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Análise das abordagens sobre as funções do administrador

ARTIGOS

Análise das abordagens sobre as funções do administrador

Hélio Janny Teixeira

Professor na Faculdade de Economia e Administração da USP e na EAESP, área de Administração Geral; economista pela CEA/USP; administrador pela EAESP/FGV e mestre em administração pela CEA/USP

1. CONCEITO DE FUNÇÃO E ALGUNS PROBLEMAS DE SUA APLICAÇÃO AO TRABALHO ADMINISTRATIVO

Em geral, os autores da teoria administrativa empregam o conceito da função sem justificar por que o adotaram como base para caracterizar o trabalho administrativo e sem defini-lo de maneira clara. Eles seguem a tradição iniciada por Fayol sem serem influenciados pelas contribuições relevantes da psicologia social que abordou o assunto sob o título "teoria do papel". Assim, o termo função poderia ser substituído por outros nomes como: atividades, propósitos da ação administrativa, tipo de ação, orientação da ação, etc. Isto tem ocasionado problemas, pois o conceito passa a ser utilizado com abrangência superior às suas possibilidades ou de modo mal direcionado, ao mesmo tempo que não fica clara sua posição em relação às outras dimensões do trabalho administrativo. As conseqüências do que foi mencionado vão desde as dificuldades de uso prático do conceito por parte de dirigentes e pesquisadores, até a utilização equívoca em cursos de administração, prejudicando a elaboração dos programas e a aprendizagem dos alunos.

Apesar da ausência de definição explícita por parte dos autores, normalmente o nome função é adotado para relacionar a atuação do administrador ao seu contexto de trabalho, ou seja, mostra os resultados do trabalho administrativo para a sua unidade organizacional. Esta linha é coerente com a definição mais precisa adotada pelos autores estruturalistas, como Piaget (1969), para quem "função é o resultado do funcionamento de uma subestrutura para o funcionamento de uma estrutura total" (p. 130).

Tomando-se o caminho da psicologia social, notamos que há várias dificuldades conceituais inerentes à questão, que, quando percebidas, dão um sentido mais claro ao assunto. Conforme podemos ver em Krauss (1965), Biddle (1966) e Sarbin (1969), o emprego do conceito de papel é complexo e não há consenso entre os estudiosos sobre o mesmo. Adotando-se as posições destes autores e utilizando o enfoque da teoria do papel, podemos identificar as seguintes restrições às abordagens usuais sobre as funções do administrador:

a) apesar dos autores da administração quererem aplicar o conceito no sentido prescritivo (Krauss, 1965), eles realmente o fazem no "sentido idealizado", ou seja, os estudos não identificam por que o administrador deve ter certos comportamentos quando ocupa o cargo, dizem apenas que ele deve comportar-se de certa maneira. Os critérios de validação do papel são deixados de lado;

b) os vários sentidos ou empregos interessantes do conceito (Krauss, 1965) não são considerados ou são pouco considerados, como o papel subjetivo (conforme percebido pelo indivíduo), o papel desempenhado (o que o indivíduo realmente faz). Conseqüentemente, a grande maioria dos estudos que adotaram a abordagem funcional deixou de lado o indivíduo, ou seja, o trabalho real dos administradores em situações específicas, e analisou as "funções dos administradores em geral", em situações idealizadas. Com isto ignoraram as diferenças entre os administradores quando ocupam cargos diversos em contextos variados;

c) a perspectiva de análise ou o nível do enfoque usualmente não fica claro, gerando confusões entre o papel do administrador perante o grupo restrito, perante a empresa como um todo, ou diante do contexto social mais amplo.

As limitações apontadas, e outras, serão vistas de forma mais específica, com a identificação dos autores, nos tópicos seguintes.

2. CRITÉRIOS PARA AVALIAR AS ABORDAGENS SOBRE AS FUNÇÕES ADMINISTRATIVAS

Tencionamos definir critérios de avaliação, que nos permitam fugir um pouco de uma análise superficial das funções, algo muito comum quando os autores apontam as categorias1 1 Utilizaremos, até o final deste artigo, a palavra categoria, para indicar as funções ou papéis do administrador. como muito gerais ou ambíguas, mas não identificam os graus e as causas da generalidade e da ambigüidade. Por outro lado, sabemos que o aprimoramento desses critérios bem como a avaliação mais precisa das diversas classificações demandam testes empíricos, além de análises lógicas apriorísticas. Revisamos as experiências de autores que aplicaram ou tentaram aplicar em pesquisas às abordagens sobre as funções administrativas, e ao mesmo tempo efetuamos alguns testes rudimentares com alunos de cursos de graduação em Administração. Entretanto, estes elementos são insuficientes para uma análise conclusiva do tema, e nosso objetivo será mais levantar problemas ou falhas nas classificações, os pontos fortes e fracos de cada uma delas, sem chegar a uma síntese global ou a uma nova forma de enfocar o trabalho administrativo.

O propósito da avaliação é determinar o grau de utilidade das abordagens para a prática da administração (e, conseqüentemente, para cursos e pesquisas) bem como os fatores que reduzem essa utilidade.

Os critérios de avaliação adotados são os seguintes:

1. Número de categorias, conteúdo das mesmas e grau de evidência dos critérios ou pressupostos utilizados na classificação. Neste item procuraremos identificar o conteúdo das categorias e os critérios utilizados para formá-las, dentro das seguintes possibilidades:

a) Contigüidade e similaridade - formar categorias por contiguidade seria dividir o processo administrativo em partes que estão em seqüência. A formação por similaridade, como o próprio nome indica, procuraria aglutinar, sob uma categoria, as atividades ou partes do processo administrativo semelhantes em relação a algum aspecto;

b) processo real e processo ideal - grau em que a classificação se baseia em um processo que ocorre na realidade ou em um que deveria ocorrer (idealizado).

2. Abrangência. Diz respeito ao grau em que abarca a realidade do administrador (o conteúdo do trabalho administrativo).

3. Grau de ambigüidade na identificação das categorias em um trabalho real e grau de utilidade para orientar o trabalho prático dos administradores.

a) diferenciação versus precisão da medida - quanto maior o número de categorias, maior a possibilidade de diferenciação dos fenômenos e mais difícil fica a realização de medições precisas das mesmas;

b) superposição de categorias como fonte indesejável de ambigüidade - mostra o grau em que o mesmo fenômeno pode ser identificado por meio de mais de uma categoria. Como veremos, a simultaneidade de ocorrência das categorias é algo difícil de ser evitado, devido a variações do referencial adotado para classificar as operações, pois, segundo Sayles (1961), "a função básica do administrador é manter ou estabilizar diversos fluxos inter-relacionados de trabalho" (p. 67), que ocorrem seqüencial e simultaneamente.

4. Grau de facilidade em identificar as variações no trabalho administrativo. A classificação em funções deve ser igualmente útil para representar o trabalho administrativo nos mais diferentes cargos e níveis hierárquicos. Para tal, deve mostrar "sensibilidade" às variações situacionais ou, em outras palavras, os valores das categorias devem variar e serem passíveis de identificação (mensurabilidade).

5. Grau de facilidade em "absorver" as contribuições da teoria administrativa. Grau em que as diversas contribuições da teoria administrativa, como estudos sobre liderança, tomada de decisão, sistemas de informações, etc. podem ser absorvidos pelas categorias, para orientar o trabalho do administrador.

3. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DAS PRINCIPAIS CLASSIFICAÇÕES DAS FUNÇÕES DO ADMINISTRADOR

Entre as diversas classificações do trabalho administrativo, analisaremos as principais, para evitar que este tópico fique muito repetitivo e, também, por não ser nosso objetivo efetuar estudo exaustivo do assunto. A principal classificação é sem dúvida a clássica, tendo como pioneiro Fayol (1970) e muitos seguidores, inclusive autores da atualidade. Nenhuma outra teve tanta repercussão na teoria administrativa, mas podemos destacar alguns autores que desaprovaram a visão clássica e propuseram classificações alternativas, como Simon (1960), Sayles (1961) e Mintzberg (1973). Em decorrência do exposto, separaremos as classificações dos autores em dois grupos: clássicos (e seguidores) e autores contrários à abordagem clássica. Em cada um dos grupos distinguiremos aqueles que efetuaram pesquisa de campo, aplicando as abordagens, dos outros que fizeram apenas desenvolvimentos lógicos, sem testes práticos, explícitos.

3.1 Clássicos e seguidores

Neste grupo, além dos clássicos (como Fayol) e seguidores (Koontz e O'Donnel, Newman, Jucius e Schlender, Ernest Dale, etc), incluiremos também alguns autores (Chester Barnard e Drucker) que não se opuseram à abordagem clássica, e adotaram outra semelhante.

Os critérios utilizados para analisar as classificações não serão aplicados de maneira uniforme a todas elas. Variará em função do interesse e também para evitar repetições.

1. Número de categorias, conteúdo das mesmas e grau de evidência dos critérios ou pressupostos utilizados na classificação. Inicialmente descreveremos as classificações dos diversos autores, para depois comentá-las.

Segundo Fayol (1970), "administrar é prever, organizar, comandar, coordenar e controlar".

• "Prever é perscrutar o futuro e traçar o programa de ação.

• Organizar uma empresa é dotá-la de tudo que é útil a seu funcionamento: matérias-primas, utensílios, capitais e pessoal, constituindo um duplo organismo material e social.

• Comandar é dirigir o pessoal.

• Coordenar é ligar, unir e harmonizar todos os atos e todos os esforços.

• Controlar é velar para que tudo ocorra de acordo com as regras estabelecidas e as ordens dadas."

"Assim compreendida, a administração não é nem privilégio exclusivo nem encargo pessoal do chefe ou dos dirigentes da empresa; é uma função que se reparte, como as outras funções essenciais, entre a cabeça e os membros do corpo social" (p. 20).

Newman (1974) estabelece a seguinte classificação para as funções do administrador:

• "Planejar - isto é, determinar a tarefa a realizar. No sentido aqui empregado, o planejamento abrange uma vasta gama de decisões, tais como esclarecer os objetivos, firmar as políticas, traçar programas e campanhas, estabelecer métodos e procedimentos específicos e fixar a programação diária.

• Organizar - isto é, grupar as atividades necessárias à realização dos planos em unidades administrativas e definir as relações entre a chefia e os empregados dessas unidades.

• Reunir recursos - isto é, obter, para utilização pela empresa, o pessoal de chefia, o capital, as instalações e tudo mais que seja necessário à execução dos planos.

• Supervisionar - isto é, ter a direção diária das operações. Isto inclui a emissão de instruções, a motivação daqueles que devem seguir essas instruções, a coordenação do trabalho detalhado, bem como o contato pessoal entre "patrão" e seus subordinados.

• Controlar - isto é, assegurar que os resultados obtidos correspondam, tanto quanto possível, aos planos. Isto implica estabelecer padrões, comparar os resultados atuais com o padrão estabelecido e na necessária ação quando a execução se desviar do plano."

"Há um sexto grupo de atividades que, em grau maior ou menor, absorve o tempo de todo administrador, ou seja, o desempenho de atividades não-delegáveis...

Conseqüentemente, não faremos, neste estudo, mais do que verificar que as atividades não-delegáveis restringem o tempo que um administrador pode dedicar a tarefas administrativas..." (p. 18 e 19).

Analogamente a Newman, para Koontz e O'Donnel (1959), "o método mais útil de classificar as funções administrativas é agrupá-las em torno das atividades de planejamento, organização, designação de pessoal, direção e controle.

"Nem sempre é possível na prática separar todas as atividades administrativas exatamente nestas categorias, de vez que as funções tendem a se fundir; não obstante, esta classificação é instrumento útil e realístico" (p. 48).

"... Os autores excluíram a representação como função separada, pois parece que ela é um complexo composto em parte de comunicação e do exercício de autoridade (incluídos na direção e na organização respectivamente) e em parte devido à influência dos não-administradores na imagem da empresa."

Koontz e O'Donnel (1959) tratam também da universalidade das funções administrativas, realçando que: a) "os administradores desempenham suas funções, quaisquer que sejam seus lugares na estrutura organizacional ou tipo de empresa... " e, em conseqüência, "as funções de um administrador se aplicam a todos os administradores... é agora possível desenvolver-se uma teoria de administração aplicável a todos os executivos em todas as ocupações...; b) "o conhecimento e a experiência administrativa são transferíveis de um departamento para outro (...) até o ponto em que suas tarefas forem administrativas e não técnicas, e com motivação adequada..." (p. 55 e 56).

As funções administrativas, segundo Jucius e Schlender (1972), são as seguintes:

"O planejamento é a função administrativa que determina antecipadamente que grupo de indivíduos deve fazer o que, e como as metas devem ser atingidas. Ele estabelece metas, métodos para que elas sejam atingidas, e quais os recursos necessários para isso.

É uma função por meio da qual se programa antecipadamente o trabalho que será eventualmente feito. Cada nível de uma organização torna o planejamento do nível que lhe está acima e, ou converte os planos para o nível que lhe está abaixo, ou aplica os planos como eles foram traçados. O planejamento é o passo original da tomada de decisão da ação administrativa."

• A organização é a função administrativa de congregar os diversos recursos e fatores necessários para a execução dos planos, após seu estabelecimento. Deve ser estabelecida uma estrutura de organização por meio da qual os diversos executivos e subordinados serão coordenados. Devem ser estabelecidos sistemas e normas para executar os projetos especificados nos planos. Devem ser procurados pessoal, materiais, instrumentos, equipamentos e outros recursos necessários à execução dos planos. Dessa maneira, em certo sentido, a organização é a função de assentar a máquina necessária para a operação dos planos.

• Direção é a função administrativa de gerir a organização à medida que esta ativamente executa os planos. Um diretor é comparável a um piloto dirigindo seu avião para um objetivo, ou um capitão na ponte de comando do navio, à medida que este navega em direção ao porto. Do mesmo modo, na fase "operacional", a administração empenha-se em dirigir e motivar a organização à medida que esta procura ativamente converter os planos em resultados.

• Controle é a função administrativa de regular e restringir atividades. O piloto e o capitão alcançaram o porto certo? E o fizeram em tempo hábil? E com um mínimo ou justificável desvio da rota planejada? E foram levados em consideração os desejos dos passageiros?

Para Ernest Dale (1969), as funções do administrador são: planejamento, organização, designação de recursos, direção, controle, inovação e representação. Essa classificação é mais abrangente do que as anteriores ao incluir a representação (relacionamento externo do administrador). Há alguns autores modernos que adotaram o enfoque sistemático para representar a organização, mantendo porém a visão clássica quanto às funções do administrador.

Johnson, Kast e Rosenzweig (1967) mostram o processo administrativo composto por quatro funções: planejamento, organização, controle e comunicação. Consideram que as funções não são atividades independentes e que não há implicitamente seqüência exata de tempo.

Kast e Rosenzweig (1970), em outro livro, classificam o processo administrativo em: planejamento, organização, obtenção de recursos, motivação e controle. Além disso, consideram a administração como um dos cinco subsistemas da organização (Metas e valores, Psicológico, Estrutura, Psicossocial e Administrativo) que tem por incumbência integrar os outros.

Os autores mencionados até agora não explicitaram de maneira clara os critérios adotados para formar as funções. Nota-se, entretanto, que se basearam principalmente no critério de contiguidade, em termos do ciclo de planejamento - implantação - controle, para construir a categorização. Poderíamos consolidar todas as abordagens (sem incluir a abordagem de Ernest Dale) da seguinte maneira:

Em um ciclo de trabalho, pode-se classificar a atividade do administrador em quatro funções, com base na relação entre a ação grupal e o tempo. Suponhamos três instantes de tempo:

t -1 - antes da ação grupal;

t - durante a ação grupal;

t + 1 - após a realização da ação grupal.

Em t - 1, o administrador exercerá a função de planejar, isto é, determinar antecipadamente os resultados a serem alcançados e os meios pelos quais o grupo poderá alcançar esses resultados. Incluiríamos a função Organizar no planejamento (planejamento da estrutura organizacional).

Em t, o administrador exercerá as funções de obter recursos e dirigir. Durante a obtenção de recursos, o administrador procurará reunir os recursos materiais e humanos, necessários à execução do planejamento. A direção agrupa as atividades durante as quais o administrador, tendo contato com os subordinados, comunica-se com os mesmos, de maneira a transmitir-lhes as informações requeridas para o desempenho da atribuição. Ainda, para fazer com que os subordinados executem a tarefa de acordo com o planejamento, o administrador deverá, através da comunicação, estimulá-los e fazer com que se identifiquem com os objetivos da organização.

Em t + 1, o administrador exercerá função de controlar, isto é: verificará se existe adequação entre o que foi planejado e o realizado, de maneira a corrigir os desvios e assegurar a consecução (ou mudança) de planos.

O quadro 1 mostra a comparação entre as abordagens dos vários autores mencionados.


É importante notar que os autores colocaram as funções em seqüência, formando um ciclo de elementos interligados. Assim, elas só se definem de maneira clara quando contrapostas, ou seja, de per si não há uma característica definida. Por exemplo, coletar informações sobre o trabalho dos subordinados faz parte do controle, se houver um planejamento prévio deste trabalho. Se não houver, essa atividade poderia ser enquadrada como parte do planejamento, se forem utilizadas para melhorar o esquema de trabalho. Quando afirmamos que de per si elas não têm característica definida, queremos dizer que o conteúdo de uma função particular só difere do conteúdo das outras se elas forem colocadas em seqüência e estiverem ligadas a um mesmo esquema de referência.

Por exemplo: o planejamento está presente em todas as outras funções. A obtenção de recursos deve ser planejada, o controle também. Em menor grau pode-se pensar em planejamento da direção.

Seguindo a linha de raciocínio anterior, autores modernos, como Ackoff (1970), elaboraram modelos com o planejamento participando de diversos níveis e áreas, como planejamento dos fins, planejamento da estrutura organizacional, planejamento da obtenção de recursos, planejamento de controle, etc.

Há também o problema de classificação das atividades que em certo momento não se caracterizam de modo preciso, como componente de qualquer uma das funções. Por exemplo, a leitura de um jornal pelo administrador é em si uma atividade que não se enquadra em nenhuma das funções. Entretanto, se o administrador utilizar algum dado da leitura para planejar ou detectar alguma falha dos subordinados, ele passará a ter uma localização definida no planejamento ou no controle. Em geral, as atividades com utilidade potencial, principalmente as ligadas à coleta de dados, são difíceis de serem identificadas como pertencentes a uma função específica.

A diversidade de terminologia adotada pelos vários autores, sem justificativa explícita, e também os nomes diferentes para se referir ao mesmo conteúdo, dificultam a aprendizagem dos iniciantes na teoria administrativa.

Como autores que adotaram abordagens semelhantes à clássica, citaremos Chester Barnard e Drucker.

Para Barnard (1971), a função do administrador seria prover a organização dos elementos necessários e suficientes à sua existência contínua, quais sejam: comunicação, desejo de servir ao propósito comum. As funções do administrador seriam: manutenção das comunicações da organização, garantia de serviços essenciais aos indivíduos e formulação de objetivos.

Esse autor tem o mérito de ser um dos primeiros a explicitar a dependência da organização em relação a seu meio ambiente e de realçar a importância da comunicação para os administradores. Sua classificação não pode ser considerada melhor que as apresentadas, a não ser quanto à distinção que efetuou entre atividades dá administração e atividades da organização, e tem a seguinte correspondência (aproximadamente) com a clássica:

a) manutenção das comunicações organizacionais equivaleria, na clássica, a definição da estrutura organizacional, obtenção de pessoal, controle e estímulo da pessoa;

b) garantia dos serviços essenciais aos indivíduos equivaleria a obter pessoal e dirigir;

c) formulação de propósitos corresponderia ao planejamento.

Para Drucker (1975) as tarefas do administrador seriam:

a) "cumprir" a finalidade e missão específica das instituições em que trabalhe;

b) tornar o trabalho produtivo e o trabalhador realizado;

c) administrar impactos sociais e responsabilidades sociais.

Essa classificação também não pode ser considerada melhor do que as anteriores apesar de identificar mais claramente alguns dos propósitos da administração.

2. Abrangência. Os trabalhos de campo sobre os administradores Carlson (1951), Choran (1969), Guest (1956), Stewart (1967 e 1976), etc. e também as pesquisas que adotaram de maneira aproximada, o enfoque clássico, como o estudo de Fleishman (1953) e o de Mahoney (1963), tudo isso mostra que as classificações analisadas anteriormente não abarcam toda a realidade administrativa. Elementos importantes como representação (envolvendo contatos diversos do administrador, além daqueles com seus subordinados - incluídos na direção) e negociação (compras, vendas, trocas diversas) não foram considerados ou não podem ser abarcados de maneira explícita pela classificação clássica. Julgamos essas duas categorias importantes para diferenciar os diversos, cargos administrativos e identificar seus requisitos, e com isso direcionar a contento programas de seleção, treinamento, etc.

3. Grau de ambigüidade na identificação das categorias em um trabalho real e grau de utilidade para orientar o trabalho prático dos administradores. A maioria dos autores que efetuaram pesquisa de campo, como Carlson (1951), Mintzberg (1973) e Stewart (1967), considera que a classificação clássica não oferece ao administrador uma nomenclatura que absorva, sem sobreposições de categorias e dúvidas de enquadramento, o conteúdo prático do seu trabalho. E justificam essa linha de pensamento dizendo que as classes são muito genéricas ou mal definidas.

Alguns pesquisadores que adotaram a classificação clássica expandida, como Fleishman (1953) (nove funções) e Mahoney (1963) (oito funções), fizeram testes de validação para verificar em que medida pessoas diferentes classificavam igualmente o mesmo fenômeno. Fleishman (1953), que aplicou questionários a 300 membros de tripulações da força aérea norte-americana, concluiu que houve um acordo entre 71 e 88% quando membros do grupo descreviam o próprio líder, utilizando a classificação clássica expandida (p. 2).

Mahoney (1963) fez um teste com seu esquema, aplicando-o a 21 supervisores que tinham de classificar 100 exemplos específicos de desempenho administrativo. Houve um acordo médio de 70% entre eles, variando entre 53% e 78% em função da categoria (p. 18).

Um problema apontado por Fleishman (1953), após efetuar análises matemáticas, foi a falta de independência entre as nove categorias que poderiam ser reduzidas a apenas duas, com maior grau de independência: Consideration (dimensão que refletia o grau em que o líder considerava os sentimentos dos trabalhadores) e Initiating structure (refletia o grau em que o líder definia ou facilitava as interações grupais em direção ao alcance das metas) (p. 2).

Além dos problemas de ambigüidade e falhas de classificação já levantados, o próprio dinamismo, a abertura e variedade de trabalhos, inerentes ao cargo administrativo, acarretam dificuldades de classificação.

Nós vimos como as funções do administrador complementam-se e encadeiam-se. Entretanto, há situações em que não é necessário seguir-se a seqüência mencionada. Por exemplo, se os recursos exigidos para a execução do planejado estiverem disponíveis, faltará apenas dirigir e controlar. Em casos extremos, o administrador poderá somente planejar e controlar, quando os planos são precisos e completos, estando os recursos obtidos, e não haverá necessidade de direção; pois os planos já contêm informações suficientes para serem seguidos.

Conforme Sayles (1961), o administrador deve manter em funcionamento diversos fluxos de operação, que ocorrem simultaneamente ou em seqüência. Os fluxos variam em função da natureza do cargo mas, de maneira genérica, podemos identificar fluxos de materiais, de recursos financeiros, de informações, de pessoas e mistos que são os mais comuns e envolvem diversos recursos.

A seguir damos exemplos dos fluxos:

• Fluxo de recursos materiais: obtenção de materiais, transformação de matérias-primas em produtos acabados, transporte de materiais, armazenagem, etc.

• Fluxo de recursos financeiros: obtenção de recursos financeiros, aplicação de recursos, etc.

• Fluxo de informações: trabalhos burocráticos diversos envolvendo coleta de dados, filtragem dos mesmos, síntese, classificação, distribuição, etc.

• Fluxo de pessoas: obtenção de pessoal, alocação das pessoas, desenvolvimento dos subordinados, etc.

• Fluxos mistos: na prática, os recursos citados nos fluxos anteriores costumam combinar-se, formando fluxos complexos ("sistemas de trabalho, rotinas, etc"), que podem ou não estar formalmente definidos.

No caso de um fluxo particular, é fácil aplicar-se a classificação funcional, mas quando o administrador muda a cada instante de foco de atenção, passando de um fluxo para outro, a dificuldade aumenta, e a abordagem tem a sua utilidade prática reduzida por não conter elementos que indiquem, por exemplo, quando o administrador deve planejar cada fluxo. Essa questão da mudança de foco de atenção foi apontada pelos diversos autores que estudaram o trabalho real dos administradores. Principalmente Carlson (1951), Stewart (1967), Mintzberg (1973), Choran (1969) e Guest (1956), mostraram de maneira quantitativa a variabilidade e fragmentação do trabalho administrativo, implicando uma reformulação ou complementação da visão clássica, que pressupõe uma seqüência definida (planejamento, obtenção de recursos, etc), que não ocorre de maneira nítida na prática, pois o administrador muda de função e de fluxo de trabalho continuamente sem uma seqüência prevista.

Graficamente (quadro 2), podemos comparar a visão clássica com outra que achamos mais válida:


Visão Clássica: Cada função seria aplicada a todos os fluxos de forma simultânea.

É claro que numa visão lógica a seqüência proposta pelos clássicos ocorre, pois antes de algo ser executado, deve ser planejado, e só após o planejamento (criação de padrões) pode haver o controle. O que dissemos visa apenas demonstrar que a visão clássica é simplista ao deixar de lado a descontinuidade existente no exercício das diversas funções.

Para concluir este tópico, afirmamos que a principal vantagem da abordagem clássica está em fornecer uma visão global sobre o trabalho administrativo, centrada em categorias significativas que consolidam atividades ou pormenores sem grande importância, quando considerados isoladamente. Esta visão abrangente, apesar de útil para uma primeira aproximação sobre o significado da administração, é insuficiente para abarcar toda a complexidade do fenômeno. Ela não contém elementos que permitam um desdobramento sistemático das categorias de análise, em função das necessidades de aplicação. De qualquer forma, o uso da mesma em cursos e pesquisas deve levar em conta as críticas que efetuamos neste tópico.

4. Grau de facilidade em identificar as variações no trabalho administrativo. Com exceção daqueles que efetuaram pesquisa de campo, como Mahoney (1963) e Fleishman (1953), os demais autores que citamos ilustram as funções administrativas, em nível da organização como um todo (cargos de cúpula), apesar de considerarem que elas são aplicáveis a qualquer nível ou gênero de cargo administrativo. Também se preocuparam mais em estabelecer as igualdades do que as diferenças entre os cargos administrativos. Esta linha de análise, iniciada por Fayol,2 2 Fayol (1970), no capítulo 2 de seu livro Administração industrial e geral, chamou a atenção para o problema das variações no trabalho administrativo; conforme se mudava o porte da organização, o nível hierárquico e o gênero do cargo, mas seus seguidores infelizmente relegaram esse assunto a segundo plano. teve continuidade em muitos outros autores, com conseqüências negativas para o ensino e talvez para a prática da administração.

Os autores já citados neste artigo como Koontz & O'Donnel (1959), Newman (1974) e outros, bastante lidos pelos interessados na administração, seguiram Fayol e ilustraram, por exemplo, a função planejamento com elementos ou conceitos voltados ao planejamento da organização como um todo. Ilustraram a organização com teorias de departamentalização e relações hierárquicas, também aplicáveis a toda a organização. O mesmo se pode falar das outras funções, com exceção da direção, que ficou ilustrada mais em nível da atuação de um administrador em qualquer nível da organização.

Esse tipo de colocação dificulta a aplicação da abordagem aos diversos cargos administrativos que variam quanto ao nível hierárquico e área de trabalho. Pela visão clássica fica realmente confuso especificar quem planeja ou quem organiza a empresa ou qual a parcela que cabe a cada administrador.

Na realidade, o que os autores fizeram foi analisar, com o nome indevido de funções administrativas (funções de um administrador), o planejamento, a obtenção de recursos etc, da organização como um todo (funções conjuntas de diversos administradores) e não a parcela efetuada por um administrador específico. E quanto mais baixo o nível hierárquico menos adequada é a análise.

Julgamos que programas escolares (e livros) baseados na visão clássica, sem distinguir o nível de atuação de um administrador dos processos que ocorrem na organização como um todo, envolvendo diversos administradores, dificultam a aprendizagem.

Apesar de pouco estudado, sabe-se que as funções administrativas são distribuídas pelos diversos cargos dentro da organização sem equivalência na importância (ou tempo) atribuída(o) a cada função para os diferentes cargos. Esse assunto foi objeto de pesquisa para alguns autores, destacando-se Mahoney (1963) que identificou a percentagem de tempo de cada cargo, despendida nas diversas funções. Após medição e análise dos desempenhos chegou-se à identificação de oito grupos de cargos administrativos identificados em função do tempo despendido nas diversas funções administrativas.

5. Grau de facilidade em absorver as contribuições da teoria administrativa. Com exceção dos assuntos mais atuais ligados a títulos como sistemas de informação, decisão e operação, as demais contribuições da teoria administrativa podem ser enquadradas de maneira fácil no modelo funcional clássico, pois em sua maioria nele se originaram.

3.2 Autores que se opuseram à classificação clássica

Comentaremos os autores Simon (1960), Sayles (1961) e Mintzberg (1973), mas apenas sobre o último aplicaremos de forma completa o esquema de análise explicado anteriormente no item 2. No caso de Simon e Sayles, serão identificadas as peculiaridades das suas abordagens e também em que medida complementam ou contradizem a visão clássica.

Simon (1960), em seu livro The New science of management decision considera o administrador um tomador de decisões. Suas funções seriam: procura de ocasiões para tomar a decisão, localizar cursos alternativos de ação e escolher curso(s) de ação.

Esta abordagem é importante no sentido de realçar a dimensão decisorial da administração, mas apresenta os seguintes inconvenientes:

a) não relaciona de maneira clara a atuação administrativa ao seu contexto de trabalho. Ou seja, a classificação é neutra e para cada categoria necessitamos adicionar elementos que vinculem o administrador à sua unidade organizacional;

b) da mesma maneira que a clássica, apresenta ambigüidade na identificação das categorias em um trabalho real. A diversidade de fluxos sob controle do administrador faz com que as três funções não ocorram seqüencialmente, de maneira nítida.

Sayles apresenta suas idéias em dois livros, que se complementam: The measure of management (1961), elaborado em conjunto com Chapple, e Managerial behavior (1964). No primeiro, o autor preocupou-se com o desenvolvimento de critérios para conceber a estrutura organizacional, o cargo administrativo e medidas de seu desempenho. No seu livro, como o próprio nome indica, foi analisado mais profundamente o cargo administrativo, especialmente quanto à forma de descrevê-lo e integrá-lo ao sistema em que opera.

Para Sayles (1961), a função básica do administrador seria manter e desenvolver diversos fluxos de trabalho (seqüência de eventos correlacionados por razões técnicas ou cronológicas) que ocorrem seqüencial ou simultaneamente. Esses fluxos do trabalho seriam os principais fatores da concepção e descrição dos cargos administrativos.3 3 O autor mostra, também, os fluxos de trabalho como os determinantes básicos da estrutura organizacional, que deveria ser concebida (fluxos de trabalho e tecnologia para cima) e não ao contrário (iniciando-se pelos critérios de departamentalização, níveis de autoridade, etc). As classificações tradicionais, como a clássica, deveriam ser abandonadas (devido à tendência em dividirem o cargo em compartimentos estanques, e por serem muito genéricas e ambíguas. Cada cargo seria analisado como parte de um ou mais fluxos de trabalho, especificando-se para cada administrador o que faz, quando, com quem, por quanto tempo e com que freqüência.

Nesse sentido, o primeiro passo da análise do cargo administrativo seria o estudo (por exemplo, por meio de observação) da seqüência de eventos que constituem o cargo. Depois disso, os eventos seriam classificados em certos gêneros, para permitir uma visão sintética do cargo, além da pormenorizada, obtida no primeiro levantamento.

No livro The measure of management (1961), Sayles ilustra um exemplo de descrição de cargo em termos de fluxo de trabalho. Trata-se do cargo de superintendente (de produção). Em primeira descrição, as atividades aparecem em seqüência, numa segunda, elas são classificadas de acordo com certos padrões e na terceira são ilustrados o número de contatos, a duração média dos contatos e o tempo despendido em cada gênero de atividade. A seguir, mostramos de maneira resumida as duas primeiras formas de apresentar a descrição do cargo administrativo.

Descrição do cargo de superintendente em termos de fluxo de trabalho (p. 49 a 62).

"1. Recebe diariamente relatórios do departamento de inspeção. Observa-os e assinala os quadros com elementos "Fora do limite", faz comentários à margem, e manda de volta ao supervisor. Quando a qualidade fica de fora dos limites por dois dias sucessivos, entra em contato com os supervisores e procura localizar as causas.

2. Recebe diariamente gráficos representativos de carga de máquina de cada um de seus departamentos. Analisa para verificar quais máquinas estiveram paralisadas e por quanto tempo. Se não foi notificado pelo supervisor...

3. Recebe diariamente relatórios de produção de cada um de seus departamentos, indicando que ordens foram efetuadas no dia anterior. Compara com sua folha de programação para saber a situação corrente de produção, o quanto as ordens estão atrasadas em relação ao programado...

4. Recebe diariamente cópias do planejamento da produção...

5. Recebe semanalmente folha com as cargas...

6. Recebe semanalmente relatórios de variação...

7. Recebe relatórios de engenharia, periódicos técnicos, etc.

8. Recebe chamadas dos seus próprios supervisores com relação a problemas especiais da produção...

9. Recebe chamadas do Depto. de Engenharia...

10. Recebe chamadas...

11. Quando um de seus supervisores tenha enviado uma requisição ao Departamento de Emprego (...) irá entrevistar o candidato...

12. Conforme haja uma requisição (...) pode discutir o problema...

13. Prepara esquemas de arranjo físico...

14. Conduz reuniões semanais...

15. Participa de reuniões semanais com os superintendentes..."

Descrição do cargo de superintendente em termos de padrões de atividade (p. 49 a 62)

As atividades são agrupadas de acordo com a semelhança, nas seguintes classes:

• Dar informações, consultar, aconselhar ou entrevistar: 11.

• Conduzir reuniões: 14.

• Negociar: 12.

• Inquirir.

• Analisar dados: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 13.

• Analisar, iniciar ações.

• Manipular distúrbios atendendo iniciativa de outros: 8, 9, 10.

• Padrão de Comportamento não especificado: 15.

Num último resumo, o autor mostra, para cada um dos padrões de trabalho (consultar, conduzir reuniões, etc.), a freqüência de contatos (diário, semanal, mensal), duração média de cada contato e tempo total requerido por semana.

A proposta de Sayles é útil para descrever os cargos administrativos em termos de abrangência e de clareza, pois as categorias são criadas a partir da análise do fluxo de trabalho real. Deixa de lado nomes genéricos como planejar, coordenar, etc., e adota uma descrição mais precisa das diversas ações envolvidas no dia-a-dia especificando os pontos relevantes para o administrador como: tipo de informação recebida, fonte de informação, uso dado à informação, etc.

Os pontos falhos ou incompletos dessa visão são os seguintes:

a) não fica especificado o critério adotado para classificar as funções, apesar de o autor deixar em aberto a criação de outras, além das que propôs, em função da necessidade de descrever cargos específicos;

b) suas categorias (negociar, inquirir, etc), quando utilizadas sem as descrições complementares, também apresentam problemas de ambigüidade.

Mintzberg (1973), no capítulo 3 de seu livro The Nature of managerial work, mostra sua visão dos papéis administrativos.

A seguir, descreveremos e analisaremos sua abordagem.

a) Número de categorias, conteúdo das mesmas e grau de evidência dos critérios ou pressupostos utilizados na classificação. O autor identifica 10 papéis administrativos, lembrando que sua classificação é uma entre as possíveis. "O delineamento de papéis é essencialmente um processo de categorização, em parte uma partição arbitrária das atividades administrativas em grupos afins. Em última análise, o resultado deve ser analisado em termos de sua utilidade" (p. 55).

Mostraremos a seguir, nas palavras do próprio autor, o conteúdo das categorias e os critérios para formá-las.

"As atividades administrativas podem ser divididas em três grupos: aquelas que são pertinentes basicamente ao relacionamento interpessoal, aquelas que lidam basicamente com a transferência de informação e aquelas que envolvem essencialmente tomada de decisões. É por essa razão que os 10 papéis são divididos em três grupos: três papéis interpessoais, três papéis informacionais, quatro papéis decisoriais.

A posição do administrador fornece o ponto de partida para essa análise. O administrador costuma ser definido como pessoa formalmente responsável por uma unidade organizacional. Essa autoridade formal leva a uma situação de status especial na organização. E, da autoridade formal e do status decorrem os três papéis interpessoais. O primeiro e mais simples é o papel de imagem do chefe. O administrador tem o dever de representar sua organização em todos os assuntos formais. O status permite ao administrador desempenhar também o papel de contato, no qual ele interage com pares e outras pessoas externas à sua organização para obter favores e informações. O terceiro papel interpessoal, o de líder, define o relacionamento do administrador com seus subordinados - motivando, recrutando, e assim por diante.

Os papéis interpessoais colocam o administrador em uma posição única quanto à obtenção de informações. Esses contatos externos trazem informações especiais e suas atividades de liderança servem para torná-lo um ponto central para a informação organizacional. O resultado é que o administrador emerge (p. 56) como centro nervoso chave de um tipo especial de informação organizacional. Dos três papéis informacionais o primeiro monitor - identifica o administrador como recebedor e coletor de informações, capacitando-o a desenvolver um entendimento amplo da sua organização. O segundo papel, denominado disseminador, envolve a transmissão por parte do administrador de informações especiais para sua organização. O terceiro, o papel de porta-voz, envolve a disseminação de informações da organização para seu ambiente externo.

O acesso único do administrador às informações, e seu status e autoridade especiais colocam-no em um ponto central no sistema sobre o qual decisões organizacionais significantes (estratégicas) são tomadas. Aqui, quatro papéis podem ser delineados: no papel de empreendedor, a função do administrador é iniciar mudanças; no de manipulador de distúrbios o administrador enfrenta ameaças à sua organização; no papel de alocador de recursos o administrador decide onde sua organização despenderá seus esforços; e no papel de negociador ele lida com aquelas situações nas quais ele se sente compedido a entrar em negociações referentes à organização"(p. 57).

A seguir, apresentamos dois gráficos extraídos do livro de Mintzberg para dar uma visão mais clara da abordagem do autor.

Quadro 3 - Clique para ampliar


Quadro 4 - Clique para ampliar


b) Abrangência. Na p. 57, o autor declara que foi possível classificar em seu esquema de papéis todos os contatos e correspondências de cinco executivos envolvidos em um estudo de campo que efetuou. Também afirma, com razão, que tem havido uma tendência na literatura a excluir certos trabalhos que os administradores fazem como inerentemente não-administrativos.

Julgamos que essa abordagem tem como principal vantagem, sobre a clássica, a abrangência, ao incluir adicionalmente os seguintes papéis: imagem do chefe, contato, porta-voz e negociante. Também os' conteúdos ligados a papéis como disseminador, manipulador de distúrbios, alocador de recursos, foram melhor explicitados por Mintzberg. A equivalência, em termos aproximados, da abordagem de Mintzberg com a clássica seria a seguinte:

c) Grau de ambigüidade na identificação das categorias em um trabalho real e grau de utilidade para orientar o trabalho prático dos administradores. Apesar de cada papel ser realmente observável na realidade, há certas atividades que podem corresponder a mais do que um papel. Julgamos este o principal ponto fraco dessa abordagem, pois inclusive há mais superposição de categorias do que na abordagem clássica. Os papéis informacionais sobrepõem-se aos interpessoais e decisoriais, pois em todo contato interpessoal há troca de informações e é muito difícil isolar a decisão em si do processo informativo em que se baseia. Fizemos algumas comprovações preliminares deste ponto de vista, através de aplicação de um exercício a alunos de cursos de graduação em administração. Solicitamos aos mesmos que classificassem, segundo os clássicos e segundo Mintzberg, um texto contendo aproximadamente 30 atividades de um administrador real em um dia de trabalho. Houve mais confiança na classificação com a abordagem de Mintzberg, na qual ocorreu maior sobreposição de categorias.

Essa questão de ambigüidade levou a autora Stewart (1976) a não aplicar a classificação de Mintzberg em seu mais recente estudo de campo, conforme ela mesma afirma na p. 153 de seu livro.

d) Grau de facilidade em identificar as variações no trabalho administrativo. Achamos esta abordagem mais útil do que a clássica para mostrar as variações no trabalho administrativo. Mintzberg ilustra este ponto, identificando as variações nas ênfases atribuídas aos 10 papéis em função das peculiaridades do cargo, ambiente, personalidade do ocupante e época.

e) Grau de facilidade em "absorver" as contribuições da teoria administrativa. A classificação de Mintzberg é mais abrangente do que a clássica neste ponto, ao absorver com facilidade elementos atuais da teoria administrativa, ligados aos sistemas administrativos de informação e decisão. Principalmente quanto aos papéis interpessoais e informacionais, a absorção é tranqüila. Resta ainda classificar melhor os papéis decisoriais, tendo em vista o aproveitamento das noções sobre planejamento já desenvolvidas na teoria administrativa.

4. CONCLUSÕES

Julgamos inevitável a superposição de categorias na classificação do trabalho administrativo, pois uma mesma atividade pode ser vista (e deve ser vista) sob diferentes ópticas. O importante é ter consciência deste aspecto e classificar as situações reais em mais de uma categoria, percebendo porém a participação e influência de cada uma delas. Esta observação é particularmente importante para a classificação de Mintzberg, quando os papéis informacionais, interpessoais e decisoriais se sobrepõem, mas a participação de cada um pode ser esclarecida.

Faltam ainda estudos de campo e testes para que cheguemos a conclusões mais definitivas sobre as funções do administrador. Entretanto, as evidências empíricas e as análises disponíveis permitem-nos levantar os seguintes pontos:

• A abordagem clássica é incompleta em termos de abarcar todo conteúdo do trabalho administrativo. Para adotá-la, devemos incluir outras categorias, conforme já vimos.

• A abordagem de Mintzberg apresenta vantagens sobre a clássica quanto à questão da abrangência dos papéis interpessoais e informacionais. Para aprimorá-la, devemos reclassificar os papéis decisoriais.

• Os papéis ou funções do administrador representam apenas uma das dimensões da realidade do mesmo e sua participação deve ser bem especificada para evitar confusões tanto na prática como no ensino da administração.

• As diversas abordagens são mais úteis para indicar, de forma genérica, o conteúdo do trabalho administrativo, para não-administradores ou não-iniciados no assunto, do que para auxiliar as pessoas com experiência em administração. Para permitir auto-análise dos administradores e dar pistas para melhoria do desempenho no dia-a-dia, elas necessitam de complementações.

• A análise anterior não mostrou evidências da necessidade e vantagens de se utilizar em pesquisas de campo as classificações funcionais, da forma como aparecem na teoria administrativa. Pelo contrário, o desencontro reinante entre os autores e as ambigüidades de cada classificação de per si mostram que a atitude mais cuidadosa é não utilizá-las como meio básico para levantar dados sobre o trabalho administrativo. Esta foi a conduta que adotamos em uma pesquisa que conduzimos sobre o trabalho de dirigentes de pequenas e médias empresas (Teixeira, 1979).

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  • Teixeira, Hélio Janny. Descrição e análise do trabalho de dirigentes de pequenas e médias empresas. Tese de Mestrado não-publicada, apresentada à Faculdade de Economia e Administração da USP, 1979.
  • 1
    Utilizaremos, até o final deste artigo, a palavra
    categoria, para indicar as funções ou papéis do administrador.
  • 2
    Fayol (1970), no capítulo 2 de seu livro
    Administração industrial e geral, chamou a atenção para o problema das variações no trabalho administrativo; conforme se mudava o porte da organização, o nível hierárquico e o gênero do cargo, mas seus seguidores infelizmente relegaram esse assunto a segundo plano.
  • 3
    O autor mostra, também, os fluxos de trabalho como os determinantes básicos da estrutura organizacional, que deveria ser concebida (fluxos de trabalho e tecnologia para cima) e não ao contrário (iniciando-se pelos critérios de departamentalização, níveis de autoridade, etc).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 1981
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