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Má oclusão Classe II, 2ª divisão de Angle com sobremordida exagerada e discrepância acentuada

Resumos

Este artigo relata o tratamento de uma jovem paciente, com 13,8 anos de idade, que apresentava uma má oclusão Classe II, segunda divisão de Angle, retenção prolongada de dentes decíduos, mordida cruzada dentária, sobremordida exagerada, dentre outros desvios da normalidade. Inicialmente, a abordagem ortodôntica envolveu uma expansão da maxila, seguida pelo uso do aparelho extrabucal de Kloehn e aparelhagem ortodôntica fixa. O resultado obtido demonstra a importância de um diagnóstico e planejamento criteriosos, bem como a necessidade de colaboração do paciente durante o tratamento ortodôntico. Este caso clínico foi apresentado à Diretoria do Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial (BBO), representando a categoria livre, como parte dos requisitos para a obtenção do título de diplomado pelo BBO.

Classe II, segunda divisão; Mordida cruzada; Sobremordida acentuada; Retenção prolongada de dentes decíduos


This article reports the treatment of a young patient at 13.8 years of age who presented with an Angle Class II, division 2 malocclusion, prolonged retention of deciduous teeth, dental crossbite and severe overbite, among other abnormalities. At first, the approach involved rapid maxillary expansion followed by the use of Kloehn headgear and fixed orthodontic appliance. Treatment results demonstrate the importance of careful diagnosis and planning as well as the need for patient compliance during treatment. This case was presented to the Brazilian Board of Orthodontics and Facial Orthopedics (BBO). It is representative of the free category and fulfills part of the requirements for obtaining the BBO Diploma.

Class II, division 2; Crossbite; Severe overbite; Prolonged retention of deciduous teeth


CASO CLÍNICO BBO

Má oclusão Classe II, 2ª divisão de Angle com sobremordida exagerada e discrepância acentuada* Endereço para correspondência: Daniela Kimaid Schroeder Rua Visconde de Pirajá, 444, sala 205 - Ipanema CEP: 22.410-002 - Rio de Janeiro / RJ E-mail: danikimsc@gmail.com

Daniela Kimaid Schroeder

Mestre em Ortodontia pela UFRJ. Diplomada pelo Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Daniela Kimaid Schroeder Rua Visconde de Pirajá, 444, sala 205 - Ipanema CEP: 22.410-002 - Rio de Janeiro / RJ E-mail: danikimsc@gmail.com

RESUMO

Este artigo relata o tratamento de uma jovem paciente, com 13,8 anos de idade, que apresentava uma má oclusão Classe II, segunda divisão de Angle, retenção prolongada de dentes decíduos, mordida cruzada dentária, sobremordida exagerada, dentre outros desvios da normalidade. Inicialmente, a abordagem ortodôntica envolveu uma expansão da maxila, seguida pelo uso do aparelho extrabucal de Kloehn e aparelhagem ortodôntica fixa. O resultado obtido demonstra a importância de um diagnóstico e planejamento criteriosos, bem como a necessidade de colaboração do paciente durante o tratamento ortodôntico. Este caso clínico foi apresentado à Diretoria do Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial (BBO), representando a categoria livre, como parte dos requisitos para a obtenção do título de diplomado pelo BBO.

Palavras-chave: Classe II, segunda divisão. Mordida cruzada. Sobremordida acentuada. Retenção prolongada de dentes decíduos.

HISTÓRIA E ETIOLOGIA

A paciente procurou tratamento ortodôntico aos 13,8 anos de idade. Apresentava como queixa principal o fato de que os dentes demoravam muito a cair e tinha vergonha de sorrir. Sua história médica e odontológica não possuía registros significativos. Sua má oclusão, com a característica principal de falta de espaço para o alinhamento de alguns dentes - o que comprometia consideravelmente sua estética facial (Fig. 1) -, teve como fator etiológico primário a retenção prolongada dos dentes decíduos. A menarca havia ocorrido aos 12 anos de idade.


DIAGNÓSTICO

Em relação ao padrão dentário (Fig. 1, 2), apresentava Classe II, 2ª divisão, subdivisão direita, de Angle, incisivos superiores e inferiores com excessiva verticalização, sobremordida exagerada de 100%, desvio das linhas médias superior e inferior de 3mm para direita, falta de espaço para erupção do dente 13 e alinhamento de outros dentes, mordidas cruzadas dentárias e arcadas atrésicas.


Apresentava harmonia esquelética, com ANB igual a 4º, e bom posicionamento maxilar e mandibular. Como mencionado, os incisivos superiores e inferiores encontravam-se bastante verticalizados, com ângulo interincisal de 157º, IMPA de 75º, 1-NA de 7º e 2,5mm, e 1-NB de 12º e 4mm. Esses aspectos podem ser observados na figura 4 e na tabela 1.



Na análise das radiografias periapicais e panorâmica (Fig. 3), foi possível verificar que a paciente não apresentava qualquer alteração que comprometesse o tratamento ortodôntico.

A paciente apresentava perfil levemente convexo e um sorriso desagradável, devido aos apinhamentos e inclinações dentárias incorretas (Fig. 1, 4).

OBJETIVOS DO TRATAMENTO

No sentido anteroposterior, objetivou-se estabelecer relação de Classe I de Angle e melhorar as inclinações dos incisivos superiores e inferiores. No sentido vertical, seria necessário reduzir a sobremordida exagerada, por meio do nivelamento das arcadas inferior e superior. No sentido transverso, buscou-se a expansão das arcadas superior e inferior, com aumento das distâncias intercaninos.

Com isso, esperava-se eliminar as mordidas cruzadas, alcançar sobremordida adequada e corrigir as linhas médias superior e inferior, melhorando significativamente a estética do sorriso.

PLANO DE TRATAMENTO

Foi elaborado um plano de tratamento iniciando-se com a disjunção palatal, com o objetivo de aumentar a dimensão transversa da maxila e obter espaço para o alinhamento de todos os dentes.

Após a remoção do disjuntor, seria instalado um aparelho extrabucal de Kloehn (AEBK) assimétrico, com o objetivo de corrigir a relação molar e auxiliar na obtenção de espaço. Concomitantemente ao uso do AEBK, planejou-se a colocação de aparelhagem ortodôntica superior, iniciando o alinhamento e nivelamento nessa arcada, para depois, quando houvesse altura favorável, realizar a montagem da aparelhagem ortodôntica inferior. Para melhorar a forma da arcada inferior e obter espaço para o alinhamento e nivelamento dos dentes inferiores, os arcos teriam um formato expandido em relação às distâncias intercaninos iniciais, uma vez que as inclinações dos caninos para lingual e a forma atrésica da arcada permitiam essa expansão.

Para auxiliar a abertura de espaço para o dente 13 e, consequentemente, corrigir a linha média superior, foi planejada a colocação de uma mola aberta, comprimida entre os dentes 12 e 14, a partir do arco 0,018".

Para a finalização, foram usados arcos 0,019" x 0,025" superior e inferior, coordenados, com dobras de primeira e terceira ordens individualizadas, e mecânica de elásticos intermaxilares, de acordo com as necessidades do caso.

Após a fase de tratamento ativo, planejou-se utilizar placa de contenção superior do tipo wraparound e, na arcada inferior, barra intercaninos com fio 0,028".

PROGRESSO DO TRATAMENTO

Para a disjunção palatal, foi utilizado o aparelho de Haas modificado, com ativação de 2/4 de volta por dia. O mesmo aparelho foi utilizado como contenção da disjunção por seis meses. A maxila foi expandida, melhorando a forma da arcada superior e, consequentemente, permitindo a melhora da forma da arcada inferior.

Após a remoção do disjuntor, adaptou-se o AEBK assimétrico, com braço externo direito mais longo e aberto, com força de 350g, para ser usado aproximadamente 14 horas/dia, corrigindo a relação molar e auxiliando na obtenção de espaço para o alinhamento dos dentes superiores.

Foram utilizados os braquetes metálicos do tipo standard, sem torques ou angulações, de slot 0,022" x 0,028", sistema Edgewise. A montagem foi iniciada na arcada superior e, somente após a obtenção de espaço e altura, a arcada inferior recebeu a aparelhagem.

Na arcada superior, foram utilizados arcos de alinhamento e nivelamento de aço inoxidável 0,014" a 0,020" e, a partir do arco 0,018", foi instalada uma mola aberta, comprimida entre os dentes 12 e 14, para auxiliar na criação de espaço para o posicionamento do dente 13 e consequente correção da linha média. Após o alinhamento e nivelamento de todos os dentes, a arcada superior recebeu o arco de aço inoxidável 0,019" x 0,025" individualizado para a finalização.

A montagem do aparelho inferior e a sequência de arcos para o alinhamento e nivelamento foram semelhantes às realizadas na arcada superior, porém os arcos foram conformados com o objetivo de expandir a arcada inferior, verticalizando os caninos e pré-molares e permitindo a projeção dos incisivos, que se apresentavam retroinclinados antes do tratamento. Isso permitiu um correto alinhamento, nivelamento e a correção da linha média. Para finalização, foi utilizado o arco de aço inoxidável 0,019" x 0,025", com dobras individualizadas.

Após a verificação de que todos os objetivos pretendidos foram alcançados, a aparelhagem fixa foi removida, iniciando-se, então, a fase de contenção. Foi utilizada uma placa de contenção superior do tipo wraparound e barra intercaninos inferior de fio de aço inoxidável 0,028". Foi recomendada a utilização da placa de contenção superior durante 24 horas por dia nos primeiros seis meses e, depois, somente para uso noturno. Foram solicitadas as exodontias dos terceiros molares superiores e inferiores.

RESULTADOS DO TRATAMENTO

Avaliando-se os registros finais da paciente, pode-se verificar que os principais objetivos pretendidos foram alcançados (Fig. 5, 6, 8 ). Na maxila, o ângulo ANB foi reduzido 2º e houve bom controle vertical e melhora considerável na forma da arcada superior (Fig. 5, 6, 8 ). Os dentes apresentaram bom alinhamento e houve melhora da inclinação dos incisivos. A sobremordida também foi corrigida e a distância intercaninos sofreu aumento de 11mm, como planejado inicialmente, tendo-se mantido a distância intermolares.




Na mandíbula, foi observado um giro no sentido horário com aumento do ângulo FMA (Tweed) de 28º para 32º (Fig. 8 , 9, Tab. 1), devido à utilização do AEBK e, também, ao nivelamento.


Do ponto de vista dentário, foi alcançado bom alinhamento, a curva de Spee foi nivelada e os incisivos foram projetados, com aumento do ângulo IMPA (Tweed) de 75º para 90º (Fig. 8 , 9, Tab. 1).

Em relação à oclusão, as linhas médias se tornaram coincidentes com a linha média facial, os molares e caninos assumiram uma relação de chave de oclusão, o trespasse vertical se tornou adequado e as guias de desoclusão satisfatórias.

Na avaliação da radiografia panorâmica (Fig. 7A), observa-se bom paralelismo entre as raízes. O suave arredondamento dos ápices das raízes dos incisivos superiores observado nas radiografias periapicais finais (Fig. 7B) é compatível com a quantidade de movimentação ocorrida. Na radiografia cefalométrica de perfil (Fig. 8A ), observa-se a melhora da sobremordida e da relação interlabial.

Com a correção das assimetrias e da sobremordida exagerada, houve melhora significativa da estética do sorriso, o que também refletiu na face da paciente (Fig. 5).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A princípio, foi levantada a possibilidade de tratar esse caso com exodontias, devido à aparente falta de espaço para os dentes superiores e inferiores. Porém, a falta de espaço era decorrente de inclinações axiais alteradas, migrações dentárias e atresia das arcadas.

A idade da paciente permitiu que tais problemas fossem corrigidos através de recursos ortodônticos para obtenção de espaço, sem prejudicar o suporte periodontal, a estética e a função2-5. Em relação à estabilidade, outro fator deve ser levado em consideração ao projetar dentes e expandir arcadas: acredita-se que, pelo fato de o aumento das distâncias intercaninos ter sido obtido por meio da correção do posicionamento dos caninos superiores e inferiores, e não por levar os dentes para fora de suas bases ósseas, as chances de estabilidade, após a correção, são elevadas1. Mesmo assim, a contenção foi cuidadosamente planejada e com objetivo de acompanhamento semestral.

O tempo previsto para o tratamento foi de 30 meses. Porém, a paciente foi estudar fora da cidade por dois anos e faltava com muita frequência nesse período, o que aumentou significativamente o tempo de tratamento para 48 meses.

A colaboração da paciente com o uso do AEBK era instável, com momentos de muita colaboração e outros de relaxamento, embora essa necessidade fosse sempre enfatizada durante o tratamento. Como pode ser observado nos registros finais, o resultado geral foi considerado bom no que diz respeito à oclusão e estética facial e dentária.

Enviado em: março de 2010

Revisado e aceito: abril de 2010

* Relato de caso clínico, categoria livre, aprovado pelo Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial.

  • 1. Giannely A. Evidence-based therapy: an orthodontic dilemma. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 2006 May;129(5):596-8.
  • 2. Haas AJ. Palatal expansion: just the beginning of dentofacial orthopedics. Am J Orthod. 1970 Mar;57(3):219-55.
  • 3. Haas AJ. Long-term post-treatment evaluation of rapid palatal expansion. Angle Orthod. 1980 Jul;50(3):189-217.
  • 4. Hershey H, Houghton CW, Burstone CJ. Unilateral face-bows: a theoretical and laboratory analysis. Am J Orthod. 1981 Mar;79(3):229-49.
  • 5. Turpin DL. Correcting the Class II subdivision malocclusion. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 2005 Nov;128(5):555-6.
  • Endereço para correspondência:
    Daniela Kimaid Schroeder
    Rua Visconde de Pirajá, 444, sala 205 - Ipanema
    CEP: 22.410-002 - Rio de Janeiro / RJ
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Jun 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Aceito
      Abr 2010
    • Recebido
      Mar 2010
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