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Ceratoplastia penetrante e glaucoma

Penetrating keratoplasty and glaucoma

Resumos

O objetivo deste artigo é discutir os conhecimentos atuais sobre a abordagem clínica e terapêutica da ceratoplastia penetrante e do glaucoma a ela associado.

Córnea; Ceratoplastia penetrante; Glaucoma


The aim of this article is to make a review about glaucoma associated with penetrating keratoplasty, describing since its incidence and risk factors until the different options for treatment.

Cornea; Keratoplasty, penetrating; Glaucoma


ARTIGO DE REVISÃO

Ceratoplastia penetrante e glaucoma

Penetrating keratoplasty and glaucoma

Márcio Eulálio Barreto SoaresI; Sebastião CronembergerII

IOftalmologista do Hospital de Olhos Francisco Vilar - Teresina (PI), Brasil

IIProfessor titular de Oftalmologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG — Belo Horizonte (MG), Brasil

RESUMO

O objetivo deste artigo é discutir os conhecimentos atuais sobre a abordagem clínica e terapêutica da ceratoplastia penetrante e do glaucoma a ela associado.

Descritores: Córnea; Ceratoplastia penetrante; Glaucoma

ABSTRACT

The aim of this article is to make a review about glaucoma associated with penetrating keratoplasty, describing since its incidence and risk factors until the different options for treatment.

Keywords: Cornea; Keratoplasty, penetrating; Glaucoma

INTRODUÇÃO

A ceratoplastia penetrante (CPP) é uma cirurgia realizada com freqüência nos dias atuais, com bons resultados, apesar de poder se associar a complicações sérias, como o glaucoma, capazes de comprometerem o resultado final(1). O glaucoma é a principal causa de cegueira após CPP, pois leva à falência do enxerto e a lesões irreversíveis do disco óptico causadas pela pressão intra-ocular (Po) muito elevada(2). Devido a sua freqüência, gravidade e dificuldade diagnóstica e de tratamento, o glaucoma pós-CPP é uma complicação séria e a segunda causa mais freqüente de insucesso do transplante penetrante de córnea, superada pela rejeição. Na rejeição, existe, na maioria dos casos, a possibilidade de nova CPP para substituir a córnea opaca, enquanto que o glaucoma, caso não seja tratado a tempo, causa déficit visual permanente(3). Metade dos pacientes com glaucoma após CPP permanece com enxertos transparentes, porém, só 18,9% deles têm visão igual ou melhor a 20/60(4). Mesmo no ceratocone em que a CPP é uma forma efetiva de tratamento, o glaucoma é causa de limitação visual no pós-operatório(5).

Atualmente, mais de 40.000 transplantes de córnea são realizados anualmente nos Estados Unidos, havendo o reconhecimento de que o glaucoma é uma complicação importante em olhos afácicos e pseudofácicos. Como a ceratopatia bolhosa pseudofácica é atualmente uma freqüente indicação cirúrgica, o glaucoma pós-CPP é um problema crescente(6).

O tratamento do glaucoma pós-CPP é um desafio devido à dificuldade diagnóstica, comprometimento do enxerto pela Po elevada e agressão ao enxerto pelas próprias medicações antiglaucomatosas(2,7).

Informações sobre lesão glaucomatosa do disco óptico freqüentemente não são bem documentadas em estudos de glaucoma pós-CPP. Com freqüência, a Po eleva-se no pós-operatório precoce mas pode retornar rapidamente ao normal. Elevação crônica da Po, meses após a cirurgia, apresenta risco de perda visual(6).

Neste artigo, abordar-se-ão especificamente as diferentes causas do glaucoma associado à CPP, os métodos diagnósticos e as modalidades de tratamento.

INCIDÊNCIA E FATORES DE RISCO

A incidência de glaucoma após CPP varia de 9% a 31% no pós-operatório recente e de 18% a 35% no pós-operatório tardio. Dentre os fatores de risco, destacam-se em importância a ceratopatia bolhosa afácica, CPP combinada à extração intracapsular do cristalino, glaucoma preexistente, perfuração do globo ocular e ceratoplastia prévia(8). É alta a incidência de glaucoma em olhos submetidos à CPP devido à perfuração corneana, especialmente se secundária a ceratite infecciosa. A probabilidade de desenvolvimento de glaucoma eleva-se na medida em que aumenta o tempo entre a perfuração e a cirurgia em virtude da intensidade da inflamação intra-ocular que leva a sinéquias anteriores periféricas e fechamento do seio camerular. Há também maior risco em olhos traumatizados e em idosos(9). A incidência de glaucoma pode chegar a 10,6% após CPP(4). Leucoma aderente pré-operatório freqüente-mente está associado com glaucoma. Também, o glaucoma ocorre com maior freqüência em olhos afácicos que em olhos fácicos e pseudofácicos. Vitrectomia associada e reconstrução do segmento anterior são outros fatores de risco(4). Num estudo da incidência de glaucoma em olhos submetidos a vários transplantes registrou-se o glaucoma em 34% dos mesmos(8). A incidência de glaucoma aumenta com o número de CPP, o que é explicado pelo maior dano ao seio camerular e inflamação pós-operatória com as várias cirurgias. Nos pacientes que desenvolveram glaucoma pós-operatório, cicatriz devido à ceratite herpética foi a indicação mais comum para repetidas ceratoplastias; a razão é desconhecida, mas é possível que tais casos tenham maior tendência a desenvolver reação de câmara anterior após cirurgias, predispondo ao glaucoma(8). Po alta foi evidenciada em 54,3% dos pacientes com CPP devido à ceratopatia bolhosa e em 26,6% dos casos devido à ceratocone(9). Também a idade acima de 60 anos foi outro fator de risco relatado(9). Outros autores, em estudo retrospectivo, diagnosticaram glaucoma em 52 (27,4%) olhos submetidos à CPP, em 190 analisados(10). Nesse estudo, a afacia (37%), a pseudofacia (24%), o glaucoma preexistente (81,8%) e o retransplante (43,18%) foram fatores de risco para o desenvolvimento do glaucoma(10). O glaucoma após CPP parece fortemente associado a sinéquias anteriores preexistentes e/ou simultânea remoção de lente intra-ocular de câmara anterior(11). Assim sendo, uma iridectomia per-operatória pode prevenir o glaucoma agudo de ângulo fechado após CPP(11). Estudo prospectivo, realizado em 155 pacientes submetidos à CPP, evidenciou aumento da Po no pós-operatório imediato de 18 pacientes (12%)(12). Isso ocorreu em 21% dos pacientes com glaucoma prévio, 21% dos casos de cirurgia combinada (CPP com facectomia extracapsular e implante de lente intra-ocular de câmara posterior) e em 23% daqueles em que foi realizada vitrectomia associada à CPP(12). Por outro lado, na casuística de outro trabalho foi observado que o glaucoma é mais comum após CPP, com incidência de 21,5%, sendo os principais fatores de risco a ceratopatia bolhosa afácica e pseudofácica, herpes vírus e traumatismo ocular. O conhecimento desses fatores pode limitar a ocorrência do glaucoma, aumentando as chances de sucesso(13). A incidência e a gravidade do glaucoma após CPP variam com o diagnóstico pré-operatório que levou ao transplante(14). Olhos com ceratocone, distrofia endotelial de Fuchs e distrofias corneanas estromais apresentam baixo risco. Por outro lado, em casos de ceratopatia bolhosa afácica, a incidência de glaucoma é bem mais alta; nesse estudo, dez de 33 olhos nessa categoria tiveram glaucoma. Também é freqüente a elevação intensa da Po dos olhos transplantados devido à leucoma traumático, queimaduras químicas e úlcera de Mooren(14).

A incidência de glaucoma em transplante de córnea varia também com a técnica da CPP empregada. A diferença de tamanho entre os diâmetros da trepanação na córnea doadora e na receptora parece influenciar no aparecimento do glaucoma, de forma que um disco doador 0,5 mm maior que o leito receptor diminui a chance de ocorrer o glaucoma, apesar de resultados variáveis(3).

Em suma, não há dúvidas de que a afacia e o glaucoma preexistente estão fortemente relacionados à Po elevada tanto no pós-operatório precoce como no tardio da CPP. Traumatismo ocular perfurante e ceratite herpética também apresentam grande associação(3).

ETIOPATOGENIA

A etiologia do glaucoma após CPP é multifatorial, existindo vários mecanismos(2-3). Fatores pré-operatórios, operatórios e pós-operatórios relacionam-se ao glaucoma após o transplante de córnea(6). O colapso da rede trabecular, principalmente em afácicos, a técnica cirúrgica da CPP, a inflamação pós-operatória e o fechamento do seio camerular secundário a sinéquias anteriores periféricas destacam-se entre os principais mecanismos(2-3). É freqüente a elevação da Po no pós-operatório da CPP em afácicos e em olhos submetidos à cirurgia combinada de ceratoplastia com catarata. Esse aumento tensional, precoce e transitório, não se deve a fechamento do seio camerular, mas sim, a uma diminuição da facilidade de escoamento do humor aquoso devido a uma distorção do sistema de drenagem, representado pela rede trabecular e canal de Schlemm(3). Em olhos afácicos e na cirurgia combinada, o colapso do seio camerular relaciona-se com a compressão causada pela perda de suporte posterior, representado pelo cristalino e zônula, além da perda do suporte anterior da membrana de Descemet(14). Já foi postulado que a Po elevada após CPP em afácicos resulta da distorção do seio camerular secundária ao excesso de compressão dos tecidos do seio camerular. Também a rede trabecular é comprometida por edema e reação inflamatória(15). Contribuem para a distorção do seio camerular: sutura muito apertada, pontos com pegada longa, maior diâmetro da trepanação da córnea receptora, espessura corneana periférica aumentada e diâmetro da córnea doadora igual ou menor que o diâmetro de trepanação da córnea receptora. Suturas muito apertadas e pontos mais longos geram maior efeito compressivo sobre o seio camerular e maior aplanamento corneano. Por outro lado, suturas menos apertadas, botões doadores maiores que os receptores e córneas receptoras mais finas tendem a aliviar essa distorção(15). Alternativamente, foi proposta a existência de um colapso mecânico da rede trabecular em olhos afácicos como a causa do glaucoma(16). Nessa proposta, os autores referem que o trabeculado precisa de fixação posterior fornecida pelo corpo ciliar e cristalino e um suporte anterior dado pela membrana de Descemet. Na afacia, o suporte posterior encontra-se relaxado, mas não criticamente. Após o transplante, ocorre relaxamento do suporte anterior, que conduz ao colapso parcial do trabeculado. Isso pode explicar a maior incidência de glaucoma em olhos afácicos em relação aos fácicos. Estudos de perfusão em olhos afácicos demonstraram também que suturas de espessura total, que aproximam a membrana de Descemet, não diminuem a facilidade de escoamento do humor aquoso, ao passo que suturas de espessura parcial relacionam-se a uma diminuição de 37% da facilidade de escoamento do humor aquoso(16).

As Figuras 1, 2 e 3 mostram os mecanismos de colapso da rede trabecular, compressão tecidual pela sutura corneana e aplanamento corneano, respectivamente(3).




O desenho da Figura 1 mostra o mecanismo de colapso da rede trabecular nas suturas corneanas de espessura parcial (a) e sua prevenção com as suturas que englobam a membrana de Descemet (b). Em (a), nota-se o deslizamento da membrana de Descemet e colapso da rede trabecular na sutura corneana de espessura parcial por má coaptação das bordas posteriores da ferida. Em (b), a sutura transfixante, evita esse colapso.

No desenho, (A) e (B) são pontos de entrada e saída da agulha. Com a confecção do nó e o aperto da sutura, há compressão tecidual que causa diminuição no diâmetro do enxerto corneano em torno de 0,4 mm.

Dando suporte a essa teoria, alguns autores mostraram que botões 0,5 mm maiores que o leito receptor em afácicos diminuem a incidência de glaucoma, sendo mais evidente quando um botão de 8,0 mm foi suturado a um leito de 7,5 mm(17). O mesmo ocorreu com as trepanações de maior diâmetro(18). Ao contrário, os resultados de outro trabalho não demonstraram proteção usando disparidade de 0,5 mm em nenhum grupo estudado: afácicos, pseudofácicos e fácicos(19). Os autores desse trabalho não referiram a técnica de trepanação, técnica de sutura e rigidez corneana, que podem alterar o tamanho do botão corneano(2).

O fechamento do seio camerular é fator crucial relacionado ao glaucoma pós-CPP, sendo a principal causa de elevação persistente da Po após esse procedimento. Mecanismos diversos levam ao fechamento do seio camerular: difícil restauração da câmara anterior ao final da cirurgia, vazamento de humor aquoso pela incisão, descolamento de coróide, iridociclite, bloqueio pupilar, distorção do seio camerular pela técnica empregada(3). Atalamia pós-operatória, descolamento de coróide e iridociclite levam a goniossinéquias e fechamento do seio camerular. Inflamação intra-ocular intensa, atalamia prolongada e olhos sem iridectomia podem gerar bloqueio pupilar. Goniossinéquias surgem com freqüência quando há maior reação inflamatória pós-operatória e em olhos com periferia corneana mais espessa(3). Enxertos doadores com disparidade de 1,0 mm proporcionam boa formação da câmara anterior e diminuem o risco de glaucoma em pacientes com opacidades corneanas e aderências iridocorneanas extensas(20). Muitos olhos submetidos à CPP já tiveram cirurgias prévias, podendo, assim, ter o escoamento do humor aquoso comprometido e com a CPP ocorrer dano adicional ao seio camerular, induzindo a formação de sinéquias anteriores periféricas e levando ao surgimento do glaucoma secundário(21). A CPP isolada apresenta menor risco de causar glaucoma do que quando ela é combinada a outros procedimentos, tais como vitrectomia, extração de catarata e implante de lente intra-ocular(6).

O uso de substâncias viscoelásticas durante a CPP relaciona-se a elevação da Po em curto prazo após o transplante(6). O quadro 1 mostra as causas de elevação da Po após CPP (2).


QUADRO CLÍNICO

O glaucoma pós-CPP tem quadro clínico variável em decorrência de suas várias causas e mecanismos fisiopatológicos(3). A anamnese no pós-operatório é de grande importância, devendo-se sempre questionar o paciente sobre sintomas relacionados à elevação da Po. A dor, associada ao aumento rápido e intenso da Po, é sinal de alerta. Elevação insidiosa da Po geralmente não causa dor. Baixa visual normalmente não é relatada pelos pacientes, já que, em geral, o alto astigmatismo e inflamação pós-operatórios causam baixa visual pós-operatória. Às vezes, há queixa de halos coloridos(3). Edema epitelial pode ser um sinal de elevação da Po, mas pode também relacionar-se com o baixo número de células endoteliais do enxerto. A câmara anterior pode mostrar alterações, tais como a presença de restos inflamatórios e cristalinianos, hifema ou vítreo. Vítreo na câmara anterior pode causar bloqueio pupilar ou ciliar. Pode surgir midríase paralítica em casos de glaucoma agudo de ângulo fechado; sinéquias anteriores periféricas podem ser observadas, bem como a presença de sinéquias posteriores, que podem causar bloqueio pupilar. Assim, na dependência da causa da elevação da Po, várias são as alterações observadas no glaucoma associado à CPP (3). A elevação crônica da Po, potencialmente compromete o endotélio corneano, conduzindo à falência do enxerto. Por sua vez, a falência do enxerto ocorre mais precocemente em pacientes com glaucoma (18 meses após o CPP) que naqueles com Po controlada (32 meses após o CPP)(22). O aumento da Po após CPP causa perda progressiva de células endoteliais e falência precoce do enxerto corneano(23). O aumento da Po no pós-operatório da CPP é uma causa possível de aceleração da perda de células endoteliais em olhos com glaucoma, limitando o prognóstico nesses olhos(24). Tanto o glaucoma como a hipertensão ocular preexistentes são fatores de risco para a falência do enxerto(25). Para alguns autores, a elevação temporária, leve a moderada, da Po após CPP não parece afetar o enxerto até a remoção completa da sutura, a despeito de afirmarem que estudos mais prolongados são necessários(26). Uma crise de glaucoma agudo pode levar a uma perda de células endoteliais de 10 a 33%(2). A porcentagem de falência de enxertos devido ao glaucoma após CPP pode atingir 52%(8). Num seguimento de dois anos, a viabilidade de um enxerto num olho com glaucoma pode ser 10,6% inferior quando comparado com um olho sem glaucoma(9).

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico do glaucoma pós-CPP é baseado nos valores da Po no pós-operatório recente ou tardio, na escavação do disco óptico e nas alterações progressivas do campo visual(2). Devido ao astigmatismo irregular, geralmente presente, as medidas da Po são difíceis, principalmente no início, quando a irregularidade corneana é maior(2,6). Medidas de Po realizadas com o tonômetro de aplanação de Goldmann podem não ser acuradas, e o tonômetro de Schioetz pode subestimar os valores da Po(6). A tonometria de Schioetz não é confiável em olhos com cicatrizes e edema de córnea(3). A medida da Po com o tonômetro de MacKay-Marg é mais acurada que àquela realizada com os tonômetros de Goldmann e Schioetz em olhos submetidos à CPP(6). Foi feito um estudo comparando as medidas da Po após CPP com esses três tonômetros com aquelas obtidas por canulação direta da câmara anterior(27). O tonômetro eletrônico de MacKay-Marg foi o mais preciso(27). Acredita-se que esse tonômetro esteja menos sujeito a erros por não depender de visualização da área aplanada e em virtude dessa área ser menor nos tonômetros eletrônicos(3). Casos em que a superfície do enxerto é lisa e as miras são regulares, o tonômetro de Goldmann pode ser utilizado; se há edema de córnea, cicatrizes, ou alterações na espessura da córnea a tonometria de Goldmann não é totalmente confiável. Edema epitelial ou estromal levam a medidas de Po subestimadas, enquanto que cicatrizes superestimam a Po. Córneas finas subestimam e córneas espessas superestimam a Po(2). O tonômetro de aplanação pneumático tem funcionamento semelhante ao de MacKay-Marg e fornece boas medidas(3). Esse instrumento aplana pequena área da córnea e tem a vantagem de medir a Po na presença de cicatrizes e edema de córnea, ou quando apenas pequena parte da córnea é visível, como nas tarsorrafias. Se há tarsorrafia completa, a avaliação da Po deve feita pela tonometria bidigital(2). A tonometria bidigital tem o seu valor, informando se a Po encontra-se muito baixa ou muito elevada(3). O Tono-Pen é um tonômetro eletrônico digital de aplanação(3). Sua comparação com a manometria direta da câmara anterior mostrou ótima correlação(28). O Tono-Pen é similar em princípio ao tonômetro de MacKay-Marg, que fornece medidas acuradas em córneas com edema e irregularidade(29). Foi relatado que o Tono-Pen forneceu medidas de Po similares às do tonômetro de MacKay-Marg após a ceratoplastia penetrante, epiceratoplastia e em córneas com cicatrizes tendo sido recomendada a sua utilização em córneas irregulares(30). O Tono-Pen tem várias vantagens: é pequeno, portátil e de fácil uso. Entretanto, em córneas normais, o Tono-Pen não é tão preciso quanto o tonômetro de Goldmann, principalmente em medidas acima de 30 mmHg(31). Apesar das limitações, o Tono-Pen é útil em várias situações: edema de córnea, cicatrizes e irregularidades corneanas, sendo importante após o transplante penetrante de córnea(30-31).

A biomicroscopia ultra-sônica (UBM) (Figura 4) pode ser extremamente útil na avaliação pré-operatória e no seguimento de pacientes portadores de glaucoma associado à CPP.


As alterações do disco óptico devem ser monitoradas se há elevação da Po após CPP. Quando exeqüível, isso pode ser feito por fotografias seriadas ou por exames realizados por um mesmo observador(2). Nos glaucomatosos com córneas opacas, pode-se tentar avaliar a escavação do disco óptico utilizando-se a ecografia B. Assim que a transparência dos meios esteja adequada o suficiente para permitir o exame do pólo posterior, o disco óptico deve ser avaliado. Se não há fotografias para comparação, o disco óptico contralateral pode servir de base(6).

Exames de campo visual podem ser difíceis após CPP, especialmente durante o pós-operatório imediato(2). Após o enxerto estar estabilizado, é importante a realização de campo visual nos suspeitos de glaucoma para se estabelecer um exame de base. Deve-se escolher uma estratégia de exame adequada ao nível de visão do paciente(6).

TRATAMENTO

Prevenção de complicações

É importante durante a realização da CPP evitar complicações que possam predispor ao glaucoma. Técnica cirúrgica apurada é essencial para evitar o colapso da rede trabecular, especialmente em afácicos, devendo-se evitar suturas muito apertadas, pontos muito longos ou superficiais e usar enxerto maior que a trepanação da córnea receptora(3). Botões doadores 0,5 mm maiores que o leito receptor, suturas profundas, goniossinequiálise na presença de sinéquias anteriores periféricas, remoção total do viscoelástico antes do final da cirurgia e fechamento cuidadoso da ferida cirúrgica reduzem o glaucoma secundário a CPP(2). Ao término de uma CPP, a câmara anterior deve estar sempre bem formada, para evitar sinéquias que levem ao glaucoma (Figura 4). Assim, deve-se sempre, ao final, verificar se há vazamentos pela ferida e realizar suturas adicionais quando necessário. Iridectomia periférica também é importante. Em casos com íris muito flácida, tais como iridodiálise, ruptura de esfíncter ou iridectomia setorial, surgem sinéquias com muita facilidade, devendo-se realizar uma iridoplastia per-operatória para preveni-las, como na Figura 5(3).


O uso de corticosteróide tópico controla o processo inflamatório e evita a instalação das sinéquias. Se indicados, os cicloplégicos mantêm a pupila midriática e evitam o bloqueio pupilar(2).

Tratamento clínico

O tratamento clínico é a primeira opção no glaucoma pós-CPP. Várias drogas estão disponíveis, dentre elas os betaboloqueadores, agentes adrenérgicos, agonistas alfa-2 adrenérgicos, mióticos, análogos de prostaglandinas e inibidores da anidrase carbônica, tópicos ou sistêmicos(2). No entanto, seu uso muitas vezes constitui agressão ao enxerto, causando seu comprometimento(2,5). O uso de colírios hipotensores acarreta risco para falência do enxerto por três causas: rejeição, descompensação endotelial sem reação imunológica e doença de superfície ocular(32). Os betabloqueadores são o alicerce do tratamento do glaucoma nas últimas décadas e agem diminuindo a produção do humor aquoso. A eficácia do timolol no glaucoma associado à CPP já foi demonstrada, mesmo com fechamento angular crônico. Dentre seus efeitos adversos, cita-se: ceratite puntacta superficial, anestesia corneana, danos a superfície ocular e olho seco, por enfraquecimento da camada da mucosa do filme lacrimal. Essas agressões ao epitélio corneano podem comprometer a função do enxerto corneano(2). A toxicidade ao epitélio corneano observada com o timolol deve-se ao conservante benzalcônio. Nos casos de toxicidade importante pode-se usar o levobunolol que tem menos benzalcônio na formulação ou usar timolol sem conservantes(6).

Dentre os agonistas alfa-2 adrenérgicos, o tartarato de brimonidina 0,2% é mais bem tolerado que a apraclonidina, sendo muito útil no tratamento em longo prazo do glaucoma pós-CPP. A apraclonidina 0,5% é um potente vasoconstrictor do segmento anterior, geralmente usado no pré-operatório para prevenir sangramentos na câmara anterior durante a cirurgia e para controlar picos pressóricos resultantes de tais sangramentos; por outro lado, seu uso a longo prazo é restrito devido a reações alérgicas em até 40% dos pacientes(2). Em face da compressão do seio camerular e colapso da rede trabecular contribuírem para a elevação pós-operatória precoce da Po e as sinéquias anteriores periféricas para a elevação tensional tardia, os mióticos não são úteis na maioria dos casos de glaucoma após CPP(6), além de causarem quebra da barreira sangue-humor aquoso, o que pode causar uveíte anterior e desencadear episódios de rejeição do enxerto(2,6). Em casos de rejeição, a suspensão do miótico e o uso de corticosteróides podem reverter o quadro. Os mióticos também elevam o risco de descolamento de retina em pacientes afácicos(2). Dentre os inibidores da anidrase carbônica de uso tópico, a dorzolamida 2% foi a primeira a ser usada no tratamento do glaucoma. Recentemente, a brinzolamida 1% foi introduzida no mercado, sendo aparentemente mais bem tolerada(2). Porém, há relato de casos de descompensação corneana irreversível após o uso tópico de dorzolamida em pacientes com comprometimento endotelial prévio(33). Também já foi mostrado que a dorzolamida pode causar edema corneano irreversível em pacientes com intervenções cirúrgicas prévias, com comprometimento endotelial(7). Assim, essa droga deveria ser usada com cautela se há história prévia de rejeição ou baixo número de células endoteliais. Outros efeitos colaterais da dorzolamida são reações alérgicas (5 a 10%) e presença de gosto amargo em 25% dos pacientes(2). Os inibidores sistêmicos da anidrase carbônica (acetazolamida) são muito importantes no tratamento de picos pressóricos no pós-operatório inicial, porém seu uso prolongado é limitado pelos efeitos colaterais sistêmicos: parestesias, fadiga, distúrbios gastrointestinais, perda de peso, anorexia, depressão, dentre outros(2). Esses efeitos são mais freqüentes e menos toleráveis em idosos, devendo-se ter cuidado com o uso dessas drogas nesses pacientes(6). Os análogos de prostaglandinas são bastante efetivos no controle da Po, agindo através do aumento do fluxo úveo-escleral, e podem ser associados a betabloqueadores e inibidores da anidrase carbônica. Por outro lado, há relatos de que essas drogas podem induzir a infecção herpética recorrente em pacientes com história de ceratite herpética, devendo por esse motivo ser usadas com cautela em pacientes submetidos à CPP. Edema cistóide de mácula em afácicos e pseudofácicos e uveíte anterior também podem ocorrer com os análogos das prostaglandinas(2). No glaucoma pós-CPP induzido por corticosteróide tópico, o corticosteróide mais potente (acetato de prednisolona 1%) pode ser substituído por outro com menor potencial para elevar a Po (fluorometolona, rimexolona, loteprednol) ou até por antiinflamatório não esteróide como o cetorolaco de trometamina(2,6). O uso tópico de ciclosporina A a 0,5%, diminuindo a inflamação ocular, também pode ajudar a controlar a Po(34). A ciclosporina A a 0,5% tópica pode substituir o corticosteróide tópico para auxiliar no tratamento do glaucoma pós-CPP. No entanto, a redução da Po pode estar associada a maior risco de rejeição(35). A penetração corneana da ciclosporina A de uso tópico é excelente, enquanto que a penetração da droga na câmara anterior é baixa(34-35). O cloreto de benzalcônio é o conservante usado na maioria dos antiglaucomatosos, mas possui vários efeitos tóxicos ao epitélio corneano, podendo levar a aumento na sua permeabilidade. Olhos em uso de colírios hipotensores devem ser examinados para a presença de ceratite puntacta superficial. A Figura 6 mostra uma ceratite puntacta difusa em um paciente usando vários colírios antiglaucomatosos e o quadro 2 resume os problemas associados ao uso dos hipotensores oculares após CPP(2).



Tratamento cirúrgico

Dentre as opções para o tratamento cirúrgico do glaucoma associado à CPP, pode-se incluir: trabeculoplastia a laser, trabeculectomia, implantes artificiais de drenagem e procedimentos ciclodestrutivos(36).

Trabeculoplastia a laser (ltp)

A trabeculoplastia a laser pode ser feita com os lasers de argônio e de diodo. Estudos mostram a efetividade desse tratamento no glaucoma pós-CPP quando o seio camerular está aberto. Deve-se ter cautela nos casos com vítreo na câmara anterior ou inflamação ativa, pois pode haver agravamento do glaucoma(6). A LTP deve ser indicada em pacientes com ângulos abertos, enxertos transparentes e elevação moderada (25 a 30 mmHg) da Po com o uso de drogas antiglaucomatosas. Em casos com Po acima de 30 mmHg, com medicação máxima tolerável, deve-se realizar outro procedimento, já que a LTP não consegue diminuir a Po mais que 10 mmHg(2).

Trabeculectomia (Trec)

Trec Convencional

A TREC simples ou convencional é a técnica mais empregada no tratamento cirúrgico dos glaucomas. Porém, no glaucoma pós-CPP essa cirurgia tem baixo índice de sucesso, cerca de 70% de controle após 9 meses e 50% após 2 anos de acompanhamento(36). Assim, é muito provável a falência da TREC simples (sem antimetabólitos) no glaucoma pós-CPP(6). Contribuem para o alto índice de falência: cicatrizes conjuntivais devido a cirurgias prévias, sinéquias anteriores extensas, afacia e câmara anterior muito rasa(2). Portanto, no glaucoma após CPP, a TREC simples não é a cirurgia de escolha, a menos que haja contra-indicação maior ao uso de antimetabólitos(37).

Trec com Antimetabólitos

( 5-Fluorouracil – 5-Fu e Mitomicina C - Mmc)

Os agentes antiproliferativos tais como o 5-FU e a MMC são usados para inibir a fibrose tecidual episcleral e conjuntival na TREC. A MMC é mais efetiva em controlar a Po em relação ao 5-FU, e há mais complicações, incluindo defeitos no epitélio corneano, quando se utiliza o 5-FU(38). A utilização da MMC ou do 5-FU aumentou o sucesso da TREC, especialmente em glaucomas refratários, como após CPP. Esses agentes inibem a proliferação de fibroblastos e aumentam a formação da bolha fistulante(2). Deve-se utilizar a MMC ou o 5-FU no intra-operatório, em virtude da toxicidade ao epitélio corneano que pode ocorrer com injeções pós-operatórias de 5-FU(6). Estudos mostram que a falência do enxerto é menor após a TREC com MMC, quando comparada com cirurgias de implantes artificiais de drenagem e procedimentos ciclodestrutivos. Quando bem sucedida, a TREC com MMC está associada a menos complicações em relação a outras cirurgias usadas nos glaucomas de difícil controle(2). Olhos com glaucoma pós-CPP com conjuntiva bulbar preservada e sem sinéquias, principalmente nos quadrantes superiores, têm bons resultados com a TREC com MMC. Isoladamente, a cirurgia parece ter maior sucesso do que quando associada a outros procedimentos cirúrgicos(2). Há relato de controle adequado em 77% dos olhos com glaucoma após CPP submetidos à TREC com MMC com taxa de falência de enxerto de 15% em um seguimento de 23 meses(39).

Cpp combinada com Trec com Mmc

A abordagem do glaucoma de difícil controle coexistente com doenças da córnea é um desafio. A CPP associada à TREC com MMC pode ser considerada quando há conjuntiva suficiente para um procedimento fistulante(38). A CPP simultânea à TREC com MMC está associada à boa taxa de sobrevivência do enxerto, mas também com risco de falência precoce do controle da Po(40). Nesses casos, a sobrevivência do enxerto foi de 85% em um ano e de 60% em dois anos; o controle da Po foi de 55% com um ano e de 50% com dois anos; a maior falência da bolsa ocorreu com a realização concomitante de outros procedimentos, tais como vitrectomia anterior e implante ou explante de lente intra-ocular(39). Assim, a TREC com MMC é uma opção para pacientes com glaucoma não controlado na época da realização da CPP. Embora um único procedimento seja menos agressivo para a córnea doadora, há evidências de uma menor chance de controle da Po a longo prazo(37).

Implantes artificiais de drenagem

Os implantes artificiais de drenagem são artifícios plásticos que criam uma comunicação entre a câmara anterior e o espaço subtenoniano(41), gerando uma via alternativa para canalização do humor aquoso da câmara anterior para um explante episcleral posterior que promove a formação da bolha fistulante. Há muitos relatos do uso desses dispositivos no glaucoma pós-CPP, resistente ao tratamento convencional. Tal tratamento controla o glaucoma em muitos casos (média de 84,8%), porém, associa-se a alta taxa de falência do enxerto (média de 36,2%)(2). Há vários tipos de implantes (Ahmed, Krupin, Molteno, Baerveldt, Schocket). A escolha do implante varia com o caso e o cirurgião(2). Na Figura 7, observa-se um caso em que foi usado o implante de Schocket após CPP(3).


Os implantes de drenagem se tornaram importante alternativa de tratamento cirúrgico nos casos difíceis, como no glaucoma pós-CPP. Apesar do controle pressórico, a presença do implante associa-se a pior prognóstico para a sobrevivência do enxerto. O mecanismo de falência do enxerto não está totalmente esclarecido. Trauma mecânico durante a colocação do implante ou no pós-operatório devido a pequenos movimentos dos olhos ou durante o piscar pode causar dano endotelial, além do simples mau posicionamento do mesmo, com toque endotelial. Aventou-se também a possibilidade de alterações imunes, após a comunicação da câmara anterior com o espaço subconjuntival, levando à rejeição(42). Há a hipótese de que os tubos na câmara anterior permitem ao humor aquoso entrar em contato com linfócitos circulantes e a passagem retrógrada de células inflamatórias para a câmara anterior. Haveria assim risco aumentado de rejeição(43). A inflamação pós-operatória e a presença de um corpo estranho intra-ocular são também associados à falência da CPP. Coçar os olhos leva a movimentação do tubo na câmara anterior com toque tubo-endotélio corneano e perda de células. Se há toque na córnea, o reposicionamento deve ser feito, pelo risco de falência(44). A época da cirurgia também parece influenciar a falência do enxerto. Estudos mostram que a cirurgia realizada após o transplante tende a apresentar uma maior incidência de falência(2). A sobrevivência do enxerto corneano após um ano de seguimento é maior nos olhos em que o implante é colocado na cavidade vítrea em relação aos casos em que o mesmo é colocado na câmara anterior(44). Os autores não observaram diferenças em relação ao controle da Po, que foi eficaz nos dois grupos, nem com relação à magnitude de redução tensional. Para o implante ser colocado na cavidade vítrea, via pars plana, completa vitrectomia é necessária para evitar obstrução do tubo por vítreo. Complicações incluem descolamento hemorrágico de coróide, colocação do tubo no espaço supracoroidal ou sub-retiniano e hipotonia pós-operatória imediata(44). A colocação do implante no sulco ciliar é uma outra alternativa em pacientes afácicos e pseudofácicos submetidos à CPP com glaucoma refratário e com alto risco de descompensação corneana(45). O implante valvular no glaucoma pós-CPP pode controlar a Po em 82% dos olhos em três anos de seguimento. Porém, a viabilidade do enxerto em três anos é baixa (55%) e as complicações são comuns(46). O implante valvular via pars plana é uma boa medida para pacientes já submetidos ou candidatos a CPP(47), mas acreditam que o potencial de aumento da sobrevida do enxerto corneano com o implante via pars plana em relação ao implante no segmento anterior requer mais investigações. Complicações no segmento posterior observada pelos mesmos foi maior com o implante via pars plana(47). Um estudo mostrou uma alta percentagem (86% em três anos) de eficiência da válvula de Ahmed no controle do glaucoma pós-CPP(48). No entanto, a transparência do enxerto foi mantida em apenas 50% dos olhos após três anos, tendo a maioria das falências resultado de rejeição ou toque do tubo no endotélio(48). Em outro estudo, o mesmo autor observou que a cirurgia de implante de Ahmed simultânea com CPP, em casos de glaucoma congênito refratário associado a opacidades corneanas, apresenta pouco sucesso a longo prazo havendo muitas complicações(49). O implante de Ahmed em olhos transplantados ou simultaneamente à CPP apresenta sucesso no controle da Po, mantendo a viabilidade do enxerto, em 75,4% dos olhos com um ano de seguimento e em 51,5% dos olhos em 20 meses(49). O maior risco de falência ocorre nos casos de CPP devido à ceratite infecciosa e ceratouveíte, sendo 5,8 vezes maior que o risco de falência nos transplantes por outras razões(49). Após transplante e colocação de implante de drenagem a porcentagem de enxertos transparentes era de 25,8% após dois anos, apesar do controle pressórico em 63,1% dos olhos(41). Além da rejeição e da falência do enxerto, são complicações dessa cirurgia em olhos transplantados: erosão conjuntival, toque tubo-endotelial, obstrução do tubo, falência do tubo, descolamento de retina, extrusão da placa e infecção(2).

Procedimentos ciclodestrutivos

Os procedimentos ciclodestrutivos objetivam controlar a Po pela diminuição da produção do humor aquoso, devido à destruição de parte do corpo ciliar. A ciclocrioterapia foi inicialmente usada com essa finalidade desde a sua descrição em 1950; mais recentemente, introduziu-se a ciclofotocoagulação (CFC) com Nd:YAG laser e com laser de diodo. A CFC com esses lasers pode ser de contato ou não contato(2). A ciclocrioterapia foi, no passado, um procedimento de escolha no tratamento do glaucoma pós-CPP não controlado por outros métodos, especialmente quando a CFC não era disponível. Devido às suas complicações, tais como "phthisis bulbi", hemorragia vítrea, falência do transplante, perda de visão, desconforto e edema macular, prefere-se atualmente a CFC, pois essas complicações são menores com esse tratamento(6). Outras complicações associadas com ambos os procedimentos incluem: uveíte anterior, hifema, hipópio, dor intratável, hipotonia, oftalmia simpática e afinamento escleral(2). A Figura 8 mostra a aplicação da ciclocrioterapia em um olho com glaucoma e a Figura 9 mostra o aspecto da conjuntiva após cicloablação transescleral com Nd: YAG laser(31).



Em relação ao controle da Po e sobrevida do enxerto, a comparação entre a TREC com MMC, a colocação de implantes artificiais de drenagem e a CFC com Nd:YAG laser no tratamento do glaucoma pós-CPP(50) não apresenta diferenças entre os procedimentos; porém, há maior incidência de falência corneana, hipotonia e perda visual maior que uma linha com CFC, embora sem significância estatística(39).

A falência do enxerto é um problema importante após a CFC, tendo sido encontrada em 11 a 44% dos pacientes. O decréscimo na visão resulta de falência do enxerto, neuropatia óptica glaucomatosa, catarata, edema macular cistóide e síndrome de efusão uveal recorrente. Estudos mostram que 22% a 56% dos pacientes perdem duas ou mais linhas de visão após CFC(50). Alguns autores observaram redução média de 16 mmHg na Po dos pacientes com glaucoma pós-CPP após CFC com laser de diodo. Nos pacientes com enxertos transparentes antes do procedimento, 16% desenvolveram opacificação(50).

Goniossinequiálise

Sinéquias anteriores após CPP são comuns (Figura 4), com fechamento do seio camerular e bloqueio à drenagem do humor aquoso. Nesses casos, pode-se tentar a goniossinequiálise, técnica cirúrgica com a qual são desfeitas as sinéquias, utilizando-se uma espátula de ciclodiálise(51).

A Figura 10 esquematiza a técnica da goniossinequiálise(3) e a Figura 4 mostra as imagens de UBM pré e pós-operatória num dos quadrantes de um olho pseudofácico com glaucoma pós-CPP submetido a esse procedimento. As sinéquias foram desfeitas (goniossinequiálise) nos quatro quadrantes e a Po que era de 40 mmHg no pré-operatório sob medicação antiglaucomatosa máxima, incluindo 250 mg de acetalozamida oral três vezes ao dia, baixou para 14 mmHg no pós-operatório apenas sob medicação tópica antiglaucomatosa num seguimento de um ano.


CONCLUSÕES

O glaucoma pós-CPP é uma das mais importantes causas de falência do enxerto corneano e de perda visual definitiva pelas lesões irreversíveis acarretadas ao disco óptico. Impõe-se cuidadoso pós-operatório com monitoração da Po para o diagnóstico precoce e o pronto tratamento dessa condição. O tratamento clínico deve ser tentado inicialmente. Entretanto, muitas vezes, o glaucoma é refratário, devendo-se lançar mão de procedimentos cirúrgicos para o seu controle. A TREC com MMC é a cirurgia mais segura em termos de controle da Po e da sobrevivência do enxerto. Os implantes artificiais de drenagem associam-se a altos índices de falência do enxerto, mas são uma opção para pacientes com importante cicatrização conjuntival, câmara anterior rasa, sinéquias anteriores periféricas extensas e trabeculectomia falida. Os procedimentos ciclodestrutivos devem ser reservados para os casos em que os outros procedimentos falharam.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Mar 2008
  • Data do Fascículo
    Ago 2007
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