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As ciências na formação do Brasil entre 1822 e 2022: história e reflexões sobre o futuro

RESUMO

Este artigo traça um panorama da história da atuação das ciências no processo histórico de formação do Brasil como nação. Entre 1822 e 2022, os cientistas deram contribuições cruciais ao debate sobre constituição do Estado; identidade nacional; cidadania; visões sobre populações; políticas públicas de saúde e educação; projetos de criação de universidades; circulação internacional de saberes; soberania, desenvolvimento nacional, inserção do Brasil no mundo e convivência entre o atraso e a modernidade. Sugere-se que esses temas centrais em 1822 e 1922 devem ser atualizados na agenda do Bicentenário da Independência. Tal atualização requer uma análise do processo histórico em que se destacam tendências acentuadas pela pandemia de Covid-19: a importância das ciências, e da sustentabilidade da atividade científica, na resposta à crise e aos desafios contemporâneos; a persistência das desigualdades, inclusive as relacionadas ao desenvolvimento científico e tecnológico, e a questão ambiental, transversal e incontornável para todas as áreas do conhecimento.

PALAVRAS-CHAVE:
Bicentenário da Independência do Brasil; História das Ciências; Ciências na formação nacional; Crise da ciência; Desafios da ciência no futuro

ABSTRACT

This article outlines the role of science in the historical process of formation of Brazil as a nation. Between 1822 and 2022, scientists made crucial contributions to the debate about the constitution of the State, national identity, citizenship, views on populations, public health and education policies, university creation projects, international circulation of knowledge, sovereignty, national development, the insertion of Brazil in the world, and coexistence between backwardness and modernity. We suggest that these central themes in 1822 and in 1922 should be amended in the agenda of the Bicentennial of Independence. This requires an analysis of the historical process in which trends enhanced by the covid-19 pandemic stand out, namely, the importance of science and the sustainability of scientific activity in responding to the crisis and other contemporary challenges; the persistence of inequalities, including those related to scientific and technological development; and the environmental issue, which is transversal and unavoidable in every area of knowledge

KEYWORDS:
Brazil’s Bicentennial of Independence; History of science; Sciences in nation-building; Crisis of science; Future challenges of science

Introdução

Em 7 de setembro de 1922, nos 100 anos da Independência do Brasil, o governo do presidente Epitácio Pessoa inaugurou uma grande exposição internacional no Rio de Janeiro, então capital do país, que durou até abril do ano seguinte. Marcada por grande monumentalidade, a Exposição era iniciada, na Av. Rio Branco, por um portal de 33 metros de altura, e abarcava 2.500 metros entre 15 pavilhões estrangeiros e nacionais, erigidos como palácios a atestar as riquezas naturais, a capacidade de trabalho dos brasileiros, o lugar do Brasil no rol dos países modernos, e os progressos da ciência e da indústria no primeiro centenário da nação independente. Ocupou parte expressiva do centro da cidade do Rio de Janeiro, desde a região do antigo Palácio Monroe, na Cinelândia, até a Praça XV e a Praça Mauá. A Exposição exaltava o passado do país como pacífico e consensual percurso em direção ao modelo da modernidade europeia, mas ocorria em meio à ascensão do movimento operário, de rebeliões militares, como o tenentismo, da emergência de vanguardas estéticas e intelectuais, preconizadas na Semana de Arte Moderna, e, sobretudo, de fortes divisões políticas entre as oligarquias nacionais; crise que se estenderia por toda a década de 1920 (Motta, 1992MOTTA, M. S. da. A nação faz 100 anos: a questão nacional no Centenário da Independência. Rio de Janeiro: Editora da FGV, 1992., Bicalho, 2008BICALHO, M. F. Redimensionando a Independência. Tempo, Rio de Janeiro, v.12, n.24, p.194-200, 2008.; Sant´Ana, 2008).

Quase 100 anos depois de 1922, estamos às voltas com nova efeméride do imaginário político nacional, o Bicentenário da Independência do Brasil. O contexto, apesar das evidentes especificidades históricas, é também de crise política, econômica e institucional. A agenda de 2022, ainda largamente indefinida, prevê a reconstrução do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, destruído em incêndio em 2018, e a reinauguração do Museu do Ipiranga em São Paulo. Nos meios acadêmicos e intelectuais, é enorme a resistência ao sentido de comemoração que o marco temporal inspirou há 100 anos, a invisibilizar as crises então latentes. Que Independência, afinal, tivemos? Que cidadania fomos capazes de construir em 200 anos? - essas são algumas perguntas que norteiam o balanço inicial sobre o Bicentenário, com juízos contrários ao discurso ufanista que marcou o Centenário do Brasil independente.

A história e a memória do 7 de setembro também são debates estimulados, nos meios acadêmicos, para 2022. São objeto de críticas a visão da independência a partir do grito do Ipiranga, ou como um único episódio emblemático ou momento fundacional; a perspectiva da mudança histórica conduzida, de modo ordeiro, por grandes personagens e heróis nacionais; as narrativas nacionais linea- res; e mesmo a própria definição da nação como constituída por características unificadoras e homogêneas. A historiografia atual, por outro lado, considera que o processo da independência foi longo e complexo (Soares; Scarelli, 2021SOARES, G. P.; SCARELLI, R. D. Bicentenários das independências latino-americanas: disputas narrativas e construção da memória. Revista USP, São Paulo, n.130, p.9-13, julho/agosto/setembro 2021.). Defende que ultrapassou, em muito, o ano de 1822, e esteve associado a diferentes projetos nativos e revoltas em províncias diversas. Ressalta ainda que os acontecimentos políticos daqueles anos devem ser localizados no quadro de um movimento atlântico de contestação dos laços coloniais, que conectou “revolucionários de Espanha, Portugal, Estados Unidos, diversas cidades ibero-americanas e da América portuguesa” (Brilhante, 2020BRILHANTE, N. O Bicentenário da Independência e os usos políticos do 7 de setembro, segundo esta historiadora (Entrevista): Bruno Leal entrevista Neuma Brilhante. In: Café História. 2020. Disponível em: <https://www.cafehistoria.com.br/o-bicentenario-da-independencia-e-os-usos-politicos-do-7-de-setembro-segundo-esta-historiadora/>. Acesso em: 7 set. 2021.
https://www.cafehistoria.com.br/o-bicent...
), em discussões pronunciadas sobre séries de categorias e processos: Estado, soberania, liberdades individuais, constitucionalismo, pactos sociais, direitos, igualdade, regras eleitorais, a adoção do regime monárquico ou republicano, da centralização ou do federalismo, as tensões entre a capital e as províncias, as cidades e o campo, a definição dos princípios da representatividade política e da cidadania em um país escravocrata (Soa- res; Scarelli, 2021; Carvalho et al., 2014CARVALHO, J. M. de et al. (Org.) Guerra literária. Panfletos da Independência (1820-1823). Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014.; Carvalho; Neves; Basile, 2012; Palacios, 2009PALACIOS, G. (Coord.) La nación y su historia. Independencias, relato historiográfico y debates sobre la nación: América Latina, siglo XIX. México, D.F.: El Colegio de México, Centro de Estudios Históricos, 2009.; Carvalho, 2007). A seguir a historiadora Neuma Brilhante (2020), “A independência do modo como a conhecemos era um dos diferentes projetos e futuros possíveis do Reino do Brasil daquele início dos oitocentos”.

Outras correntes historiográficas demonstram ainda a importante participação das ciências e dos cientistas nessas disputas entre diferentes projetos de país nos últimos 200 anos.

A história das ciências no Brasil, como campo historiográfico constituído a partir dos anos 1980, reflete algumas transformações que ocorreram nos estudos históricos e sociológicos da ciência no mesmo período. Os Science Studies, ou Estudos Sociais de Ciência e Tecnologia, analisavam a influência de aspectos extracientíficos no processo de produção de conhecimento, que passou a ser entendido como uma construção social, como um tipo de cultura (Dantes, 2001DANTES, M. A. M. (Org.) Espaços da Ciência no Brasil: 1800-1930. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2001. p.13-22.). Essa historiografia era motivada também pelos impactos do artigo de George Bassala, “The spread of western Science”, publicado na Science em 1967. Bassala, preocupado em refletir sobre a produção da ciência em regiões com passado colonial, sugeriu que esses países, tidos como periféricos, haviam sido mero receptores e repetidores de teorias e práticas exógenas. Essa abordagem foi muito criticada, mas estimulou estudos sobre os mecanismos de difusão científica, sobre as instituições historicamente criadas para a produção e o exercício da cultura científica (academias letradas, sociedades científicas, universidades, laboratórios, periódicos, burocracia científica e agências de fomento), assim como sobre o estabelecimento de tradições científicas locais.

Um importante resultado dessa visão crítica foi enfatizar o tema da ciência nacional e da relação entre nacionalismo e ciência; fortes aspectos da discussão sobre a especificidade da produção científica em diferentes contextos históricos e países (Kropf; Hochman, 2011KROPF, S. P.; HOCHMAN, G. From the Begginings: Debates on the History of Science in Brazil. The Hispanic American Historical Review, v.91, p.391-408, 2011.). Outro desdobramento é a abordagem da ciência como produção de conhecimento multicêntrica, com ênfase em redes de comunicação, alianças, intercâmbios e hibridismo cultural; circulação de ideias, pessoas e artefatos tecnológicos; sincronias, reciprocidade e interseções. Marca importante da historiografia das ciências na análise da formação do Brasil, portanto, é a análise dos processos históricos e tradições locais desenvolvidos na América portuguesa, mas também da intensa circulação de saberes entre Américas e Europa.

Neste artigo, traçamos um panorama da história da atuação das ciências no processo histórico de formação do Brasil como nação. Entre 1822 e 2022, os cientistas deram contribuições cruciais ao debate sobre constituição do Estado; identidade nacional; cidadania; visões sobre populações; políticas públicas de saúde e educação; projetos de criação de universidades; circulação internacional de saberes; soberania, desenvolvimento nacional, inserção do Brasil no mundo e convivência entre o atraso e a modernidade. Sugerimos que esses temas centrais em 1822 e 1922 devem ser atualizados na agenda do Bicentenário da Independência. Tal atualização requer uma análise do processo histórico em que se destacam tendências acentuadas pela pandemia de Covid-19: a importância das ciências, e da sustentabilidade da atividade científica, na resposta à crise e aos desafios contemporâneos; a persistência das desigualdades, inclusive as relacionadas ao desenvolvimento científico e tecnológico, e a questão ambiental, transversal e incontornável para todas as áreas do conhecimento.

Da América portuguesa ao Brasil independente

O contexto dos descobrimentos europeus do século XVI transformou a natureza americana em importante objeto de estudo colonial, e deu início a um movimento de acumulação e divulgação de informações sobre a fauna, a flora e a geografia americanas. A colonização e a conquista da América exigiam a produção de conhecimento sobre os produtos naturais e as características físicas e climáticas do Novo Mundo, bem como sobre a adaptação dos europeus aos trópicos. Neste momento, os produtores de conhecimento apresentavam as mais diversas formações: cosmógrafos, teólogos, filósofos naturais, médicos, negociantes e missionários (Gesteira, 2004GESTEIRA, H. M. A cura do corpo e a conversão da alma - conhecimento da natureza e conquista da América, séculos XVI e XVII. TOPOI, v.5, n.8, p.71-95, jan.-jun. 2004.; Arnold, 2001ARNOLD, D. La naturaleza como problema histórico: el medio, la cultura y la expansión de Europa. México: Fondo de Cultura Econômica, 2001.).

No que se refere ao Estado Português e suas colônias, os séculos XVI e XVII foram caracterizados por uma certa dispersão no processo de acumulação do conhecimento justamente pela dificuldade do poder central em exercer um controle absoluto do enorme banco de dados que estava em formação a partir da conquista. No entanto, a partir da segunda metade do século XVIII, como parte de um projeto de fomento econômico da Coroa portuguesa, foram promovidas redes de informações sobre os domínios lusitanos, com rica produção e circulação das múltiplas experiências atlânticas e dos domínios coloniais do ultramar por meio de inventários, memórias, relatórios científicos e correspondências (Domingues, 2001_______. A Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional e as Ciências Naturais no Brasil Império. In: DANTES, M. A. (Org.) Espaços da Ciência no Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2001.; Kury, 2004KURY, L. Homens de ciência no Brasil: impérios coloniais e circulação de informações (1780-1810). História, Ciências, Saúde-Manguinhos, Rio de Janeiro, v.11, supl.1, p.109-29, 2004.; Pombo, 2015POMBO, N. A cidade, a universidade e o Império: Coimbra e a formação das elites dirigentes (séculos XVII-XVIII). Intellèctus, ano XIV, n.2, p.1-20, 2015.). Eram realizados estudos em Angola, Moçambique, Cabo Verde e na América portuguesa, onde, especialmente, os ilustrados produziam levantamentos acerca de produtos comercialmente interessantes e não conhecidos ou explorados. Dentre as medidas para aumentar a rentabilidade da colônia luso-brasileira estiveram a realização de expedições de naturalistas para desbravar o território e o apoio à criação de associações científicas que tinham como objetivo difundir o saber científico sobre a natureza brasileira, como a Academia Científica do Rio de Janeiro e a Sociedade Literária do Rio de Janeiro (Marques, 2005MARQUES, V. R. Beltrão. Escola de homens de ciências: a Academia Científica do Rio de Janeiro, 1772-1779. Educar em Revista, Curitiba, n.25, p.39-57, 2005.; Fonseca, 2012FONSECA, M. R. F. da. A institucionalização das práticas científicas na Corte do Rio de Janeiro. In: KURY, L.; GESTEIRA, H. (Org.) Ensaios de história das ciências no Brasil. Das Luzes à nação independente. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2012. p.293-305.). O estabelecimento dessas redes de informações acerca dos domínios coloniais nas últimas décadas do século XVIII estava relacionado à difusão do Iluminismo na Europa, pois esse não foi um movimento apenas no campo das ideias, e sim um conjunto de transformações na esfera das práticas administrativas executadas pelo Estado (Kury, 2004).

O ideário iluminista de crença no poder da razão, única e universal, e na função pragmática da ciência a serviço do progresso material estava presente na política promovida pela Coroa portuguesa que fomentava a realização de atividades de pesquisa e de exploração que produzissem conhecimentos que pudessem ser úteis. Dentre esses, podemos destacar os voltados para a produção de matérias-primas para a incipiente industrialização de Portugal e, sobretudo, os relacionados à renovação da agricultura por meio de novas técnicas rurais que melhorassem a produção, bem como a introdução e domesticação de espécies, sobretudo vegetais, na Colônia, e que fossem de elevado interesse comercial para a Metrópole. Essa política de promoção da ciência, como instrumento de intervenção na realidade brasileira, estimulou o estudo das ciências naturais entre os luso-brasileiros, caracterizou o perfil aplicado do conhecimento produzido como um traço do exercício da atividade científica existente na América Portuguesa desde o século XVIII, e marcou o início do processo de institucionalização das ciências no Brasil.

A historiadora Maria Odila da Silva Dias (2005DIAS, M. O. da S. Aspectos da Ilustração no Brasil. In: ___. A interiorização da metrópole e outros estudos. São Paulo: Alameda, 2005. p.39-126.) analisou aspectos da mentalidade da geração de brasileiros formados nas principais universidades europeias, especialmente na Universidade de Coimbra, a partir das últimas décadas do século XVIII. Ao retornarem ao Brasil, esses homens buscavam adaptar o ideário iluminista ao contexto local, e estavam especialmente voltados para a corrente de pensamento que estabelecia relações pragmáticas entre os intelectuais e a sociedade. Dias considerou a influência da cultura do Iluminismo europeu sobre os intelectuais brasileiros e a sua contribuição para a elaboração de características que foram conformadoras da prática científica no Brasil. Esses acreditavam que os estudos científicos deveriam servir ao progresso material e às melhorias nas condições de vida. Viam-se como sábios e homens práticos, aos quais caberia construir a felicidade com inventos e descobertas importantes para o bem-estar, a saúde e o proveito da sociedade. Buscavam ser úteis, ocupando-se dos problemas de sua terra e dedicando seus estudos principalmente para a agricultura (Dias, 2005). Na sua visão, o “exame da natureza” era de extrema utilidade aos Estados (Pombo, 2015POMBO, N. A cidade, a universidade e o Império: Coimbra e a formação das elites dirigentes (séculos XVII-XVIII). Intellèctus, ano XIV, n.2, p.1-20, 2015.).

A política de Estado que fomentou os estudos científicos de finalidade prática, especialmente de mineralogia e história natural, também promoveu a participação dos ilustrados brasileiros na vida pública e na política administrativa da Coroa. Nesse contexto foram criadas instituições científicas como o Jardim Botânico do Rio de Janeiro (1808) e o Museu Nacional (1818), que surgiram com o propósito de aplicação da ciência na resolução de demandas práticas colocadas pelos problemas que impediam a expansão da economia, sobretudo o desenvolvimento da agricultura.

Na sua carreira de homens públicos, preocuparam-se estritamente em fomentar o progresso técnico e científico e em zelar pela conservação e boa aplicação dos recursos minerais e vegetais da América Portuguesa. Os trabalhos práticos e os estudos pragmáticos que esses ilustrados luso-brasileiros realizaram em fins do século XVIII resultaram em preocupação com a realidade brasileira, e estão relacionados ao processo de formação de laços de identidade com a terra natal. Embora o surgimento da consciência nacional só tenha vindo a ocorrer posteriormente, em meados do século XIX, a pesquisa científica promovida nas últimas décadas do século XVIII foi fundamental para despertar, nos ilustrados, a ideia de pátria. Se o projeto de Império luso-brasileiro foi gestado na Universidade de Coimbra, a construção da ideia de Brasil também tem origem nessa instituição, a partir das afinidades eletivas entre processo político e atividade científica (Pombo, 2015POMBO, N. A cidade, a universidade e o Império: Coimbra e a formação das elites dirigentes (séculos XVII-XVIII). Intellèctus, ano XIV, n.2, p.1-20, 2015.; Carvalho, 2006CARVALHO, J. M. de. A construção da ordem: a elite política imperial; Teatro de Sombras: a política imperial. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; Relume-Dumará, 2006.; Dias, 2005DIAS, M. O. da S. Aspectos da Ilustração no Brasil. In: ___. A interiorização da metrópole e outros estudos. São Paulo: Alameda, 2005. p.39-126.). Esses homens de ciência adaptaram a cultura ilustrada da Europa às condições de seu meio, forjaram as bases das ideias de independência e atuaram nas manifestações progressistas e modernizadoras do Brasil durante o Império. Como afirma o historiador José Murilo de Carvalho (2006), a formação das elites políticas, que conduziram o Brasil imperial e independente, se deu na Universidade de Coimbra. Deram início ao processo de institucionalização das ciências naturais no Brasil e foram os artífices da autonomia política do Brasil.

As ciências na formação do novo Estado Nacional

Nas décadas após a proclamação da Independência, o processo de consolidação e institucionalização das atividades científicas seguiu ocorrendo atrelado ao projeto político de desenvolvimento do potencial econômico do Brasil. Com a criação do Estado Nacional e o aprofundamento da política econômica baseada na produção agrícola, aumentou o investimento estatal nas ciências naturais durante o século XIX (Domingues, 1995DOMINGUES, H. M. B. Ciência um caso de política: ciências naturais e agricultura no Brasil Império. São Paulo, 1995. Tese (Doutorado em História Social) -- Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo.; Bediaga, 2011BEDIAGA, B. Marcado pela própria natureza: o Imperial Instituto Fluminense de Agricultura e as ciências agrícolas (1860 a 1891). Campinas, 2011. Tese (Doutorado) - Instituto de Geociências, Universidade Estadual de Campinas.). Assim ocorreu a passagem do projeto imperial português de revitalização econômica da Coroa para uma visão de desenvolvimento da economia do Brasil enquanto nação pós-independente.

A relação entre ciência, conformação da consciência nacional e formação do Estado fica clara na análise dos esforços concretos de engenheiros e naturalistas que, em meados do século XIX, atuaram na construção do Império. A Comissão Científica de Exploração (1859-1861) pode ser vista como parte do projeto de construção do Estado Imperial. Em um movimento de “expansão para dentro”, essa comissão, organizada pelo Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, e que integrava as atividades científicas do Museu Nacional do Rio de Janeiro, foi encarregada de explorar o interior de províncias do Norte e Nordeste do Brasil e pretendia contribuir para o conhecimento e a manutenção da indivisibilidade e integralidade do território. A Comissão Científica de Exploração apresentava instruções ambiciosas que sinalizavam amplos programas disciplinares adaptados ao que os representantes das elites científicas da Corte consideravam as urgências do país. Entre os objetivos da Comissão estava o mapeamento botânico, geológico, mineralógico, astronômico e geográfico, bem como das condições meteorológicas e da distribuição das populações indígenas. Pretendia-se contribuir para o incremento da agricultura por meio do levantamento das condições climáticas e dos solos, do estudo da topografia dos terrenos e das análises acerca da potencialidade da vegetação e da disponibilidade de água subterrânea (Lopes, 2009bLOPES, M. M. A Comissão Científica de Exploração: uma “expansão para dentro”. In: KURY, L. (Org.) Comissão Científica do Império (1859-1861). Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Editora, 2009b.; Kury, 2009_______. Comissão Científica do Império. Andrea Jakobsson Estúdio, 2009.). As viagens científicas na ocasião eram uma importante etapa de formação de naturalistas, colaboravam com o fortalecimento da infraestrutura dos museus de história natural, e promoviam o conhecimento e a exploração do território do país em formação.

Nos museus eram reunidas e classificadas as coleções, organizadas as excursões científicas para conhecimento do território, atendidas solicitações de órgãos públicos, estabelecidas prioridades de investigação, realizados cursos e palestras relacionados à educação em ciências naturais e promovidos intercâmbios científicos. O Museu Nacional se destacava como centro de pesquisa pela produção científica e pela pesquisa experimental (Lopes, 2009aLOPES, M. M. O Brasil descobre a pesquisa científica: as ciências naturais e os museus no século XIX. 2.ed. São Paulo: Hucitec; UnB, 2009a.).

A partir de 1860, além da consolidação do Museu Nacional, foram criados museus nas províncias com coleções de ciências naturais, arqueológicas, etnográficas, históricas e artísticas. Nesses espaços se destacavam as iniciativas de uma emergente comunidade científica nacional que disputava apoio político e mecenato imperial (Lopes, 2009aLOPES, M. M. O Brasil descobre a pesquisa científica: as ciências naturais e os museus no século XIX. 2.ed. São Paulo: Hucitec; UnB, 2009a.; Sanjad, 2010SANJAD, N. O Museu Paraense entre o Império e a República, 1866-1907. In: HEIZER, A.; VIDEIRA, A. A. P. (Org.) Ciência, civilização e república nos trópicos. Rio de Janeiro: Mauad/Faperj, 2010. v.1, p.305-25.).

A exploração científica, que havia começado como um empreendimento europeu e sinônimo de exploração colonial, foi apropriada pelos brasileiros seguindo uma lógica de busca pela autossuficiência econômica nacional. Nessa chave foram criadas, ao longo do século XIX, instituições como a Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional (1827) e o Instituto Imperial Fluminense de Agricultura (1860). Tanto a Sociedade Auxiliadora quanto o Instituto Imperial fizeram parte da política governamental capitaneada pelo Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, criado em 1860, e que ambicionava diversificar e aperfeiçoar a agricultura do país. Sob a alçada desse ministério estavam todas as atividades que diziam respeito à terra, desde as instituições burocráticas, até aquelas voltadas à pesquisa científica e sua divulgação (Domingues, 2001_______. A Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional e as Ciências Naturais no Brasil Império. In: DANTES, M. A. (Org.) Espaços da Ciência no Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2001.; Bediaga, 2011BEDIAGA, B. Marcado pela própria natureza: o Imperial Instituto Fluminense de Agricultura e as ciências agrícolas (1860 a 1891). Campinas, 2011. Tese (Doutorado) - Instituto de Geociências, Universidade Estadual de Campinas.).

Essa tradição de aliança entre ciência e Estado em prol da agricultura esteve presente ao longo dos séculos XIX e XX, conduziu o processo de especialização das ciências agrícolas e instituiu políticas de conservação da natureza (Pádua, 2002PÁDUA, J. A. P. Um sopro de destruição: pensamento político e crítica ambiental no Brasil escravista (1786-1888). Rio de Janeiro: Zahar, 2002.). Nesse sentido, os marcos políticos não produziram rupturas, apenas novos arranjos, e o Estado foi importante ator nesses processos. Nos primeiros anos do período republicano, o Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio (Maic) continuou funcionando como um lócus de produção de conhecimento científico voltado para um melhor aproveitamento dos recursos naturais na agricultura. O ideal de uma agricultura racional para promover o aumento e a diversificação da produção agrícola era o lema dos institutos científicos que estavam sob a tutela do Maic. A cultura de um único produto para exportação, o mal cultivo e o alto custo da produção no país eram apontados como obstáculos ao desenvolvimento da agricultura e a consequente prosperidade econômica do país. Cabia à ciência desenvolver meios para romper com a rotina nas colheitas e plantações, sobretudo a monocultura, as queimadas e o extrativismo, e transformar o que ainda se encontrava em estado potencial de exploração em reais fontes econômicas.

As ciências rumo ao Brasil moderno

O período pós-1870 foi palco de uma diversificação dos espaços institucionais de ciência, com a criação de comissões geológicas, laboratórios, museus e escolas superiores, com a difusão de teorias evolucionistas, doutrinas positivistas e pesquisas experimentais. Destaque, nesse período, deve ser dado ao processo de implantação e valorização da ciência de laboratório como um meio de atingir o progresso e a civilização por meio da ciência e da técnica (Sanjad, 2010SANJAD, N. O Museu Paraense entre o Império e a República, 1866-1907. In: HEIZER, A.; VIDEIRA, A. A. P. (Org.) Ciência, civilização e república nos trópicos. Rio de Janeiro: Mauad/Faperj, 2010. v.1, p.305-25.; Figueiroa, 1997FIGUEIRÔA, S. F. M. As Ciências Geológicas no Brasil: Uma História Institucional, 1875-1934. São Paulo, HUCITEC, 1997, 270p.; Lopes, 2009bLOPES, M. M. A Comissão Científica de Exploração: uma “expansão para dentro”. In: KURY, L. (Org.) Comissão Científica do Império (1859-1861). Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Editora, 2009b.; Vimieiro-Gomes, 2013).

A criação do Instituto Soroterápico Federal em 1900, atual Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e do Instituto Butantan (1899-1901), em São Paulo, como respostas a emergências sanitárias, são marcos importantes nesse processo (Benchimol; Teixeira, 1993BENCHIMOL, J. L.; TEIXEIRA, L. A. Cobras, lagartos e outros bichos: uma história comparada dos Institutos Oswaldo Cruz e Butantan. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1993.). A peste bubônica havia chegado ao porto de Santos e, para conter o surto, que ameaçava se propagar pelo país e pela Capital Federal, os cientistas foram chamados pelos governos federal e de São Paulo. O Instituto Soroterápico, sob a coordenação do jovem médico Oswaldo Cruz, ficou responsável pela produção de soro e vacina contra a peste bubônica. Nos seus primeiros anos, a instituição dedicou-se à investigação de doenças infecciosas, como febre amarela, varíola, febre tifoide e impaludismo, e doenças animais, como a febre da manqueira, que atacava o gado em toda a América do Sul, e contra a qual a instituição desenvolveu vacina, garantindo a sustentação de importante atividade econômica da ocasião (Benchimol, 2020, 2014).

A instituição, que passaria a se chamar Instituto Oswaldo Cruz (IOC) a partir de 1908, situou-se, logo nos seus primeiros anos de existência, na fronteira do conhecimento, em esforço de superação da dependência científica e tecnológica do Brasil, e sintonizou-se com congêneres no exterior animadas com a revolução biomédica: pesquisa sobre micro-organismos patogênicos, diagnóstico e controle de doenças transmissíveis, produção de vacinas e soros curativos, e inovação em técnicas e equipamentos da medicina de laboratório. Ampliou a agenda institucional de pesquisa em microbiologia e medicina tropical, áreas novas da ciência da época, inaugurou atividades de educação em medicina experimental, e foi capaz de atuar no controle à epidemia de febre amarela, que assolava o Rio de Janeiro no início do século XX (Benchimol, 2020_______. Manguinhos do sonho à vida: a ciência na Belle Époque. 2.ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2020., 2014; Kropf, 2009KROPF, S. Doença de Chagas, doença do Brasil: ciência, saúde e nação, 1909-1962. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009.).

Dava-se início, então, a um novo modelo organizacional da ciência, por meio do qual o Instituto assumia posição estratégica no cenário nacional, produzindo concomitantemente conhecimento científico e soluções tecnológicas para a área de saúde, vista como um meio de superação do atraso do país.

Desde os seus primórdios se associou às políticas federais de estímulo ao desenvolvimento econômico e social do país, realizando levantamentos de quadros epidemiológicos de regiões interioranas com vistas ao combate de doenças que ameaçavam vidas e a economia nacional. Seus cientistas partiram Brasil adentro, em viagens científicas, para colaborar com projetos regionais de modernização e diversificação econômica: construção de ferrovias e hidrelétricas, estudos voltados ao desenvolvimento da extração da borracha na Amazônia e obras para a criação de açudes em regiões de seca (Lima, 2013LIMA, N. T. Um sertão chamado Brasil. 2.ed. São Paulo: Hucitec, 2013.; Kropf, 2009KROPF, S. Doença de Chagas, doença do Brasil: ciência, saúde e nação, 1909-1962. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009.).

Os relatórios médico-científicos produzidos a partir dessas viagens do IOC deram origem ao debate sobre o Brasil como “um imenso hospital”, célebre frase do médico Miguel Pereira, pronunciada em 1916, e que se transformou na expressão síntese dos males do Brasil na produção intelectual daqueles anos: o Brasil seria um “país doente”, suas áreas rurais seriam marcadas pela ampla incidência de moléstias plenamente evitáveis pela ciência médica. Essa discussão motivou forte movimento nacionalista pelo saneamento dos sertões e a fundação da Liga Pró-Saneamento do Brasil em 1918, a associação entre doenças e o dito “atraso” dos meios rurais brasileiros, e a campanha pela federalização dos serviços de saúde pública no país (Hochman, 2012HOCHMAN, G. A Era do Saneamento - As bases da Política de Saúde Pública no Brasil 3.ed. São Paulo: Hucitec, 2012.; Hochman e Lima, 2015; Lima e Hochman, 2004, 1996; Lima, 2013; Sá, 2009). O “Brasil imenso hospital” tornou-se, enfim, uma chave de interpretação de cunho sociológico, tendo sido relacionado ao tema dos “dois Brasis” de Euclides da Cunha, ou à oposição entre sertão e litoral; ao Jeca Tatu de Monteiro Lobato, a principal representação do homem doente do interior, anemiado e inapto para o trabalho na agricultura, e à expressão de Mario de Andrade, em Macunaíma, sobre a situação sanitária do país: “Pouca saúde, muita saúva: os males do Brasil são” (Hochman e Lima, 2015; Lima e Hochman, 2004; Lima, 2013).

O Estado brasileiro, além das viagens do IOC, patrocinou, durante a Primeira República, outras missões científicas. Destaca-se, nesse contexto, a “Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas do Mato Grosso ao Amazonas” (1907-1915), a Comissão Rondon. Figurou como um importante instrumento de exploração científica do território nacional tendo o objetivo de mapear e integrar os territórios do interior do país, reunindo, a um só tempo, obras de instalação de estações telegráficas, identificação de recursos naturais e localização de terras mais adequadas à agricultura. Com a Comissão, teve início a política indigenista no país (Lima, 2013LIMA, N. T. Um sertão chamado Brasil. 2.ed. São Paulo: Hucitec, 2013.; Sá; Sá; Lima, 2008SÁ, D. M. de; SÁ, M. R.; LIMA, N. T. Telégrafos e Inventário do Território no Brasil: as atividades científicas da Comissão Rondon (1907-1915). História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v.15, p.779-810, 2008.; Diacon, 2006DIACON, T. A. Rondon: o marechal da floresta. São Paulo: Cia. das letras, 2006.).

Como vemos, nas primeiras décadas do século XX, as atividades científicas encontravam legitimidade por meio de sua capacidade de avaliar e solucionar problemas da sociedade brasileira. Mas, além da promoção do valor social da ciência, os cientistas buscavam mecanismos para maior profissionalização das atividades científicas no país. Inseparável deste processo é a criação da Academia Brasileira de Ciências (ABC). A geração que a criou em 1916, como Sociedade Brasileira de Ciências, e a rebatizou em 1921 como ABC, esteve envolvida na implementação das universidades públicas brasileiras a partir da década de 1930, e na organização de múltiplas iniciativas de divulgação científica: editou revistas para públicos variados; organizou exposições e cursos livres em escolas do país e no Museu Nacional do Rio de Janeiro; produziu filmes educativos e fundou uma estação de rádio que transmitia programas científicos e de cultura, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, a primeira do Brasil, criada em 1923. Os cientistas defendiam o fomento institucional a pesquisas e formação em ciência básica, a criação de novos campos do conhecimento, em contexto de baixa especialização disciplinar; a exortação à realização de pesquisas sobre temas nacionais; e a definição de novas áreas de atuação pública. A ABC foi fundamental no Brasil para a emergência de um tipo especializado de profissional que se autodenominava e era reconhecido socialmente como “cientista”, quanto também para a discussão sobre o papel nacional a ser exercido pela ciência nas primeiras décadas do século XX: tratava-se de ampliar o diálogo entre os cientistas e a sociedade, e fornecer estudos e evidências científicas para a formulação de políticas públicas (Carvalho; Moreira, 2017CARVALHO, J. M. de; MOREIRA, I. C. (Org.) Ciência no Brasil: 100 anos da Academia Brasileira de Ciências. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 2017.; Duarte, 2010DUARTE, R. H. A Biologia Militante: o Museu Nacional, especialização científica, divulgação do conhecimento e práticas políticas no Brasil, 1926-1945. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.; Sá, 2006).

Soma-se aos esforços de legitimação profissional da ciência no país o lançamento do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova em 1932, que marcou o início do processo de institucionalização das universidades no Brasil: USP (1934), da Universidade do Distrito Federal (1935) e da Universidade do Brasil (1937). Entre as singularidades do processo de constituição acadêmica das universidades no país, destaca-se o modelo de organização do ensino e da pesquisa desenvolvidos pelas Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras. Responsáveis pela criação de departamentos específicos para o ensino das ciências (naturais, sociais e exatas), as faculdades de filosofia tinham por objetivo formar quadros para o ensino secundário além de “promover a pesquisa científica exclusivamente teórica ou experimental” (Ferreira; Azevedo, 2012FERREIRA, L. O.; AZEVEDO, N. Sucesso e Fracasso das Faculdades de Filosofia: ciência, cientistas e universidade no Brasil, 1930-1960. Locus (UFJF), v.18, p.279-306, 2012., p.6).

As décadas seguintes, sobretudo no contexto do pós-Segunda Guerra, foram marcadas pela convicção acerca do papel decisivo que a ciência e a tecnologia poderiam ter no processo de elevação dos níveis socioeconômicos da América Latina (Schwartzman, 2001_______. Um espaço para ciência: a formação da comunidade científica no Brasil. Brasília: MCT, 2001., 1980). No Brasil, os programas do Estado desenvolvimentista acionaram a organização profissional das ciências, bem como a estrutura educacional superior, como motores para o desenvolvimento de projetos que viabilizassem a soberania, a segurança e a autonomia nacionais (Cunha, 2007CUNHA, L. A. A universidade crítica: o ensino superior na república populista. São Paulo: Editora Unesp, 2007. p.127-68.).

A Segunda Guerra Mundial também teve impactos na organização internacional da ciência. O projeto Manhattan, que levou à construção da bomba atômica, é considerado o início da chamada Big Science - novo tipo organizacional da produção científica que envolve vultuosas somas de dinheiro, grandes equipes técnico-científicas, administração própria, além de constante diálogo com as áreas estratégicas do Estado, da indústria e das forças de defesa. Esse modelo começou a se disseminar na década de 1940 por meio da construção dos grandes laboratórios de física de partículas elementares. A partir da organização da Big Science em diferentes países, “a ciência torna-se cada vez mais dependente do Estado ou de recursos financeiros que as indústrias e o setor privado aplicam em seus próprios centros de pesquisa e desenvolvimento tecnológico” (Videira, 2010VIDEIRA, A. A. P. 25 anos de MCT: raízes históricas da criação de um ministério. Rio de Janeiro: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010., p.67).

Naqueles anos, obras de modernização com emprego da ciência e de alta tecnologia balizaram projetos político-econômicos em escala global. Esses projetos tinham relação com a ideia de desenvolvimento, que significava, na ocasião, o caminho que a humanidade deveria trilhar, depois das crises econômicas perpetradas por duas guerras mundiais, rumo a conquistas que caracterizariam as sociedades “avançadas”: industrialização, urbanização, modernização da agricultura, aumento da oferta de serviços sociais, altos padrões de produtividade material e elevados níveis de qualidade de vida e saúde (Cooper; Packard, 2005COOPER, F.; PACKARD, R. History and politics of development knowledge. In: EDELMAN, M.; HAUGUERUD, A. The anthropology of development and globalization: From classical political economy to contemporary neoliberalism. Oxford: Blackweel Publishing, 2005.; Lleys, 2005LLEYS, C. The rise and fall of development theory. In: EDELMAN, M.; HAUGUERUD, A. The anthropology of development and globalization: From classical political economy to contemporary neoliberalism. Oxford: Blackweel Publishing, 2005.). A adoção e a promoção desses projetos, especialmente no pós-Segunda Guerra, figuraram como condições indispensáveis para vencer o “subdesenvolvimento”, cujas principais marcas seriam atraso econômico, alto crescimento populacional, desindustrialização, doenças, analfabetismo, desnutrição, fome, pobreza e prevalência de práticas agrícolas extrativistas (Staples, 2006STAPLES, A. L. S. The Birth of Development: How the World Bank, Food and Agriculture Organization, and World Health Organization Changed the World, 1945-1965. Ohio: The Kent State University Press (New Studies in U.S. Foreign Relations, n.16), 2006.).

Em países como o Brasil, a institucionalização do fomento estatal para a ciência, como via de superação do subdesenvolvimento, era vista como urgente pelos cientistas: o Estado deveria criar órgãos de planejamento, administração e financiamento para a ciência nacional.

Essa é a pauta que está na origem da criação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em 1948: instalação do tempo integral nas universidades brasileiras e da autonomia universitária, concessão de bolsas de estudo e pesquisa, e fundação de um órgão governamental ou de uma agência de fomento para apoiar e financiar a pesquisa no Brasil. Desde 1949, a SBPC edita a revista Ciência e Cultura e realiza eventos de caráter nacional, com o objetivo de debater políticas públicas de C&T e de difundir o conhecimento científico (Videira, 2010VIDEIRA, A. A. P. 25 anos de MCT: raízes históricas da criação de um ministério. Rio de Janeiro: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010.; Schwartzman, 2001_______. Um espaço para ciência: a formação da comunidade científica no Brasil. Brasília: MCT, 2001.; Fernandes, 1990FERNANDES, A. M. A Construção da Ciência no Brasil e a SBPC. Rio de Janeiro, Ed. UnB, 1990.; Botelho, 1990BOTELHO, A. J. The professionalization of brazilian scientists, the Brazilian Society for the Progress of Science (SPBC), and the State (1948-1960). Social Studies of Science, v.20, p.473-502, 1990.).

Os membros da SBPC participaram ativamente da criação do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), projeto encaminhado ao Congresso Nacional em 1949 e sancionado na Lei n.1.310 de janeiro de 1951. O CNPq representou um esforço de estruturação da produção científica e tecnológica brasileira, a partir dos ideais de desenvolvimento, modernização, segurança nacional e autonomia científica. Caberia ao Conselho a promoção de pesquisas científicas no país, a partir do financiamento e do intercâmbio internacional entre redes de cientistas. O modelo institucional do CNPq buscava sedimentar a produção científica no país, “fornecendo auxílios e equipamentos de pesquisa para os institutos já existentes nas universidades e fora delas” (Cunha, 2007CUNHA, L. A. A universidade crítica: o ensino superior na república populista. São Paulo: Editora Unesp, 2007. p.127-68., p.132). Nessa direção, exatamente, também foram criados o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) em 1949 e a Campanha [Coordenação] Nacional do Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) do Ministério da Educação em 1951 (Romani, 1982ROMANI, J. P. O Conselho Nacional de Pesquisa e a institucionalização da pesquisa científica no Brasil. In: SCHWARTZMAN, S. (Org.) Universidade e Instituições Científicas no Rio de Janeiro. Brasília: CNPq, 1982.).

O projeto de autonomia requerido pela comunidade científica nacional, e potencializado pela criação de institutos de pesquisa e pela valorização do ensino superior no país, encontrou entraves na década seguinte com a instauração da ditadura civil-militar, após o golpe de 1964. A relação entre Estado e comunidade científica (instituições de pesquisa e universidades) foi conflituosa durante todo o período de governo militar. A SBPC era um dos poucos espaços possíveis de resistência e luta pela redemocratização (1964-1985) (Videira, 2010VIDEIRA, A. A. P. 25 anos de MCT: raízes históricas da criação de um ministério. Rio de Janeiro: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010.; Freire Junior, 2007).

A reforma universitária de 1968 ocorreu nesse cenário. Convivendo com fortíssima repressão política e perseguição à comunidade científica, em 28 de novembro daquele ano, entrava em vigor a Lei n.5.540, para regular o ensino superior no país. A reforma propunha fortes investimentos para modernizar a infraestrutura das universidades brasileiras, sobretudo por meio da expansão da pós-graduação, com o propósito de impulsionar o desenvolvimento e o crescimento econômico do país. Houve extinção das cátedras, a criação de departamentos, fortalecimento de institutos, construção e expansão de campi universitários e melhoria de salários de professores. Investia-se na institucionalização da pesquisa científica e na indissolubilidade entre pesquisa e ensino, como via de aceleração do processo de industrialização nacional e de substituição das importações. Além de constituir o projeto do Brasil potência, o fomento à ciência também configurava forte propaganda do regime para aplacar críticas à ditadura. Foi enorme o vigor financeiro dessa política (Motta, 2020MOTTA, R. P. S. As universidades e o regime militar. 2.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.).

Em 1967, foi criada a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Em 1969, foi organizado o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Em 1972 foi fundada a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). No mesmo ano, o Decreto-lei n.70.553 definiu as competências do Ministério do Planejamento e do CNPq no âmbito do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia (SNDCT). Nesse desenho, o CNPq passou a ser o órgão central do SNDCT. Em 1973, o Decreto-lei n.70.000 instituiu o Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para o biênio 1973/1974 (Videira, 2010VIDEIRA, A. A. P. 25 anos de MCT: raízes históricas da criação de um ministério. Rio de Janeiro: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010.; Freire Junior, 2007).

Muitos historiadores se dedicam a investigar as formas pelas quais os cientistas da ocasião enfrentaram o autoritarismo político concomitantemente ao forte apoio que recebiam para o desenvolvimento científico de suas pesquisas, como, por exemplo, a comunidade de físicos (Freire Junior, 2013). O fomento estatal não interrompeu a perseguição política.

Esse fenômeno também foi vivenciado em outras instituições de pesquisa brasileiras, como o Instituto Oswaldo Cruz, atual Fiocruz, nas décadas de 1960 e 1970. Com a edição do Ato Institucional n.5 (o AI-5), em 1968, houve o chamado “Massacre de Maguinhos”, que representou a cassação, em 1970, dos direitos políticos de dez importantes pesquisadores da instituição. Foram instituídos inquéritos policiais, houve o encerramento de atividades de laboratórios e de linhas de pesquisa, e a descontinuidade de áreas e especialidades que existiam desde a década de 1930 na instituição, ao lado da aposentadoria compulsória de cientistas (Santos, 2020SANTOS, D. G. E. Massacre de Manguinhos: a ciência brasileira e o regime militar (1964-1970). São Paulo: Hucitec, 2020.; Lent, 2019LENT, H. O massacre de Manguinhos [recurso eletrônico]. Rio de Janeiro: Fiocruz; Edições Livres, 2019.). Em 1974, no entanto, grave epidemia de meningite acometeu o país, e, em 1975, foi anunciado, pelo governo ditatorial, um plano de modernização institucional para transferência de tecnologia e capacitação para a produção de vacinas bacterianas. Em 1976, foram criados Bio-manguinhos e Farmanguinhos na Fiocruz (Azevedo; Ferreira, 2017AZEVEDO, N.; FERREIRA, L. O. Epidemias, vacinas e tecnologia: experiência de inovação em ciência, tecnologia e saúde na Fiocruz em meados dos anos 1970. Revista Brasileira de Inovação, v.16, p.167-80, 2017.; Benchimol, 2014BENCHIMOL, J. L. O legado de Oswaldo Cruz aos olhos de um historiador. In: CRUZ, A. O. (Org.) Manguinhos. Retratos e histórias do campus da Fundação Oswaldo Cruz. Rio de Ja- neiro: Editora Fiocruz, 2014.).

Entre os anos 1979 e 1984, no governo Figueiredo, houve uma grande descontinuidade nas ações do governo para a área de C&T, a começar pela redução drástica dos recursos do FNDCT. A despeito desse período de esvaziamento de políticas científicas, historiadores afirmam que, na ditadura, foi estruturado um projeto de desenvolvimento industrial nacional articulado com a organização de uma base científica e tecnológica (Videira, 2010VIDEIRA, A. A. P. 25 anos de MCT: raízes históricas da criação de um ministério. Rio de Janeiro: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010.).

Com a redemocratização, os cientistas buscaram novas formas de relação com o Estado, sem descurar do seu importante papel como agente fundamental na proposição de políticas para o desenvolvimento econômico e social, tal como ocorre em muitos outros países (Mazzucato, 2014MAZZUCATO, M. O Estado empreendedor: desmascarando o mito do setor público vs. setor privado. São Paulo: Portfolio-Penguin, 2014.). Em 1985, houve finalmente a criação do Ministério da Ciência e da Tecnologia (MCT). Entre 1985 e 1988, a pasta procurou estruturar orçamento para apoios prioritários em áreas consideradas de fronteira, como biotecnologia, química fina e mecânica de precisão. Atuou também para a ampliação do número de bolsas para cientistas no País e no exterior.

Anos de crise - e o futuro pós-2022?

Nas décadas seguintes, orçamentos e prioridades do MCT sofreram flutua- ções em razão das políticas estratégicas de diferentes governos, mas, especialmente a partir de 2014, passaram a ocorrer cortes sistemáticos e crescentes no orçamento de CT&I no país. No ano 2016 a situação se agravou ainda mais: foi feita a fusão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) com o Ministério das Comunicações (MCTIC). Nesse mesmo ano, foi aprovada a Proposta de Emenda à Constituição 55/2016, mais conhecida como a PEC do Teto de Gastos, que limitou o aumento dos gastos públicos à variação da inflação pelos vinte anos seguintes.

Para piorar a já péssima situação orçamentária, emergiram, em contexto local, mas também em diferentes outros países, movimentos organizados anticiência e negacionistas. De discurso social difuso, o negacionismo tornou-se movimento estruturado de circulação de fake news nas redes sociais e aplicativos de mensagens. Os cientistas são definidos, por esse movimento, como “inúteis”, sem pesquisas de relevância no cotidiano da população, e “excessivamente politizados”, especialmente nas universidades públicas. Um dos fundamentos desse movimento negacionista é a defesa de que a ciência deve ser “neutra” e obrigatoriamente aplicada, ou seja, destituída de valores sociais e ética, dedicada exclusivamente ao desenvolvimento de aparatos tecnológicos de uso comercial ou industrial imediato.

Esses negacionistas buscaram justificar tanto o baixíssimo investimento público em ciência quanto a ausência deliberada de políticas baseadas em evidências científicas. Esses movimentos negacionistas também fizeram coincidir e pioraram graves crises de saúde pública no período. Universidades e instituições científicas brasileiras, mas especialmente a ABC e a SBPC, em reação ao difícil contexto econômico e político-institucional do país, multiplicaram as suas linhas de ação no enfrentamento aos negacionistas da ciência, buscando demonstrar a importância da ciência para o país, inclusive para o enfrentamento das emergências sanitárias. Nos anos 2016 e 2017, durante a tríplice epidemia de Dengue, Zika e Chicungunya, a comunidade de cientistas advogava que “a ciência salva vidas”. Nos anos 2020 e 2021, durante a pandemia de Covid-19, alertava que “o negacionismo mata”.

Nesse contexto, SBPC e ABC, especialmente, reavivaram a sua missão histórica, como já vimos neste artigo: a importância da ciência básica para uma sociedade do conhecimento e capacidade de inovação tecnológica; de uma agenda dinâmica de comunicação pública e divulgação científica para a população; da formação continuada de novas gerações de pesquisadores; e da ciência comprometida com a qualidade de vida da população e com um projeto nacional soberano e de longo prazo. Sua atuação foi incessante.

Já em 2016, a ABC lançou o programa “Um Projeto de Ciência para o Brasil”. O programa foi organizado em doze temáticas, para as quais grupos de trabalho, coordenados por acadêmicos, produziram documentos com vistas a subsidiar políticas públicas para o futuro de áreas consideradas estratégicas para o país: atividades espaciais, cérebro, cidades sustentáveis-inteligentes, ciências agrárias, ciências básicas, ciências do mar, ecossistemas e meio ambiente, energia, igualdade e inclusão, novas tecnologias para o século XXI e saúde. Resultados desta ampla pesquisa foram reunidos em livro publicado em 2018 (Silva; Tundisi, 2018SILVA, J. L.; TUNDISI, J. G. (Coord) Projeto de Ciência para o Brasil. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 2018.).

Em 2017, ladeadas por outras instituições e associações científicas, SBPC e ABC lançaram a campanha “Conhecimento sem Cortes” para informar a gravidade da situação e engajar a população na recomposição orçamentária da área de CT&I como garantia de futuro soberano para o país. Em 2017 tinha-se o pior orçamento para a ciência dos últimos doze anos. Houve corte de 44% na previsão anual para o setor, e o montante era apenas 25% do orçamento global em CT&I para o país na comparação com o ano de 2010. Diversas Fundações de Amparo à Pesquisa (FAP) em diferentes estados tinham orçamentos zerados, e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), uma das principais universidades públicas do país, vivia histórica crise com incapacidade sistêmica de funcionamento por falta de recursos. Bolsas de estudos estavam atrasadas, o êxodo de pesquisadores começava a se intensificar, laboratórios e linhas de pesquisa paralisavam suas atividades em diferentes instituições de todo o país. O quadro era de iminente colapso.

Além de reuniões de mobilização em todo o país com cientistas e estudantes de diferentes campos do saber, a ABC, juntamente com a Universidade Federal do Rio do Janeiro (UFRJ), lançou o “Tesourômetro do Conhecimento”, com vistas a demonstrar os impactos sociais da redução de recursos para a ciência e a educação brasileiras. Também foram organizadas “Marchas pela Ciência” em diversas cidades do Brasil, com feiras e atividades de divulgação científica, na esteira da March for Science, um movimento internacional em prol da valorização da ciência em nível mundial. A 1ª Marcha pela Ciência ocorreu em 610 diferentes cidades do mundo, incluindo o Brasil, no dia 22 de abril de 2017. O movimento foi inicialmente organizado nos Estados Unidos como reação aos cortes orçamentários em CT&I e ao negacionismo climático do presidente americano Donald Trump, então recém-eleito.

A 2ª Marcha pela Ciência no Brasil ocorreu em 2 de setembro de 2017, e o 3º encontro, também de nível nacional, no mês seguinte. A defesa da recomposição orçamentária da área de CT&I somada ao enfrentamento a discursos anticiência foram as agendas primordiais da comunidade científica brasileira nos anos de 2018 e 2019, sobretudo porque os cortes na pasta ministerial e agências de fomento recrudesceram, assim como os ataques às universidades públicas, à autonomia universitária, à reputação, ao direito de cátedra e à liberdade de expressão dos professores e pesquisadores brasileiros. Novamente com parceria privilegiada com a SBPC, a ABC promoveu encontros e audiências públicas em defesa da ciência com representantes do MCTI e poderes legislativo e judiciário, e lançou manifestos e notas contra cortes, sobretudo do CNPq. Alertavam para os riscos de atraso insolúvel do Brasil em nível global e em futuro próximo: enquanto países como Estados Unidos, Israel, Alemanha e China fazem altíssimos investimentos públicos em ciência e educação, o nosso país segue o caminho oposto.

Em 2020 e 2021, no contexto da pandemia de Covid-19, decretada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 11 de março de 2020, a comunidade científica intensificou ainda mais a sua atuação contra o negacionismo científico e o diálogo com a sociedade civil. Atuava contra a desestruturação galopante da ciência brasileira, mas também contra discursos contrários a medidas de controle da pandemia utilizados no mundo inteiro, como o uso de máscaras, quarentenas e isolamento social. Posicionou-se contra o uso e a promoção de tratamentos sem comprovação científica, assim como em oposição a movimentos contra as vacinas, cujos desenvolvimento tecnológico e ensaios clínicos ocorreram em rapidez inédita.

E na proporção em que se aprofundavam o desmonte da ciência nacional e o negacionismo científico na crise sanitária, multiplicavam as manifestações dos cientistas. Em maio de 2020, foi retomada a organização das Marchas pela Ciência, mas, respeitando o distanciamento social, foram organizadas atividades virtuais e campanhas nas redes sociais.

Em setembro de 2020, a ABC iniciou uma campanha nas redes virtuais: #EuConfionaCiência, por meio da qual conclamava profissionais, estudantes e a população a gravar vídeos curtos em que manifestavam a sua confiança no trabalho dos cientistas para a superação da crise econômica e sanitária no país. Em outubro de 2020, a ABC, juntamente com a Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da SBPC, lançou nota pela liberação dos recursos que integram o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). O FNDCT, criado em 1968, como vimos, é responsável pelo investimento em atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) realizadas por universidades, institutos de pesquisa e indústrias.

Outro desafio trazido pela pandemia de Covid-19, e largamente discutido pela comunidade científica nos últimos meses, são as desigualdades econômicas e sociais entre populações de diferentes países e as fortes assimetrias globais agravadas pela crise sanitária. Somente na América Latina, mais de 30 milhões de pessoas passaram a estar abaixo da linha da pobreza depois da pandemia. As severas disputas, entre os Estados nacionais, no acesso a produtos e serviços de saúde, com destaque para as vacinas, geraram uma profunda iniquidade planetária (Lima; Gadelha, 2021LIMA, N. T.; GADELHA, C. G. The COVID-19 Pandemic: Global Asymmetries and Challenges for the Future of Health. China CDC Weekly, v.3, p.140-1, 2021.). No espaço de um ano, comunidades científicas de diferentes latitudes saltaram de cerca de 200 diferentes projetos de imunizantes a mais de 6 bilhões e 700 milhões de doses de vacinas, eficazes e seguras, já aplicadas em todo o planeta. No entanto, a despeito de iniciativas de solidariedade global, como o COVAX Facility, da OMS, da Global Alliance for Vaccines and Immunization (GAVI) e da Coalition for Epidemic Preparedness Innovations (CEPI), são abissais as desigualdades, entre o Norte e o Sul Global, no acesso às vacinas contra a Covid-19. Mais do que ampliar o acesso à imunização nesta pandemia, que já matou quase 6 milhões de pessoas em todo o mundo, cientistas argumentam que é preciso rediscutir a cooperação internacional e as iniquidades em ciência entre os países, com estímulos à transferência de conhecimentos e tecnologia, sem os quais estaremos ainda mais vulneráveis em caso de novas emergências sanitárias (Lima; Gadelha, 2021).

Além da pandemia, o mundo enfrenta atualmente outros graves problemas: riscos de disrupção tecnológica, a mutação climática, e as mudanças antropogênicas no Sistema Terra caracterizadas sob o nome de Antropoceno: níveis jamais vistos de industrialização em escala planetária, com verticalização súbita e acentuada de todos os níveis de exploração de recursos naturais, especialmente daqueles destinados a gerar energia. A queima de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás) intensificou a poluição do ar e o desflorestamento, assim como o aumento de dióxido de carbono na atmosfera. A exploração da água levou à alteração brutal de cursos e regimes hidrológicos por barragens, usinas hidrelétricas e canais para irrigação na agricultura. Somem-se a esses fenômenos a criação intensiva de animais para a alimentação humana e a crescente simplificação de ecossistemas pela drástica diminuição da biodiversidade para a criação agropecuária (McNeill; Engelke, 2014).

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) publicou, no dia 9 de agosto de 2021, relatório intitulado Climate Change 2021, mostrando que as mudanças climáticas causadas pelos seres humanos são irrefutáveis, inexoráveis e vão se agravar. Somos mais de 7 bilhões de indivíduos em todo o planeta. Como espécie, alteramos paisagens em todos os cantos do globo, com nossas cidades, indústrias, carros, aviões, agricultura extensiva e domesticação de animais. Produzimos e consumimos bens e serviços em escala jamais vista em 4,5 bilhões de história planetária. Produzimos acidificação dos solos e das águas, poluímos rios, lagos e oceanos, e vivemos risco iminente de crise hídrica. Nos mares, toneladas de plástico asfixiam a vida marinha. A Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, marcada por megabiodiversidade, segue ameaçada por derrubadas e incêndios e perde vidas humanas, entre ribeirinhos e populações tradicionais, todos os dias.

Há historiadores que argumentam que não vivemos uma crise, mas tempos de mudanças sem precedentes, que, por sua vez, serão cada vez mais comuns (Robin, 2020ROBIN, L. Bunkering down in the New Normal. Environmental History, v.25, p.653-6, 2020.; Boldizsár, 2020BOLDIZSÁR, Z. Eventos de transformação disruptiva. In: SÁ, D. M. de; SANGLARD, G.; HOCHMAN, G.; KODAMA, K. Diário da Pandemia: o olhar dos historiadores. São Paulo: Hucitec, 2020. p. 214-221.; Latour, 2020LATOUR, B. Onde aterrar? - como se orientar politicamente no Antropoceno. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020.; Hartog, 2020HARTOG, F. Chronos, l’Occident aux prises avec le temps. Paris: Gallimard, 2020.; Harari, 2018HARARI, Y. N. 21 lições para o século XXI. São Paulo: Cia. das Letras, 2018.).

Como enfrentar essas transformações radicais do lugar periférico que o Brasil ocupa em ciência, economia e desenvolvimento humano no mundo? Além dos 200 anos da Independência do Brasil, em 2022, teremos também os 50 anos da Conferência de Estocolmo, e a ONU planeja lançar a Década da Restauração de ecossistemas, biomas e ambientes marinhos. Como integraremos esses debates numa das piores crises científicas em dois séculos de país “independente”? Os projetos de ciência profissional, comprometida com visões de um país soberano, como vimos, estruturaram a própria história do campo científico brasileiro. Que agendas de futuro poderemos edificar com o desmonte de toda a estrutura pela qual os cientistas brasileiros lutaram arduamente por dois séculos?

A historiadora Libby Robin (2020ROBIN, L. Bunkering down in the New Normal. Environmental History, v.25, p.653-6, 2020.), em artigo sobre a história ambiental na era da Covid-19, diz que estamos manejando, em escala global, uma distopia com estresse pós-traumático, pois lidamos sem cessar com incertezas e com o inesperado, sem saber quanto tempo o problema atual durará até que cheguem outros. Nesse artigo, Robin cita livro de David Farrier, professor de humanidades ambientais da Universidade de Edimburgo, chamado Footprints, disponibilizado online nesses tempos da Covid-19, e no qual autor se propõe a imaginar quais fósseis legaremos para os tempos futuros.1 1 Disponível em: <http://newnatures.org/greenhouse/events/greenhouse-online-book-talk-farrier/>. Robin propõe que deixemos histórias com outra imaginação sobre o futuro.

A segui-la, é preciso renovar o conhecimento científico para a compreensão das transformações inauditas que vivenciamos. É preciso uma nova ciência, sem fronteiras entre as disciplinas, mas tampouco entre os países, em prol da solidariedade e cooperação global. A nova ciência deve carrear também reflexão crítica sobre as fronteiras entre o mundo humano e o mundo natural, do qual o Homo sapiens, afinal, também faz parte. Sem a ciência, seremos incapazes de enfrentar os tempos de mudanças radicais que temos pela frente.

Que 2022 não seja ocasião apenas, portanto, para balanço do passado, mas para o exercício de uma nova imaginação sobre o futuro, que estimule a reflexão crítica sobre os problemas nacionais que conectam diferentes temporalidades e o próprio destino da vida no planeta. Em entrevista de setembro de 2020, o importante filósofo e antropólogo francês Bruno Latour chegou a declarar: “Se o Brasil achar solução para si, vai salvar o resto do mundo”.2 2 Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2020/09/se-o-brasil-achar-solucao-para-si-vai-salvar-oresto-do-mundo-diz-bruno-latour.shtml>.

É, pois, com essa responsabilidade que argumentamos que as agendas do campo científico brasileiro desses 200 anos, como acompanhamos no artigo, devem ser consideradas em incontornável perspectiva histórica, pois as análises processuais são fundamentais para a compreensão dos desafios do presente, especialmente a importância da ciência para a soberania nacional, o protagonismo dos cientistas na reflexão sobre os rumos do país, o lugar do Brasil no mundo e a valorização da vida. O atraso não é uma opção.

Com a nova imaginação sobre o futuro, atualizaremos o legado das gerações de cientistas que vieram antes de nós, e que, há 200 anos, tinham um país inteiro pela frente para ajudar a construir, mas também teremos tentado, como sugere Robin (2020ROBIN, L. Bunkering down in the New Normal. Environmental History, v.25, p.653-6, 2020.), ser melhores ancestrais.

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Notas

  • 1
    Disponível em: <http://newnatures.org/greenhouse/events/greenhouse-online-book-talk-farrier/>.
  • 2
    Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2020/09/se-o-brasil-achar-solucao-para-si-vai-salvar-oresto-do-mundo-diz-bruno-latour.shtml>.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    04 Nov 2021
  • Aceito
    23 Nov 2021
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