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Influência da espessura dos segmentos de anel corneano na correção do astigmatismo ceratométrico em pacientes com ceratocone

Influence of corneal ring segment thickness on correction of corneal astigmatism in patients with keratoconus

RESUMO

Objetivo:

Avaliar retrospectivamente a influência da espessura do anel intracorneano na redução do astigmatismo corneano em pacientes portadores de ceratocone.

Métodos:

De um banco de dados com 2.033 olhos submetidos à cirurgia de implante de anel corneano, foi selecionada uma amostra de 90 olhos com características semelhantes em relação à ceratometria e ao astigmatismo. Todos os olhos deste estudo receberam dois segmentos de comprimento de arco tradicional de aproximadamente 160°, com espessuras variadas: Grupo A recebeu dois segmentos de 150µm; Grupo B recebeu dois segmentos de 200µm, e Grupo C recebeu dois segmentos de 250µm. As variáveis analisadas foram ceratometria média e astigmatismo corneano pré e pós-operatório.

Resultados:

Nos olhos que receberam dois segmentos de anel de 150µm de espessura (Grupo A), houve redução média de 5,0D (10%) em relação à ceratometria média e redução média de 3,26D (57,69%) em relação ao astigmatismo corneano. Na amostra em que foram utilizados dois segmentos de 200µm (Grupo B), foi observada redução da ceratometria média de 7,0D (14,28%) e do astigmatismo corneano de 3,53D (63,6%). Já na amostra que recebeu dois segmentos de anel de 250µm de espessura (Grupo C), a redução média da ceratometria foi de 10D (20,4%) e de seu astigmatismo corneano de 2,09D (38,99%).

Conclusão:

Nos pacientes com ceratocone submetidos à cirurgia de anel corneano, o aumento da espessura dos segmentos implantados promove maior aplanamento da córnea, mas não o aumento em sua capacidade de reduzir o astigmatismo ceratométrico. Seria interessante a análise de uma amostra maior de pacientes, aliada a cálculos vetoriais de astigmatismo, para comprovar os achados deste estudo.

Descritores:
Anel intracorneano; Ceratometria; Astigmatismo; Ceratocone; Córnea

ABSTRACT

Objective:

To retrospectively evaluate the influence of intracorneal ring thickness on reduction of corneal astigmatism in patients with keratoconus.

Methods:

From a database of 2,033 eyes submitted to corneal ring implant surgery, a sample of 90 eyes with similar keratometry and astigmatism characteristics was selected. All eyes in this study received two segments of traditional arc length of approximately 160°, with varying thicknesses: Group A received two segments of 150 µm; Group B received two segments of 200 µm, and Group C received two segments of 250 µm. The variables analyzed were mean keratometry and corneal astigmatism before and after surgery.

Results:

In the eyes that received two 150-µm ring segments (Group A), there was a mean reduction of 5.0 D (10%) in relation to mean keratometry, and a mean reduction of 3.26 D (57.69%) in relation to corneal astigmatism. In the sample in which two 200-µm segments (Group B) were used, there was a mean reduction in keratometry of 7.0 D (14.28%) and in corneal astigmatism of 3.53 D (63.6%). In the sample receiving two 250-µm ring segments (Group C), the mean reduction in keratometry was 10 D (20.4%) and in corneal astigmatism was 2.09 D (38.99%).

Conclusion:

In keratoconus patients undergoing corneal ring surgery, increased thickness of the implanted segments promotes greater flattening of the cornea, but does not enhance their ability to reduce corneal astigmatism. It would be interesting to analyze a larger sample of patients, combined with vector calculations of astigmatism, to confirm the findings of this study.

Keywords:
Intracorneal ring; keratometry; Astigmatism; Keratoconus; Cornea

INTRODUÇÃO

O ceratocone é uma ectasia corneana que gera afinamento do estroma central, com consequente diminuição da acuidade visual, ao induzir distúrbios refrativos, como miopia e astigmatismo irregular.(11 Rabinowitz YS. Keratoconus. Surv Ophthalmol. 1998;42(4):297-319.) É uma desordem não inflamatória, bilateral e assimétrica, com protrusão anterior da córnea central, geralmente inferior.(11 Rabinowitz YS. Keratoconus. Surv Ophthalmol. 1998;42(4):297-319.,22 Krachmer JH, Feder RS, Belin MW. Keratoconus and related non-inflammatory corneal thinning disorders. Surv Ophthalmol. 1984;28(84):293-322.) Gera grande impacto social e psicológico nos pacientes, uma vez que a diminuição da acuidade visual nem sempre pode ser corrigida por meios clínicos tradicionais, como óculos e lentes de contato. Uma das opções para reabilitação visual desses pacientes é o implante de anel corneano, o qual, na maioria dos casos, consegue reduzir tanto a curvatura quanto o astigmatismo da córnea. Além disso, acredita-se que esse dispositivo também contribui lentificando ou interrompendo a progressão do ceratocone, podendo ajudar a evitar um transplante corneano, que é o tratamento indicado para os casos mais graves da doença.(33 Ambrósio Júnior R, Borges JS, Costa-Ferreira C, Coelho V, Silva RS, Valbon B, et al. Intrastromal corneal ring segments for keratoconus: results and correlation with preoperative corneal biomechanics. Rev Bras Oftal. 2012;71(2):89-99.)

Em 1949, Barraquer demonstrou que a adição de material na periferia da córnea promove um aplanamento de sua região central, o que ficou conhecido como a “Lei da Espessura” de Barraquer.(44 Barraquer JI. Queratoplastia refractiva. Est e Inf Oftal. 1949;2:10-30.) Na mesma época, Blavatskaia afirmou que esses resultados são diretamente proporcionais à espessura e inversamente proporcionais ao diâmetro do implante utilizado.(55 Blavatskaia D. The use of intralamellar homoplasty in order to reduce refraction of the eye. Uberstzt.Aus.Oftalmol.Zh 1966;7:530-7.) Outros autores, como Fleming et al., descreveram o implante de anel intraestromal de polimetilmetacrilato (PMMA) com finalidade refrativa.(66 Fleming JF, Reynolds AE, Kilmer L, Burris T, Abbott R, Shanzlin D. The intrastromal corneal ring: two cases in rabbits. J Refract Surg. 1987;3:227-32.,77 Fleming JF, Wan WL, Schanzlin DJ. The theory of corneal curvature change with the intrastromal corneal ring. CLAO J. 1989;15(2):146-150.)

Vários estudos seguiram e demonstraram que o anel intracorneano, inicialmente usado apenas para a correção da miopia, também poderia ser útil na correção do astigmatismo regular e irregular. Por isso, ele passou a ser indicado no tratamento de pacientes com ceratocone ou outras patologias que cursam com irregularidade de córnea, como a degeneração marginal pelúcida, a ectasia pós-cirurgia refrativa e pós-ceratoplastia ou o trauma corneano.(88 Siganos D, Ferrara P, Chatzinikolas K, Bessis N, Papastergiou G. Ferrara intrastromal corneal ring for the correction of keratoconus. J Cataract Refract Surg. 2002;28(11):1947-51.,99 Nosé W, Neves RA, Schanzlin DJ, Belfort Júnior R. Intrastromal corneal ring-one-year results of first implants in humans: a preliminar nonfuncional eye study. Refract Corneal Surg. 1993;9(6):452-8.

10 Assil KK, Barret AM, Fouaker BD, Schanzlin DJ. One-year results of the intrastromal corneal ring in nonfunctional humam eyes. Intrastromal Corneal Ring Study Group. Arch Ophthalmol. 1995;113(2):159-67.
-1111 Ferrara P, Bicalho F. Anel de Ferrara. Rio de Janeiro: Cultura Médica; 2006. p. 53-127.)

O presente estudo objetivou avaliar a relação entre a espessura do anel intracorneano utilizado e a modulação da ceratometria média (Km) do paciente, assim como a diminuição de seu astigmatismo corneano final.

MÉTODOS

Os olhos analisados neste trabalho foram extraídos do banco de dados disponibilizado na internet, conhecido como Keratoconus Study Group (KSG, www.keratoconusstudygroup.com). Trata-se de um banco de dados multicêntrico, internacional, gratuito, aberto para ser utilizado pela comunidade científica, que reúne os resultados obtidos com a cirurgia de implante de anel corneano de diversos modelos e vários fabricantes. Tal banco de dados foi criado para permitir o estudo mais aprofundado da cirurgia de anel corneano, uma vez que análises com significância estatística dependem da utilização de amostras numerosas (o que é difícil de se conseguir com dados provenientes de apenas um ou poucos médicos). Para participar desse grupo, o médico efetua um cadastro on-line, podendo, em seguida, inserir os dados de seus pacientes.

O site do KSG possui um mecanismo de filtros que permite selecionar os pacientes que apresentam as características desejadas para um determinado estudo. Até o fechamento deste trabalho, tal grupo reunia 2.033 olhos operados.

Dessa amostra de 2.033 olhos, foram selecionados apenas os pacientes entre 15 e 45 anos de idade que receberam dois segmentos com comprimento de arco tradicional (aproximadamente 160°), sendo ambos da mesma espessura. Foram considerados como segmentos de arco tradicional e incluídos neste estudo aqueles com 160° ou 155° de arco.

Para homogeneizar a amostra em relação ao quesito Km pré-operatória, foi estudado em qual intervalo de 5 dioptrias (D) estaria englobado o maior número de pacientes. Assim, foram contados quantos olhos existiam dentro dos intervalos: de 47D a 52D; de 48D a 53D; de 49D a 54D; de 50D a 55D e assim por diante. O grupo mais volumoso foi o que possuía Km pré-operatória entre 47D e 52D.

Dessa forma, foram selecionados olhos com curvatura média entre 47D e 52D, os quais receberam exclusivamente dois segmentos de arco tradicional e tendo ambos a mesma espessura. Faltava ainda homogeneizar a amostra em relação ao astigmatismo corneano pré-operatório. Para isso, foi definido com critério de inclusão a presença de astigmatismo corneano entre 4D e 7D (Tabela 1).

Tabela 1
Critérios de inclusão dos olhos

Foram excluídos do estudo pacientes com dados incompletos no registro. Os demais critérios de exclusão foram olhos submetidos a cirurgias prévias, pacientes com menos de 15 e mais de 45 anos de idade, córneas com opacidades de qualquer intensidade, Km pré-operatória menor que 47D e maior que 52D, astigmatismo corneano pré-operatório menor que 4D e maior que 7D, olhos que receberam apenas um segmento de arco e olhos que receberam dois segmentos de arcos menores ou maiores que 160° a 155°. Foram também excluídos os pacientes que receberam dois segmentos de 300µm de espessura devido ao número insuficiente de casos para análise.

Após o processo de homogeneização da amostra com a eliminação dos casos que não se enquadravam nos critérios de inclusão, foi definido o grupo a ser analisado, o qual apresentava 90 olhos. Essa amostra foi dividida em três grupos, cada um com 30 olhos, sendo Grupo A, com olhos que receberam dois segmentos com espessura de 150µm; Grupo B, com olhos que receberam dois segmentos com espessura de 200µm e Grupo C, com olhos que receberam dois segmentos com espessura de 250µm.

As variáveis analisadas nos exames pré e pós-operatório foram Km e astigmatismo corneano. O exame pós-operatório selecionado para fazer parte deste trabalho foi o último obtido antes de se completar 1 ano de pós-operatório.

A técnica cirúrgica foi a seguinte: o paciente foi deitado e permaneceu olhando diretamente para a luz do microscópio. Foi feito um pequeno ponto de desepitelização sobre o primeiro reflexo de Purkinje (considerando que este se encontrava muito próximo do eixo visual). Em seguida, foi feita a marcação da zona de tunelização centrada no ponto de desepitelização descrito. A espessura corneana foi medida com o paquímetro ultrassônico no local onde foi feita a incisão – na zona de tunelização demarcada, sobre o meridiano mais curvo da córnea. A incisão foi realizada com bisturi de diamante com a lâmina ajustada para 70% a 80% da paquimetria local. Um bolsão corneano originado no fundo da incisão foi criado, utilizando-se, inicialmente, o pré-delaminador (starter) e, em seguida, o spreader, para aumentar sua extensão. Foi feita a delaminação do túnel estromal seguindo as marcas da zona de tunelização estampada na córnea, utilizando os tunelizadores horário e anti-horário (técnica de tunelização manual). Foram inseridos os segmentos de anel (neste estudo, cada olho recebeu dois segmentos idênticos em relação a comprimento de arco e espessura). No pós-operatório, foram utilizados antibiótico e corticoide tópicos, além de colírio lubrificante.

Os pacientes foram avaliados diversas vezes no período pós-operatório, sendo utilizados, para este estudo, os dados coletados no último retorno realizado no primeiro ano.

Para estudos do tipo antes e depois, como é o caso deste, considera-se como sendo controles os dados obtidos no exame do pré-operatório. As alterações observadas no pós-operatório em relação a esse controle foram atribuídas à intervenção cirúrgica realizada, ou seja, o implante do anel corneano.

RESULTADOS

Os pacientes selecionados possuíam entre 15 e 45 anos (média de 26,08 anos) e nunca tinham sido submetidos à cirurgia ocular. Eram intolerantes ao uso de lentes de contato e possuíam baixa visão com óculos. Em relação à lateralidade, 45 eram olhos direitos e 45, olhos esquerdos. Em relação ao sexo, 46 pacientes eram do sexo masculino e 44 do sexo feminino.

Os dados coletados dos pacientes antes e depois da cirurgia foram a acuidade visual com correção, a Km e o astigmatismo corneano.

Antes da cirurgia, a média da acuidade visual corrigida foi de 0,5logMAR (equivalente a 20/63 na tabela de Snellen). Os cálculos de média dos valores de acuidade visual foram feitos segundo a escala logMAR.

Antes do implante do anel, as Km compreenderam valores entre 47D e 52D, e o astigmatismo corneano variou entre 4,0D e 6,9D, respeitando os critérios de inclusão estabelecidos. Nenhuma córnea possuía opacidades.

Todas as cirurgias foram feitas pela técnica manual, sob anestesia tópica, utilizando microscópio cirúrgico em ambiente estéril. Os anéis utilizados foram do modelo Ferrararing (Ferrara Ophthalmics, Brasil/AJL, Espanha) e Cornealring (Visiontech, Brasil), com tamanhos de arco entre 155° e 160° e espessuras entre 150µm e 250µm. Todos foram implantados em zona óptica de 5mm. Foram incluídos no estudo apenas olhos com implante de dois segmentos de anel, ambos com a mesma espessura e o mesmo comprimento de arco. Não foram relatadas complicações ou intercorrências no intra ou pós-operatório.

No Grupo A, houve redução média de 5,0D (10%) em relação à Km e de 3,26D (57,69%) em relação ao astigmatismo corneano. No Grupo B, a redução média da Km foi de 7,0D (14,28%) e do astigmatismo corneano de 3,53D (63,6%). Já no Grupo C, a redução média do Km foi de 10D (20,4%) e do astigmatismo corneano de 2,09D (38,99%).

Foi realizada análise estatística comparando os valores do pré com os do pós-operatório, tanto relativos à redução da Km quanto à do astigmatismo corneano, utilizando-se o teste t de Student pareado em cada um dos três grupos. A redução encontrada na Km, bem como a obtida no astigmatismo corneano foram estatisticamente significativas (p≤0,05) nos Grupos A, B e C.

A redução da Km aumentou à medida que foram utilizados segmentos mais espessos. Assim, a redução encontrada no grupo que recebeu os segmentos mais espessos (Grupo C, com segmentos de 250µm) foi maior que a encontrada no Grupo B, que, por sua vez, foi maior que a apresentada no Grupo A. Ainda, não foi observado aumento na capacidade de reduzir o astigmatismo corneano à medida que se aumentou a espessura dos segmentos implantados.

As Figuras 1 e 2 ilustram os dados obtidos.

Figura 1
Variação ceratométrica.
Figura 2
Variação do astigmatismo corneado.

DISCUSSÃO

O objetivo do implante do anel intracorneano é melhorar a acuidade visual com correção do paciente, reduzindo seu astigmatismo regular e irregular, além de diminuir a ceratometria central e, consequentemente, a miopia. Também se acredita que ele possa contribuir para lentificar ou evitar a progressão da ectasia. É um procedimento reversível e ajustável, com a possibilidade de reposicionamento ou troca dos segmentos, até a obtenção do resultado desejado.(1212 Colin J, Cochener B, Savary G, Malet F. Correcting keratoconus with intracorneal rings. J Cataract Refract Surg. 2000;26(8):1117-22.)

Entre os anéis cornenanos atualmente disponíveis, os utilizados neste estudo foram o Ferrararing e o Cornealring, ambos de PMMA, com zona óptica de 5mm e 6mm e espessura variando entre 150µm e 350µm (a cada 50µm). Os arcos variam entre 90° e 210°, no Ferrararing, e entre 90° e 220°, no CornealRing. O comprimento de arco do segmento standard (tradicional) no modelo Ferrararing tem 160° de arco, e o segmento standard (tradicional) no modelo Cornealring tem 155° de arco. Essa diferença de 3% no comprimento do arco parece não ter relevância prática, de forma que foram considerados como idênticos para as finalidades do estudo.

Para realizar este trabalho, foi necessária a criação de um grupo multicêntrico de estudo, o KSG, possibilitando a análise de uma quantidade grande de olhos operados por meio do implante de anel corneano. Para obter resultados confiáveis, foi fundamental partir de grupos homogêneos, ou seja, com características semelhantes em relação aos segmentos implantados e, especialmente, com relação à ceratometria e ao astigmatismo do pré-operatório. Para a definição de uma amostra com 90 olhos, divididos em três grupos homogêneos entre si, foi necessário eliminar 1.943 olhos de um total inicial de 2.033 olhos.

O anel intracorneano atua criando espaços entre as lamelas do estroma, aumentando seu tensionamento e, por fim, gerando redução da curvatura da córnea central.(1313 Silvestrini TA, Mathis ML, Loomas BE, Burris TE. A geometric model to predict the change in corneal curvature from the intrastromal corneal ring (ICR). Invest Ophthalmol Vis Sci. 1994;35:2023.) Estudos mostraram que essa aplanação gerada pelo anel é diretamente proporcional à espessura do segmento implantado e inversamente proporcional ao diâmetro da zona óptica na qual o anel é inserido, ou seja, quanto mais espesso e menor o diâmetro, maior o efeito de aplanação corneana.(1414 Burris TE, Baker PC, Ayer CT, Loomas BE, Mathis ML, Silvestrini TA. Flattening of central corneal curvature with intrastromal corneal rings of increasing thickness: an eye-bank eye study. J Cataract Refract Surg. 1993;19 Suppl:182-7.,1515 Ferrara P, Torquetti L. Ferrara Ring. In: Barbara A. Textbook on keratoconus: new insights. Delhi: JP Medical; 2011. p. 163-74.) Outro fator que interfere na redução da ceratometria central é o comprimento do arco do segmento usado. Assim, quanto maior for a quantidade de material implantado (segmentos com comprimento de arco maiores), maior o efeito de aplanação com maior redução da asfericidade corneana.(1616 Torquetti L, Berbel RF, Ferrara P. Long-term follow-up of intrastromal corneal ring segments in keratoconus. J Cataract Refract Surg. 2009;35(10):1768-73.)

Neste estudo, foi demonstrado que o aumento da espessura do segmento de anel intracorneano foi estatisticamente relevante (p≤0,05) em aumentar a capacidade de redução da Km em todos os grupos. Isso confirma o enunciado conhecido como Lei das Espessuras de Barraquer: “quanto maior a espessura dos segmentos implantados na periferia da córnea, maior será seu poder de aplanação da região central”.(44 Barraquer JI. Queratoplastia refractiva. Est e Inf Oftal. 1949;2:10-30.)

Em relação à correção do astigmatismo corneano, ainda existem poucos trabalhos que abordam o tema partindo de uma amostra suficientemente grande para alcançar um bom nível de significância estatística. O que se acredita hoje é que o posicionamento dos segmentos interfere na redução do astigmatismo, sendo que uma melhor eficácia nessa correção é obtida ao se alinharem as extremidades dos segmentos com o meridiano mais curvo da córnea. A maioria dos estudiosos também acredita que os segmentos de comprimento de arco menores (por exemplo: arco de 140°) possuem boa capacidade para reduzir o astigmatismo, a despeito de sua eficácia limitada para o aplanamento da córnea e correção da miopia. Até este trabalho, pouca discussão vem sendo feita a respeito da influência da espessura do segmento implantado em sua capacidade para redução do astigmatismo.

CONCLUSÃO

A complexidade no manejo da melhora da acuidade visual do paciente portador de ceratocone intolerante aos óculos e às lentes de contato é um desafio para o oftalmologista. As opções de tratamento são limitadas e o implante de anel corneano se torna importante para evitar a indicação do transplante de córnea, por este ser um tratamento com complicações mais frequentes e mais severas.

Dentro dos limites deste experimento, conclue-se que, em pacientes com ceratocone submetidos à cirurgia de anel corneano, o aumento da espessura dos segmentos implantados promove um maior aplanamento da córnea, mas não promove um aumento de sua capacidade de reduzir o astigmatismo ceratométrico. Seria interessante a análise de uma amostra maior de pacientes, aliada a cálculos vetoriais de astigmatismo, para comprovar os achados deste estudo.

Estudos como este são importantes para o melhor entendimento e o planejamento desta cirurgia, com o objetivo de sempre buscar os melhores resultados.

Em patologias cuja prevalência na população não é muito alta, como é o caso do ceratocone, a união das experiências de diversos médicos em estudos multicêntricos, como é o Keratoconus Study Group, torna-se fundamental.

  • Instituição de realização do trabalho: Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.
  • Fonte de auxílio à pesquisa: trabalho não financiado.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    24 Fev 2021
  • Aceito
    23 Jun 2021
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