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LASIK hipermetrópico pós-DSAEK (Descement Stripping Automated Endotelial Keratoplasty)

RESUMO

O DSAEK (Descemet stripping automated endotelial Keratoplasty) é um dos procedimentos de escolha para tratamento das doenças que acometem o endotélio corneano. Apesar do sucesso terapêutico, o procedimento pode induzir uma hipermetropia residual. Em média a refração se estabiliza em um perído que varia de 6 a 12 meses após o transplante. O objetivo desse relato é descrever a evolução dessa opção terapêutica utilizada em um paciente de 54 anos portador de Distrofia de Fuchs. O paciente foi submetido ao transplante de córnea (DSAEK) e a remoção do cristalino no mesmo tempo cirúrgico o que resultou em hipermetropia residual. Após 3 anos de acompanhamento apresentava-se com a melhor visão corrigida de 20/20 (Snellen) no olho operado com uma refração de +3,25 -1,00 (5º). Optou-se por realização de LASIK (Laser assisted in situ Keratomileusis) hipermetrópico, obtendo um resultado visual satisfatório.

Descritores:
Ceratomieleuse assistida por eximer laser in situ; Doenças da córnea; Ceratoplastia endotelial com remoção da lâmina limitante posterior; Relatos de casos

ABSTRACT

DSAEK (Descemet stripping automated endothelial keratoplasty) is one of the options for corneal endothelium disease, which in some patients can result in a residual hyperopia after the procedure. Usually 6 to 12 months after corneal transplantation refraction is already stable. This report describes a therapeutic option used in a 54 years old patient with Fuchs' endothelial dystrophy submitted to cataract and corneal transplant that resulted in residual hyperopia, three years after the procedure the best corrected vision was 20/20 with a refraction of +3.25 -1.00 (5 º) treated with Hyperopic - LASIK (Laser-assisted In Situ Keratomileusis) with satisfactory visual result.

Keywords:
keratomieleusis, laser in situ; Corneal diseases; Descemet stripping endothelial keratoplasty/methods; Case reports

INTRODUÇÃO

O DSAEK (Descemet stripping automated endotelial Keratoplasty) é um dos procedimentos de escolha, para o tratamento de doenças que acometem o endotélio corneano. As vantagens em relação à ceratoplastia penetrante são inúmeras, destacando-se: a reabilitação visual mais rápida, maior previsibilidade e menor indução e regularidade no astigmatismo pós-operatório. Como desvantagem, no entanto, muitos trabalhos observam a ocorrência de hipermetropia residual após o DSAEK, frequentemente atribuída ao tecido doador.(11 Price MO, Price FW Jr. Descemet's stripping with endothelial keratoplasty: comparative outcomes with microkeratome - dissected and manually dissected donor tissue. Ophthalmology. 2006;13(11):1936-42.

2 Gorovoy MS. Descemet-stripping automated endothelial keratoplasty. Cornea. 2006;25(8):886-9.

3 Fung SS, Iovieno A, Shanmuganathan V, Maurino V. Femtosecond laser refractive surgery after descemet stripping - automated endothelial keratoplasty. Case Rep Ophthalmol Med. 2012; 2012:190953.
-44 Ratanasit A, Gorovoy MS. Laser-Assisted In Situ Keratomileusis or Photorefractive Keratectomy After Descemet Stripping Automated Endothelial Keratoplasty. Cornea. 2011;30(7):787-9.)

Embora a curvatura corneana seja minimamente afetada, pode ocorrer a indução de um astigmatismo residual atribuído a curvatura posterior da lamela doadora. A refração tende a tornar-se estável após 6-12 meses de pós-operatório.(44 Ratanasit A, Gorovoy MS. Laser-Assisted In Situ Keratomileusis or Photorefractive Keratectomy After Descemet Stripping Automated Endothelial Keratoplasty. Cornea. 2011;30(7):787-9.,55 Chen ES, Terry MA, Shamie N, Hoar KL, Friend DJ. Stability of hyperopic refractive shift following Descemet-stripping automated endothelial keratoplasty. J Cataract Refract Surg. 2009;35(8):1473.)

O objetivo do presente relato é reportar o caso de um paciente submetido ao DSAEK e que evoluiu com hipermetropia residual e astigmatismo, sendo realizado um LASIK (Laser-assisted in-situ keratomileusis) para correção da ametropia residual.

RELATO DE CASO

Paciente do sexo masculino, 54 anos, encaminhado para o serviço de córnea da Ocular Surgery Center (SP) com diagnóstico de distrofia endotelial de Fuchs e catarata bilaterais. A melhor visão corrigida era de 20/80 (Snellen) em OD e 20/60 (Snellen) em OE, atingidas com a seguinte refração: OD - 4,75 -1,75 (15º) OE -2,00 -1,50 (155º). Na ocasião, a biomicroscopia evidenciava catarata nuclear bilateral, córnea guttata em ambos os olhos, e o mapeamento de retina não apresentava alterações.

Foi realizado o procedimento combinado no OD: Facoemulsificação , implante de LIO e DSAEK no mesmo tempo cirúrgico, sem complicações. A lente (LIO) Tecnis® 1-piece (AMO foi implantada em posição intra-capsular). O DSAEK foi realizado, sem intercorrências. O botão doador foi trepanado com um diâmetro de 8.50mm e posicionado centralmente à córnea com auxílio de uma bolha de ar ao final da cirurgia.

Um mês após o procedimento, o paciente apresentava uma visão de 20/20 OD com uma refração de +3,50 -1,00 (5º), mantendo o olho contralateral sem alterações. (Figura 1).

Figura 1
OCT corneano com 1 mês após o DSAEK, espessura central de 685 micra.

O pós-operatório transcorreu sem intercorrências, e após 10 meses a visão permaneceu estável e 20/20 OD, com refração de +3,25 -1,00 (5º). Houve, entretanto, piora refracional e aumento das queixas do paciente relativas ao OE: visão corrigida de 20/80, com refração de -3,25 -1,75 (140º).

Após 1 ano e 6 meses transcorridos da realização de procedimento combinado em OD realizou-se a mesma abordagem, de facoemulsificação e DSAEK, do OE.

Após o primeiro mês de pós-operatório do OE ao exame o paciente apresentava a seguinte refração e visão corrigida: +0,75 -1,00 (150º), 20/20.

Após seguimento de 3 anos do OD e 2 anos do OE, o paciente permaneceu com acuidade visual e refração estável, queixando, no entanto, de anisometropia e dificuldade de utilizar óculos, sendo proposto o tratamento do OD com LASIK.

Foi realizado um H-LASIK e programado a correção de +3,25 -1,00 (5º), utilizando a plataforma Swind Amaris®. A topografia pré-operatória (Figura 2) e pós operatória (Figura 3) assim como o resultado final ilustrado pelo OCT após o tratamento a laser (Figura 4) evidenciam a boa evolução do caso.

Figura 2
Topografia corneana pré-ablação com excimer
Figura 3
Topografia corneana com 1 mês após-ablação com excimer
Figura 4
OCT corneano 1 mês após ablação com excimer, espessura central de 676 micra.

Com um mês de pós-operatório, o paciente apresentavase com visão de 20/20 em ambos olhos e uma refração de: +0,50 -1,00 (5) OD e +0,25 -1,25 (140º) OE.

DISCUSSÃO

Ao longo dos anos, o transplante endotelial vem ganhando bastante espaço no tratamento das patologias endoteliais principalmente quando comparado aos transplantes penetrantes, sendo o DSAEK uma das técnicas de escolha. O tratamento combinado de facoemulsificação e DSAEK permite reabilitação visual mais rápida e com melhores resultados que o transplante penetrante combinado a facoemulsificação; contudo, o paciente ainda pode manifestar hipermetropia residual, como no caso em questão.(22 Gorovoy MS. Descemet-stripping automated endothelial keratoplasty. Cornea. 2006;25(8):886-9.,33 Fung SS, Iovieno A, Shanmuganathan V, Maurino V. Femtosecond laser refractive surgery after descemet stripping - automated endothelial keratoplasty. Case Rep Ophthalmol Med. 2012; 2012:190953.)

Outra possibilidade de correção de ametropia residual poderia ser através da utilização de lentes de contato, embora, a tolerância diminua com a idade. Outras opções terapêuticas seriam a troca da lente intraocular, ou mesmo, o implante de outra lente, em piggy-back. No entanto, qualquer novo procedimento intraocular pode favorecer a perda endotelial, ou mesmo, precipitar uma rejeição, o que diminui sua utilização na prática clínica.(33 Fung SS, Iovieno A, Shanmuganathan V, Maurino V. Femtosecond laser refractive surgery after descemet stripping - automated endothelial keratoplasty. Case Rep Ophthalmol Med. 2012; 2012:190953.,44 Ratanasit A, Gorovoy MS. Laser-Assisted In Situ Keratomileusis or Photorefractive Keratectomy After Descemet Stripping Automated Endothelial Keratoplasty. Cornea. 2011;30(7):787-9.)

A correção das ametropias pós-transplantes penetrantes através do laser, seja utilizando o LASIK, ou mesmo, o PRK (Photorefractive Keratectomy), mostram-se opções eficazes, principalmente as que apresentam maiores componentes esféricos.

Importante salientar que não foi observada perda de células endoteliais no tratamento dos pacientes pós-transplante penetrante que realizaram LASIK, o que sugere sua segurança para utilização em pacientes pós-transplantes endoteliais.(66 Barequet IS, Hirsh A, Levinger S. Femtosecond thin-flap LASIK for the correction of ametropia after penetrating keratoplasty. J Refract Surg. 2010;26(3):191-6.)

Recentemente, uma série de casos relatados por Ratanasit e Gorovoy foi publicada utilizando-se do LASIK e do PRK após o DSAEK para o tratamento das ametropias em 5 pacientes; os autores obtiveram bons resultados refracionais após o tratamento, não sendo descrito nenhum caso de rejeição, ou mesmo, de necessidade de retratamento acompanhamento pós-operatório de 30 meses.(44 Ratanasit A, Gorovoy MS. Laser-Assisted In Situ Keratomileusis or Photorefractive Keratectomy After Descemet Stripping Automated Endothelial Keratoplasty. Cornea. 2011;30(7):787-9.)

Nosso paciente também não apresentou falência do transplante, rejeição, ou mesmo, instabilidade refracional após o procedimento em um seguimento de 6 meses após o LASIK. No presente relato, o LASIK se mostrou eficaz na redução da ametropia do paciente, reduzindo as queixas de anisometropia e desconforto com uso da correção óptica.

Outros relatos corroboram que o tratamento das ametropias residuais pós DSAEK com o LASIK são seguros, contudo, estudos com maiores períodos de seguimento devem ser realizados para se avaliar a estabilidade refracional e a eficácia a longo prazo. Importante salientar que na eventualidade de troca da lamela posterior, o erro refracional não é previsível, e que um retratamento refrativo pode ser necessário e, possivelmente, mais complexo que o primeiro.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Price MO, Price FW Jr. Descemet's stripping with endothelial keratoplasty: comparative outcomes with microkeratome - dissected and manually dissected donor tissue. Ophthalmology. 2006;13(11):1936-42.
  • 2
    Gorovoy MS. Descemet-stripping automated endothelial keratoplasty. Cornea. 2006;25(8):886-9.
  • 3
    Fung SS, Iovieno A, Shanmuganathan V, Maurino V. Femtosecond laser refractive surgery after descemet stripping - automated endothelial keratoplasty. Case Rep Ophthalmol Med. 2012; 2012:190953.
  • 4
    Ratanasit A, Gorovoy MS. Laser-Assisted In Situ Keratomileusis or Photorefractive Keratectomy After Descemet Stripping Automated Endothelial Keratoplasty. Cornea. 2011;30(7):787-9.
  • 5
    Chen ES, Terry MA, Shamie N, Hoar KL, Friend DJ. Stability of hyperopic refractive shift following Descemet-stripping automated endothelial keratoplasty. J Cataract Refract Surg. 2009;35(8):1473.
  • 6
    Barequet IS, Hirsh A, Levinger S. Femtosecond thin-flap LASIK for the correction of ametropia after penetrating keratoplasty. J Refract Surg. 2010;26(3):191-6.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    09 Fev 2015
  • Aceito
    22 Set 2015
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