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Imaturos de mosquito (Diptera, Culicidae) de áreas urbana e rural no norte do Estado do Paraná, Brasil

Immatures of mosquitoes (Diptera, Culicidae) in urban and rural environments of northern Paraná State, Brasil

Resumo

The results of larval collections of mosquitoes from artificial containers and natural breeding at urban and rural areas carried out at Sertaneja, northern State Paraná, Brazil, from February to April, 1995, are presented. Among the 4534 immature forms collected, belonging to 21 species or species-groups, the species with higher density were Aedes aegypti (Linnaeus, 1762), Aedes albopictus (Skuse, 1894), Culex quinquefasciatus Say, 1823 and Limatus durhami Theobald, 1901.

Culicidae; larvae; vectors; Brazil


Culicidae; larvae; vectors; Brazil

IMATUROS DE MOSQUITO (DIPTERA, CULICIDAE) DE ÁREAS URBANA E RURAL NO NORTE DO ESTADO DO PARANÁ, BRASIL1 1 . Financiado pela Fundação Nacional de Saúde.

Allan Martins da Silva2 1 . Financiado pela Fundação Nacional de Saúde.

ABSTRACT

IMMATURES OF MOSQUITOES (DIPTERA, CULICIDAE) IN URBAN AND RURAL ENVIRONMENTS OF NORTHERN PARANÁ STATE, BRASIL. The results of larval collections of mosquitoes from artificial containers and natural breeding at urban and rural areas carried out at Sertaneja, northern State Paraná, Brazil, from February to April, 1995, are presented. Among the 4534 immature forms collected, belonging to 21 species or species-groups, the species with higher density were Aedes aegypti (Linnaeus, 1762), Aedes albopictus (Skuse, 1894), Culex quinquefasciatus Say, 1823 and Limatus durhami Theobald, 1901.

KEYWORDS. Culicidae, larvae, vectors, Brazil.

INTRODUÇÃO

Os ecossistemas antrópicos são diferentes dos naturais por apresentarem feições próprias (Clapham Jr. apud FORATTINI, 1992). Tanto os ambientes urbanos quanto o rural, sofrem modificações profundas devido à atividade humana, a qual influencia formas imaturas de culicídeos ditos sinantrópicos que tendem a ocupar determinados tipos de criadouros, na sua maioria, artificiais.

No Estado do Paraná (Brasil), estudos foram realizados na intenção de identificar o comportamento de imaturos de mosquitos frente ao ambiente modificado pelo homem: ANDRADE & RACHOU (1954), LOPES et al. (1987), SILVA & MENEZES (1996) em área rural; SILVA & LOPES (1985), LUZ et al. (1987), LOPES et al. (1993) em área urbana e LOZOVEI & LUZ (1976a,b), nos dois ambientes.

Apresenta-se os resultados das coletas de larvas realizadas no município de Sertaneja, norte do Paraná, expondo de forma quali- e quantitativa a composição da fauna de Culicidae de criadouros artificiais e naturais em áreas urbana e rural.

MATERIAL E MÉTODOS

O município de Sertaneja está localizado no terceiro planalto do Estado do Paraná, na zona fisiográfica do Norte (23º01'S, 50º47'W). A Mata Tropical nesta região foi inicialmente substituída, em sua maior parte, pela cultura cafeeira, hoje ocupada por rotação de culturas de milho, trigo e soja (WONS, 1985). Foram investigadas duas áreas urbanas, a cidade de Sertaneja e o povoado de Paranagi, entre 1 de fevereiro e 24 de abril de 1995. Na área rural, foram amostrados seis pontos, com 400 m de raio, separados por distâncias regulares de 3 km, nas rodovias PR 160 e PR 323, entre os quilômetros 0-21 e 0-8, respectivamente.

As pesquisas realizadas nas áreas urbanas cobriram residências, terrenos baldios, cemitério e outros possíveis pontos para o desenvolvimento larvário de mosquitos, como postos de combustível, borracharias e depósitos de material de construção. Na área rural, incluíram-se residências, campos de cultivo, escola rural, aviário e posto de fiscalização. Todos os reservatórios contendo água foram observados, artificiais ou naturais. Os imaturos foram recolhidos com peneira de malha fina, aplicada em vários lances, objetivando coletar maior número de indivíduos e acondicionados em pequenos tubos de vidro contendo etanol a 70%, devidamente etiquetados, transportados para o laboratório, analisados e depositados na coleção da 19ª Regional de Saúde de Jacarezinho, Paraná.

A identificação dos exemplares foi realizada com bibliografia de LANE (1953a,b); FORATTINI (1962, 1965a,b); CONSOLI & LOURENÇO-DE-OLIVEIRA (1994). A abreviação dos gêneros segue REINERT (1975).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram coletadas nos dois ambientes, rural e urbano, 4534 formas imaturas de culicídeos de 21 espécies ou grupos de espécies distribuídas em oito gêneros, arroladas segundo GUIMARÃES (1997) (tab. I). As espécies com maior representatividade, coletadas nas duas áreas, Ae. aegypti 43%e Ae. albopictus 33,8% foram encontradas apenas em recipientes artificiais, assim como Cx. quinquefasciatus e Li.durhami, representando respectivamente 16,1% e 2,3% (tabs. II, III). O ambiente urbano contribuiu com 86,5% dos imaturos coletados e dentre eles, os mais representativos foram Ae. aegypti (49,4%), Ae. albopictus (31,4%) e Cx. quinquefasciatus (16,0%). Li. durhami, An. argyritarsis, Cx. aff. declarator, Culex sp. do grupo coronator, Ae. fluviatilis e An. triannulatus totalizaram 123 imaturos, correspondendo a 3,2% do total coletado.

Para os 610 imaturos coletados no ambiente rural (tab. III), além da maioria das espécies citadas para o ambiente urbano, foram encontradas Ur. nataliae, Cx. eduardoi, Ur. lowii, Cx. chidesteri, Cx. bigoti, Cx.(Melanoconion)spp., An. evansae, Ae. scapularis, Ps. confinnis, Toxorhynchitessp. e Sabethessp., sendo esta última coletada apenas uma vez, em lata pequena, abandonada na margem de uma mata residual. O gênero Aedes contribuiu com 312 espécimens (51,1%), Culex 163 (26,7%), Limatus 69 (11,3%), Uranotaenia 44 (7,2%), Anopheles 17 (2,8%), Psorophora 2, Sabethes 2, Toxorhynchites 1. Neste ambiente verificou-se a predominância do Ae. albopictus sobre outras espécies em criadouros artificiais, seguida por Cx. quinquefasciatus e Li.durhami.

Aedes aegypti foi encontrada colonizando ampla variedade de recipientes em área urbana, sem mostrar preferência por qualquer um deles. Vaso de plantas, pneu e recipiente de plástico ou metal reuniram 69,6% dos exemplares coletados desta espécie, coincidindo com o observado por LOPES et al. (1993). Entretanto, na área rural a sua presença esteve restrita a poucos recipientes.

Aedes albopictus é uma espécie exótica, e assim como Ae. aegypti, poderá vir a ter importância epidemiológica. Isto se deve à sua valência ecológica que a possibilita colonizar com sucesso o ambiente urbano e o rural, utilizando criadouros naturais e artificiais. Na área urbana de Sertaneja, mostrou acentuada preferência por vaso de plantas, enquanto que na rural, dominou em recipientes dos tipos plástico e lata, na forma de lixo. Pneus albergaram a espécie nos dois ambientes.

Nos diferentes tipos de criadouros na área urbana, as larvas de Ae.aegypti foram encontradas em maior número do que as de Ae. albopictus em pneus, latas/plásticos e caixas d'água. Em vasos de plantas, as quantidades foram praticamente iguais (fig. 1). SILVA & MENEZES (1996) encontraram duas larvas de Paranapanema. Essa espécie é normalmente encontrada em coleções hídricas temporárias e semi-permanentes, formadas no solo principalmente pelas águas das chuvas (CONSOLI & LOURENÇO-DE-OLIVEIRA, 1994). Aedes fluviatilis, espécie autóctone, foi encontrada em pequenos criadouros do cemitério, em cujo ambiente também foi coletada por ANDUZE (1973), SILVA & LOPES (1985) e LOPES et al. (1993). Estes últimos autores ressaltaram a grande capacidade de distribuição e adaptabilidade a diversos tipos de criadouros artificiais desta espécie para a área urbana de Londrina, Paraná. Este fato foi também observado no norte do Estado, antes do processo de colonização por Ae. aegypti e Ae. albopictus. Atualmente, a ausência de Ae. fluviatilis em criadouros artificiais de determinadas regiões pode estar relacionada a competitividade com outras espécies. Gonçalves, 1989, apud NATAL et al. (1997), citou ter detectado competição entre Cx. quinquefasciatus e Ae.fluviatilis; esta última, por ser muito comum na Região Neotropical, segundo CONSOLI et al. (1987), é freqüentemente coletada juntamente com Cx. quinquefasciatuse Ae. aegypti.


As espécies do subgênero Culex apresentaram acentuada diversificação quanto a criadouros e ambientes. Encontradas colonizando recipientes em área urbana foram Cx. quinquefasciatus, Cx. aff. declarator e Cx.sp. do grupo coronator. A primeira foi encontrada desenvolvendo-se em recipientes nos dois ambientes, sendo que, no urbano, vaso de plantas e pneu contribuíram com 63,3% das larvas coletadas e no meio rural, esteve restrita a criadouros do tipo pneu, caixa d'água, plástico e lata, quando estes estavam próximos às habitações humanas. Larvas de Cx. aff. declarator e Culex. sp. do grupocoronator foram coletadas de recipientes em área urbana e de criadouros artificiais de solo e natural permanente, tipo alagadiço, em área rural.

As espécies encontradas apenas na área rural, colonizando coleções líquidas de solo do tipo escavação e alagadiço, foram Cx.eduardoi,Cx. chidesteri e Culex (Melanoconion) spp. Já Cx. bigoti foi encontrada em pneus. Limatus durhami foi mais freqüente em recipientes de plástico e lata, geralmente em locais sombreados, junto a porções de mata residual, em ambiente rural. Segundo CONSOLI & L.-DE-OLIVEIRA (1994), trata-se de um sabetíneo que aproveita recipientes abandonados em florestas, plantações geralmente próximas à mata e no peridomicílio.

Dos anofelinos coletados, An. argyritarsis foi encontrada em recipientes no ambiente urbano. No ambiente rural, esteve tanto em criadouros artificiais como naturais. A capacidade adaptativa dessa espécie a tais circunstâncias já foi mencionada por LOPES et al. (1993). Anopheles triannulatus foi encontrada ocasionalmente no meio urbano em criadouro artificial, distintamente do citado por FORATTINI (1962), que associa a sua presença a grandes coleções líquidas, expostas ao sol e com abundante vegetação horizontal e de CONSOLIM & FAGUNDES (1981) que, em coletas realizadas na região do alto rio Paraná, identificam como seus criadouros mais comuns, grandes lagoas existentes nas ilhas e nas margens do rio. Anopheles evansae foi coletada em Sertaneja no meio rural, em criadouros do tipo escavação de solo, represa e alagadiço. FORATTINI (1962) destacou como criadouros desta espécie, remansos de rios e riachos, poças, buracos em rochas, escavações diversas, como valas, barreiras, alagadiços e poços.

Encontraram-se Ur. nataliae e Ur. lowii colonizando apenas um tipo de criadouro, terreno alagadiço com água pouco profunda e coberta por vegetação. L.-DE-OLIVEIRA et al. (1986) verificaram situação similar, onde grandes massas líquidas cobertas por gramíneas corresponderam aos criadouros das espécies deste gênero.

Os vasos de plantas foram o criadouro em área urbana que apresentou maior abundância de espécies (7) e de exemplares coletados (1409), representando 35,9% do total, seguido de pneu (19,8%) e recipientes de plástico e lata (16,2%). No ambiente rural, o maior percentual ficou com os recipientes de plástico e lata com 320 exemplares (52,5%) e pneu (17,9%).

Recebido em 25.09.2000; aceito em 22.08.2002.

2. Secretaria de Estado da Saúde do Paraná, 19ª Regional de Saúde, Seção de Ação Sobre o Meio, Caixa Postal 214, 86400-000, Jacarezinho, PR, Brasil.

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  • 1
    . Financiado pela Fundação Nacional de Saúde.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Fev 2003
    • Data do Fascículo
      Dez 2002

    Histórico

    • Aceito
      22 Ago 2002
    • Recebido
      25 Set 2000
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