Indicadores de efetividade da assistência de enfermagem na dimensão segurança do paciente

RESUMO

Objetivos:

validar indicadores de efetividade da assistência de enfermagem hospitalar na dimensão segurança do paciente.

Métodos:

estudo quantitativo, tipo survey, mediante a técnica Delphi eletrônica, com 52 participantes selecionados pela técnica Bola de Neve. Oito indicadores foram avaliados quanto aos atributos disponibilidade, confiabilidade, simplicidade, representatividade, sensibilidade, abrangência, objetividade, custo, utilidade, estabilidade e tempestividade. Para validação o critério mínimo de concordância foi de 70%.

Resultados:

o alfa de Cronbach (0,942) evidenciou a alta consistência interna entre os atributos. Os indicadores queda com dano, fratura de quadril, e fratura de quadril pós-operatória, incidentes relacionados a equipamentos, incidentes devido a falhas na identificação do paciente, e lesão por pressão foram validados em todos os atributos, e os de erro de medicação e higiene de mãos não foram validados.

Conclusões:

os indicadores validados permitem avaliação da efetividade assistencial da enfermagem hospitalar. A indisponibilidade de dados é um óbice ao monitoramento da segurança do paciente.

Descritores:
Indicadores de Qualidade em Assistência à Saúde; Efetividade; Cuidado de Enfermagem; Segurança do Paciente; Gestão da Qualidade em Saúde

ABSTRACT

Objectives:

to validate nursing care effectiveness indicators of patient safety dimension.

Methods:

quantitative survey, using the electronic Delphi sampli, with 52 participants selected by the Snowball sampling. Eight indicators were evaluated regarding the attributes: availability, reliability, simplicity, representativeness, sensitivity, comprehensiveness, objectivity, cost, utility, stability and timeliness. For validation, the minimum agreement criterion was 70%.

Results:

Cronbach’s alpha (0.942) evidenced the high internal consistency among the attributes. The indicators fall with damage, hip fracture, and postoperative hip fracture, incidents related to equipment, incidents due to failures in patient identification, and pressure injury were validated in all attributes, and those of medication error and hand Hygiene were not validated.

Conclusions:

the validated indicators allow assessment of the effectiveness of hospital nursing care. Unavailability of data is an obstacle to monitoring patient safety.

Descriptors:
Quality Indicators, Health Care; Effectiveness; Nursing Care; Patient Safety; Quality Management

RESUMEN

Objetivos:

validar los indicadores de efectividad de la asistencia de enfermería hospitalaria en la dimensión seguridad del paciente.

Métodos:

estudio quantitativo, tipo survey, mediante la técnica Delphi electrónica, en el cual participaron 52 individuos seleccionados por la técnica Bola de Nieve. Se evaluaron ocho indicadores en los atributos disponibilidad, confiabilidad, sencillez, representatividad, sensibilidad, alcance, objetividad, costo, utilidad, estabilidad y tempestividad. El criterio mínimo de concordancia para validación fue del 70%.

Resultados:

el Alfa de Cronbach (0,942) evidenció la alta consistencia interna entre los atributos. Los indicadores caída con daño, fractura de cadera y fractura de cadera postoperatoria, incidentes relacionados con herramientas, incidentes debido a fallas en la identificación del paciente, y lesión por presión fueron validados en todos los atributos, y los de error de medicación y la higiene de las manos no han sido validados.

Conclusiones:

los indicadores validados permiten evaluar la efectividad asistencial de la enfermería. La indisponibilidad de datos es un obstáculo al monitoreo de la seguridad del paciente.

Descriptores:
Indicadores de Calidad de la Atención de Salud; Efectividad; Atención de Enfermería; Seguridad del Paciente; Gestión de la Calidad

INTRODUÇÃO

A segurança do paciente integra a agenda prioritária global de saúde desde 2000, quando relatório americano revelou a magnitude de erros na assistência hospitalar⁽¹⁾. Esta é uma relevante dimensão da qualidade e, mediante indicadores, mede riscos da assistência ao paciente⁽²⁾.

Indicadores são representações quantificáveis da estrutura, dos processos e dos resultados, e proporcionam informações expressas por eventos, taxas ou índices^(3-5). Embora relevantes, são subutilizados. Não se percebe a mensuração sistemática da efetividade de programas intra-hospitalares⁽⁴⁾, sendo mais frequentes mensurações relativas à estrutura ou a processos.

Indicadores de resultados ou de efetividade referem-se às mudanças desejáveis ou indesejáveis atribuídas a cuidados de saúde prestados⁽⁶⁾. Apesar de os indicadores de resultados serem influenciados por muitos fatores, são elementos concretos de medida do impacto de cuidados com a saúde e imprescindíveis⁽⁷⁾. A efetividade é o grau em que melhorias atingíveis em saúde são alcançadas⁽⁸⁾. Assim, espera-se que a assistência seja efetiva e segura, proporcione bons resultados e boa qualidade de vida ao indivíduo e à comunidade, e seja baseada nas melhores evidências.

Destaca-se a enfermagem como a maior força de trabalho na área da saúde brasileira, respondendo pela maioria dos cuidados hospitalares, com envolvimento direto na concepção, operacionalização e avaliação de estratégias para melhorar a segurança do paciente⁽⁹⁾. Logo, indicadores para mensuração de efetividade da assistência de enfermagem devem se correlacionar às principais dimensões da qualidade, como a segurança e o cuidado centrado no paciente; e as organizações devem prover mecanismos para facilitar aos profissionais de saúde diretamente envolvidos no cuidado e aos gestores a compreensão dos conceitos relativos a esses indicadores e a sua utilização na rotina hospitalar.

Na perspectiva de contribuir para a qualidade e segurança dos cuidados em saúde, foi criado o Sistema de Notificações à Vigilância Sanitária (Notivisa), segundo o qual, no período de 2014 a 2016, houve 63.933 incidentes relacionados à assistência, sendo 417 (0,6%) com desfecho de óbito⁽¹⁰⁾. Todos os serviços públicos e privados, por meio do seu Núcleo de Segurança do Paciente, são responsáveis pelas notificações de incidentes no Notivisa. Salienta-se a adesão da enfermagem à notificação interna destes, embora a cultura de segurança em hospitais ainda requeira amadurecimento para que profissionais se sintam seguros ao informar ocorrências⁽⁹⁾.

Encontram-se na literatura^(1,11-25) indicadores de efetividade da assistência de enfermagem que carecem de validação por especialistas com expertise no estudo e/ou uso de indicadores na prática em saúde. Este estudo focaliza os seguintes indicadores: queda com dano^{(1,11-12,14-15,21,23-24)}, fratura de quadril^(15,22) e fratura de quadril pós-operatória⁽¹⁵⁾, incidentes relacionados a equipamentos⁽¹⁵⁾, incidentes devido a falhas na identificação do paciente⁽²¹⁾, lesão por pressão^(11-15), erro de medicação^{(1,13-14,18-20,26)} e higiene de mãos^(16-17).

A validação de conteúdo de indicadores de efetividade da assistência de enfermagem na dimensão segurança do paciente demonstra em que medida tais indicadores expressam os resultados planejados para um determinado cuidado de enfermagem. Assim, essa validação pode contribuir para evidenciar indicadores sensíveis ao cuidado de enfermagem, qualificar o planejamento da assistência, e explicitar a contribuição da equipe de enfermagem para os resultados do cuidado hospitalar aos pacientes⁽¹³⁾.

Como critérios para avaliar se os indicadores medem a efetividade do cuidado de enfermagem podem-se utilizar atributos reconhecidos na literatura como desejáveis a um bom indicador, como: disponibilidade, confiabilidade, simplicidade, representatividade, sensibilidade, abrangência, objetividade, baixo custo, utilidade, estabilidade e tempestividade^{(11-12,27-28)}.

OBJETIVOS

Validar indicadores de efetividade da assistência de enfermagem na dimensão segurança do paciente, considerando sua correspondência aos atributos disponibilidade, confiabilidade, simplicidade, representatividade, sensibilidade, abrangência, objetividade, baixo custo, utilidade, estabilidade e tempestividade.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O estudo incorporou no seu desenho os referenciais básicos da Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 466/2012, sendo respeitados os direitos dos participantes, que concordaram com o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE). Suas identidades permanecem anônimas, e sua identificação se deu por código alfanumérico, não acarretando malefícios ou prejuízos monetários e morais. Houve aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Setor de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Paraná, sob número CAAE 59558216.7.0000.0102.

Desenho, local de estudo e período

Trata-se de estudo descritivo exploratório, do tipo survey, de abordagem quantitativa. Utilizou-se a técnica Delphi eletrônica, um método para coleta sistemática e agregação de julgamentos informados por experts ou especialistas⁽²⁹⁾, que almejou o consenso mínimo de 70% nas respostas, obtidas em duas rodadas. A coleta de dados foi realizada no período de 10 de maio a 19 de setembro de 2017, no Brasil.

População ou amostra

A seleção da amostra foi intencional. Foram convidados a participar da pesquisa todos aqueles que preenchessem os critérios de inclusão: ser brasileiro e ter experiência profissional ou produção científica relacionada a indicadores de saúde em hospitais. O critério de exclusão foi a não completude de 90% das respostas.

Protocolo do estudo

Para recrutamento de participantes utilizou-se da técnica Bola de Neve⁽³⁰⁾. A partir de uma listagem de 20 autores de artigos relacionados a indicadores em saúde e de 20 indivíduos com experiência no uso de indicadores na sua prática profissional, identificaram-se aqueles que correspondiam a um ou mais critérios de inclusão, o que foi confirmado mediante a análise de seus currículos Lattes. O contato preliminar ocorreu via mensagens eletrônicas. A cada contato, um possível participante indicava outros, e assim sucessivamente. Obtiveram-se 176 possíveis participantes.

A cada um deles foi encaminhado um convite para participação. Aos que o aceitaram, enviou-se um link de acesso à plataforma eletrônica Survey Monkey e ao questionário, após anuência ao TCLE eletrônico. Participaram na primeira rodada 52 especialistas, e 43 na segunda, todos identificados pela letra P, seguida de um número cardinal, na ordem de envio do instrumento preenchido ao pesquisador.

Autores^(27-28) recomendam que para averiguar a validade de conteúdo seja utilizado um painel de especialistas que avaliem o quanto o indicador satisfaz determinados requisitos. Dessa forma, com uma abordagem alicerçada na objetividade e neutralidade científica, pode-se avaliar se o indicador ou um grupo de indicadores representam a situação ou o fenômeno estudado.

Solicitou-se aos participantes que avaliassem os indicadores de efetividade levantados na literatura^(1,11-25), tendo por base a ficha técnica do indicador elaborada por Seiffert⁽³¹⁾ para este estudo. Cada ficha técnica de indicador continha sua denominação, definições, objetivo/uso, método de cálculo, tipo/unidade de medida, método de apuração, incluindo coleta e origem dos dados, frequência com que seria medido e referências. Os padrões para validação de conteúdo dos indicadores foram especificados nos atributos apresentados no Quadro 1, os quais foram respaldados pela literatura^{(27-28,32-33)}.

Quadro 1
Atributos desejáveis utilizados como padrão para validação de conteúdo dos indicadores de efetividade da assistência de enfermagem

Atributo	Especificação
Disponibilidade	Fácil obtenção de dados para sua estruturação.
Confiabilidade	Fontes originais e métodos de coleta de dados e de processamento confiáveis.
Simplicidade	Facilidade no cálculo a partir de informações básicas, bem como no entendimento ou na interpretação.
Representatividade	Representa fielmente o que propõe medir.
Sensibilidade	Distingue variações ocasionais de tendência da situação, numa determinada área, com reflexos em seu resultado.
Abrangência	Sintetiza o maior número possível de condições ou fatores que afetam a situação a ser medida.
Objetividade	Clareza no objetivo de medição.
Baixo custo	Relação favorável entre custos de obtenção dos dados e benefícios decorrentes de seu uso.
Utilidade	Proporciona tomada de decisão.
Estabilidade	A série de medições permite monitoramentos e comparações coerentes.
Tempestividade	Estruturado com informações atuais e oportunas ao uso.

^{(27)(28)(32)(33)}

O survey constituiu-se de 96 questões com opções de resposta em escala Likert de cinco níveis: discordo totalmente; discordo parcialmente; não discordo nem concordo; concordo parcialmente; concordo totalmente. Estipulou-se o mínimo de 70% de concordância entre as respostas em relação a todos os atributos (Quadro1) para validação de cada indicador, por rodada, calculada pela soma dos percentuais das respostas “concordo totalmente” e “concordo parcialmente”.

Análise dos resultados e estatística

A análise dos dados foi realizada por meio de estatística descritiva uni e bivariada. O Survey Monkey forneceu percentuais de concordância entre respostas da primeira rodada, e todas as respostas foram insertas no Programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 22, para aferir a validação após as duas rodadas. Utilizou-se o teste do coeficiente alfa de Cronbach para análise da consistência interna e das diferenças de opinião dos painelistas também nas duas rodadas, além da correlação de Spearman para análise da correlação entre os atributos.

Entre os especialistas, 65,38% eram enfermeiros; 15,38% médicos; 9,62% farmacêuticos; 5,77% administradores; e 3,85% eram outros profissionais. Em relação à titulação, 36,64% eram graduados; 36,64% mestres; 26,92% doutores; e 5,77% realizaram pós-doutorado.

O alfa de Cronbach foi de 0,942, demonstrando que, no conjunto, as respostas aos atributos para cada indicador guardam alta consistência interna. A correlação de Spearman, utilizada para obtenção da avaliação da intensidade da relação entre os atributos de cada indicador, apontou correlação positiva de todos os atributos entre si. Esse resultado permite inferir que os indicadores validados são adequados para medir o impacto do cuidado de enfermagem na assistência hospitalar na dimensão da segurança do paciente.

No Quadro 2 apresentam-se as taxas de concordância entre os atributos para cada indicador avaliado e, no Quadro 3, os principais comentários e sugestões dos participantes para os indicadores não validados.

Quadro 2
Indicadores de efetividade da assistência de enfermagem hospitalar na dimensão da segurança do paciente: taxas de concordância das respostas dos especialistas e validação

Indicadores	Taxas de concordância das respostas dos especialistas quanto à correspondência dos indicadores aos atributos pesquisados	Validação
Incidentes devido a falhas de identificação do paciente	Tempestividade (88,47%); objetividade e utilidade (88,46%); demais atributos acima de 75%	Sim
Lesão por pressão	Tempestividade (98,09%); utilidade (98,08%); objetividade e representatividade (96,15%); demais atributos acima de 82,69%	Sim
Fratura de quadril em pacientes internados	Simplicidade quanto à facilidade no cálculo (90,38%); simplicidade na interpretação do indicador (88,46%); objetividade (88,46%); demais atributos acima de 73,07%	Sim
Fratura de quadril no pós-operatório	Simplicidade relacionada à facilidade no cálculo (75,00%); estabilidade e sensibilidade (74,74%); demais atributos acima de 70,59%	Sim
Quedas com danos	Utilidade e estabilidade (94,23%); simplicidade quanto à facilidade no cálculo (92,31%); simplicidade no entendimento (92,16%); demais atributos acima de 76,92%	Sim
Incidentes graves relacionados a equipamentos	Utilidade (82,64%); tempestividade e objetividade (78,85%); estabilidade (78,84%); demais atributos acima de 70,53%	Sim
Estratégia multimodal de higiene de mãos	Utilidade (92,31%); representatividade e tempestividade (82,70%); estabilidade (80,77%); disponibilidade (53,68%); demais atributos acima de 71,58%	Não
Erro de medicação	Objetividade (90,40%); utilidade (88,46%); disponibilidade (67,37%); demais atributos acima de 74,74%	Não

Quadro 3
Comentários e sugestões de especialistas acerca dos atributos dos indicadores de efetividade da assistência de enfermagem hospitalar não validados na dimensão da segurança do paciente

Indicadores	Comentários e sugestões
Estratégia multimodal de higiene de mãos	Comentários: técnicas para obtenção dos dados demandam tempo (P02, P51); é de difícil execução (P06, P31, P16); mensurar oportunidades perdidas requer vigilância específica (P06, P31).
	Sugestões: estudar diferentes formas de coleta das oportunidades perdidas para higienização das mãos (P44); auxílio de multiplicadores, isto é, setores se auditam com checklist (P30); usar amostragem estratificada por setores e profissionais, observadores não identificáveis, registrando o comportamento dos profissionais (P17).
Erro de medicação	Comentários: esse tipo de erro, quando não ocasiona dano, é de difícil detecção (P16, P17, P32, P36).
	Sugestões (para melhorar a detecção): melhoria nos registros em prontuários e relatórios de produção da farmácia (P45); informatização de prontuário, da logística de gestão e da administração de medicamentos (P08, P37, P48, P51); estímulo institucional para aumentar notificações de incidentes (P10, P16, P27, P35); especialmente de near-miss e incidentes sem danos (P10, P35, P45); incluir o paciente (P08); realizar análise técnica farmacêutica de prescrições (P26, P33).

DISCUSSÃO

O estudo proporciona aos gestores informação para que selecionem indicadores validados por especialistas, destinados a captar o quanto os resultados dos processos assistenciais de enfermagem do hospital atendem à melhoria da segurança dos pacientes.

Destaca-se a desconfiança dos participantes em relação às fontes de coleta dos dados já que, na realidade brasileira, registros em prontuários apresentam-se incompletos ou omitem diagnósticos da Classificação Internacional de Doenças⁽³⁴⁾.

Dos oito indicadores, dois não foram validados: adesão institucional à estratégia multimodal de higiene de mão e erros de medicação. A não validação decorreu do fato de não ter havido consenso superior a 70% no atributo disponibilidade, denotando que os dados para estruturar esses indicadores não são de fácil obtenção.

Em relação ao indicador adesão institucional à estratégia multimodal de higiene de mãos, frequentemente os hospitais utilizam a medição de sabão líquido e álcool, que possibilita a avaliação indireta da adesão - constituindo-se, portanto, como um indicador de processo, e não de efetividade⁽¹⁶⁾. Contudo, a estratégia multimodal é mais abrangente do que somente medir o consumo de produtos, pois implica mudanças no sistema, com provimento de infraestrutura, educação dos profissionais, avaliação e retroalimentação sobre desempenho e resultados, lembretes no local de trabalho, e dimensionamento do clima de segurança institucional⁽¹⁷⁾. Essas múltiplas abordagens acrescentam complexidade ao indicador e tornam a obtenção de dados mais laboriosa e onerosa, o que pode explicar por que este não foi validado pelos especialistas. Após análise das sugestões dos painelistas (Quadro 3), elaborou-se um indicador composto abrangendo essas várias práticas para medir a adesão à estratégia multimodal na instituição.

Erros de medicação são relevantes por resultarem em maior tempo de permanência do paciente no hospital e em aumento do risco de morte e dos custos hospitalares. Baixa notificação e ausência de registros em prontuário de incidentes relacionados às etapas de dispensação, prescrição e administração ainda são comuns^(18-20).

Embora o indicador erro de medicação não tenha sido validado por não alcançar o consenso mínimo em relação ao atributo disponibilidade nas duas rodadas, os outros atributos alcançaram tal consenso entre os painelistas, variando de 76,92% a 90,40%. Os atributos que obtiveram concordância mais elevada foram objetividade (90,40%), utilidade (88,46%) e representatividade (86,55%), apontando que esse indicador corresponde ao seu objetivo e subsidia uma tomada de decisão coerente com o que se deve medir.

Apropriadamente, os participantes sugeriram o fortalecimento dos sistemas de notificação de erros de medicação, devido à baixa detecção quando não há dano ao paciente, bem como a inclusão do paciente no cuidado, uma vez que notificações podem ser originadas pela comunicação de erros detectados por ele ou seus familiares à equipe de saúde⁽¹⁹⁾.

Os incidentes com danos relacionados a medicamentos são os que ocorrem com maior frequência em pacientes hospitalizados, e cerca de 25% deles são evitáveis. A cadeia terapêutica medicamentosa é extensa, envolvendo a logística voltada ao suprimento, à prescrição, à dispensação, ao preparo e à administração, o que torna ainda mais complexa a identificação dos erros. É possível que erros nessa cadeia estejam relacionados a condições latentes sistêmicas⁽³⁵⁾.

Contudo a gestão desse indicador está intimamente relacionada à enfermagem, posto que a maior parte dos erros de medicação ocorrem na fase de administração, cuja atribuição é quase exclusiva dessa categoria profissional⁽¹⁸⁾ - embora a ausência de registros em prontuário de incidentes relacionado às etapas de dispensação e prescrição também seja comum^(19-20). Portanto, estratégias para aumentar a disponibilidade dos dados para esse indicador estão voltadas para o fortalecimento da cultura de segurança, a implementação e o estímulo à adesão a protocolos de prevenção de erros de medicação, e o incentivo à notificação de incidentes.

Em relação aos enfermeiros, os óbices ao relato sobre erros de medicação e quase incidentes em ambientes hospitalares foram explorados em revisão sistemática abrangendo o período de 1981 a 2015. Barreiras organizacionais como a cultura, o próprio sistema de notificação não amigável, o comportamento gerencial e fatores emocionais, como o medo das consequências e o peso da responsabilidade, foram associadas à baixa notificação⁽³⁶⁾.

Como contribuintes da segurança dos pacientes, os enfermeiros necessitam de educação e qualificação no gerenciamento de erros, cabendo à organização a responsabilidade de desenvolver uma cultura de aprendizagem com os erros, sem culpabilizar e punir, bem como de adotar sistemas de notificação anônimos, eficazes, descomplicados e eficientes, além de propiciar apoio pelos gestores, com fornecimento de feedback aberto aos enfermeiros⁽³⁶⁾.

Adicionalmente, métodos automatizados para identificar incidentes mediante registros eletrônicos potencializam a superação de vieses metodológicos relacionados aos estudos retrospectivos em prontuários, de tal sorte que a obtenção de dados mais precisos favoreça o emprego de indicadores validados para mensurar a incidência de falhas, erros e omissões relacionados aos medicamentos^(37)).

Os demais indicadores foram validados. A identificação do paciente é fundamental à prevenção de erros nas ações de cuidado de enfermagem, como medicação e procedimentos em geral, e esse indicador objetiva contabilizar o número de incidentes devido a falhas na identificação do paciente. Os resultados apontam que, embora a identificação do paciente vise determinar com segurança a legitimidade do receptor do procedimento, na prática isso recebe pouca atenção⁽²¹⁾ - fato que destaca esse indicador como um dos prioritários para medir a segurança do paciente.

Em relação ao indicador de lesão por pressão, é recomendada a utilização de escalas para determinar o grau de risco para o desenvolvimento dessa lesão. Há uma variedade de escalas disponíveis, como as de Braden, Norton, Waterlow, e a Avaliação de Risco para o Desenvolvimento de Lesões Decorrentes do Posicionamento Cirúrgico^(38-40), que podem ser selecionadas para aplicação sistemática, a critério de cada hospital.

Quanto ao monitoramento da fratura de quadril entre pacientes internados e em pós-operatório, a simplicidade no cálculo do indicador (Quadro 2) favorece a viabilidade desses indicadores. Vítimas desses eventos são frágeis, limitadas e incapazes fisicamente; apresentam piora da condição clínica; enfrentam longo tempo de internação e reinternações; oneram os custos hospitalares; e sua mortalidade é elevada em 50% após um ano da queda^(22-23). É indispensável também a avaliação sistemática pela enfermagem do risco utilizando escalas validadas, implantação, monitoramento e avaliação da adesão ao protocolo para prevenção de quedas, principal fator associado a fraturas.

O indicador de quedas é preconizado mundialmente. Neste estudo, apresentou-se à avaliação dos participantes o indicador de quedas com identificação de dano, por este ser sensível à mensuração da efetividade da assistência de enfermagem. Devido à baixa incidência, a California Nursing Outcomes Coalition contabiliza o número de quedas com dano para cada mil pacientes por dia⁽²⁴⁾. Diante da importância da notificação da fratura de quadril entre pacientes internados e em pós-operatório, e também das quedas com dano, os hospitais podem utilizar um indicador composto pelos três indicadores em vez do indicador simples, ampliando sua abrangência⁽³¹⁾.

Quanto ao indicador incidentes graves relacionados a equipamentos, a interação com o serviço de engenharia clínica pode intensificar a tecnovigilância e favorecer a identificação das causas e a prevenção de incidentes, tendo como resultado programas de capacitação para evitá-los e oportunidade para os fabricantes tornarem seus produtos mais seguros⁽²⁵⁾. A utilidade desse indicador é respaldada pela frequência desses incidentes e pela expressiva utilização de dispositivos na prática assistencial de enfermagem.

Dos incidentes considerados críticos ocorridos em 90 meses em uma unidade de terapia intensiva (UTI) para adultos na Inglaterra, 30% foram causados por equipamentos^(25,41). No Reino Unido, em 13 anos foram notificados 564 incidentes críticos em UTI, envolvendo 94 tipos de equipamentos; 12,41% estavam relacionados ao uso de leitos, colchões e cadeiras, e 12,05% a equipamentos e dispositivos necessários ao cuidado, como infusão intravenosa e monitorização, traqueostomia, ventilação mecânica e traqueostomia, terapia renal e broncoscopia⁽²²⁾.

Os resultados apontam a dependência da obtenção de dados para o cálculo dos indicadores e a necessidade de registros completos e corretos da assistência, bem como do emprego de sistemas eficazes de identificação direta e indireta e notificação de incidentes. Contudo, a legislação que obriga a notificação sistemática de eventos por hospitais surgiu somente em 2013⁽²⁶⁾, demandando mudanças na cultura de segurança, fortemente atrelada às ações gerenciais, e requerendo tempo para que se torne rotina na atuação profissional.

A fragilidade na obtenção de dados fidedignos na saúde está também relacionada à ausência de integração entre sistemas de informação gerenciais, à má qualidade dos registros administrativos, a prontuários parcialmente informatizados ou com registros manuscritos, e à limitada abrangência na codificação dos diagnósticos relacionados à iatrogenia⁽⁴²⁾.

Além da infraestrutura computacional, há a interface do usuário com o sistema. Enfermeiros são usuários dos sistemas hospitalares, alimentadores e coletores de dados para indicadores assistenciais e gerenciais. Alguns fatores interferem na eficácia da interação enfermeiro-computador, como erros de configuração de software, fluxo de trabalho inadequado, falta de tempo, número inadequado de profissionais e falta de conhecimento a respeito de indicadores⁽¹²⁾. Estratégias como a utilização de algoritmos e a configuração de avisos para dados alarmantes podem minimizar a indisponibilidade de dados necessários ao cálculo de indicadores, permitindo que enfermeiros ajam tempestivamente, realizando cuidados efetivos e seguros para o paciente.

Limitações do estudo

O estudo baseou-se no julgamento de especialistas sobre os atributos dos indicadores estudados e, devido à subjetividade peculiar às pesquisas do tipo survey, considera-se possível haver algum viés nos resultados. Contudo, o critério mínimo de 70% de concordância entre os especialistas para a validação do indicador e a consistência interna muito alta conferem confiabilidade aos resultados. Há que se considerar como elementos adicionais à confiabilidade dos resultados a seleção criteriosa dos especialistas de acordo com sua experiência em estudos e/ou no uso de indicadores de saúde, e a autoanálise quanto a sua contribuição para o estudo.

Contribuições para a área de enfermagem

Os indicadores validados permitem a avaliação da efetividade assistencial da enfermagem hospitalar, e a translação desses indicadores para a prática hospitalar facilita o monitoramento de esforços da enfermagem visando à segurança do paciente, com redução de incidentes danosos.

CONCLUSÕES

Indicadores de efetividade da assistência de enfermagem na dimensão segurança foram avaliados por um painel de especialistas, considerando sua correspondência com atributos desejáveis: disponibilidade, confiabilidade, simplicidade, representatividade, sensibilidade, abrangência, objetividade, baixo custo, utilidade, estabilidade e tempestividade. Foram validados em relação a todos os atributos os indicadores: queda com dano; fratura de quadril; fratura de quadril pós-operatória; incidentes relacionados a equipamentos; incidentes devido a falhas na identificação do paciente; e lesão por pressão.

O indicador erro de medicação e aquele relativo à estratégia multimodal de higiene de mãos não foram validados quanto à disponibilidade de dados para estruturá-los. No entanto, dada sua relevância para medir a efetividade assistencial de enfermagem na dimensão da segurança do paciente, estratégias que fortaleçam a cultura de segurança, sistemas de identificação e notificação de incidentes, e a informatização de registros assistenciais, entre outras, são medidas que devem ser implementadas pelos hospitais para que esses indicadores possam ser utilizados sistematicamente.

• FOMENTO
  Fonte de fomento: Leila Soares Seiffert - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes; bolsa do Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior).

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Aparecida Barbosa

EDITOR ASSOCIADO: Alexandre Balsanelli

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  22 Abr 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  31 Out 2018
• Aceito
  08 Jun 2019