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Tumor esofágico de células granulares associado à carcinoma epidermoide: relato de caso

CARTA AO EDITOR

Tumor esofágico de células granulares associado à carcinoma epidermoide: relato de caso

Esophageal granular cell tumor associated to squamous cell carcinoma: a case report

Eduardo Cambruzzi; Raul Pruinelli; Daniel Marini Milani; Ricardo Pedrini Cruz; Otávio Cunha; Nayane Clivatti

Trabalho realizado no Hospital Conceição de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Eduardo Cambruzzi dudacambruzzi@yahoo.com.br

INTRODUÇÃO

Os tumores primários do esôfago podem ser classificadas com base na sua origem celular em tumores epiteliais e não epiteliais. Cada categoria pode ser subdividida em tipos benignos e malignos. Os tumores não epiteliais surgem a partir do tecido do estroma mesenquimal e a maioria deles é benignos. Quase todos os cânceres de esôfago são carcinomas. Sarcomas raramente surgem. Os tumores compostos são colisão de tumores que surgem em loci adjacentes, mas separados. À medida que crescem, eles se fundem e invadem um ao outro1,2. O esôfago é um dos locais mais comuns de tumores de células granulares (tumor de Abrikossoff) no trato gastrointestinal. Tumor de células granulares de esôfago é geralmente solitário, pequena lesão, incidental. Tumores múltiplos são encontrados em cerca de 10% dos casos, e podem apresentar-se com obstrução quando grandes. Os tumores surgem com mais frequência no terço inferior do esôfago, produzindo nódulo mal circunscrito, firme, amarelo-pálido na submucosa1,3,4.

Carcinoma de esôfago é o sexto tipo de câncer mais comum entre os homens e o nono entre as mulheres; afeta mais de 450.000 pessoas a cada ano no mundo. Sobrevida é uniformemente baixa, com taxa em cinco anos geralmente inferior a 10%. O carcinoma espinocelular é o mais comum dos tumores malignos do esôfago, afetando os homens com mais frequência do que as mulheres, com idade média de 60 anos. O carcinoma de células escamosas pode ocorrer em qualquer parte do esôfago, mas o terço médio e o inferior são os mais comuns2, 5,6,7.

Aqui, os autores relatam um caso de tumor de células granulares do esôfago associado com carcinoma de células escamosas, e descrevem os critérios morfológicos, imunoistoquímicos e de diagnóstico destas duas neoplasias distintas.

RELATO DO CASO

Mulher de 52 anos foi internada no serviço de oncologia clínica com queixa de disfagia progressiva e perda de peso durante os últimos quatro meses. A endoscopia digestiva alta revelou um tumor vegetante no terço inferior do esôfago. A lesão impediu a progressão do duodenoscópio. Tomografia computadorizada do tórax revelou uma área de espessamento irregular da parede esofágica. Biópsia da lesão foi realizada e foi determinado o diagnóstico histopatológico de carcinoma de células escamosas. Com base nos achados clínicos e patológicos, foi realizada esofagectomia transhiatal. A peça cirúrgica consistiu no esôfago distal e do estômago proximal. O esôfago media 11,0 cm comprimento. Foi identificado a 6,5 cm do topo, um tumor vegetante cinza, com bordas indistintas. O processo medido 3,0 cm de comprimento invadia adventícia do esôfago. Continuando com a lesão descrita, na camada muscular, foi identificada uma firme e mal definida protuberância esbranquiçada que media 1,0 cm de diâmetro. Na avaliação microscópica, duas neoplasias distintas foram identificadas. A maior correspondia a um carcinoma de células escamosas bem diferenciado. A menor à uma neoplasia mal demarcada surgindo nas camadas submucosa e muscular. Ela era composta por células poliédricas ou em fuso, com citoplasma eosinofílico finamente granular e pequenos núcleos arredondados, dispostos em ninhos ou padrão sólido, com baixo índice mitótico e nenhuma evidência de necrose (Figura 1). O estudo imunoistoquímico da peça cirúrgica mostrou, na lesão menor, forte reação para vimentina (Vim3B4) e proteína S100 (policlonal) e imunomarcação negativa para alfa actina de músculo liso (1A4), desmina (D33), CD117 (policlonal ) e CD34 (células endoteliais, QB-END/10). A área correspondente ao carcinoma de células escamosas mostrou imunocoloração positiva apenas para pancitoqueratina (AE1/AE3). A morfologia das lesões associadas com as conclusões do estudo imunoistoquímico foi compatível com tumor de células granulares do esôfago associado com carcinoma de células escamosas. Não havia metástases identificadas na amostra. A porção do estômago mostrou gastrite crônica moderada, com formação de folículos linfóides e metaplasia intestinal. A busca por Helicobacter pylori (Giemsa método) foi negativa. Após 14 meses de acompanhamento clínico, a paciente não teve nenhuma evidência de progressão da doença.


DISCUSSÃO

Os tumores de células granulares surgem em todo o tracto gastrointestinal, mas são mais comuns no esôfago, especialmente nos segmentos mais baixos. A maior parte dos tumores de esôfago é de lesões de crescimento lento. Os tumores se desenvolvem em indivíduos de idades entre 20 a 70, afetando igualmente homens e mulheres. O tamanho se correlaciona com os sintomas, que consistem principalmente em disfagia ou dor. Os nódulos intramurais produzem protuberâncias sésseis, quando vistos a partir do aspecto da mucosa. Os tumores geralmente aparecem como lesões suaves, sésseis, solitárias, branco-acinzentadas com 1 a 4 cm de diâmetro. Elas estão localizadas na muscular própria, submucosa ou em padrão infiltrante e são cobertas por um epitélio hiperplásico. Ao exame microscópico, processo exibe cordões poligonais de células arredondadas com pequenos núcleos arredondados e citoplasma abundante, granular e eosinofílico. Na maioria dos casos, os tumores de células granulares são processos benignos. As lesões suspeitas para malignidade incluem tumores com tamanho grande (> 5 cm), presença de necrose, aumento da celularidade, alto índice mitótico (superior a duas mitoses por 10 HPF), pleomorfismo nuclear, grandes nucléolos, áreas de necrose e invasão de órgãos adjacentes . Os grânulos vermelhos no citoplasma são PAS positivo. Na avaliação imunoistoquímica, os tumores de células granulares são positivos para anticorpos S100, vimentina, CD68, GFAP, NSE e Leu7. Algumas lesões são imunopositivas para citoqueratina e CD117. O diagnóstico diferencial inclui melanomas malignos ou os raros casos de metástase de carcinoma1,4,8. Os achados ultra-estruturais de tumores de células granulares incluem células mostrando numerosos vacúolos citoplasmáticos contendo mielina1,4,8,9,10,11,12.

Os tumores de células granulares pode coexistir com carcinoma de células escamosas, adenocarcinoma, tumores estromais gastrointestinais e leiomiomatose1,3,4,9,11,13,14. O carcinoma espinocelular é o mais comum dos tumores malignos do esôfago, afetando mais homens com idade média de 60 anos. Os possíveis fatores etiológicos incluem tabagismo, consumo de álcool, deficiência alimentar, contaminação fúngica dos alimentos, acalásia, divertículo esofágico, síndrome de Plummer-Vinson, tilose, história de irradiação prévia e doença celíaca. Na maioria dos casos há esofagite crônica associada1,3,5,9.

Carcinomas de células escamosas ocorrem geralmente no meio ou no terço inferior do esôfago, e o prognóstico em geral é pobre. Tumores mais avançados estão associados com disfagia progressiva, perda de peso e anemia. Grosseiramente, as lesões são geralmente circunferenciais, exofíticas, em parte ulceradas, com margens irregulares. Em seções de corte, tumor cinza ou branco com bordas indistintas é aspecto comum, muitas vezes estendendo-se até a parede muscular ou para trás. Infiltração submucosa e intra-epitelial também é comum; invasão de vasos sanguíneos está presente em 3/4 dos casos. Histologicamente o carcinoma de células escamosas do esôfago pode variar de tumores bem diferenciados de neoplasias pouco diferenciadas. Os tumores em espécimes cirúrgicos costumam invadir a muscular com infiltração variável dos tecidos extra-esofágicas. Lesões multicêntricas podem ser encontradas em menos do que 30% dos casos. Indicadores prognósticos desfavoráveis incluem invasão vascular ou linfática, áreas de necrose tumoral, lesões pouco diferenciadas e presença de metástases ganglionares. Outros fatores relacionados à menor sobrevida são tumores que afetam os homens. As variantes histológicas do carcinoma de células escamosas do esôfago incluem carcinoma superficial, variante verrucosa e carcinomas basocelulares. O diagnóstico diferencial é feito com epitélio hiperplásico ou reativo, adenocarcinoma mal diferenciado e, eventualmente, melanoma maligno. Na técnica de imunoistoquímica, carcinoma de células escamosas do esôfago é positiva para anticorpos AE1/AE3, CAM5.2, 34betaE12, CK19, CK 5 e p63 2,5,6,7,9.

Recebido para publicação: 20/09/2011

Aceito para publicação: 11/12/2012

Fonte de financiamento: não há

Conflito de interesses: não há

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  • Endereço para correspondência:

    Eduardo Cambruzzi
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013
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