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Hesio Cordeiro: uma justa homenagem

Em 2004 foi publicado na Physis o artigo de Hesio Cordeiro intitulado “O Instituto de Medicina Social e a Luta pela Reforma Sanitária: Contribuição à História do SUS” (CORDEIRO, 2004CORDEIRO, H. A. O Instituto de Medicina Social e a Luta pela Reforma Sanitária: Contribuição à História do SUS. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 14, n. 2, p. 343-362, 2004.). Nesse artigo, escrito 16 anos após o direito à saúde se tornar cláusula pétrea da Constituição Federal de 1988, Hesio termina propondo dez pontos nos quai o Instituto de Medicina Social (IMS) da UERJ e as instituições de ensino e pesquisa em Saúde Coletiva poderiam contribuir para a produção de conhecimento associado à formação e às práticas inovadoras para assegurar qualidade e equidade. Entre esses pontos, merecem destaque: “reconsiderar as normas do SUS à luz das necessidades dos cidadãos e cidadãs, tornando-as ágeis e mais simples para evitar a hipertrofia tecnoburocrática de um Estado cujas relações sociais e técnicas se orientam pelo segredo e pela pouca transparência, além da fragmentação dos interesses dos grupos e classes sociais” e “dar contribuição para elaborar um projeto de ciência e tecnologia em saúde, envolvendo a gestão, o uso de novos procedimentos, insumos e métodos baseados em evidências científicas e resultados”. Essas duas recomendações de Hesio não perderam o seu valor e agora, e mais do que nunca, seguem vivas e deixam um recado claro para todos nós que dedicamos nossas vidas à saúde coletiva.

Neste número que é lançado 17 anos após o artigo de 2004, a Physis publica o Dossiê Hesio Cordeiro com comentários que mostram o vigor e a criatividade de nosso mestre por onde ele passou. Resgatam com muita verdade e delicadeza o legado de Hesio, não só pelo que ele nos ensinou, mas também pelo que construiu, como pode ser observado na breve cronologia1 1 O quadro cronológico aqui apresentado foi elaborado com base em informações retiradas de: <http://cebes.org.br/2020/11/homenagens-do-cebes-a-hesio-cordeiro-um-dos-idealizadores-e-construtores-do-sus/>; <https://periodicos.fiocruz.br/pt-br/content/hesio-cordeiro-e-sa%C3%BAde-coletiva-uma-homenagem-sua-trajet%C3%B3ria-0>; <Cv Lattes Hesio de Albuquerque Cordeiro> e <https://cee.fiocruz.br/?q=node/1276>. apresentada ao final deste editorial.

Os depoimentos aqui presentes realçam a trajetória de Hesio nos diversos espaços em que atuou. Deixam bem marcados seu investimento na formação de profissionais críticos e comprometidos com o desenvolvimento do país, assim como seus passos firmes para garantir o acesso à saúde com qualidade para toda a população.

O conhecido artigo “A questão democrática e a saúde”, de Hesio Cordeiro, José Luís Fiori e Reinaldo Guimarães, aqui republicado, foi escrito em 1976 e publicado em 1980 pela Revista do CEBES (CORDEIRO; FIORI; GUIMARÃES, 1980CORDEIRO, H. A.; FIORI, J. L.; GUIMARÃES, R. A questão democrática e a saúde. Saúde em Debate, n. 9, 1980.). Esse texto se transformou em um “verdadeiro manifesto do movimento sanitário brasileiro”, como afirma Fiori em seu texto de apresentação, também incluído neste número. Foi a partir desse texto de 1976 que Hesio e colaboradores contribuíram publicamente com uma reflexão que serviu de base para os trabalhos da VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986.

Guimarães, em seu comentário, descreve de forma detalhada o papel decisivo de Hesio na criação do Instituto de Medicina Social da UERJ no final dos anos 1960. Foi em plena ditatura militar que Hesio e outros dois médicos formados pela Faculdade de d Ciências Médicas (FCM) da UERJ, Nina Pereira Nunes e Moysés Szklo, com apoio de Piquet Carneiro, titular de clínica médica da FCM, colocaram em prática um projeto ambicioso para a época. Como mostra Fiori, o Instituto foi capaz de trazer questões sociais para dentro de uma Faculdade de Medicina, oferecendo aos alunos formação teórica e crítica política.

Ao mesmo tempo em que se dedicava à estruturação do IMS, Hesio não cuidou apenas de seu trabalho como professor e pesquisador, mas dividiu seu tempo como um ativista para a garantia do direito à saúde. Este aspecto fica bem claro no artigo de Rodrigues, que resgata a importância de Hesio na orientação da Política Nacional de Saúde, relatando sua participação no I Simpósio sobre Política Nacional de Saúde da Câmara de Deputados em 1979.

Com muita ênfase, Noronha, Temporão e Sayd, em seus comentários (que no caso de Sayd tomam os contornos de uma resenha), traçam a importância de Hesio na construção do Sistema Único de Saúde (SUS) e como teórico da reforma sanitária brasileira. Seguindo a trajetória de Hesio como mestre, Moraes descreve em seu depoimento a importância que ele teve na formação de gerações de sanitaristas, inovando conteúdos em cursos de graduação e de pós-graduação.

Com a dupla missão de gestor e professor, Hesio sempre se preocupou em avançar o conhecimento na área de saúde, mantendo seu olhar atento para o coletivo e o indivíduo. É esta a marca que o IMS mantém até hoje. Não há dúvida de que isto foi possível por ser Hesio uma pessoa tão especial que escutava e acolhia todos, como descreve Rodrigues dos Santos em seu depoimento que trata do legado humanista e civilizatório de Hesio.

Muito nos orgulha a nomeação do IMS como Instituto de Medicina Social Hesio Cordeiro. Nosso homenageado merece o título dado por Temporão: um gigante da Saúde Coletiva!

Referências

  • CORDEIRO, H. A. O Instituto de Medicina Social e a Luta pela Reforma Sanitária: Contribuição à História do SUS. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 14, n. 2, p. 343-362, 2004.
  • CORDEIRO, H. A.; FIORI, J. L.; GUIMARÃES, R. A questão democrática e a saúde. Saúde em Debate, n. 9, 1980.
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    O quadro cronológico aqui apresentado foi elaborado com base em informações retiradas de: <http://cebes.org.br/2020/11/homenagens-do-cebes-a-hesio-cordeiro-um-dos-idealizadores-e-construtores-do-sus/>; <https://periodicos.fiocruz.br/pt-br/content/hesio-cordeiro-e-sa%C3%BAde-coletiva-uma-homenagem-sua-trajet%C3%B3ria-0>; <Cv Lattes Hesio de Albuquerque Cordeiro> e <https://cee.fiocruz.br/?q=node/1276>.

Período/ano Fato 1942 Nasce em Juiz de Fora 1960-1965 UEG/UERJ - Formação em Medicina 1966-1967 Residência em Clínica Médica na UERJ 1967-1971 Médico na UERJ 1970 Um dos fundadores do IMS 1971-1978 Consultor da OPAS (Argentina, Peru, Equador, Venezuela, Costa Rica, Nicarágua, Hounduras, México e República Dominicana) 1971 Docente do IMS 1974 Criação do Programa de Pós-Graduação do IMS 1977 "A Questão Democrática e a Saúde" (Hesio, Fiori e Reinaldo) 1978 Mestre em Saúde Coletiva pelo IMS; orientadora: Maria Andrea Loyola Leblond 1979 I Simpósio sobre Saúde na Câmara dos Deputados 1979-1981 Doutor em Medicina Preventiva pela Faculdade de Medicina da USP, orientadora: Maria Cecília Ferro Donnangelo 1980 Publica o livro A Indústria da Saúde no Brasil, pela editora Graal 1981 Publica o livro La pratica Médica em America Latina pela Universidade Autônoma de Santo Domingo, em coautoria com H. Mercer. 1983-1985 Presidente da Abrasco 1983-1984 Diretor do IMS 1984 Publica o livro Empresas Médicas: as transformações capitalistas da prática médica pela Editora Graal 1985-1988 Presidente do INAMPS 1986 Membro da Comissão Organizadora da 8ª Conferência Nacional de Saúde 1988 Doutor honoris causa pela ENSP 1990 Candidato a deputado federal pelo PDT 1991 Publica o livro Sistema Único de Saúde pela Ayuri Ed./ABRASCO 1992-1996 Reitor da UERJ 1993-1995 Presidente da Associação Brasileira das Universidades Estaduais e Municipais - ABRUEM 1996 a 2011 Consultor da Fundação Cesgranrio - coordenador de saúde 1996 a 1997 Conselheiro do Conselho Nacional de Educação (CNE) 1996 Aposenta-se do IMS/UERJ 1997 a 1999 Presidiu o Conselho Nacional de Educação (CNE) 1999 Secretário de Educação do Estado do Rio de Janeiro 2000-2006 Coordenou o curso de Medicina da Universidade Estácio de Sá 2003-2005 Criou o 1º Programa de Pós-Graduação em Saúde da Família da Universidade de Sá 2005-2015 Coordenou o Mestrado Profissional em Saúde da Família da Universidade Estácio de Sá 2005 Publica a 2ª edição do livro Sistema Único de Saúde pela Editora Rio 2007-2010 Diretor de gestão da ANS 2007 Medalha do Mérito de Oswaldo Cruz- categoria ouro, Ministério da Saúde 2009 Título de Cidadão do Estado do Rio de Janeiro, Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro projeto de Resolução 1105/2009. 2011 Comenda Sergio Arouca, Conselho Federal de Medicina. 2014 Recebe o título de Doutor honoris causa pela Fiocruz 2020/nov Falecimento

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2021
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