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INFLUÊNCIA DA LUZ NA GERMINAÇÃO DE SEMENTES DE CANAFÍSTULA SUBMETIDAS AO ESTRESSE HÍDRICO

LIGHT INFLUENCE ON THE GERMINATION OF CANAFISTULA SEEDS UNDER SIMULATED WATER STRESS

Resumos

Objetivou-se verificar a influência da luz na germinação de sementes de canafístula [Peltophorum dubium (Spreng.) Taub.] sob estresse hídrico simulado com dois agentes osmóticos. Realizaram-se os experimentos com quatro repetições de 50 sementes selecionadas, previamente escarificadas com ácido sulfúrico durante 20 minutos, lavadas e distribuídas em placas de Petri esterilizadas, forradas com papel-filtro umedecido com solução-teste (PEG 6000 ou manitol), com diferentes valores de potencial osmótico. Sob temperatura ótima, o limite máximo de tolerância, sob luz ou escuro, utilizando-se soluções de PEG ou manitol, está situado entre -1,4 e -1,6 MPa. Quando compararam-se os dois agentes osmóticos, verificou-se que a germinação iniciou-se primeiramente nas sementes mantidas em soluções de manitol; sob luz contínua, a porcentagem de germinação foi significativamente reduzida para as sementes mantidas na solução de manitol. Após 21 dias sob estresse hídrico (-1,6 a -2,0 MPa) não houve germinação. As sementes foram, então, lavadas em água destilada e colocadas em solução de Captan a 0,2%, nas mesmas condições de luminosidade; decorridas 24 horas, observou-se a presença de resposta de recuperação. As sementes que estavam em soluções de manitol apresentaram menores valores de porcentagem de germinação do que aquelas em soluções de PEG. A luz contínua reduziu a resposta de recuperação para as sementes que permaneceram em soluções de manitol.

agentes osmóticos; déficit hídrico; luminosidade; Peltophorum dubium


This research aimed at recording the influence of light during germination of canafistula seeds under water stress. Seeds of Peltophorum dubium (Spreng.) Taub. were selected for this experiment. Four samples of 50 seeds were used in each test. The seeds were previously scarified with sulfuric acid during 20 minutes, rinsed and distributed in sterilized Petri dishes and incubated under optimal temperature. The dishes had a filter-paper moistened with test solution (PEG 6000 or manitol) in order to induce different osmotic potential values. The maximum tolerance limit under light or darkness, using PEG or manitol was between -1.4 and -1.6 MPa. When results of both osmotic treatments were compared, it was observed that seeds germinated faster in manitol than in PEG solutions. Under continuous light condition, the germination percentage was significantly reduced for seeds kept in manitol solutions. After 21 days under water stress (-1.6 to -2.0 MPa) the germination was suppressed. The seeds were rinsed in distilled water and maintained on 0.2% Captan solution, under the same light conditions. After 24 hours it was observed a recovery response. The seeds kept in manitol solutions presented lower values of germinability than those in PEG solutions. Continuous light conditions reduced the recovery response for seeds in manitol solutions.

osmotic agents; water stress; light; Peltophorum dubium


BOTÂNICA E FISIOLOGIA VEGETAL

INFLUÊNCIA DA LUZ NA GERMINAÇÃO DE SEMENTES DE CANAFÍSTULA SUBMETIDAS AO ESTRESSE HÍDRICO(1 (1 ) Recebido em 1.º de março de 2000 e aceito em 20 de agosto de 2001. )

SONIA CRISTINA JULIANO GUALTIERI DE ANDRADE PEREZ(2 (1 ) Recebido em 1.º de março de 2000 e aceito em 20 de agosto de 2001. ); SILMARA CRISTINA FANTI(2 (1 ) Recebido em 1.º de março de 2000 e aceito em 20 de agosto de 2001. ); CARLOS APARECIDO CASALI(2 (1 ) Recebido em 1.º de março de 2000 e aceito em 20 de agosto de 2001. )

RESUMO

Objetivou-se verificar a influência da luz na germinação de sementes de canafístula [Peltophorum dubium (Spreng.) Taub.] sob estresse hídrico simulado com dois agentes osmóticos. Realizaram-se os experimentos com quatro repetições de 50 sementes selecionadas, previamente escarificadas com ácido sulfúrico durante 20 minutos, lavadas e distribuídas em placas de Petri esterilizadas, forradas com papel-filtro umedecido com solução-teste (PEG 6000 ou manitol), com diferentes valores de potencial osmótico. Sob temperatura ótima, o limite máximo de tolerância, sob luz ou escuro, utilizando-se soluções de PEG ou manitol, está situado entre -1,4 e -1,6 MPa. Quando compararam-se os dois agentes osmóticos, verificou-se que a germinação iniciou-se primeiramente nas sementes mantidas em soluções de manitol; sob luz contínua, a porcentagem de germinação foi significativamente reduzida para as sementes mantidas na solução de manitol. Após 21 dias sob estresse hídrico (-1,6 a -2,0 MPa) não houve germinação. As sementes foram, então, lavadas em água destilada e colocadas em solução de Captan a 0,2%, nas mesmas condições de luminosidade; decorridas 24 horas, observou-se a presença de resposta de recuperação. As sementes que estavam em soluções de manitol apresentaram menores valores de porcentagem de germinação do que aquelas em soluções de PEG. A luz contínua reduziu a resposta de recuperação para as sementes que permaneceram em soluções de manitol.

Palavras-chave: agentes osmóticos, déficit hídrico, luminosidade, Peltophorum dubium.

ABSTRACT

LIGHT INFLUENCE ON THE GERMINATION OF CANAFISTULA SEEDS UNDER SIMULATED WATER STRESS

This research aimed at recording the influence of light during germination of canafistula seeds under water stress. Seeds of Peltophorum dubium (Spreng.) Taub. were selected for this experiment. Four samples of 50 seeds were used in each test. The seeds were previously scarified with sulfuric acid during 20 minutes, rinsed and distributed in sterilized Petri dishes and incubated under optimal temperature. The dishes had a filter-paper moistened with test solution (PEG 6000 or manitol) in order to induce different osmotic potential values. The maximum tolerance limit under light or darkness, using PEG or manitol was between -1.4 and -1.6 MPa. When results of both osmotic treatments were compared, it was observed that seeds germinated faster in manitol than in PEG solutions. Under continuous light condition, the germination percentage was significantly reduced for seeds kept in manitol solutions. After 21 days under water stress (-1.6 to -2.0 MPa) the germination was suppressed. The seeds were rinsed in distilled water and maintained on 0.2% Captan solution, under the same light conditions. After 24 hours it was observed a recovery response. The seeds kept in manitol solutions presented lower values of germinability than those in PEG solutions. Continuous light conditions reduced the recovery response for seeds in manitol solutions.

Key words: osmotic agents, water stress, light, Peltophorum dubium.

1. INTRODUÇÃO

A canafístula [Peltophorum dubium (Spreng.) Taub.] - espécie arbórea pertencente à ordem Fabales, família Caesalpiniaceae - é uma planta ornamental. A madeira de seu tronco é moderadamente pesada, rija e de longa durabilidade. Proporciona ótima sombra quando isolada, podendo ser empregada com sucesso em projetos paisagísticos. É uma espécie heliófita, pioneira, rústica, de crescimento rápido, ótima para composição de reflorestamentos mistos de áreas degradadas de preservação permanente (LORENZI, 1992).

Para se utilizar uma espécie em reflorestamento, é necessário conhecer os aspectos de sua biologia e/ou ecologia. Há, porém, carência de informações sobre as espécies tropicais nativas, o que dificulta a adoção de práticas conservacionistas ou de recuperação de áreas degradadas (CARPI et al., 1996). Desse modo, tornam-se fundamentais os estudos sobre a germinação das sementes para a utilização e exploração de forma racional das espécies nativas.

As sementes apresentam grande diversidade de características adaptativas que lhes permitem a sobrevivência, pelo menos em número suficiente para assegurar a perpetuação das espécies, diante dos fatores destrutivos do tempo e do ambiente, incluindo os fatores físicos e as interações com outros seres vivos, como predação, alelopatia e competição. Em função das várias interações entre as sementes, seus progenitores e o ambiente constituem material excepcional para o estudo dos mecanismos de adaptação das populações de plantas (Vasquez-Yanes, 1984 apud LEITE 1993).

Dentre os fatores do ambiente que influenciam a germinação, a água é um dos mais importantes. A diminuição do potencial hídrico do meio pode atrasar ou reduzir a taxa de germinação de muitas espécies vegetais, pois interfere na embebição e no alongamento celular do embrião. A embebição é um processo trifásico: fase I, caracterizada pela rápida absorção de água, seguida por uma fase estacionária (fase II) e uma outra, caracterizada por um novo aumento no conteúdo de água, que coincide com o crescimento da radícula (fase III). Na regulação da germinação, a fase II pode ser estendida pela dormência, altas e baixas temperaturas, déficit hídrico ou ácido abscísico, enquanto os fatores que promovem a germinação encurtam esta fase (BRADFORD, 1990).

A germinação da semente em solos com baixo potencial hídrico depende da habilidade de cada espécie. Em condições de laboratório, por conveniência, realizam-se estudos de germinação com o uso de soluções aquosas de sacarose, sais, manitol e polietileno glicol, a fim de simular condições padronizadas de estresse hídrico para seleção de espécies mais tolerantes (SANTOS et al., 1992).

De acordo com SLAVIK (1974), uma solução que esteja em contato com tecidos vivos deve possuir várias propriedades importantes: não deve ser metabolizada pela planta, nem estar sujeita a mudanças causadas por microrganismos durante a prolongada imersão do tecido na solução. Dentre os solutos mais freqüentemente usados, nenhum deles segue todas as ressalvas feitas por Slavik; existe, também, discordância quanto ao efeito das soluções nas sementes.

A sensibilidade das sementes ao estresse hídrico pode ser influenciada pelos diferentes fatores ambientais, como luz, temperatura, teor de oxigênio, etc., que variam durante o processo de embebição. O aparecimento de sensibilidade à luz na presença de estresse hídrico foi reportado por vários autores, como LOPES e TAKAKI (1987, 1988); NIEDZWIEDZ-SIEGEN e LEWAK (1988, 1989). Além disso, sob condições de estresse, muitas espécies possuem a habilidade de entrar em dormência secundária. Assim, a dormência assume importância ecofisiológica por ser uma estratégia que permite às sementes manterem o vigor e a viabilidade por um período prolongado de tempo para germinarem quando as condições do ambiente se tornarem mais favoráveis (BEWLEY e BLACK, 1994).

Trabalhos realizados anteriormente indicaram que a canafístula tem habilidade para germinar em ampla faixa de temperatura: é tolerante ao estresse térmico (PEREZ et al., 1998); apresenta resistência ao envelhecimento acelerado; tem bom desempenho em campo (DE FIORE e PEREZ, 2000); tolera estresse salino simulado com diferentes tipos de sais (PEREZ et al., 2001), podendo ser considerada uma espécie sem exigências específicas para a germinação.

Devido à importância que a canafístula pode apresentar para exploração comercial ou sua utilização em reflorestamento, propôs-se avaliar o efeito do estresse hídrico na germinação, com dois agentes osmóticos, e o efeito da luz na germinação sob estresse hídrico.

2. MATERIAL E MÉTODOS

O presente trabalho foi realizado no Laboratório de Ecofisiologia da Germinação de Sementes, do Departamento de Botânica, da Universidade Federal de São Carlos. Utilizaram-se sementes de Peltophorum dubium (Spreng.) Taub., oriundas do Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais (IPEF), USP, Piracicaba, com 12% de umidade, armazenadas em embalagens impermeáveis, em geladeira.

Realizaram-se os experimentos em quatro repetições simultâneas de 50 sementes escarificadas com ácido sulfúrico concentrado durante 20 minutos (PEREZ et al., 1999). As sementes foram secas em papel- filtro e incubadas em placas de Petri de 9 cm de diâmetro, esterilizadas, forradas internamente com duas folhas de papel-filtro autoclavado, umedecido com solução-teste, com a adição de Captan a 0,2% (CLARCK e SCOTT, 1982). Sementes que apresentavam protrusão de radícula ³ 2 mm e curvatura geotrópica positiva (DURAN e TORTOSA, 1985) foram contadas e retiradas das placas diariamente (BRASIL, 1992). Finalizou-se o experimento quando todas as sementes haviam germinado ou, as remanescentes, na placa, encontravam-se deterioradas.

a) Efeito do estresse hídrico: para que fosse avaliada a tolerância das sementes ao estresse, simulou-se um déficit hídrico utilizando-se soluções de manitol (C6 H14 O6) e de polietileno glicol (PEG 6000) [HOCH2 (6CH2CH2) N OH] em diferentes potenciais hídricos, variando de 0,0 a -2,0 MPa. Para relacionar a quantidade de manitol e potencial, empregou-se a equação citada por PARMAR e MOORE (1968)

em que:

g: massa de manitol, em gramas; P: pressão osmótica, em atmosferas; V: volume, em litros; M: peso molecular do manitol; R: constante universal dos gases (0.08205 atm.K-1 .mol-1).

Com o agente osmótico polietileno glicol (P.M. = 6000), as soluções foram preparadas de acordo com as especificações de VILELLA et al. (1991).

b) Interação luz - estresse hídrico: a fim de verificar a influência da luz na resposta ao déficit hídrico, as sementes foram incubadas em soluções de PEG 6000 ou manitol, nos diferentes potenciais hídricos e nos regimes de luz branca fluorescente (166 mmol.m-2.s-1) e escuro contínuos, sob temperatura ótima (27 °C) para germinação de sementes de canafístula (PEREZ et al., 1998). Para simular a condição de escuro, envolveram-se as placas de Petri em duas folhas de papel-alumínio e as leituras diárias foram feitas sob luz verde de segurança (KENDRICKS e FRANKLAND, 1983).

c) Resposta de recuperação: para os potenciais osmóticos cuja porcentagem de germinação foi nula (-1,6; -1,8 e -2,0 MPa), após 21 dias de permanência nessas soluções, as sementes foram lavadas em água destilada, secas e colocadas para germinar em solução de Captan 0,2%, na temperatura de 27 °C, nas mesmas condições luminosas que estavam anteriormente (sob luz ou escuro contínuos), a fim de verificar uma possível resposta de recuperação.

Partindo-se da premissa que todas as sementes de uma população não germinam simultaneamente, o tempo de germinação (Tg) pode ser calculado para um determinado valor de porcentagem. Assim, G50 poderia ser definido como o tempo necessário para a germinação de 50% das sementes em uma população, em resposta ao potencial hídrico do meio. De acordo com BRADFORD (1990), uma relação linear entre G50 e o potencial hídrico pode ser estabelecida; nesse caso, utilizou-se, para o ajuste das curvas, a equação Y = P1/1 + e a - rm.X . O uso de modelos matemáticos permite simulações e/ou previsões sob uma determinada população de sementes, em resposta às variações do ambiente.

Calcularam-se a porcentagem, o tempo de germinação e a freqüência relativa de acordo com as fórmulas descritas em LABOURIAU (1983). As comparações dos valores médios de porcentagem foram feitas pela aplicação de análise da variância e as médias, posteriormente contrastadas pelo teste de Tukey-Kramer (P < 0,05), com a utilização de um programa para computador (GRAPHPAD, 1999).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

De maneira geral, pequenas reduções no potencial hídrico das soluções de manitol ou PEG 6000 ocasionaram, primeiramente, aumento no tempo médio de germinação sem reduções significativas na porcentagem acumulada. Em potenciais mais negativos, houve aumento da sensibilidade à disponibilidade hídrica, evidenciada pelo atraso no início da germinação e pelos menores valores de porcentagem acumulada registrados (Figura 1 - A e B ; Figura 2 - A e B ).



Quando o estresse hídrico foi simulado com manitol, observaram-se reduções significativas na porcentagem de germinação a partir de -0,4 MPa sob luz (Figura 1A) e a partir de -0,6 MPa, sob escuro (Figura 1B ). O uso de soluções de PEG 6000 produziu reduções significativas da porcentagem de germinação a partir de -0,6 MPa, para sementes mantidas na luz (Figura 2A) e no potencial igual a -0,8 MPa, sob escuro contínuo (Figura 2B ).

Os limites de tolerância à seca foram os mesmos, situados entre -1,4 e -1,6 MPa, quando se utilizou PEG 6000 ou manitol (Figuras 1 e 2). Esses resultados diferiram dos encontrados por outros autores que estudaram a germinação de outras leguminosas de porte arbóreo, sob estresse hídrico. PEREZ e MORAES (1991) e NASSIF e PEREZ (1997) verificaram limites menores de tolerância à seca quando o estresse hídrico foi simulado com PEG 6000, em comparação com o manitol, para Prosopis juliflora e Pterogyne nitens respectivamente.

SLAVIK (1974) considerou que o manitol, um álcool hexanídrico, pode penetrar nas sementes durante a germinação, mostrando inclusive fitotoxicidade. Opiniões semelhantes foram relatadas por NABORS e LANG (1971) e YOUNG e GALSTON (1983).

Quanto ao PEG, vários autores o consideram como o soluto mais adequado: possui elevado peso molecular; não é tóxico; não penetra nas células; não é eletrolítico. É encontrado com peso molecular 4000, 6000, 8000, 12000 e 20000, sendo o 6000 o mais utilizado. Porém, HEYDECKER e COOLBEAR (1977) mencionaram que o PEG pode reduzir a disponibilidade de oxigênio e que, muitas vezes, pode ser limitante à germinação.

EIRA (1988), comparando o efeito das soluções de PEG e do manitol, observou que o teor de água das sementes de alface foi mais baixo quando mantidas em solução de PEG, apesar de o potencial hídrico de manitol apresentar-se mais negativo. Assim, o autor creditou tal fenômeno às propriedades da solução.

Excetuando-se o controle, pode-se dizer que, em geral, o escuro retardou o início do processo germinativo (Figura 1B ), em comparação com as sementes mantidas sob luz branca contínua (Figura 2B ). Além disso, as sementes mantidas em soluções de PEG 6000, tanto na luz quanto no escuro, começaram a germinar mais tardiamente (Figura 2A e B ), em relação àquelas mantidas em solução de manitol (Figura 1A e B ).

Analisando-se a distribuição das freqüências relativas de desenvolvimento das sementes germinadas em manitol, observa-se a presença de polígonos unimodais de 0,0 MPa -0,4 MPa, tanto na luz quanto no escuro, caracterizando uma germinação mais sincronizada. A partir de -0,6 MPa, verifica-se a presença de polimodalidade e o deslocamento do tempo médio de germinação para a direita da moda principal, evidenciando uma distribuição tempo-espacial (Figuras 3 e 4). Quando se utilizou o agente osmótico PEG 6000, verificou-se a mesma tendência de distribuição das freqüências, ou seja, a diminuição do potencial osmótico do meio promove um deslocamento do tempo médio de germinação para a direita da moda principal e um processo germinativo pouco sincronizado (Figuras 5 e 6).





Independentemente do potencial osmótico, os valores de tempo médio de germinação foram menos significativos quando se utilizou o PEG 6000 para simular o estresse hídrico (dados não apresentados).

Durante a primeira fase da embebição, o potencial hídrico da semente aumenta e o gradiente para a absorção de água diminui. O teor de água dentro da semente se eleva gradualmente durante a fase II, o que caracteriza a fase de ativação do metabolismo da germinação. O terceiro aumento na absorção de água está associado ao crescimento e à emergência da radícula. A embebição em potenciais hídricos reduzidos diminui o conteúdo de água das sementes, aumenta a duração da fase II e atrasa a emergência radicular na fase III. O crescimento da radícula ocorre apenas se o teor de água excede um nível crítico, fato que demorou a acontecer quando se mantiveram as sementes em potenciais hídricos mais negativos. A terceira fase da embebição não foi completada nas sementes mantidas nos potenciais de -1,6 até -2,0 MPa, mesmo após 21 dias (dados não apresentados).

A germinação das sementes é concluída pelo início da fase de crescimento do embrião. Desde que o crescimento das células seja direcionado pela absorção de água pelas células em expansão, as relações hídricas estão envolvidas na transição das sementes da fase II para a fase III (BRADFORD, 1995). Além disso, a habilidade do embrião sintetizar novas proteínas durante a germinação é diminuída quando o nível de hidratação diminui: os tecidos não crescem e o modelo de síntese protéica e ácidos nucléicos mudam significativamente (DELL’ÁQUILLA e SPADA, 1992).

Uma questão básica na fisiologia da germinação é a maneira como as sementes integram os sinais do ambiente para determinar o melhor momento para iniciar a emergência da radícula e o posterior desenvolvimento da plântula. Isso é um fato crítico para as sementes, pois a taxa de sobrevivência das plântulas é dependente da disponibilidade hídrica no meio (BRADFORD, 1997).

Existe a necessidade da utilização de modelos matemáticos para avaliação da emergência de plântulas em condições de campo. Gummesson (1986) apud BRADFORD (1990) propôs o modelo do tempo hídrico. De acordo com este modelo, a mais importante resposta fisiológica das sementes aos sinais ambientais é a diminuição do valor de potencial hídrico mínimo para ocorrer a emergência da radícula, possibilitando à determinada semente que inicie e complete a germinação somente quando houver água suficiente para esse processo. A relação entre o potencial hídrico do meio e o tempo de germinação é uma variável importante, sobretudo para as sementes que germinam rapidamente, nas regiões onde a superfície do solo é seca (BRADFORD, 1997).

Segundo HEYDECKER e COOLBEAR (1977), um aumento na intensidade do estresse ambiental leva, em geral, a um aumento no tempo de germinação, afetando posteriormente a porcentagem de germinação das sementes. De acordo com BEWLEY e BLACK (1994), o estresse hídrico pode reduzir tanto a porcentagem como a velocidade de germinação com grande variação de respostas entre as espécies, daquelas muito sensíveis até às mais resistentes. Sementes resistentes possuem a vantagem ecológica de estabelecer suas plântulas em áreas onde as mais sensíveis à seca não podem.

Utilizando-se o parâmetro G50 (potencial hídrico do meio que reduz 50% da germinação), o valor mais negativo (-1,2 MPa) foi registrado para as sementes mantidas em solução de manitol, no escuro, indicando a presença de uma resposta adaptativa, conforme descrito por BRADFORD (1997). As sementes mantidas sob luz branca apresentaram redução de 50% da germinação em potencial hídrico de -0,76 MPa. Assim, a manutenção das sementes em condições de luz contínua diminuiu a intensidade da resposta de adaptação das sementes ao estresse hídrico. Por outro lado, não foram observadas diferenças marcantes nos valores de potencial hídrico que reduz 50% da germinação nas sementes germinadas em PEG 6000, tanto na luz (-0,99 MPa) quanto no escuro (-1,05 MPa) - figura 7.


As sementes de canafístula não germinaram após 21 dias de permanência em soluções de PEG 6000 ou manitol, nos potenciais -1,6; -1,8 e -2,0 MPa, tanto na luz quanto no escuro (Figuras 1 e 2). Como as sementes não estavam visivelmente deterioradas, foram lavadas em água corrente e colocadas para germinar nas mesmas condições de luminosidade e temperatura. Verifica-se pela figura 8 rápida resposta de recuperação nas sementes de canafístula, iniciada 24 horas após a permanência nas soluções de Captan.



Em soluções de manitol, a resposta de recuperação iniciou-se primeiramente nas sementes mantidas no escuro. Os valores de porcentagem acumulada foram também mais elevados nas sementes mantidas no escuro, atingindo mais de 80% (Figura 8A). Por outro lado, não houve diferenças significativas na porcentagem de germinação para as sementes que estavam em soluções de PEG, tanto na luz quanto no escuro, embora a germinação tenha sido iniciada no escuro (Figura 8B).

Esses dados vêm corroborar a afirmação de HEGARTY (1978) de que o fracasso da germinação sob estresse hídrico pode ser classificado como dormência induzida ou secundária, o que, em muitas espécies, é prontamente reversível quando se aumenta o suprimento hídrico.

O conceito de tempo hídrico também pode ser utilizado para entender os modelos de germinação que ocorrem quando uma população de sementes entra ou sai da dormência induzida. Gordon apud PHELS e FINCH-SAVAGE (1997) afirmou que existe um modelo característico do tempo oportuno para germinar, quando a dormência é superada, dentro de uma população. Existe uma relação entre a porcentagem final de germinação e o tempo necessário para a emergência da radícula e, quando as condições do meio se tornam outra vez favoráveis, as sementes dormentes germinam prontamente. As sementes de canafístula, que não germinaram após a transferência para um meio contendo apenas solução de Captan, estavam visivelmente deterioradas, sendo desnecessário o teste de viabilidade como o do tetrazólio. As sementes mantidas em solução de PEG 6000 por 21 dias apresentaram percentual de deterioração que não excedeu a 20%. As sementes mantidas em soluções de manitol apresentaram, porém, um percentual de deterioração bem maior que aquelas mantidas por 21 dias nas soluções de PEG 6000 (entre 35% e 65% no escuro e 5% e 21% na luz). Nesse sentido, pode-se dizer que o manitol foi mais tóxico para as sementes de canafístula que o PEG 6000.

Com relação ao fator luz, pode haver interferência negativa em condições de estresse hídrico, como descrito por Lopes e TAKAKI (1987, 1988); TAKAKI (1990); FREITAS (1992). A luz branca pode reduzir a porcentagem de germinação de sementes sob estresse osmótico. Esta inibição pode ser dependente do potencial hídrico e da irradiância. É possível que em sementes insensíveis à luz, o fitocromo controle a germinação após o tratamento osmótico, como verificado por LADEIRA et al. (1987) para Plantago tomentosa e Rhapanus sativus.

Para canafístula, verificou-se uma redução dos valores de porcentagem de germinação, na presença de luz, quando as sementes foram mantidas em solução de manitol, sem aumentar o tempo de germinação e o do limite de tolerância. Porém, pode-se dizer que as sementes de canafístula são insensíveis à luz, pois a germinação ocorre tanto na luz quanto no escuro (Figuras 1 e 2).

A inclusão de uma semente na categoria das sensíveis ou insensíveis à luz depende das condições de maturação, armazenamento, temperatura de embebição e incubação e tratamento osmótico (LADEIRA et al., 1987).

As sementes de canafístula podem ser consideradas resistentes ao estresse hídrico simulado, com presença de dormência secundária, sob estresse hídrico intenso, como estratégia de sobrevivência. A presença de luz contínua também prejudicou a resposta de recuperação das sementes, principalmente daquelas mantidas sob manitol, que foi o mais tóxico para as sementes (Figura 8A e B).

4. CONCLUSÕES

1. As sementes de canafístula são resistentes ao estresse hídrico simulado com PEG e manitol; o limite máximo de tolerância variou de -1,4 MPa a -1,6 MPa, tanto na luz quanto no escuro.

2. Na presença de luz contínua, houve redução significativa da germinação com o uso de manitol.

3. O valor mais negativo de potencial hídrico que reduz 50% da germinação foi encontrado em sementes mantidas em soluções de manitol, no escuro.

4. Acima do limite máximo de tolerância, as sementes apresentaram dormência secundária.

5. Na presença de luz contínua houve redução da capacidade de recuperação das sementes sob estresse hídrico simulado com manitol.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao CNPq pelo auxílio financeiro concedido por uma bolsa de produtividade em pesquisa à primeira autora e outra de doutoramento, à segunda.

(2) Departamento de Botânica , Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Caixa Postal 676, 13565-905 São Paulo (SP). E-mail: dscp@power.ufscar.br

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    ) Recebido em 1.º de março de 2000 e aceito em 20 de agosto de 2001.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Jun 2002
    • Data do Fascículo
      2001
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