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“SOU UM CORPO ESTRANHO NO CONJUNTO”: NARRATIVAS DE UM ESTUDANTE NEGRO MIGRANTE EM UMA UNIVERSIDADE BRASILEIRA

“I AM A STRANGE BODY IN THE GROUP”: NARRATIVES OF A BLACK MIGRANT STUDENT IN A BRAZILIAN UNIVERSITY

RESUMO

O pensamento moderno ocidental se constitui em um sistema de distinções visíveis e invisíveis de separação social, cultural e epistêmica. São linhas abissais (SANTOS, 2007SANTOS, B. D. S. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes.Revista crítica de ciências sociais, (78), pp. 3-46, 2007.) que determinam categorizações hegemônicas de sujeito, raça, língua e conhecimento, as quais posicionam, do lado superior da linha, um ideal de homem moderno e, do lado inferior, formas subalternas e silenciadas de ser e estar no mundo. Com o objetivo de problematizar como o aluno negro migrante sofre com os efeitos das divisões abissais no espaço universitário e produz uma resposta a essas categorizações estabelecidas no contexto, neste trabalho, trago os relatos de um estudante haitiano, graduando em uma universidade pública brasileira. Jean, aprovado no curso de Bacharelado em Geografia, por meio de uma política de inclusão de migrantes refugiados e portadores de visto humanitário no ensino superior, narrou algumas experiências vividas no seu primeiro semestre da graduação. A partir de suas narrativas, recorro a uma perspectiva de Linguística Aplicada Crítica (MOITA LOPES; FABRÍCIO, 2019MOITA LOPES, L. P.; FABRÍCIO, B. F. Por uma “proximidade crítica” nos estudos em Linguística Aplicada.Calidoscópio, v. 17, n. 4, p. 711-723, 2019.; PENNYCOOK, 2001PENNYCOOK, A. Critical applied linguistics: A critical introduction. Routledge, 2001.; 2006PENNYCOOK, A. Uma linguística aplicada transgressiva. In: MOITA LOPES, L.P. (Org.). Por uma linguística aplicada indisciplinar . São Paulo: Parábola, pp. 85-105. 2006.) para tecer reflexões sobre linguagem, racialidade e decolonialidade, com base em estudos de Almeida (2019)ALMEIDA, Silvio.Racismo estrutural. Editora Jandaíra, 2019., Anya (2017)ANYA, U. Racialized identities in second language learning: Speaking blackness in Brazil. New York: Routledge, 2016., Carneiro (2005)CARNEIRO, A. S. A construção do outro como não-ser como fundamento do ser. 2005. Tese de Doutorado em Educação. USP, São Paulo, 2005.; Gomes (2005)GOMES, N. L. Alguns termos e conceitos presentes no debate sobre relações raciais no Brasil: uma breve discussão. In: Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Educação anti-racista: caminhos abertos pela Lei Federal, 10639/2003. Brasília: Ministério da Educação, v.2, pp. 39-62, 2005., Fanon (2008)FANON, F.Pele negra, máscaras brancas. Salvador: Edufba, 2008., Nascimento (2019)NASCIMENTO, G. Racismo Linguístico: os subterrâneos da linguagem e do racismo. Belo Horizonte: Editora Letramento, 2019. e Santos (2007)SANTOS, B. D. S. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes.Revista crítica de ciências sociais, (78), pp. 3-46, 2007.. Discuto ainda como o conceito de raça, construído social, histórica, cultural e discursivamente (GOMES, 2005) e a racialização das identidades (ANYA, 2017ANYA, U. Racialized identities in second language learning: Speaking blackness in Brazil. New York: Routledge, 2016.) reproduzem linhas abissais em diferentes segmentos da vida do estudante no espaço universitário e delimitam divisões coloniais de fala e silenciamento, legitimidade e exclusão.

Palavras-chave:
ensino superior; linhas abissais; racialização

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