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Nevralgias periféricas da face e seu tratamento

ATUALIZAÇÃO

Assistente extra-numerário do Serviço de Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de S. Paulo (Prof. A. Tolosa)

Três são os nervos que presidem à sensibilidade da face: trigêmeo, glosso-faríngeo e facial. Qualquer lesão irritativa no trajeto destes nervos sensitivos, desde suas terminações periféricas até seus núcleos no neuro-eixo, provoca dôr. Existem, também, as dôres provocadas pelas lesões do sistema simpático. Veremos, assim, as nevralgias do trigêmeo, a nevralgia do glosso-faríngeo, a nevralgia do facial e as simpatalgias faciais. Além destas, outro tipo deve ser lembrado: a psicalgia facial.

Nevralgias do trigêmeo.

Recordaremos, preliminarmente, em largos traços, a anatomia e a fisiologia do Vo par craneano. O gânglio de Gasser, situado sobre a pirâmide do rochedo, é a sede das células nervosas cujos dendritos e cilindro-eixos vão constituir a porção sensitiva do trigêmeo. Os dendritos das células dos gânglios de Gasser agrupam-se em 3 nervos: oftálmico, maxilar superior e maxilar inferior. Assinalemos, desde já, que estes tres ramos sensitivos constituem via de empréstimo a fibras nervosas simpáticas e parasimpáticas, que se dirigem aos gânglios anexados a cada um deles: gânglio oftálmico, anexo ao nervo nasal (ramo do oftálmico); gânglio de Meckel ou esfenopalatino, anexo ao nervo maxilar superior e gânglio de Arnold ou ótico, anexo ao nervo maxilar inferior.

Os cilindro-eixos das células nervosas do gânglio de Gasser se reúnem em um tronco único que se dirige para a face ântero-externa da protuberância, na sua parte média. Na raiz sensitiva do trigêmeo, as fibras correspondentes aos três ramos periféricos, mantêm a seguinte sistematização, muito importante pelas aplicações cirúrgicas: as fibras do oftálmico ocupam o terço interno, as do maxilar superior o terço médio e as do maxilar inferior o terço inferior. André Sicard1 1 . Cit. por Raymond Garcin - Les nerfs crâniens. Traité de physiologie normale et pathologique. Roger e Binet. Tomo X - Fase. 1. Masson et Cie, 1935, pág. 322. , baseado em 42 dissecções, nega esta sistematização; para ele, certo número de fibras sensitivas acompanham a raiz motora. Isto explicaria a conservação parcial da sensibilidade na face, observada depois da neurotomia total do trigêmeo, quando a intervenção respeita a raiz motora.

A raiz sensitiva do trigêmio penetra profundamente na protuberância e seus cilindro-eixos terminam nas celulas da substância gelatinosa de Rolando. Termina aí o neurônio sensitivo periférico ou proto-neurônio sensitivo; nessas células tem origem o deuto-neurônio, cujos cilindro-eixos se incorporam aos feixes sensitivos do tronco cerebral para atingir o tálamo e, depois, pelo neurônio tálamo-cortical, a córtex da região parietal.

O trigêmio é um nervo mixto, sensitivo e motor - a raiz motora, partindo da protuberância, acompanha o tronco sensitivo até o gânglio de Gasser e, depois, o ramo maxilar inferior, para inervar os músculos da mastigação - porém, em seu trajeto periférico, recebe numerosos filetes simpáticos e para-simpáticos. O trigêmio tem, pois, além da ação motora (músculos da mastigação), funções sensitivas e vegetativas.

As ações vegetativas do trigêmio são devidas às anastomoses de fibras orto-simpáticas provindas do simpático cervical (anastomose carótido-gasseriana) e para-simpáticas que emprestam as vias do VIIo, do IXo e do XIIo pares cranianos. Por essas vias de empréstimo, as fibras do sistema vegetativo vão aos gânglios ótico, esfeno-palatino e oftálmico, anexos aos três ramos de distribuição periférica do trigêmio. Estas fibras vegetativas têm ação vaso-motora e secretora e, pelas estreitas ligações que mantêm com as fibras do trigêmio compreende-se que, nas afecções dêste ultimo, entrem em jogo sintomas dependentes do simpático. As perturbações tróficas (queratite ulcerosa, queratite experimental neuro-paralítica), verificada após secções altas do trigêmio ou alcoolizações do gânglio de Gasser e atribuídas, por alguns, à perda da inervação vegetativa trófica, seriam, para outros, devidas aos traumatismos aos quais a cornea se vê exposta em razão da sua insensibilidade ou ainda à ação traumática direta sobre o gânglio de Gasser.

O trigêmio dá à face a quase totalidade da sua inervação sensitiva. A topografia da anestesia determinada pela secção do trigêmio, varia conforme seja seccionada a raiz do trigêmio ou um dos seus ramos. O território do oftálmico compreende a metade anterior da região parietal, as regiões frontal e superciliar, a pálpebra superior, a dura-mater das partes anterior e média do estojo craniano, a mucosa dos seios frontais e esfenoidais, a mucosa das células etmoidianas, a conjuntiva e a córnea. O território do maxilar superior compreende o lábio superior, a asa do nariz, a região geniana anterior, a abóbada palatina, o véu do paladar, a mucosa das fossas nasais e os dentes do maxilar superior. O território do maxilar inferior compreende a fossa temporal, a caixa do tímpano, a região geniana posterior, a região masseterina, a região mentoniana, as gengivas e os dentes inferiores e a mucosa dos dois terços anteriores da língua. Em relação à sensibilidade profunda da face, a questão ainda não foi resolvida definitivamente. Após neurotomia retro-gasseriana ela é muito pouco alterada ou mesmo permanece íntegra em qualquer das suas formas (barestésica, palestésica e sentido muscular). Para alguns autores ela corre por conta do facial. Para outros, seria devida à raiz mesencefálica, parcela da raiz sensitiva do trigêmio que, na protuberancia, em lugar de acompanhar os outros cilindro-eixos (raiz descendente do trigêmio), se dirige para cima, para a região mesencefálica.

Graças à extensão deste territorio sensitivo, o trigêmio contribui para a bôa realização de quatro funções sensoriais (visão, olfação, gustação e audição), pois que os órgãos receptores destas funções estão localizados no seu campo de inervação sensitiva. Ao aparelho visual, o Vo par dá, além da sensibilidade da córnea (reflexos de proteção), filetes írido-dilatadores (anastomose carótido-gasseriana) e filetes que regulam o tonus intra-ocular. O trigêmio ampara os aparelhos olfativo, gustativo e auditivo pelos reflexos protetores dos quais êle constitui a via centrípeta.

A nevralgia do trigêmio deve ser dividida em dois grandes grupos, diferentes pela sua sintomatologia, etiologia, tratamento e prognóstico: a nevralgia secundária e a nevralgia essencial.

Nevralgia secundária do trigêmio: Toda a lesão localizada no trajeto do nervo, entre seus núcleos sensitivos e os seus ramúsculos, terminais na pele e mucosas, determinará uma síndrome dolorosa na face. Estas nevralgias caracterizam-se pela existência de um fundo doloroso contínuo, com períodos de exacerbação. Conforme a lesão se localize num dos ramos ou ramúsculos do Vo par, sobre o gânglio de Gasser ou na porção retro-gasseriana, a dor distribuir-se-á em todo seu campo de inervação periférica ou apenas em parte dele. A medida que a lesão progride aparecerão perturbações da sensibilidade objetiva: hipoestesia e, mais tarde, anestesia. Durante muito tempo acreditou-se que a nevralgia secundária só se observava nas irritações do gânglio de Gasser ou de seus três ramos periféricos. Admite-se hoje que, nas lesões bulbo-protuberanciais, as algias do trigêmio não são raras.

Entre as causas capazes de produzir nevralgia secundária do trigêmio destacam-se: afecções dentárias - cáries penetrantes, pulpites, dentes inclusos, gengivo-alveolites crônicas; afecções nasais - coriza crônico, ozena, rinites fungosas, polipos; afecções dos seios para-cranianos - sinusites frontais, maxilares e etmoidais; afecções oculares - irites, irido-ciclites e glaucoma; neo-formações e inflamações de qualquer natureza, localizadas ao longo do trajeto do trigêmio ou de seus ramos - neoplasias primitivas do gânglio de Gasser ou de sua bainha, tumores da base do crâneo, placas de meningite (tuberculose, lues), tumores da órbita, periostite luética da fenda esfenoidal, tumores hipofisários, etc.; doenças gerais - sífilis, impaludismo e diabetes; finalmente, lesões vasculares ou neo-plásicas bulbo-protuberanciais. A esclerose em placas e a siringobulbia tambem podem ser a causa de nevralgias trigeminais.

Merece reparo especial o zona do trigêmio, podendo apresentar-se sob diversas formas clínicas, conforme a localização: zona do oftálmico, zona do maxilar superior, zona do mandibular ou, mesmo, zona total. Mais comum é o zona do oftálmico que se inicia por dores peri-orbitárias e frontais; na infância esse período é acompanhado de reação febril, no adulto e no velho essa reação frequentemente falta. Dias depois aparecem as vesículas, que nunca ultrapassam a linha mediana. Em poucos dias elas desaparecem. Na infância tudo está terminado, porém, nos adultos e velhos, segue-se um período de um a quatro ou mais meses de dores muito fortes, às vezes acompanhadas de paralisia dos nervos oculares. Nem sempre aparecem muitas vesículas; às vezes, uma ou duas apenas podendo, assim, passar desapercebidas. As dores podem ser contínuas ou não, sendo porém limitadas ao território correspondente ao ramo trigeminal afetado. Não é uma afecção rara e o prognóstico é sempre bom.

Nas nevralgias do trigêmio de fundo doloroso contínuo devemos, em primeiro lugar, pensar em lesão focal: dentária, sinusal, ocular ou otogênica. Excluídas estas, devem-se afastar hipóteses mais sérias, porém mais raras, como neoformações, meningites de base, siringobulbia e esclerose em placas. Não nos devemos esquecer do zona do trigêmio e da possibilidade da lues, do diabetes e do impaludismo serem, às vezes, a causa desta nevralgia. O impaludismo nunca deve ser esquecido no nosso meio, dada sua grande incidência.

De causa desconhecida, a nevralgia essencial do trigêmio tem sintomatologia própria que a distingue claramente da nevralgia secundária. A dor é discontinua, intermitente, surgindo por crises, no intervalo das quais, o paciente nada sente. O exame objetivo nada ou muito pouco revela: raras vezes é assinalada hiperestesia. A compressão das extremidades periféricas dos ramos do trigêmio ao nível dos orifícios supra-orbitário, infra-orbitário e mentoniano (pontos de Vaillex) não provoca dor, na maioria dos casos. Algumas vezes, essa compressão provoca dor, seja irradiada a todo o território do trigêmio seja localizada no território do ramo comprimido. As crises dolorosas não obedecem a ritmo algum.

Elas variam desde as subintrantes até aquelas com longos períodos de acalmia, durando meses e, mesmo, anos. As crises dolorosas podem ser desencadeadas por um ato qualquer como a deglutição, a fala, a tosse, o espirro ou o simples atrito da face. Elas começam em um ponto determinado para cada doente, para depois se espalharem rapidamente. Iniciada a dor, o paciente permanece imóvel, angustiado pela sua violência. Êle procura atenuar o mal comprimindo energicamente a região dolorosa com as mãos. Quando as crises são frequentes, o doente vive apavorado esperando nova crise a todo o momento, evitando falar, comer, beber, tocar na face, conforme o tipo do fator desencadeante. O caráter das dores é mais ou menos fixo para o mesmo doente e pode ser comparado a agulhadas, facadas, cãimbras, queimaduras e formigamentos dolorosos. O início da dor é sempre limitado a um ramo do trigêmio. Em geral, inicia-se pelos territórios do maxilar superior ou do inferior e, depois, se espalha atingindo o do oftálmico. Raramente a dor inicia-se por este último. J. Ribe Portugal2 2 . Portugal, J. Ribe - Nevralgias da face. Medicina, Cirurgia e Farmácia (Rio de Janeiro) 76: 518-528 (Julho) 1942. em 105 casos de grande nevralgia, só observou três em que a dor era primitivamente oftálmica. Carlos Gama3 3 . Gama, Carlos - Contribuição para o estudo das nevralgias do trigêmeo. Tese de docência, 1938, São Paulo. em 123 casos, encontrou somente seis em que o oftálmico foi atingido isolada ou primitivamente. A dor de dentes é, comumente, o ponto de partida das grandes nevralgias e isto leva muitas vezes o paciente a submeter-se a múltiplas e inúteis extrações dentárias. Raramente a dor é bilateral. Em seus casos, Ribe Portugal (1: 105) e Carlos Gama (1: 123), só verificaram um caso de bilateralidade da dôr.

Sicard4 4 . Sicard, J. A. - Les algies et leur traitement. Questions neurologiques-d'actualité, Masson Cie., 1922, pgs. 311-342. estipula que dever ser tidas como secundárias todas as nevralgias: 1) nais quais a dor é contínua, sem fase de acalmia franca; 2) que se acompanharem de hipo ou anestesia cutânea ou mucosa; 3) acompanhadas de sinais de irritação ou de paralisia de outros nervos craneanos - trismos, diplopia, paralisia facial, hemiatrofia lingual, etc.; 4) nas quais a dor, desde o início, atinge, de uma vez, o território dos três ramos do trigêmio.

As nevralgias do trigêmio podem ser acompanhadas de manifestações motoras, simpáticas e sensitivas, por lesão concomitante de outros pares craneanos. Dentre as principais, lembraremos: a) tique doloroso da face (espasmo dos músculos inervados pelo facial, acompanhado de dor); b) complicações decorrentes da lesão do sistema simpático, consistindo em reações vaso-motoras (congestão conjuntival e da mucosa nasal), lacrimejamento, salivação e miose; c) otalgia dependente da participação do VIIo par (intermediário de Wrisberg); d) distúrbios da gustação e deglutição decorrentes da participação do IXo par (alteração da gustação no terço posterior da língua e perturbação no 1.° tempo da deglutição); e) dores na nuca devidas à participação do nervo occipital de Arnold ou ramo posterior do 2.° par cervical.

Mesmo quanto à terapêutica devemos separar as nevralgias secundárias das nevralgias essenciais.

Nas formas secundárias, o tratamento é etiológico. Quando, por qualquer circunstância, a causa não pode ser removida, faz-se a medicação sintomática. Quando o caraterístico clínico de uma nevralgia é o das secundárias, sem contudo ter-se apreendido a causa, deve-se pensar numa moléstia a virus ou reumatismal e tratá-la como tal. São indicados os anti-infecciosos (ácido salicílico e derivados) e a vitamina B1. Em nosso meio, dada a grande incidência do impaludismo, deve-se sempre experimentar o quinino. Pode-se recorrer, também, ao uso da fisioterapia.

O tratamento das nevralgias essenciais pode ser medicamentoso, fisioterápico ou cirúrgico. Sem dúvida este ultimo é o mais útil e, por vezes, o único eficaz. Há autores que consideram a nevralgia essencial como uma forma atípica do zona do trigêmio. Assim sendo, pode-se tentar um tratamento anti-infeccioso e vitaminoterápico como para as nevralgias secundárias cuja causa não se apurou.

No terreno fisioterápico as nevralgias do trigêmio beneficiam-se com a galvanização (método de Bergonié), a ionização e a radioterapia. A galvanização pelo método de Bergonié consiste em submeter a totalidade do território de distribuição periférica do trigêmio à ação do polo positivo, fazendo atravessar uma corrente de alta intensidade (40, 50 ou mesmo mais miliampères). Na técnica de Bergonié o electrodo deve ser esponjoso, de forma particular, especie de hemimáscara facial, capaz de se moldar exatamente sobre as depressões do rosto. Em média, devem-se fazer aplicações durante 3 mezes, diariamente.

O emprego da ionização no tratamento das nevralgias do trigêmio, é feito pela aplicação de uma corrente galvânica de fraca intensidade, cujos eletrodos são embebidos em soluções contendo os diferentes ions medicamentosos. Entre estes, devemos assinalar: o quinino, utilizado por meio de uma corrente de 15 a 20 miliampères em secções de 10 a 40 minutos (as doses fortes têm o inconveniente de provocar edema); o ion salicílico, usado em solução de salicilato de sódio a 2% sob uma intensidade de 10 a 15 miliampères. O ion calcio é aconselhado por Bourguignon, com a técnica da ionização transcerebral (solução de cloreto de cálcio sob a intensidade de 2 a 3 miliampères). O ion aconitina tem sido o mais recomendado ultimamente, parecendo ser o que fornece resultados mais nítidos, porém os eletroterapeutas ainda não estão de acordo quanto à técnica e posologia, por se tratar de substância altamente tóxica: Barré5 5 . Cit. por A. Zimmern e J. A. Chavany - Diagnostic et théîapeutique electro-radiologiques des maladies du système nerveux. Masson Cie. Paris, 1930, pgs. 532. preconiza soluções de 2 miligramas por 1.000; Juster e Lehmann6 6 . Cit. por A. Zimmern e J. A. Chavany6 trataram 15 casos de nevralgias do trigêmio com solução de 20 miligramas por 1.000, usando uma corrente de 40 ou 60 miliampères e, gradativamente, até o fim da secção para evitar vertigens (sessões diarias de meia hora, durante 10 dias). Duhem7 7 . Cit. por A. Zimmern e J. A. Chavany8 emprega soluções de 250 miligramas por 1.000, o que impede de elevar a corrente acima de 15 miliampères, devido à sensação de ardor que pode aparecer quando a corrente ultrapassa aquele limite com solução tão concentrada. Segundo Duhem os resultados são os mais animadores, aparecendo, depois de cada sessão, uma hipoestesia que perdura por 24 horas. As sessões não devem ir além de 15 a 30 minutos, não sendo aconselhável empregar mais de 10 consecutivamente.

A eficácia da radioterapia é ainda muito discutida mas em muitos casos tem dado bons resultados. Deve ser usada a radioterapia semipenetrante, dirigindo o feixe para a zona do gânglio de Gasser, isto é, na zona temporal, acima da apófise zigomática e para traz da apófise orbitaria. A dose total deve ser de 3.000 R, distribuída em 3 semanas de 2 sessões, com 5500 R, no máximo, em cada sessão.

O tratamento cirúrgico, é sem duvida, o mais eficaz tendo, porém, alguns inconvenientes. Antes de indicá-lo deve-se tentar o tratamento medicamentoso e eletroterápico. Vários métodos são empregados para o tratamento cirúrgico: secção dos ramúsculos e troncos periféricos, destruição do gânglio de Gasser, secção total ou parcial da raiz posterior e a cordotomia que atinge, diretamente, as fibras sensitivas intra-nevraxiais do trigêmio.

O primeiro - secção dos ramúsculos e troncos periféricos - nasceu da idéia de que nos tegumentos estaria a sede inicial da dor. Assim sendo, a secção cirúrgica ou a neurolise química das terminações periféricas do trigêmio, determinaria o desaparecimento das dores. Estas terminações podem ser facilmente atingidas, pela alcoolização ao nível dos orifícios supra-orbitário, infra-orbitário e mentoniano. Em geral este procedimento não corresponde aos resultados desejados, pois o efeito é muito transitório e, por vezes, incompleto.

A destruição do gânglio de Gasser pode ser cirúrgica (gasserectomia), por neurolise química (alcoolização) ou pela eletrocoagulação. A gasserectomia está hoje completamente abandonada por ser de técnica dificil e por acarretar graves perturbações, principalmente oculares.

A alcoolização do gânglio de Gasser é ainda empregada, embora a tendência atual nos meios neuro-cirúrgicos seja a de abandoná-la completamente. Para a alcoolização, o gânglio é atingido através do buraco oval. O método mais usado é o de Haertel, no qual Carlos Gama8 8 . Gama, Carlos - Alcoolização do gânglio de Gasser (aperfeiçoamento da técnica). Bol. Soc. Med. e Cir. S. Paulo. 11 (Fevereiro) 1929. Gama, Carlos - Alcoolização do gânglio de Gasser (novos aperfeiçoamentos da técnica). Bol. Soc. Med. e Cir. S. Paulo. 13 (Outubro e Novembro) 1929. introduziu modificações técnicas muito úteis. A alcoolização pode determinar numerosas complicações, algumas sem gravidade e outras muito sérias. Entre todas, destacam-se as oculares (paralisias dos nervos motores oculares, blefarite escamosa, enoftalmo, queratites). Ainda hoje discute-se o mecanismo patogênico das queratites. Para alguns, seriam devidas à supressão da ação simpática sobre o trofismo tissular, para outros a traumatismos múltiplos e sucessivos a que é exposta a córnea insensibilizada, e ainda para terceiros, seriam devidas a traumatismo do gânglio de Gasser como sucede não só na gasserectomia e na alcoolização mas também na neurotomia retrogasseriana tipo Frazier ou Stookey. Qualquer seja o mecanismo patogênico, foi essa complicação que fez com que se abandonasse a gasserectomia e que se receasse a alcoolização do gânglio de Gasser. A queratite constitue uma complicação em 25% das alcoolizações do gânglio de Gasser, segundo a estatística de Haertel9 9 . Cit. por J. Ribe Portugal 3 Pg. 521. Carlos Gama relata 31 casos nos quais houve complicações oculares diversas: 9 casos de queratite neuroparalítica e 4 de úlcera da córnea. Segundo j. Ribe Portugal10 10 . Portugal, J. Ribe - Diagnóstico e tratamento das nevralgias da face. Separata de Anaes do Inst. Brasil, de Estomatol. (Rio de Janeiro), 1936. outra grande contraindicação da alcoolização, é que ela dificulta uma tentativa ulterior de neurotomia diferenciada quando a alcoolização não tenha dado os resultados desejados. Essa dificuldade seria devida a aderências e neovascularização produzidas pela alcoolização. Não podendo diferenciar os filetes sensitivos e mesmo a raiz motora, o cirurgião é obrigado a fazer a neurotomia retro-gasseriana total, operação que pode determinar as mesmas complicações que a gasserectomia.

Na destruição pela eletrocoagulação (metodo de Kirschner) o gânglio de Gasser é atingido pela mesma via e com a mesma técnica com que é realizada a alcoolização. Tato e Caratcoche11 11 . Tato e Caratcoche - Neuralgia essencial del trigemino e electrocoagula-cion del ganglio de Gasser. Rev. Argent. de Neurol. e Psiq. 5: 186-192 (Setembro) 1940. operaram 45 doentes por este método e não tiveram acidente fatal. Como complicações observaram um caso de meningite e 9 com úlcera córnea. Noutro trabalho os mesmos autores12 12 . Tato e Caratcoche - Neuralgia essencial del trigemino. Su tratamiento por la electrocoagulacion del ganglio de Gasser (Estatística). Rev. Argent. de Neurol. e Psiq. 5: 272-273 (Dezembro) 1940. relatam os ótimos resultados obtidos quanto à cessação da dor, mencionando, porém, alta percentagem de queratites.

A neurotomia retrogasseriana pode ser total ou parcial. A total consiste em seccionar toda a raiz do trigêmio atraz do gânglio de Gasser. Esta operação não impede o aparecimento da queratite. Daí o emprego da neurotomia retrogasseriana diferenciada, pela secção das fibras correspondentes apenas ao ramo onde se manifestou a nevralgia.

Como vimos atraz, as fibras do oftálmico ocupam o terço interno da raiz do trigêmio, as fibras correspondentes ao maxilar superior, o terço médio, ficando no terço inferior as correspondentes ao maxilar inferior. Baseado nestes fatos Frazier13 13 . Frazier, Ch. H. - Subtotal resection of sensory root for relief of major trigeminal neuralgia. Arch. Neurol, a. Psych. 13: 378-284 (Marco) 1925. preconizou a neurotomia retrogasseriana parcial, com a qual o cirurgião pode respeitar as fibras correspondentes ao oftálmico e as fibras motoras: impede-se, assim, o aparecimento da queratite e das perturbações da mastigação. A secção das fibras provindas do oftálmico só será indicada quando a trigeminalgia se localizar no território desse ramo o que, como vimos, é relativamente raro. Stookey14 14 . Stookey, B. - Differencial section of the trigeminal root in the surgical treatment of trigeminal neuralgia. Arch. Surgery. 87: 172-178 Fevereiro) 1928. propôs a neurotomia diferenciada que, em princípio, não se distingue da neurotomia parcial, uma vez que ela se propõe a diferenciar a raiz motora e as fibras oftálmicas das fibras provindas dos ramos maxilar superior e inferior, conforme os resultados desejados.

A via de acesso da neurotomia retrogasseriana é a temporal. Dandy15 15 . Dandy, W. E. - An operation for the cure of tic douloureux. Arch. Surgery 18: 687-734 (Fev.) 1929. para evitar traumatismo do gânglio de Gasser durante a neurotomia por via temporal, preconizou a neurotomia justa-protuberancial. Esta operação parece ser realmente a única que evita a queratite. Em 88 pacientes assim operados, Dandy refere não ter tido caso algum de queratite; interessante notar que esta complicação não surgiu em qualquer caso, ainda que na operação de Dandy só seja respeitada a raiz motora.

Além dessas operações, outra pode ser praticada no tratamento da nevralgia essencial do trigêmio. Consiste na secção da raiz descendente do trigêmio, ao nível do terço superior da oliva bulbar. Segundo, Olof Sjöqvist16 16 . Sjöqvist, O. - Novo metodo operatorio para o tratamento da nevralgia do trigemio: corte da raiz descendente do trigemio. Zentralbl. f. Neurochirurgie 5: 6 (Jan.) 1938 - in Lisboa Médica (Fev.) 1938. essa operação permite obter uma anestesia dissociada, isto é, analgesia e termoanestesia com conservação da sensibilidade tatil. Weinberg e Grant17 17 . Weinberger, L. M. e Grant, F. C. - Experiences with intra medullary tractotomy. Arch, of Neurol, a. Psych. 49: 665-282 Maio) 1943. praticaram esta operação em 19 casos e verificaram, em quase todos, complicações neurológicas. Estas são atribuídas à maior profundidade da incisão que são obrigados a fazer para obter analgesia completa. Segundo eles, outros neuro cirurgiões que praticaram esta intervenção, em doentes que não tiveram complicações, não atingiram a analgesia completa desejada, e isso seria devido à superficialidade da incisão. Dos 19 casos operados eles praticaram a incisão de Sjöqvist em 10. Nos 9 restantes modificaram a incisão e diminuíram as complicações. Weinberger e Grant concluem o seu trabalho dizendo que a tractotomia está ainda no período experimental e só deve ser indicada nos casos em que, devido a tumores malignos da face, língua, faringe, etc, deve-se intervir ao mesmo tempo sobre o glosso-faríngeo e nervos cervicais superiores.

Simpatalgias faciais.

As simpatalgias faciais - nevralgias simpáticas da face, nevralgismos, causalgia facial ou nevralgias atípicas da face - estão muitas vezes associadas à nevralgia do trigêmio, sendo, porisso, consideradas uma complicação desta última. Devem ser, porém, individualizadas, pois podem aparecer ou persistir mesmo após a neurotomia retrogasseriana ou a alcoolização do gânglio de Gasser.

O simpático aproveita a via do trigêmio e de outros pares cranianos para atingir a face, o que faz de modo abundante e difuso. A dor da simpatalgia facial é difusa, contínua, dando a impressão de queimadura e provocando mal estar. Não sendo viva nem intoleravel é, no entanto, pertinaz e incomodativa, pondo o doente em estado angustioso. A dor é exacerbada pela emoção e pela preocupação. Em geral, ultrapassa os limites de inervação do trigêmio, irradiando-se para fora da face, para a nuca, pescoço, ombro e, às vezes, para o membro superior do mesmo lado. Há, quase sempre, hiperestesia cutânea no território doloroso. Frequentemente notam-se outras perturbações de carácter simpático (vaso-congestão ocular e facial, edema, lacrimejamento, síndrome de Claude Bernard-Horner).

Entre as simpatalgias da face já foram destacados dois tipos bem distintos: 1) síndrome do gânglio ciliar ou síndrome do nervo nasal que se caracteriza por dores oculo-nasais. congestão conjuntival, lacrimejamento, coriza, edema das pálpebras, hiperestesia corneana e, às vezes, ulceração corneana; 2) síndrome do gânglio esfeno-palatino que, comumente, surge como complicação das sinusites esfenoidais. A dor localiza-se na base do nariz, ao redor do globo ocular e ao nível dos dentes do maxilar superior. Frequentemente o doente acusa uma sensação de alongamento dos dentes e de obstrução do ouvido. Há também intenso coriza com congestão da mucosa nasal e ocular.

No tratamento das nevralgias de tipo simpático, devemos sempre fazer a extirpação de infecções focais vizinhas (dentes infectados, sinusites, pólipos, amigdalites, germes dentários embrionários) que podem ser o ponto de origem dessas nevralgias reflexas. Além disso, deve-se prescrever medicação sintomática da dor. A eletroterapia não dá resultado. Em geral as dores de carácter simpático são muito resistentes à terapêutica. Quando a zona atingida é extensa, tomando a face, o ombro, o pescoço e o braço do mesmo lado, pode-se obter resultados satisfatórios pelas intervenções cirúrgicas (simpatectomia peri-arterial, gangliotomia cervical). Quando a nevralgia tem o tipo da síndrome do gânglio esfeno-palatino, o melhor tratamento consiste na alcoolização desse gânglio ou sua anestesia pelo líquido de Bonain (acido fênico e cloridrato de cocaina). Esta pode ser feita, através da mucosa nasal, pelo bloqueio das terminações periféricas, por intermédio de um tampão de algodão embebido naquela substância e colocado sob o corneto médio.

Nevralgia do glosso-faríngeo.

O glosso-faríngeo é um nervo de funções motora, sensitiva, sensorial e vegetativa. No momento, nos interessam apenas as três últimas. As células nervosas que dão origem às fibras sensitivas estão localizadas nos gânglios de Andersch e de Ehrenditter, situadas na base do crânio. Estas células recolhem, pelos seus dendritos, a sensibilidade do terço posterior da língua, da fossa amigdaliana, da face anterior da epiglote, da parte da caixa do timpano, da trompa de Eustachio e das células mastoidianas. As impressões sensitivas, recolhidas na periferia são veiculadas, depois, pelos cilindro-eixos que terminam na parte média do núcleo solitário (bulbo-raquidiano): depois são levadas para os hemisférios cerebrais pelos feixes bulbotalâmico e tálamo-parietal.

Fora do território lingual, que os autores são acordes em admitir como exclusivo do glosso-faríngeo, as outras zonas sensitivas atribuíveis a este nervo são de limites discutidos e, até, negados por alguns. A neuro-cirurgia trouxe contribuição valiosa para esclarecer o assunto. Dandy18 18 . Dandy, W. E. - Glosso-Pharyngeal neuralgia. Its diagnosis and treatment. Arch, of Surgery 15: 198-214 (Agosto) 1927. , Chavany e Welti19 19 . Chavany e Welti - La neuralgie du glosso-pharyngien. Sa Symptomatologie. Presse Médicale (Junho, 25) 1932, pág. 999. concluiram, após neurotomia, que o glosso-faríngeo recolhe a sensibilidade geral do terço posterior da mucosa lingual e de toda a extensão da parede anterior, lateral e posterior do faringe. No entanto, Temple Fay20 20 . Temple Fay - Observations and results from intracranial section of the glosso-pharyngens and vagus nerves in man. Journ. of Neurol, a. Psycho-pathol. 30: 110 (Outubro) 1027. , depois de neurotomias intracraneanas do IXo par no homem, admitiu que toda sensibilidade geral, atribuída a este nervo, corre por conta de anastomoses com o pneumogástrico e que o glosso-faríngeo tem apenas função gustativa. Para este autor, a chamada nevralgia do glosso-faríngeo seria, na realidade, nevralgia do pneumogástrico.

As fibras do glosso-faríngeo são acompanhadas, na sua distribuição periférica, por fibras para-simpáticas responsáveis pelas funções vegetativas do IXo par; tais fibras, provindas do núcleo salivar inferior, presidem à inervação da parótida, controlando parte importante da secreção salivar. Estas fibras atingem a parótida seguindo as raízes do glosso-faríngeo, o gânglio de Andersch, o nervo de Jacobson, o pequeno nervo petroso profundo, o gânglio ótico e o nervo aurículo-temporal. Complicando ainda mais a físio-patologia do IXo par, deve-se lembrar que este nervo envia ao seio carotidiano o nervo de Hering o qual, nascendo um pouco para baixo da base do crânio de uma anastomose com o pneumogástrico, se anas-tomosa depois com ramos do simpático para formar o plexo carotidiano: a secção do nervo de Hering ou nervo do seio carotidiano determina taquicardia e elevação permanente de tensão arterial. A sua excitação provoca, ao contrário, hipotensão arterial e bradicardia.

A nevralgia do glosso-faríngeo foi descrita, pela primeira vez, em 1910, por Weisenburg21 21 . Weisenburg. T. H. - Cerebello-pontile tumor diagnosed for six years as tic douloureux. The simptoms of irritation of the ninth and twelfth cranial nerves. Jour. Am. Med. Assoc. 54: 1600-1604 (Maio, 14) 1910. . Até essa data, era confundida com a nevralgia do trigêmio. A nevralgia do glosso-faríngeo também deve ser dividida em secundária e essencial; para Dandy ela é, quase sempre, sintomática. As causas mais comuns são os tumores do nêuro-eixo, a aracnoidite da fossa crâniana posterior e as nevrites infecciosas.

A nevralgia do glosso-faríngeo caracteriza-se por dores localizadas profundamente na base da língua, no ângulo da mandíbula e na região amigdaliana. A dor é discontínua e estritamente unilateral. Desencadeia-se por motivos banais (tosse, espirro, deglutição). A crise dolorosa é de forte intensidade, sendo a dor comparada à de uma facada. Logo depois de iniciada, se irradia para a região submaxilar, véu do paladar e caixa do tímpano. Em geral, encontra-se no fundo da boca um ponto cuja excitação dá origem à dor; é, por assim dizer, a zona metamérica (trigger-zone para os americanos) cuja cocainização poderá impedir momentaneamente as crises ou diminuir sua intensidade.

O único tratamento eficiente é o cirúrgico, que consiste na neurotomia a qual pode ser: 1) Exocraneana, atingindo o nervo logo após a emergência do estojo craneano e que, em geral, é completada pela alcoolização do coto central do nervo; 2) Endocraneana, após trepanação da fossa craneana posterior. Esta intervenção é muito mais difícil, porém tem a vantagem de permitir a exploração da fossa craneana posterior, onde o cirurgião poderá, muitas vezes, encontrar a causa da nevralgia, mormente nos casos em que esta causa seja insuficiente ainda para determinar o aparecimento de sinais neurológicos.

Nevralgia do facial.

Entende-se por nevralgia do facial a dôr que faz parte do quadro sintomático da síndrome de Ramsay-Hunt, isto é, do zona auricular ou zona do gânglio geniculado.

O nervo facial, exclusivamente motor, é acompanhado por fibras sensitivas, constituintes do nervo intermediário de Wrisberg, as quais são as responsáveis pela sintomatologia dolorosa. O intermediário de Wrisberg tem sua origem no gânglio geniculado, localizado na pirâmide do rochedo. Os dendritos das células deste gânglio recolhem a sensibilidade da zona de Ramsay-Hunt - conduto auditivo - região de cuja sensibilidade compartilham quatro outros nervos: trigêmio, pneumogástrico, glosso-faríngeo e plexo cervical superficial. Além disso, os dendritos das celulas do gânglio geniculado recolhem também parte da sensibilidade superficial, principalmente térmica, e a gustação dos dois terços anteriores da língua. Os cilindro-eixos das células do gânglio geniculado dirigem-se para a porção superior do núcleo solitário, onde começa o deuto-neurônio sensitivo que se encaminha para o tálamo e, depois, para o córtex parietal.

A síndrome de Ramsay-Hunt ou zona do gânglio geniculado, caracteriza-se pelo aparecimento de vesículas, que podem ser limitadas à parede posterior do meato auditivo externo e aos dois terços anteriores da língua, acompanhadas de dor nesses territórios. Via de regra, a dôr é comparada à queimadura e precede ao aparecimento das vesículas; pode desaparecer quando as vesículas secam, mas geralmente perdura por muitas semanas e até meses. Por vezes as vesículas extendem-se ao pilar anterior do véo do paladar e ao pavilhão da orelha. Pode aparecer, tambem, uma paralisia facial do tipo periférico, 4 a 5 dias depois do aparecimento das vesiculas. Raramente a paralisia precede ou é concomitante à erupção zoosteriana. Não raras vezes, as vesículas são em tão pequeno número ou tão discretas que passam desapercebidas. Uma paralisia facial acompanhada de dor no pavilhão da orelha, deve fazer pensar no zona do gânglio geniculado. Sinais vestibulares ou auditivos (vertigem, leve surdês ou zumbidos) podem fazer parte do quadro sintomático e seu aparecimento pode preceder a dor e à erupção.

As teorias sobre a patogênese do herpes zoster são várias. Mais geral é a tendência a considerá-lo não como simples ganglionite, mas como processo infeccioso ascendente, devido a um virus filtrável específico, com reações sorológicas bem definidas e produção de anti-corpos. (Ralph Fenton)22 22 . Fenton ,Ralph - Fattori diagnostici riguardanti l'erpes-zoster auricolare. Gaz. Ospedale e d. Clin. 56: 568 (Jan.) 1935 in Tour. Am. Med. Assoc. (Agosto, 18) 1934, pag. 468. . O frio, o exgotamentomento físico, os traumatismos, a perda súbita do equilíbrio endócrino, são fatores desencadeantes ou predisponentes dessa infecção.

O tratamento do zona auricular não é específico, uma vez que o virus não foi isolado. O soro de convalescentes atenua e abrevia a duração das dores post-herpéticas. Alguns aconselham a auto-hemoterapia. Os raios ultra-violeta parecem influir favoravelmente na evolução da moléstia, diminuindo o tempo de duração das dores. É aconselhável, também, o tratamento anti-infeccioso pelo salicilato de sódio a 10% por via venosa ou o iodureto de sódio estabilizado a 5%, pela mesma via. Grandes doses de vitamina B atenuam as dores e facilitam a evolução da moléstia, principalmente no que se refere à parte paralítica. Deve-se ter cuidado especial com as vesículas para evitar sua ulceração e infecção secundária.

Neste capítulo, além do zona do gânglio geniculado devemos nos referir ao tic doloroso do nervo intermediário, admitido por Furlow23 23 . Furlow, T. - Tic douloureux of the nervus intermedius (so called idiopathic geniculate neuralgia). J. A. M. A. 119: 255-259 (Maio, 16) 1942. como entidade clínica, ainda que extremamente rara. Este autor discordando da opinião de outros que, em casos semelhantes atribuiram a dor ao glosso-faríngeo, praticou a neurotomia do intermediário de Wrisberg no ângulo cerebelo-pontino e obteve a cura da sua paciente. Neste caso, a sintomatologia pode-se resumir em dor intensa, essencialmente intermitente, dentro do ouvido esquerdo. Essa dor não aparecia pela deglutição ou excitação do faringe. O exame neurológico foi inteiramente negativo, assim como todos os exames complementares. A excitação de uma pequena zona no canal auditivo externo desencadeava a dor e a sua cocainização fazia desaparecer, provisoriamente, as crises dolorosas. Durante a operação, as manipulações sobre o intermediário de Wrisberg reproduziram a mesma dor. A operação evoluiu favoravelmente e a paciente, curando-se completamente não apresentou sequelas dignas de reparo.

Psicoalgias faciais.

Conforme as teorias clínicas e psicológicas adotadas, variam as denominações para este tipo de dôres: topoalgias (Blocq), algias psíquicas (Huchard), dôres de hábito (Brissaud), cenestopatias (Dupré), neuralgias neurastênicas (Jendrassik), neuralgismo (Sicard), dôres histéricas (Gordon). A denominação de psicoalgias é de Pratt, Golden e Rosenthal.

O diagnóstico das psicoalgias faciais só póde ser feito por exclusão. São elas frequentemente acompanhadas de movimentos anormais, simulando, assim, o tique doloroso da face. Um dos principais característicos é a mutabilidade dos sintomas, principalmente da sede, do carater e da extensão da dor. Marcos Victoria24 24 . Marcos Victoria - Estudios de Neurologia y Psicopatologia (3. a Série) - El Ateneo Buenos Aires, 1941. chamou a atenção para as modalidades todo especiais das crises dolorosas, a localização anatômica e a propagação anômalas, e o ritmo inusual, subordinado muitas vezes a um horário especial do doente ou a um momento propício determinado pelas ocupações do mesmo. Por isso Walton as englobou sob o rotulo de "ocupation neuroses". Em geral, trata-se de doentes grandemente impressionáveis, facilmente sugestionáveis; uma psicoterapia de prova deve sempre ser tentada para esclarecimento diagnóstico. Firmado o diagnóstico e cuidadosamente eliminadas todas as outras formas de nevralgias da face, deve-se estabelecer o tratamento que só pode ser psicoterápico. A psicoterapia pode ser aplicada de variadas formas, usando desde uma injeção inofensiva ao torpedeamento, desde a persuação à psicoanálise, tudo dependendo das relações psico-afetivas entre o médico e o doente.

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  • Nevralgias periféricas da face e seu tratamento

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Mar 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 1943
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