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Determinação da Massa e Dados Orbitais de Exoplanetas pelo Método Doppler

Calculation of mass and orbital data of exoplanets by Doppler method

Resumos

O Método Doppler, também denominado método das velocidades radiais, é uma técnica utilizada na detecção de exoplanetas. Cerca de 70% dos planetas extra-solares conhecidos foram determinados utilizando esta técnica. O Método Doppler consiste em determinar os deslocamentos espectrais da estrela hospedeira, os quais possibilitam a mensuração da variação da velocidade radial com que a estrela hospedeira se aproxima ou se afasta da Terra. Este movimento da estrela hospedeira em torno do centro de massa ocorre devido à presença do exoplaneta. Neste trabalho, apresentamos uma revisão pedagógica sobre o Método Doppler aplicado à detecção de exoplanetas. A discussão permeia desde elementos teóricos fundamentais para a compreensão da técnica de detecção extrapola até o estudo de sua aplicação.

Palavras-chave
método Doppler; velocidades radiais; exoplanetas


Doppler method, also called radial velocities method, is a technique used in detecting of exoplanets. About 70% of known exoplanets were discovered using this technique. The Doppler method consist in determine spectral shifts of host star of exoplanet, which enable measurement of the variation of radial velocity of host star towards of Earth or away from Earth. This movement of host star around center of mass occurs due to the existence of exoplanet. In this work we present a pedagogical review of the Doppler method applied to detection of exoplanets. In this sense, we analyze theoretical elements of this technique and their application.

Keywords
Doppler method; radial velocities; exoplanets


1. Introdução

O desenvolvimento tecnológico crescente nos permitiu o crescimento epistemológico nas mais diversas áreas. Por exemplo, na área médica, a possibilidade de realização de exames aliada à equipamentos cirúrgicos mais eficientes e seguros nos trouxe maior qualidade de vida. As novas tecnologias nos proporcionaram também a possibilidade de conhecer realidades que ultrapassam as fronteiras do nosso sistema solar. Elementos estudados pela astrofísica e que têm prometido nos auxiliar na compreensão mais profunda do universo são os exoplanetas. Exoplaneta é o nome dado a planetas que se encontram fora do nosso sistema solar [1][1] Chris Kitchin, Exoplanets - Finding, Exploring and Understanding Alien Worlds (Springer, New York, 2012).. A primeira detecção definitiva de exoplanetas foi realizada em 1992 pelos astrônomos Aleksander Wolszczan e Dale Frail, os quais descobriram dois planetas rochosos orbitando o pulsar PSR B1257+12 [1[1] Chris Kitchin, Exoplanets - Finding, Exploring and Understanding Alien Worlds (Springer, New York, 2012)., 2[2] S. Seager, Exoplanets (University of Arizona Press, Tucson, 2010).]. Desde então, institutos de pesquisas espaciais têm organizado grandes projetos cujo objetivo principal é a detecção de exoplanetas. Um conhecido projeto dessa natureza é a Missão Kepler, a qual foi iniciada em 2009 quando a NASA lançou um satélite artificial dedicado a busca de planetas extra-solares [2[2] S. Seager, Exoplanets (University of Arizona Press, Tucson, 2010)., 3[3] M. Olivier, T. Encrenaz, F. Roques, F. Selsis and F. Casoli, Planetary Systems: Detection, Formation and Habitability of Extrasolar Planets (Springer-Verlag, Berlin, 2008).]. Essa missão tinha o objetivo de monitorar de forma ininterrupta e simultânea cerca de 150000 estrelas. As primeiras informações fotométricas oriundas da Missão Kepler surgiram em junho de 2009. O sucesso da Missão Kepler foi notável, de forma que até 2013 se contabilizavam mais de 4000 exoplanetas, entre candidatos e confirmados. A detecção e o estudo de exoplanetas proporcionam interesses práticos e teóricos, dentre os quais podemos citar desde a elaboração de respostas para a origem do universo até a possibilidade do estabelecimento de colônias humanas além do sistema solar.

Os exoplanetas já encontrados podem ser classificados em sete principais categorias: júpiteres quentes; netunos quentes; júpiteres frios; superjúpiteres; superterras; exoterras; pontos livres flutuantes. Os júpiteres quentes correspondem a cerca de 40% dos exoplanetas já encontrados e apresentam as seguintes características: são gasosos; constituídos predominantemente por hidrogênio e hélio; são quentes e massivos (possuem massa até cerca de 13 vezes da massa de Júpiter e temperaturas superiores a dois mil graus Celsius); a distância até a estrela hospedeira é inferior a distância da Terra ao Sol. O primeiro júpiter quente detectado foi o 51 Peg b em 1995. Este também foi o primeiro exoplaneta descoberto que orbita uma estrela semelhante ao Sol [4][4] Michel Mayor and Didier Queloz, Nature 378, 355 (1995).. Os netunos quentes são similares aos júpiteres quentes, porém estes possuem massa da ordem de cinco vezes menor a massa de Júpiter. Os júpteres frios correspondem a cerca de 30% dos exoplanetas detectados, possuem massa da mesma magnitude dos júpiteres quentes, distam da estrela hospedeira duas vezes da distância da Terra ao Sol, e são bastante parecidos com Júpiter. Em 2002, Geoff Marcy e Paul Butler descobriram o primeiro júpiter frio. Este exoplaneta tem a massa similar a massa de Júpiter e dista da sua estrela hospedeira o mesmo que Júpiter dista do Sol. Os superjúpiteres são intermediários entre os júpiteres quentes e frios, tendo de 5 a 13 vezes a massa de Júpiter. As superterras, ao contrário dos apresentados até então, são rochosos e possuem entre 1,5 e 10 vezes a massa da Terra. Os primeiros planetas rochosos descobertos foram o Kepler-10b e o Kepler-10c, ambos anunciados em 2011 pela Missão Kepler. As exoterras são similares à Terra e possuem massa entre 0,5 e 1 da massa terrestre. As exoterras que distam da estrela hospedeira o suficiente para possuir água líquida e são denominadas de goldilocks [5[5] John W. Mason (Editor), Exoplanets - Detection, Formation, Properties, Habitability (Springer & Praxis Publishing Ltd, Chichester, UK, 2008)., 6[6] Michel Mayor and PierreYves Frei, New Worlds in the Cosmos - The Discovery of Exoplanets (Cambridge University Press, Cambridge, 2003).]. E ainda, quando os goldilocks reúnem todos os requisitos para a vida humana recebem o nome de Twin Eearth (Terra Gêmea). O primeiro exoplaneta descoberto que possui características similares a Terra e que se encontra numa zona habitável é o Kepler-452b. Este planeta orbita uma estrela hospedeira similar ao Sol. Sua descoberta foi anunciada pela Nasa em 2015 [6][6] Michel Mayor and PierreYves Frei, New Worlds in the Cosmos - The Discovery of Exoplanets (Cambridge University Press, Cambridge, 2003).. Por último, mas não menos importantes, estão os denominados pontos livres flutuantes, os quais são exoplanetas não associados a estrelas hospedeiras [1[1] Chris Kitchin, Exoplanets - Finding, Exploring and Understanding Alien Worlds (Springer, New York, 2012).3[3] M. Olivier, T. Encrenaz, F. Roques, F. Selsis and F. Casoli, Planetary Systems: Detection, Formation and Habitability of Extrasolar Planets (Springer-Verlag, Berlin, 2008)., 5[5] John W. Mason (Editor), Exoplanets - Detection, Formation, Properties, Habitability (Springer & Praxis Publishing Ltd, Chichester, UK, 2008)., 6[6] Michel Mayor and PierreYves Frei, New Worlds in the Cosmos - The Discovery of Exoplanets (Cambridge University Press, Cambridge, 2003).].

A elevação da quantidade de exoplanetas descobertos se deve ao surgimento de tecnologias, tais como telescópios mais potentes e sondas especiais, aliadas a poderosas técnicas de detecção. As principais técnicas de detecção são: observação direta; método Doppler; método do trânsito; microlentes gravitacionais [1[1] Chris Kitchin, Exoplanets - Finding, Exploring and Understanding Alien Worlds (Springer, New York, 2012).6[6] Michel Mayor and PierreYves Frei, New Worlds in the Cosmos - The Discovery of Exoplanets (Cambridge University Press, Cambridge, 2003).]. O método da observação direta, como o próprio nome já sugere, consiste em fotografar os exoplanetas com telescópios. Este método, responsável por 3% das detecções, é bastante limitado, pois os exoplanetas são corpos pequenos que orbitam estrelas bem maiores que eles e brilhantes, sendo assim ofuscados. O método Doppler, também denominado método da velocidade radial, determina, a partir do deslocamento das linhas espectrais da estrela hospedeira, variações na velocidade radial com que a estrela se aproxima ou se afasta da Terra. Esta técnica, que funciona bem para sistemas que distam da Terra até 160 anos-luz, é responsável pela detecção de cerca de 70% dos exoplanetas conhecidos. O método do trânsito, responsável por 23% das detecções, detecta a variação luminosa causada pelo exoplaneta quando este transita diante da estrela hospedeira. Este método só funciona bem quando o plano orbital do exoplaneta estiver completamente alinhado com nossa linha de visão. O método das microlentes gravitacionais é responsável por cerca de 2,3% das detecções. O efeito das microlentes ocorre quando os campos gravitacionais de um planeta e da sua estrela hospedeira agem de forma a amplificar a luz de uma estrela distante que esteja no fundo do céu. A vantagem desta técnica é possibilitar a detecção de exoplanetas de pouca massa e a desvantagem é a impossibilidade de repetição do experimento, devido às condições de alinhamento entre os corpos extremamente específicas que devem ser satisfeitas. Neste trabalho, analisaremos detalhadamente o método Doppler, apresentando os seus pormenores de maneira pedagógica. O nosso objetivo é que o texto seja acessível a qualquer estudante que já tenha cursado mecânica básica em nível de graduação. Por fim, para exemplificar a eficácia da técnica, discutiremos a detecção e a obtenção da massa e dados orbitais do exoplaneta 51 Peg b.

Nesse sentido, a apresentação deste trabalho seguirá os seguintes tópicos. Na seção 2, apresentaremos o problema da dinâmica de dois corpos, a interação gravitacional entre eles e as Leis de Kepler. Na seção 3 discutiremos acerca do efeito Doppler da luz. Na seção 4 explicaremos o método Doppler. A aplicação da técnica será discutida na seção 5. Finalmente, na seção 6 elencaremos as considerações finais.

2. Um pouco de mecânica celeste

Nesta seção, revisaremos alguns tópicos relacionados à mecânica celeste que nos auxiliarão na compreensão do método Doppler. Iniciaremos a discussão pelas leis de Newton e o problema de dois corpos, destacando a análise no referencial do centro de massa. Em seguida, discutiremos a Leis da gravitação universal de Newton e apresentaremos as Leis de Kepler.

2.1. Leis de Newton e o problema de dois corpos

As Leis de Newton constituem ingredientes fundamentais para discussão de problemas dinâmicos. Conhecê-las e saber aplicá-las é de suma importância no estudo de diversos tópicos de astrofísica, inclusive no que faremos neste trabalho. As Leis de Newton estão enunciadas a seguir [7[7] Keith R. Symon, Mecânica (Editora Campus, Rio de Janeiro, 1982).9[9] Louis Leithold, O Cálculo com Geometria Analítica (Editora Harbra, Goiânia, 1994) 3ª ed.]. As grandezas físicas representadas por m, υ e t são, respectivamente, massa, velocidade e tempo.

  • Primeira Lei - lei da inércia: um objeto se manterá em repouso ou em MRU a menos que uma força externa atue sobre este objeto. O momento p=mυ mantêm-se constante.

  • Segunda Lei

    (1) i F i = d p d t = d m d t υ + m d υ d t

    que para uma partícula resulta em

    (2) i F i = m d υ d t = m a
  • Terceira Lei Para toda ação existe uma reação oposta

    F 1 ( 2 ) = - F 2 ( 1 )

    em módulos essa forças são iguais,

    | F 1 ( 2 ) | = | F 2 ( 1 ) |
Figura 1
Par ação-reação entre duas partículas

2.1.1. Sistemas de referências no centro de massa

Vamos discutir o problema de dois corpos com o centro de massa (CM) na origem de uma sistema de coordenadas, no qual r1=(x1,y1,z1) e r2=(x2,y2,z2), conforme mostra a Figura (2).

Figura 2
Centro de Massa entre duas partículas na origem do sistemas de referências

Nesse percurso, temos que as coordenadas do CM são dadas por

(3) R C M = m 1 r 1 + m 2 r 2 m 1 + m 2 = 0 ,

que resulta em

(4) m 1 r 1 = - m 2 r 2 .

É importante observar que as partículas 1 e 2 estão diametralmente opostas. Disso obtemos as seguintes relações

(5) r 1 = - m 2 m 1 r 2 e r 2 = - m 1 m 2 r 1 .

De acordo com a Figura (2) distância relativa entre m1 e m2 será r=r2-r1, cujo módulo resulta em,

(6) r = r 1 2 + r 2 2 - 2 r 1 r 2 cos 18 0 = r 1 + r 2 .

E ainda, a partir da Eq.(4), obtemos para r1

r 1 = - m 2 m 1 ( r + r 1 ) ,

ou então

m r 1 = - m 2 r - m 2 r 1 ,

resultando em

(7) r 1 = - m 2 m 1 + m 2 r ,

e da mesma forma para r2

(8) r 2 = - m 1 m 1 + m 2 r .

A energia total desse sistema de corpos é dada por

E = K 1 + K 2 + V ( r ) ,

onde K1 e K2 são as respectivas energias cinéticas das partículas m1 e m2 e V(r) é a energia potencial entre as duas partículas, sendo r=|r| o módulo da distância relativa entre m1 e m2, Das expressões (7) e (8) obtemos que os vetores de velocidades são

(9) υ 1 = - m 2 m 1 + m 2 υ e υ 2 = - m 1 m 1 + m 2 υ .

Colocando os módulos dessas velocidades nos termos de energias cinéticas na energia total,

E = 1 2 m 1 | υ 1 | 2 + 1 2 m 2 | υ 2 | 2 + V ( r ) = 1 2 m 1 m 2 2 ( m 1 + m 2 ) 2 | υ | 2 + 1 2 m 2 m 1 2 ( m 1 + m 2 ) 2 | υ | 2 + V ( r ) = 1 2 m 1 m 2 ( m 1 + m 2 ) 2 ( m 2 + m 1 ) | υ | 2 + V ( r ) = 1 2 m 1 m 2 m 1 + m 2 | υ | 2 + V ( r )

que pode ser reescrito da seguinte forma

(10) E = 1 2 μ | υ | 2 + V ( r ) ,

onde

(11) μ = m 1 m 2 m 1 + m 2 ,

é a massa reduzida do sistema de duas partículas.

O sistema de duas partículas representado na Figura (2) pode ser substituído pela representação gráfica dada na Figura (3).

Figura 3
Movimento da massa reduzida

O momento angular total das duas partículas em torno do centro de massa é dado por

L = r 1 × p 1 + r 2 × p 2 = m 1 r 1 × υ 1 + m 2 r 2 × υ 2

onde podemos substituir as expressões (7), (8) e (9) na expressão acima do momento angular,

L = - m 1 m 2 m 1 + m 2 r × υ ( - m 2 ) m 1 + m 2 - m 2 m 1 m 1 + m 2 r × υ ( - m 1 ) m 1 + m 2 = m 1 m 2 ( m 1 + m 2 ) 2 ( m 2 + m 1 ) r × υ

resultando em

(12) L = μ r × υ .

Ou seja, o momento angular do sistema de duas partículas pode ser escrito em termos da massa reduzida e da distância relativa entre as duas partículas.

2.2. Lei da Gravitação Universal de Newton

No século XVII, Isaac Newton descobriu que a interação que mantém os planetas em órbita ao redor do Sol é a mesma que faz a maçã cair de uma macieira. Isso marcou o começo da Mecânica Celeste, o estudo da dinâmica dos astros. Hoje, nossos conhecimentos de mecânica celeste nos permitem determinar como colocar um satélite artificial em uma órbita desejada ou escolher a trajetória exata para enviar uma nave espacial para outro planeta. Esta lei é universal: a gravidade atua do mesmo modo entre a Terra e nossos corpos, entre o Sol e um planeta, e entre um planeta e uma das suas luas.

O nosso peso, a força gravitacional que nos atrai para o centro da Terra, é o mais familiar exemplo de atração gravitacional. Estudando o movimento da Lua e dos planetas, Newton descobriu o caráter fundamental da atração gravitacional entre dois corpos de qualquer natureza. Juntamente com as três leis do movimento, Newton publicou a lei da gravitação em 1687:

  • Cada partícula do universo atrai qualquer outra partícula com uma força diretamente proporcional ao produto das respectivas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre as partículas.

Traduzindo matematicamente, essa lei é escrita como,

(13) F ( r ) = - G m 1 m 2 r 2 = - G m 1 m 2 r 1 + r 2 2 ,

onde F é o módulo da força gravitacional que atua sobre cada partícula, m1 e m2 são as massas das partículas, r é a distância relativa entre elas de acordo com a Equação (6), vide Figura (2). O sinal negativo na equação significa que a força gravitacional é atrativa. G é a constante gravitacional cujo valor no Sistema Internacional de medidas é

(14) G = 6 , 67259 × 1 0 - 11 N m 2 kg 2 ,

este valor foi determinado por Henry Cavendish em 1798. Observe que esta medida foi efetuada mais de cem anos após a publicação da lei da gravitação universal por Newton.

Uma força dirigida sempre para uma centro fixo, cujo módulo só é função da distância entre a partícula e o centro fixo é um exemplo de força conservativa central. Em coordenadas polares, tendo O como origem,

(15) F = F ( r ) u r = - G m 1 m 2 r 1 + r 2 2 u r ,

onde ur é o vetor unitário radial das coordenadas polares.

A energia potencial gravitacional é então dada por,

(16) V ( r ) = - G m 1 m 2 r .

Podemos desenvolver esse termo da seguinte maneira

V ( r ) = - G m 1 m 2 r m 1 + m 2 m 1 + m 2 = - G ( m 1 + m 2 ) r m 1 m 2 m 1 + m 2

onde vamos denotar a massa total por M=m1+m2 e vamos usar a Equação (6) de forma que teremos

(17) V ( r ) = - G M μ r 1 + r 2 .

Quando uma partícula se move ao longo de uma curva no plano de coordenadas polares, expressamos sua posição, velocidade e aceleração em termos dos vetores unitários móveis cuja relação com com as coordenadas cartesianas são dados por

(18) u r = cos θ i + sin θ j , u θ = - sin θ i + cos θ j .

O vetor posição é dado por

r = | r | u r = r u r ,

a velocidade é obtida derivando o vetor posição em relação ao tempo,

(19) υ = r = d ( r u r ) d t = u r + r u r = u r + r θ u θ .

A aceleração em coordenadas polares é a derivada do vetor velocidade acima em relação ao tempo que resulta em

(20) a = ( r ¨ - r θ 2 ) u r + ( r θ ¨ + 2 θ ) u θ .

A força central gravitacional (15) é somente radial, de forma que expressando essa força de acordo com a segunda lei de Newton,

F ( r ) u r = μ a ,

teremos duas equações:

(21) - G M μ r 2 = μ r ¨ - μ r θ 2 ,

e

(22) r θ ¨ + 2 θ = 0

Devemos observar que o vetor momento angular da partícula sob ação de uma força central é constante, porque o torque é

(23) N = r × F = ( r × u r ) F ( r ) = 0 ,

logo temos que,

(24) N = d L d t = 0 ,

implicando que o momento angular L em torno de qualquer eixo que passe pelo centro de força é constante. Se uma força sobre uma partícula dirigir-se sempre para a origem, a partícula nunca poderá adquirir qualquer componente de velocidade fora do plano em que a partícula se move inicialmente. Esta é uma das consequências da conservação do momento angular (24), o percurso da partícula fica neste plano que contém o centro da força [7][7] Keith R. Symon, Mecânica (Editora Campus, Rio de Janeiro, 1982).. O vetor momento angular para um problema de dois corpos dado pela equação (12) será

(25) L = μ r × υ = μ r u r × ( u r + r θ u θ ) = μ r 2 θ k ^ ,

onde o versor k^=ur×uθ é perpendicular ao plano das trajetórias das partículas.

A equação de movimento de uma partícula de massa reduzida sob a ação de um campo gravitacional dada pela expressão (21) pode ser reescrita em termos do módulo do momento angular constante (25),

(26) - G M μ r 2 = μ d 2 r d t 2 - L 2 μ r 3 .

A solução da equação diferencial acima pode ser vista em detalhes nas referências [7[7] Keith R. Symon, Mecânica (Editora Campus, Rio de Janeiro, 1982)., 8[8] W. Greiner, Classical Mechanics - Point Particles and Relativity (Springer, New York, 2002).], fazendo-se r=r(θ(t)). A solução em coordenadas polares para o módulo do vetor posição em coordenadas polares é

(27) r = a ( 1 - e 2 ) 1 + e cos θ ,

a equação polar de uma cônica [9][9] Louis Leithold, O Cálculo com Geometria Analítica (Editora Harbra, Goiânia, 1994) 3ª ed.. Para órbitas fechadas a excentricidade deve ser 0e<1. Se a excentricidade for igual a zero a trajetória será uma órbita circular ao passo que uma excentricidade diferente de zero e menor que um, será uma trajetória orbital elíptica com semieixo maior a.

As três leis de Kepler do movimento planetário podem ser descritas como:

  • Primeira Lei: A trajetória dos planetas em torno do Sol é elíptica, com o Sol situado em um foco;

  • Segunda Lei: O raio vetor que une o Sol a qualquer planeta varre áreas iguais em tempos iguais;

  • Terceira Lei: O quadrado do período de revolução de um planeta é proporcional ao cubo do semieixo maior da sua órbita.

A Primeira Lei segue-se do fato de a força gravitacional ser inversamente proporcional ao quadrado da distância, resultando na equação de movimento (26) cuja solução é uma cônica (27) tal que as trajetórias fechadas possíveis são círculos ou elipses.

A Segunda Lei é uma consequência da conservação do momento angular L. Do Cálculo [9][9] Louis Leithold, O Cálculo com Geometria Analítica (Editora Harbra, Goiânia, 1994) 3ª ed., sabemos que a área varrida pelo raio da origem até a partícula, quando esta se move um pequeno ângulo dθ é

(28) d S = 1 2 r 2 d θ ,

podemos diferenciar a equação acima em termos temporais dt obtendo,

(29) d S d t = 1 2 r 2 d θ d t = 1 2 r 2 θ ,

e utilizando a equação (25), onde θ=Lμr2, temos então que,

(30) d S d t = L 2 μ .

A taxa de variação instantânea da área varrida pelo vetor posição em relação ao tempo é constante, o que implica que o vetor posição r varre áreas iguais em tempos iguais. Para o movimento elíptico, o período para completar a órbita, nos dá a expressão,

(31) S = L T 2 μ ,

onde S=πab é a área total da elipse sendo que a é o semieixo maior da elipse e b=a1-e2 é o semieixo menor da elipse, e T é o período de revolução.

A Terceira Lei de Kepler é obtida da Lei de Gravitação Universal e resulta na expressão abaixo [7[7] Keith R. Symon, Mecânica (Editora Campus, Rio de Janeiro, 1982).9[9] Louis Leithold, O Cálculo com Geometria Analítica (Editora Harbra, Goiânia, 1994) 3ª ed.],

(32) T 2 = 4 π 2 G M a 3 = 4 π 2 G ( m 1 + m 2 ) a 3 .

O coeficiente 4π2GM é uma constante para o sistema solar. Como a massa do Sol é muito maior que a massa de qualquer planeta temos que MM. Se tomarmos para a Terra T=1 ano e a=1 UA =1,5×1011 m, teremos que:

(33) T 2 a 3 = 4 π 2 G M = 1 ano 2 UA 3 .

Após a determinação do valor da constante gravitacional G foi possível determinar a massa do Sol M que é aproximadamente 2×1030 kg.

3. Efeito Doppler da luz

Continuando a fundamentação teórica que estamos organizando com o objetivo de discutir a detecção de exoplanetas pelo método Doppler, esboçaremos nesta seção uma breve revisão sobre efeito Doppler relativístico. Relembraremos as propriedades e algumas aplicações desse efeito.

O efeito Doppler é muito comum e observado para ondas sonoras em nosso cotidiano. Quando uma fonte sonora se move com determinada velocidade na direção de um observador, o observador observa que o som captado tem uma frequência maior que a da fonte se essa estiver em repouso. Quando a fonte se afasta do observador, a onda captada pelo observador tem um frequência menor do que a da fonte quando a fonte está em repouso. Esse efeito conhecido como efeito Doppler também ocorre para fontes de luz, com a diferença de que a luz não necessita de um meio para se propagar e que a fonte de luz nunca deverá ultrapassar a velocidade da luz.

Em astrofísica o deslocamento Doppler da luz é muito útil para determinar qual é a velocidade da fonte luminosa. Suponha que uma estrela esteja em um referencial O se movendo com uma velocidade υ na direção da Terra, que está no referencial O, conforme está esboçado na Figura (4).

Figura 4
Efeito Doppler relativístico
Se o comprimento de onda de uma determinada luz ao ser emitida pela estrela tiver comprimento de onda λ0, um observador no referencial da Terra irá medir um comprimento de onda menor λ1, de acordo com a equação do efeito Doppler relativístico, demonstrada em cursos de Física Moderna e/ou Relatividade Especial [10[10] H.D. Young e R.A. Freedman, Física IV, Sears & Zemansky (Pearson, São Paulo, 2009), 12ª ed., 11[11] S.T. Thornton and A. Rex Modern Physics for Scientists and Engineers (Cengage Learning, Boston, 2013), 4th ed.],
(34)λ1=c-vc+vλ0,

quando a estrela se aproxima da Terra, e

(35)λ1=c+vc-vλ0
quando a estrela se afasta da Terra.

Quando a velocidade υ da estrela é muito menor que a velocidade da luz é possível expandir a raiz quadrada em uma série de potências e obtermos a seguinte expressão para o deslocamento Doppler:

Δ λ λ 0 = v c ,

de forma que a velocidade da estrela pode ser obtida medindo a diferença entre um comprimento de onda emitido e o o comprimento de onda observado, Δλ=λ0-λ1,

(36) v = Δ λ λ 0 c .

Em geral o que se observa em Astrofísica é o deslocamento Doppler das linhas espectrais de absorção das estrelas. A Figura (5) são exemplos de espectros de absorção do átomo de hidrogênio. A radiação emitida pela superfície aquecida de uma estrela é de um espectro contínuo de radiação de corpo negro, porém átomos de hidrogênio na atmosfera da estrela absorvem radiação nos comprimentos de ondas equivalentes às transições eletrônicas do átomo de hidrogênio. Então observando a Figura (5), é possível medir o deslocamento Doppler Δλ quando a estrela se próxima ou se afasta da Terra e assim medir a velocidade da estrela [11[11] S.T. Thornton and A. Rex Modern Physics for Scientists and Engineers (Cengage Learning, Boston, 2013), 4th ed.13[13] Bradley Carrol and Dale Ostlie, An Introduction to Modern Astrophysics (Addison-Wesley Publishing Company, Inc., Boston, 1996).].

Figura 5
Absorção do Hidrogênio

Ainda em relação à Figura (5), na segunda figura de linhas de absorção, o Astrofísico mede um deslocamento Doppler Δλ positivo, ou seja, um desvio para o vermelho, assim conclui-se que a fonte luminosa, a estrela, se afasta da Terra. Na terceira figura de linhas de absorção, o deslocamento Doppler Δλ é negativo, que é um deslocamento para o azul (ou violeta), concluindo-se que a estrela se aproxima da Terra.

Tendo revisado alguns tópicos de mecânica celeste, bem como do Efeito Doppler relativístico, estamos aptos a discutir o Método Doppler. Sendo assim, na próxima seção o nosso foco será em estudar sobre exoplanetas e a referida técnica de detecção.

4. O Método Doppler

Devido a possibilidade de se medir com muita precisão os deslocamentos Doppler (desvios para o vermelho ou o desvio para o azul) dos espectros de absorção de muitas estrelas, tem sido possível encontrar planetas orbitando essas estrelas. Tais sistemas são denominados de ‘sistemas extra-solares’. Um planeta extra-solar ou exoplaneta tem o potencial de fazer sua estrela hospedeira balançar em torno do centro de massa ou baricentro do sistema [1[1] Chris Kitchin, Exoplanets - Finding, Exploring and Understanding Alien Worlds (Springer, New York, 2012)., 5[5] John W. Mason (Editor), Exoplanets - Detection, Formation, Properties, Habitability (Springer & Praxis Publishing Ltd, Chichester, UK, 2008)., 6[6] Michel Mayor and PierreYves Frei, New Worlds in the Cosmos - The Discovery of Exoplanets (Cambridge University Press, Cambridge, 2003).].

Em sistemas binários de estrelas, na maioria dos casos é possível observar a luz emitida pelas duas estrelas e assim através da detecção direta de imagens por telescópios medir períodos e distâncias aproximadas entre as estrelas binárias. Porém para a maioria dos exoplanetas detectados, apenas a estrela é visível, mas se for possível medir o deslocamento Doppler do espectro de absorção da estrela, podemos calcular a velocidade da estrela em torno do centro de massa do sistema extra-solar, e assim obter valores para o período da órbita e a distância do exoplaneta à estrela hospedeira. A Figura (6) ilustra o movimento da estrela hospedeira e do exoplaneta em torno do centro de massa.

Figura 6
Órbita do exoplaneta e da estrela hospedeira em torno do centro de massa

No sistema solar a massa do Sol é de aproximadamente M2×1030 kg, o maior planeta do sistema solar é Júpiter com uma massa M42×1027, em torno de mil vezes menor que a massa do Sol. Se colocarmos o centro do Sol na origem de um sistema de coordenadas, onde o raio do Sol é de aproximadamente 700.000 km e a distância de Júpiter ao Sol é da ordem de 780.000.000 km teremos que a posição do centro de massa estará afastado em torno de 780.000 km do centro do Sol. O maior planeta do sistema solar, Júpiter, afasta o centro de massa do sistema solar em torno de 80.000 km de distância da superfície do Sol; resultados este encontrados com o uso das Equações (3), (7) e (8). O Sol ao girar em torno do centro de massa em uma órbita aproximadamente circular, tem uma velocidade tangencial ao círculo da órbita aproximadamente igual a 13 m/s. Isso causa um deslocamento Doppler igual a 2,4×10-5 nm num comprimento de onda luminosa de 550 nm, que com a instrumentação atual é possível de ser detectada. Na maior parte dos sistemas extra-solares já estudados, temos que a massa da estrela hospedeira é muito maior que a massa do exoplaneta. Um exemplo da predominância da massa da estrela hospedeira em relação aos planetas é o nosso sistema solar, no qual a massa do Sol é muito superior à massa de Júpiter.

Atualmente cerca de 70% dos exoplanetas descobertos foram detectados através do deslocamento Doppler medido nas estrelas hospedeiras.

Quando a órbita de um exoplaneta é aproximadamente perpendicular ao plano do céu, será possível medir a "velocidade radial"(medições de variações na velocidade com a qual a estrela se afasta ou se aproxima da Terra, i.e., a medida da componente da velocidade estelar ao longo da linha de visada) da estrela hospedeira pelo método do deslocamento Doppler. Na Figura (7) vemos mais uma vez a órbita da estrela hospedeira e do exoplaneta em torno do centro de massa. Contudo, nesta figura está evidenciada a velocidade de aproximação (V1) e a velocidade de afastamento (V2) da estrela hospedeira.

Figura 7
Velocidades de aproximação e de afastamento da estrela hospedeira

Uma limitação do Método Doppler é em relação a um sistema extra-solar que tem órbita coplanar ao plano do céu. Neste caso, fica impossibilitado de se medir velocidades radiais da estrela. E o não conhecimento de Δλ impede a determinação da velocidade tangencial da estrela em sua órbita. Um sistema assim está ilustrado na Figura (8).

Figura 8
Sistema extra-solar com órbita coplanar ao plano do céu
Figura 9
Plano da órbita do exoplaneta inclinada em relação ao plano do céu

Há outros casos em que o plano da órbita do exoplaneta está inclinada em relação ao plano do céu.

Nesse caso a estrela oscila em torno do ponto focal F1 da verdadeira órbita, mas que visto aqui da Terra, esse foco será projetado no ponto F3. A órbita projetada no plano do céu terá um foco aparente (ou falso) no ponto f1. O exoplaneta nos pontos P1 e P2 terá componentes do vetor velocidade na direção da Terra, conforme podemos ver na Figura (10).

Figura 10
sistema extra-solar com órbita inclinada em relação ao plano do céu

Neste caso, a componente radial da velocidade Vr=Vsini (velocidade horizontal na Figura (10)), é para o exoplaneta. Para a estrela teremos o mesmo raciocínio, de forma que a velocidade obsevada da estrela seja:

(37) v o b s e r v a d a = v e s t r e l a sin i ,

que é a velocidade radial de aproximação ou afastamento da estrela em relação à Terra. Em muitos casos é possível determinar a inclinação do eixo de rotação da estrela hospedeira através de técnicas espectroscópicas, medindo a velocidade de rotação projetada no plano do céu e podendo obter a verdadeira velocidade de rotação ao se medir o tempo de uma rotação completa em torno do eixo de rotação da estrela hospedeira e da medida do seu raio. No sistema solar o plano das órbitas planetárias estão aproximadamente no mesmo plano do equador do Sol, isso pode ser estendido aos sistemas extra-solares, assumindo que as órbitas do exoplanetas são coplanares aos respectivos equadores de suas estrelas hospedeiras. Sendo assim é possível ter uma estimativa do ângulo de inclinação do plano da órbita extra-solar em relação ao plano do céu [1][1] Chris Kitchin, Exoplanets - Finding, Exploring and Understanding Alien Worlds (Springer, New York, 2012)..

O item fundamental no Método Doppler está no fato de que o gráfico da velocidade radial da estrela hospedeira em função do tempo é uma senoide se a órbita for circular. Fato este que se observa numa boa parte dos gráficos de velocidades radiais dos sistemas planetários [1][1] Chris Kitchin, Exoplanets - Finding, Exploring and Understanding Alien Worlds (Springer, New York, 2012).. Dessa forma, percebemos que enquanto a estrela hospedeira descreve um movimento circular uniforme (MCU) em torno do centro de massa do sistema estrela-exoplaneta, visualizamos a partir da Terra um Movimento Harmônico Simples (MHS). No trabalho elaborado por R.R. Cuzinatto et al, citado na referência [14][14] R.R. Cuzinatto, E.M. de Moares e C. Naldoni de Souza, Rev. Bras. Ens. de Física 36, 3306 (2004)., um estudo da equivalência entre MHS e MCU é analisada a partir do estudo orbital das luas de Júpiter.

Na próxima seção aplicaremos o Método Doppler para determinar a massa e os parâmetros orbitais do exoplaneta 51 Peg b.

5. Estudo do Exoplaneta 51 Peg b

Conforme vimos na seção anterior, para um sistema extra-solar onde o plano da órbita é aproximadamente perpendicular ao plano do céu é possível registrar um gráfico de medidas da velocidade radial da estrela hospedeira e medir o período para que essa estrela complete uma volta em torno do centro de massa. Por exemplo a estrela 51 Pegasi ou 51 Peg a (uma estrela do tipo do Sol na constelação de Pégaso) circula em torno de um centro de massa. Essa observação foi anunciada pela primeira vez em 5 de outubro de 1995 por Michel Mayor e Didier Queloz na conferência de Florence, que detectaram um exoplaneta, o 51 Peg b[4][4] Michel Mayor and Didier Queloz, Nature 378, 355 (1995).. O gráfico de velocidades radiais da estrela hospedeira 51 Peg a é apresentado na Figura(11).

Figura 11
MHS projetado de observações da estrela 51 Peg a. O eixo horizontal representa a fase orbital onde um ciclo corresponde a 4,231 dias. O eixo vertical representa medidas de velocidade radial

A partir de uma leitura do gráfico, percebemos que um ciclo completo, ou seja, uma volta da estrela hospedeira 51 Peg a em torno do centro de massa é T=4,2 dias e velocidade radial da estrela está em torno de 57,5 m/s. A medida da massa da estrela é obtida pelos seus dados espectrais [13][13] Bradley Carrol and Dale Ostlie, An Introduction to Modern Astrophysics (Addison-Wesley Publishing Company, Inc., Boston, 1996)., sendo que a classe espectral da estrela 51 Peg a fornece um valor em torno de m1=1,1M (muito parecida com o Sol). Sendo possível medir a velocidade radial da estrela em relação ao centro de massa, também é possível medir a massa do exoplaneta que faz a estrela balançar em torno do centro de massa. Vamos considerar que as órbitas sejam aproximadamente circulares. Com a ajuda da figura 6, vamos assumir que a distância da estrela 51 Peg a e do exoplaneta 51 Peg b ao centro de massa são, respectivamente, R1 e R2. A relação entre massas e distâncias ao centro de massa dada na Equação (5) será útil para determinarmos a massa do exoplaneta,

R 1 R 2 = m 2 m 1 .

A força gravitacional entre a estrela hospedeira e o exoplaneta dada pela Equação (15) é igual a força centrípeta sobre a estrela, a qual descreve uma órbita circular de raio R1 em torno do centro de massa,

G m 1 m 2 ( R 1 + R 2 ) 2 = m 1 v 2 R 1 ,

onde m1 é a massa da estrela, m2 é a massa do exoplaneta e v é a velocidade radial da estrela. Para sistemas planetários em geral tem-se que a distância do exoplaneta ao centro de massa é muito maior que a distância da estrela hospedeira ao centro de massa, ou seja, R2>>R1, então:

(38) m 2 = R 2 2 v 2 G R 1 .

Como R1=m2m1R2, então a Equação (38) se torna

(39) m 2 2 = m 1 R 2 v 2 G .

Da terceira lei de Kepler (32), identificamos para a órbita circular do exoplaneta: T como o período orbital e a=R2 a distância do exoplaneta ao centro de sua órbita, de acordo com a Figura (6),

T 2 R 2 3 = 4 π 2 G ( m 1 + m 2 ) ,

onde a massa da estrela é muito maior que a massa do exoplaneta. Dessa forma, temos que

T 2 R 2 3 = 4 π 2 G m 1 ,

a partir do qual chegamos a

R 2 = T 2 π 2 3 G 1 3 m 1 1 3 .

Substituindo esse valor na Equação (39), obtemos que

(40) m 2 = m 1 2 3 v T 2 π G 1 3 .

Podemos então aplicar esse resultado ao exemplo do exoplaneta 51 Peg b, e obter que:

m 2 ( 1 , 11 × 2 × 1 0 30 ) 2 3 ( 57 , 5 ) × 4 , 2 × 24 × 3600 2 π 6 , 67 × 1 0 - 11 1 3 kg m 2 9 , 3 × 1 0 26 kg

ou seja, a massa desse exoplaneta 51 Peg b é em torno de 0,466M4, (0,466 massa de Júpiter).

Também é possível medir a distância do exoplaneta ao centro de massa, pela terceira lei de Kepler (32),

T 2 R 2 3 = 4 π 2 G m 1 ,

de forma que

R 2 = T 2 3 G m 1 4 π 2 1 3 = 4 , 2 365 ano 2 3 × 1 , 11 UA 3 ano 2 1 3 R 2 = 0 , 053 UA .

A título de comparação, o planeta Mercúrio está a 0,39 UA de distância do Sol em nosso sistema solar. Diante das características do exoplaneta, obtidas a partir do Método Doppler, podemos dizer que 51 Peg b está muito mais próximo de sua estrela hospedeira do que Mercúrio está do Sol. Além disso, esse exoplaneta possui cerca de 47% da massa de Júpiter, o que significa que ele é mais massivo que Saturno. Tais informações o classifica como júpiter quente, ou seja, um planeta massivo, muito grande e que orbita demasiadamente próximo à sua estrela hospedeira.

6. Considerações Finais

Neste trabalho apresentamos uma breve aplicação do Método Doppler para detecção de exoplanetas. A apresentação da técnica foi baseada em tópicos comuns em cursos de Mecânica básica, tais como Leis de Newton, o problema de dois corpos, a Lei da Gravitação Universal, as Leis de Kepler e Efeito Doppler. Dessa forma, o método de detecção de exoplanetas pelo Método Doppler ou método da medida de velocidades radiais é uma discussão que envolve vários tópicos interdisciplinares como foi cuidadosamente discutido. Visando exemplificar o método, utilizamos como um exercício didático de aplicação, os dados orbitais da estrela hospedeira do exoplaneta 51 Peg b. Com isso, almejamos que os leitores percebam que as técnicas da astrofísica estão mais palpáveis do que parecem.

Na internet, na página Astronomy Education at University of Nebraska-Lincoln - http://astro.unl.edu/, está disponível um simulador computacional [15][15] http://astro.unl.edu/classaction/animations/extrasolarplanets/radialvelocitysimulator.html.
http://astro.unl.edu/classaction/animati...
, onde o estudante pode simular a massa da estrela hospedeira, massa e distância do exoplaneta à estrela, etc, e compreender melhor como um exoplaneta balança a estrela hospedeira fazendo-a produzir um gráfico do tipo da Figura (11). Na página da internet exoplanets.org (http://exoplanets.org/table?datasets=explorer) existe uma tabela com dados de muitos exoplanetas e é possível selecionar os exoplanetas que foram descobertos pelo método das velocidades radiais (na opção Example Tables and Save escolha RV Planets). Nessa tabela é possível obter alguns gráficos de velocidades radiais de estrelas hospedeiras como o da Figura (11). O professor e/ou estudante pode obter um desses gráficos e utilizá-los para fazer exercícios obtendo a massa e a distância do exoplaneta à estrela hospedeira e ao final comparar as respostas obtidas com os dados fornecidos pela tabela de dados da página [16][16] http://exoplanets.org/.
http://exoplanets.org/...
. Existem várias páginas na internet que abordam o tema de exoplanetas, listamos alguns nas referências para uma introdução às recentes descobertas [16[16] http://exoplanets.org/.
http://exoplanets.org/...
18[18] https://exoplanets.nasa.gov/.
https://exoplanets.nasa.gov/...
]. Em trabalhos futuros, pretendemos analisar pedagogicamente outras técnicas de detecção de exoplanetas.

Referências

  • [1]
    Chris Kitchin, Exoplanets - Finding, Exploring and Understanding Alien Worlds (Springer, New York, 2012).
  • [2]
    S. Seager, Exoplanets (University of Arizona Press, Tucson, 2010).
  • [3]
    M. Olivier, T. Encrenaz, F. Roques, F. Selsis and F. Casoli, Planetary Systems: Detection, Formation and Habitability of Extrasolar Planets (Springer-Verlag, Berlin, 2008).
  • [4]
    Michel Mayor and Didier Queloz, Nature 378, 355 (1995).
  • [5]
    John W. Mason (Editor), Exoplanets - Detection, Formation, Properties, Habitability (Springer & Praxis Publishing Ltd, Chichester, UK, 2008).
  • [6]
    Michel Mayor and PierreYves Frei, New Worlds in the Cosmos - The Discovery of Exoplanets (Cambridge University Press, Cambridge, 2003).
  • [7]
    Keith R. Symon, Mecânica (Editora Campus, Rio de Janeiro, 1982).
  • [8]
    W. Greiner, Classical Mechanics - Point Particles and Relativity (Springer, New York, 2002).
  • [9]
    Louis Leithold, O Cálculo com Geometria Analítica (Editora Harbra, Goiânia, 1994) 3ª ed.
  • [10]
    H.D. Young e R.A. Freedman, Física IV, Sears & Zemansky (Pearson, São Paulo, 2009), 12ª ed.
  • [11]
    S.T. Thornton and A. Rex Modern Physics for Scientists and Engineers (Cengage Learning, Boston, 2013), 4th ed.
  • [12]
    Arnab Rai Choudhuri, Astrophysics for Physicists (Cambridge University Press, 2010).
  • [13]
    Bradley Carrol and Dale Ostlie, An Introduction to Modern Astrophysics (Addison-Wesley Publishing Company, Inc., Boston, 1996).
  • [14]
    R.R. Cuzinatto, E.M. de Moares e C. Naldoni de Souza, Rev. Bras. Ens. de Física 36, 3306 (2004).
  • [15]
    http://astro.unl.edu/classaction/animations/extrasolarplanets/radialvelocitysimulator.html
    » http://astro.unl.edu/classaction/animations/extrasolarplanets/radialvelocitysimulator.html
  • [16]
    http://exoplanets.org/
    » http://exoplanets.org/
  • [17]
    http://www.planetary.org/explore/projects/exoplanets/
    » http://www.planetary.org/explore/projects/exoplanets/
  • [18]
    https://exoplanets.nasa.gov/
    » https://exoplanets.nasa.gov/

Disponibilidade de dados

Citações de dados

http://exoplanets.org/

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    27 Jul 2016
  • Revisado
    01 Set 2016
  • Aceito
    13 Set 2016
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