. A dose média final foi 42±11mg. Os pacientes foram submetidos a avaliações clínicas e eletrocardiográficas seriadas. Realizaram-se, antes e com 196±60 dias de evolução, ecocardiograma e ventriculografia radioisotópica.

RESULTADOS: O medicamento foi tolerado em 16 (76%) pacientes. Um paciente está em fase de titulação em CF II. Com 196±60 dias de evolução observaram-se 8 pacientes em CF I e 7 em II; redução da freqüência cardíaca de 96±15 para 67±10bpm (p<0,0001); redução do diâmetro diastólico final de ventrículo esquerdo (VE) de 73±13 para 66±12mm (ecocardiograma) (p<0,009); e aumento da fração de ejeção de VE de 0,21±0,06 para 0,34±0,12 (p<0,0003).

CONCLUSÃO: O carvedilol devido aos seus efeitos benéficos na função ventricular, remodelamento e CF é, se tolerado, uma potencial alternativa terapêutica no tratamento medicamentoso da IC refratária. Entretanto, estudos adicionais são necessários para definição do efeito a longo prazo neste específico subgrupo de pacientes.

Palavras-chave: insuficiência cardíaca congestiva, antagonistas beta-adrenérgicos, transplante

Effects of Carvedilol (b1,b2,a1-blocker) on Refractory Congestive Heart Failure

PURPOSE: The effects of b-blockers on severe heart failure are not well known. We investigated the effects of carvedilol (b1,b2,a1-blocker) on symptoms, functional class (FC), and left ventricular function in patients with refractory heart failure.

METHODS: We studied 21 patients, mean age 56±10 years, 9 in FC IV, e 12 in FC III (intermittently with class IV). The initial dosage was 6.25mg, and it was increased progressively as tolerated. The mean dose was 42±11mg. The patients were submitted to routine clinical evaluation, and electrocardiogram. We determined after 196±60 days of follow-up the left ventricular end diastolic dimension (by echocardiogram), and left ventricular ejection fraction (using MUGA).

RESULTS: Carvedilol was well tolerated by 16 (76%) patients. One patient is in FC II during increment of the dosage. Eight patients were in FC I, and 7 in FC II at 196±60 days of follow-up. Heart rate decreased from 96±15 to 67±10bpm (p<0.0001), left ventricular end diastolic diameter from 73±13 to 66±12mm (p<0.009), and the left ventricular ejection fraction increased from 0.21±0.06 to 0.34±0.12 (p<0.0003).

CONCLUSION: Carvedilol may have beneficial effects on cardiac function, remodeling process, and FC. If tolerated, it seems to be a potential alternative option in the medical treatment of refractory heart failure. However, investigations are still necessary to clarify the long-term effects of carvedilol on this specific subgroup of patients.

Key-words: congestive heart failure, adrenergic beta-antagonists, transplantation

O objetivo do tratamento de portadores de insuficiência cardíaca (IC) inclui a redução da mortalidade, morbidade, com conseqüente melhoria da qualidade de vida, evitando a evolução da doença.1 Atualmente, o tratamento medicamentoso usual e disponível ainda está associado a alta morbidade e mortalidade em subgrupos selecionados de portadores de IC 2. O tratamento cirúrgico está limitado pela dificuldade de aplicação do método devido a critérios de seleção, pela limitação de doadores, pelas complicações tardias, pela degeneração de enxertos, arritmias, rejeição, ou pelo reduzido benefício hemodinâmico 3-12. Outros métodos, incluindo a ventriculectomia parcial, ainda estão em fase inicial de estudo e sua utilização é controversa ou não é conhecido o subgrupo de pacientes a ser beneficiado 13.

Embora os b-bloqueadores já tenham sido preconizado no tratamento da IC desde 1975 14, só recentemente depois da introdução de b-bloqueadores de 3a geração é que tem havido maior entusiasmo para o seu uso. Resultados recentes com b-bloqueadores de 3a geração têm sido animadores em pacientes predominantemente em classe funcional (CF) II ou III 15,16. Entretanto, nesses estudos não foram especificamente incluídos portadores de IC em CF predominantemente IV ou III intermitente com IV, deixando a efetividade da utilização da medicação nesse grupo ainda indeterminada apesar da refratariedade dos sintomas e da alta mortalidade 15-18.

O objetivo desta investigação foi estudar os efeitos de um bloqueador b1,b2,a1 (carvedilol) nos sintomas e na função ventricular de portadores de IC refratária encaminhados para transplante cardíaco.

Métodos

Vinte e um pacientes com IC refratária, encaminhados para avaliação para transplante cardíaco, de acordo com critério de Bocchi e col 8 foram incluídos neste estudo. A etiologia era isquêmica em nove pacientes, indeterminada (miocardiopatia dilatada idiopática) em 11, e miocardiopatia hipertrófica em fase dilatada em um. A etiologia foi confirmada através de estudo cinecoronarioventriculográfico, e ou ecocardiográfico. A idade média era de 56±10 anos, sendo 19 do sexo masculino e dois do feminino. O tempo de história dos sintomas era de 7,2±3,9 anos. Antes de receberem carvedilol, nove pacientes estavam em CF IV, segundo a classificação da New York Heart Association e 12 em CF III intermitente com IV, com episódios de dispnéia paroxística noturna e ortopnéia. No momento da introdução da medicação, não foi detectado nenhum fator de descompensação aguda nos pacientes. Três pacientes apresentavam episódios de angina além do quadro de IC. Os pacientes estudados recusaram o transplante cardíaco, no momento, ou apresentavam alguma contra-indicação para o procedimento (sete pacientes). Dois pacientes haviam sido submetidos a cardiomioplastia ou ventriculectomia parcial para tratamento da IC, e cinco haviam sido submetidos a revascularização miocárdica. Dezenove pacientes estavam em uso de digoxina (0,23±0,04mg); todos recebiam diuréticos incluindo furosemida (66±27mg), associados a hidroclorotiazida em oito pacientes, a amilorida em três, e a espironolactona em três; 17 pacientes em uso de inibidores de enzima de conversão da angiotensina (IECA) (enalapril 17±14mg em seis, captopril 79±28mg em 10 pacientes); inibidor de AT1 em um paciente; 10 pacientes em uso de amiodarona (210±74mg); nitratos em 10; hidralazina em dois; além das medidas usuais de restrição de sódio e água com suplementação de potássio. A medicação, exceto diuréticos, não foi modificada após o início do estudo. Ao estudo ecocardiográfico, o diâmetro diastólico final de ventrículo esquerdo (VE) era de 72± 20mm. A fração de ejeção de ventrículo esquerdo (FEVE) e a de ventrículo direito (FEVD) determinada pelo ventriculografia radioisotópica era de 22±7% e 27±6%, respectivamente.

Foram excluídos pacientes nos quais a investigação da etiologia não afastava a possibilidade de alcoolismo, miocardiopatia restritiva, história de infarto do miocárdio ou procedimento como cirurgia ou angioplastia nos últimos três meses, miocardite, doenças infiltrativas, portadores de etiologia isquêmica com possibilidade de revascularização miocárdica, portadores de miocardiopatia devido à doença de Chagas, valvulopatias, pacientes com episódios prévios de taquicardia ventricular sustentada ou reanimados, uso prévio de b-bloqueadores, portadores de asma brônquica ou episódios não esclarecidos de broncoespasmo, doença pulmonar crônica obstrutiva, distúrbios de condução atrioventricular de 2o e 3o grau, situação hemodinâmica instável com tendência a hipotensão arterial (pressão arterial sistólica (PAS) <90mmHg), PAS >140mmHg ou/e pressão arterial diastólica (PAD) >90mmHg, ou necessidade de uso endovenoso de drogas inotrópicas para manutenção de perfusão periférica ou débito urinário.

O medicamento carvedilol foi introduzido na dose inicial de 6,25mg, uma vez ao dia no período noturno durante um período de sete a 10 dias. Se o paciente apresentasse intolerância ao medicamento pelo aparecimento de novo sintoma incapacitante ou de risco caracterizado por bradicardia <55bpm, bloqueios, ou piora importante da IC, a medicação era suspensa. Em contrário, a cada 7-10 dias a dose era aumentada de 6,25mg ao dia dividida em duas vezes. Se a cada aumento de dose houvesse aparecimento de intolerância, a dose voltava aos valores anteriores ao do aumento. Nesses pacientes era novamente tentado um novo aumento da dose numa evolução mais tardia. Na ausência de intolerância aumentava-se a dose até 50mg ao dia para peso <75kg e 75mg para peso >75kg ou presença de freqüência ventricular >80bpm na dose de 50mg. As consultas de ambulatório eram realizadas semanalmente durante a titulação e mensalmente após este período e sempre pela mesma equipe.

Após confirmação do diagnóstico, os pacientes foram submetidos a avaliação clínica, eletrocardiograma, ecocardiograma com determinação de diâmetro diastólico final de VE, e ventriculografia radioisotópica com determinação de FEVE e FEVD. As avaliações clínicas e eletrocardiográficas foram repetidas conforme consultas. O ecocardiograma e a ventriculografia radiosotópica foram repetidos com 196±60 dias após o início da medicação.

Resultados

Tolerabilidade e efeitos na CF: a dose média utilizada do carvedilol foi 42±11mg. Cinco (24%) pacientes não toleraram a medicação devido ao aparecimento de tontura e dor epigástrica (dois casos), piora não tolerável da IC (dois), e cansaço (um). Em todos os pacientes os sintomas desapareceram após a retirada da medicação. Em um caso, a medicação foi reintroduzida recentemente com sucesso. Assim, 16 (76%) pacientes toleraram o medicamento, sendo que quatro apresentaram sintomas na introdução da medicação, que desapareceram ou ficaram estáveis. Estes sintomas incluíram discreto broncoespasmo (um), tontura (um), diarréia (um), e piora da IC (um).Aumento de dose de diurético foi necessário inicialmente em 1 paciente. Um paciente está em fase de titulação mas já em CF II. Em 15 pacientes que toleraram a medicação observou-se com 196±60 dias de evolução CF I em oito pacientes e II em sete. Com 288±176 dias de evolução nove pacientes estavam em CF I, três em CF II, um em CF III, e um teve morte súbita apesar da melhora da CF de IV para II. (fig. 1). O maior tempo de seguimento é de 503 dias. Não houve desenvolvimento tardio de intolerância. Nenhum dos pacientes que tolerou a medicação reinternou devido a sintomas de IC. Entre os que não toleraram a medicação dois pacientes foram submetidos a transplante cardíaco em CF IV, um foi submetido a ventriculectomia em CF IV, e dois estão em CF III.


Efeitos na freqüência cardíaca, diâmetros e função ventricular esquerda: em 15 pacientes reavaliados após 196±60 dias de início da medicação a freqüência cardíaca média diminuiu de 96±15 para 67± 10bpm (p<0,0001) (fig. 2). Observou-se ao ecocardiograma em 14 pacientes redução do diâmetro diastólico de VE de 73±13 para 66±12mm (p<0,009) (fig. 3). Observou-se à ventriculografia radioisotópica repetida em 12 pacientes aumento da FEVE de 0,21±0,06 para 0,34±0,12 (p<0,0003) (fig. 4). Em dois pacientes em que se repetiu a FEVD observou-se melhora de 0,26 para 0,43 e de 0,26 para 0,33.




Discussão

Os resultados deste estudo demonstram que o uso do carvedilol, bloqueador b1-b2-a1 de 3a geração pode determinar melhora da CF, e da função ventricular esquerda em pacientes encaminhados para transplante cardíaco predominantemente ou intermitentemente em CF IV. Em contraste com a tradicional contra-indicação de b-bloqueadores para portadores de IC, o seu uso mostrou-se seguro desde que devidamente monitorizado e com a titulação sendo feita em pequenas doses.

A melhora clínica observada neste subgrupo de pacientes de etiologia isquêmica e não isquêmica em CF IV intermitente, que tolerou a medicação está concordante com o descrito para pacientes em CF II e III.15-18 Estudos prévios não têm especificamente investigado o possível benefício do carvedilol neste subgrupo de pacientes mais graves, e tem incluído pacientes com idade avançada ou freqüência cardíaca menos elevada. Nossos resultados não necessariamente podem ser aplicados ao uso de outros b-bloqueadores, pois é discordante de investigação prévia com o b-bloqueador bisoprolol de 2a geração 19. A melhora funcional poderia ser explicada pelo aumento da função ventricular esquerda e direita. Adicionalmente, os b-bloqueadores teriam efeito prevenindo e revertendo o remodelamento ventricular. A redução do diâmetro diastólico final em nossos resultados sugere efeito do carvedilol na remodelação ventricular, também neste subgrupo de pacientes. Os mecanismos propostos de ação dos b-bloqueadores, embora não totalmente esclarecidos incluem 20,21: bloqueio da hiperatividade adrenérgica cardíaca com ressensibilização de mecanismos de transdução gênica mediada adrenergicamente via receptor b, aumento da densidade de b receptores, reacoplamento de receptores b2 e b1, redução da freqüência cardíaca, efeito vasodilatador através ou não de bloqueio a1, propriedades antioxidantes, diminuição da regulação da cinase b-receptor mediada, diminuição da atividade da proteína G inibidora, aumento da função de adenilciclase, diminuição da apoptose 22, diminuição da hipertrofia excêntrica, inibição do sistema renina-angiotensina, prevenção da produção de cardiotrofina-1, inibição da síntese de endotelina, e efeito anti-isquêmico. O fato do carvedilol não restaurar a regulação de receptores b1, ou alterar a transcrição do sinal do receptor b 23 sugere que seus efeitos benéficos adicionais possam ser devidos a bloqueio a1 e efeito antioxidante, além de efeitos biológicos não totalmente esclarecidos. O efeito benéfico maior do carvedilol 24 em relação ao b-bloqueadores seletivos b1 tem sido explicado pelo aumento da proporção de b2/b1 conforme a IC progride, e em relação aos não seletivos pelo ação nos receptores a1 que desempenham papel no remodelamento cardíaco e estresse oxidativo. A maioria dos efeitos do carvedilol teria ação anti-arrítmica, além do efeito intrínseco tipo Classe II.

O efeito benéfico na miocardiopatia isquêmica poderia ser devido à ação antiisquêmica conseqüente a redução da freqüência cardíaca e bloqueadora a1 diminuindo pós-carga e tensão intracavitária; ao efeito antioxidante inibindo formação de radicais livres derivados do oxigênio diminuindo apoptose, e redução da expressão da ICAM-1 (molécula de adesão intercelular) que é molécula chave de adesão dos neutrófilos a células endoteliais e musculares lisas 25. O carvedilol parece acumular em membranas plasmáticas excedendo até de 10.000 vezes o encontrado no extracelular explicando a alta potência antioxidante. Experimentalmente o carvedilol tem maior capacidade de diminuição de áreas de infarto quando comparados a outros bloqueadores b, sugerindo um efeito cardioprotetor independente do efeito bloqueador b. 26,27

A porcentagem maior de pacientes com intolerância inicial à medicação foi maior que o descrito para pacientes menos graves (5,6%-6%) 15,16 e pode ser explicada pela maior sensibilidade aguda ao efeito b-bloqueador devido a maior dependência dos doentes mais graves do suporte adrenérgico inotrópico e cronotrópico. O aumento mais lento das doses em nossa investigação acrescentando 6,25mg a cada semana e não dobrando a dose, poderia justificar a ausência de intolerância tardia.

Neste estudo foi incluido de maneira não cega e não sorteada um número limitado de pacientes, mas os resultados foram expressivos neste subgrupo de pacientes de alto risco. As conclusões após o uso de carvedilol não necessariamente podem ser estendidas para outros b-bloqueadores, desde que estes fazem parte de um grupo heterogêneo de drogas, diferindo em efeitos farmacológicos agudos e crônicos, hemodinâmicos, e biológicos 20. O tempo de seguimento e o número de pacientes não é suficiente para conclusão definitiva a respeito de efeitos na mortalidade a longo prazo. Entretanto, os efeitos obtidos na função ventricular sugerem um efeito benéfico desde que esta é importante na determinação do prognóstico. Mas, a possibilidade de morte súbita ou piora da IC pode ainda persistir. Os resultados também não devem ser estendidos a IC diastólica. A avaliação da CF é ausente de sofisticação e com certo grau de subjetividade, no entanto é largamente aceita e tem relação com a sobrevida.

Os efeitos benéficos do carvedilol na função ventricular e remodelamento podem favorecer o aumento da sobrevida nos portadores de IC. Sobrevida inesperadamente longa foi observada neste subgrupo de pacientes graves corroborando com o descrito para pacientes menos graves. Nossos resultados sugerem que pacientes com IC refratária na ausência de contra-indicações deveriam ser considerados para o tratamento com b-bloqueadores com o objetivo de diminuir a progressão da doença, com conseqüente redução da mortalidade e morbidade. O uso do carvedilol pode ser importante na redução do número de pacientes necessitando de tratamento cirúrgico para IC refratária.

Concluindo, o carvedilol (bloqueador b1-b2-a1) com seus efeitos benéficos na função ventricular, remodelamento e CF, é uma potencial alternativa terapêutica no tratamento medicamentoso da IC refratária. Entretanto, estudos adicionais são necessários para definição do efeito a longo prazo neste subgrupo específico de pacientes.

Instituto do Coração do Hospital das Clínicas - FMUSP

Correspondência: Edimar Alcides Bocchi - Rua Oscar Freire, 2077/161 - 05409-011 - São Paulo, SP

Recebido para publicação em 26/3/98

Aceito em 24/6/98

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jan 2002
  • Data do Fascículo
    Ago 1998

Histórico

  • Aceito
    24 Jun 1998
  • Recebido
    26 Mar 1998
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