Acessibilidade / Reportar erro

Cuidando da família na UTI: desafio de enfermeiros na práxis interpessoal do acolhimento

Resumos

Estudo que objetivou compreender o processo interpessoal de acolhimento entre enfermeiros e família em UTI adulto. Possui caráter exploratório, descritivo e observacional, com abordagem qualitativa, realizado com 10 enfermeiras atuantes em UTI adulto, selecionadas por amostragem não probabilística e delimitadas pela saturação dos dados, a partir de três técnicas de coleta de dados: tema-desenho-texto, entrevista semiestruturada e observação não participante. A análise identificou, à luz da Teoria do Relacionamento Interpessoal de Peplau, e sob o foco tridimensional: razão-emoção-volição, que o acolhimento à família apresenta lacunas referentes ao processo comunicacional, ao desenvolvimento da autonomia para alta e ao relacionamento interpessoal entre enfermeiro e família. As concepções atribuídas pelos enfermeiros ao acolhimento foram positivas, demonstrando intencionalidade em realizá-lo, embora encontrem dificuldades formadoras e experienciais referentes à prática desta teoria de enfermagem, ao relacionamento interpessoal e, consequentemente, ao acolhimento à família.

Relações profissional-família; Enfermagem; Terapia intensiva; Acolhimento


The objective of this study was to understand the interpersonal process of embracement between nurses and family members in an adult ICU. It is exploratory, descriptive and observational study, with a qualitative approach, conducted among ten nurses working in an adult ICU, selected using non-probabilistic sampling and established by data saturation, based on three data collection techniques: theme-drawing-text, semistructured interviews and non-participant observation. The analysis, based on Peplau's Theory of Interpersonal Relations and from a tridimensional focus, identified: reason, emotion and volition, that the embracement provided to families manifested certain shortcomings related to the communication process, the development of autonomy for discharge and the interpersonal relationship between nurses and the family. The nurses' concepts in relation to user embracement were positive, demonstrating their willingness to provide it, although they encounter formational and experiential difficulties in putting this nursing theory into practice, insofar as interpersonal relationships and, consequently, in the embracement of families.

Professional-family relations; Nursing; Intensive care; User embracement


Estudio tuvo como objetivo comprender el proceso interpersonal de acogimiento entre enfermeros y la familia en unidades de cuidados intensivos de adultos. Tiene un enfoque exploratorio, descriptivo, observacional cualitativo, realizado con 10 enfermeros que trabajan (muestreo no probabilístico y limitada por la saturación de los datos) de tres técnicas de recolección de datos: tema-dibujo-texto, entrevistas semi-estructuradas y observación no participante. El análisis identificó, a la luz de la Teoría de las Relaciones Interpersonales de Peplau y en el marco del enfoque tridimensional: razón-emoción-volición que el acogimiento a la familia tiene lagunas con respecto al proceso de la comunicación, el desarrollo para la autonomía del descargas y las relaciones interpersonales entre enfermero y familia. Sin embargo, los conceptos asignados por enfermeros al acogimiento fueron positivos, lo que demuestra que ellos tienen la intención de llevar a cabo, aunque encuentren dificultades formadoras y experienciales en lo que respecta a la práctica de esta teoría de enfermería, las relaciones interpersonales y en consecuencia el acogimiento a la familia.

Relaciones profesional-familia; Enfermería; Cuidados intensivos; Acogimiento


INTRODUÇÃO

Essa pesquisa surgiu a partir de inquietações emergidas na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), ao observar o quanto o cuidado exercido pela enfermagem se distanciou da sua essência humanística ante a presença maciça da tecnologia. A enfermagem, desde sua concepção histórico-cultural, emergiu como uma profissão centrada nas relações singulares de cuidado humano. Esta é a razão existencial da enfermagem, constituindo-se em sua principal atividade plenamente autônoma.11. Waldow VR. Cuidar: expressão humanizadora da enfermagem. 3ª ed. Petropólis (RJ): Vozes; 2010. Entretanto, o cuidado humanístico na UTI encontra dificuldades inerentes à sua complexidade, que distancia enfermeiros dos valores humanos.

Neste sentido, algumas estratégias têm sido criadas, incentivado a mudança no atendimento ao usuário, tais como o Programa Nacional de Humanização Hospitalar (PNHAH) e a Resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa de n. 7, de 2010. O Programa propõe a implementação de intervenções que visam a humanização e a melhoria do vínculo entre os trabalhadores da saúde, pacientes e familiares.2 2. Ministério da Saúde (BR). Portaria n. 881 de 19 Jun. 2001: Institui no âmbito do SUS, o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar. Brasília (DF): 2001.A Resolução reafirma a valorização da dimensão subjetiva e social nas práticas de atenção e de gestão na UTI, fortalecendo o compromisso com os direitos do cidadão.33. Ministério da Saúde (BR). ANVISA. Resolução da Diretoria Colegiada de n. 7, de 24 de fev 2010. Dispõe sobre os requisitos mínimos para funcionamento de UTI e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 25 de fev. de 2010. Seção 1: 48-52.

Atualmente, aliar valores humanitários ao cuidado na UTI, com sua alta tecnologia, é um grande desafio. Este desafio, enquanto prática ética, é entendido neste estudo como o ato de acolher, de modo que valorizar o acolhimento torna-se um caminho para os profissionais que desejam o resgate do cuidado humanístico na saúde. Neste contexto, emerge a família e a sua também presente necessidade de cuidado-acolhimento, pautado nas relações interpessoais, uma vez que esta entra juntamente em processo de adoecimento devido ao profundo vínculo com o doente crítico, o que gera abalo emocional e incertezas quanto ao futuro.44. Ismael SMC. A família do paciente em UTI. In: Melo Filho J, Burd M. Doença e família. 2ª ed. São Paulo (SP): Casa do Psicólogo; 2010. p.253-7.

Nesta compreensão de importância das relações entre enfermagem e paciente-família, resgata-se a Teoria das Relações Interpessoais de Peplau, que envolve quatro estágios de relacionamento: orientação, identificação, exploração e resolução. Na fase de orientação a enfermeira se apresenta e orienta o paciente, ao tempo em que passa a compreender seu problema de saúde. Na fase de identificação, o paciente desenvolve a capacidade de lidar com o seu problema de maneira benéfica. Na fase de exploração o paciente se aprofunda na relação interpessoal com a enfermeira para obter benefícios à sua saúde e utilização plena dos serviços que lhe são oferecidos, e, na fase de resolução, que nem sempre coincide com a recuperação completa do paciente, ocorre uma liberação gradual da identificação com a enfermeira com o fortalecimento da autonomia para atuar sobre sua própria saúde.55. Peplau HE. Relaciones interpersonales en enfermería: um marco de referência conceptual para la enfermería psicodinámica. Barcelona (ES): Masson-Salvat; 1990.

A associação desta Teoria, nesta pesquisa, deve-se à sua importância enquanto subsídio científico para a compreensão das relações de cuidado na enfermagem, de modo que, embora originalmente não contemple a família, persiste contribuindo para o cuidado também a esta, que é parte do doente e também sujeito do processo de cuidado.

Para além do exposto, compreende-se a relevância deste estudo pela lacuna encontrada na revisão de literatura realizada, que confirma, na maioria dos estudos observados, ser o acolhimento às famílias ainda um desafio a ser efetivado no cenário da UTI. Portanto, este estudo emerge ao encontro da superação deste desafio, sobretudo pela adaptação proposta da Teoria do Relacionamento Interpessoal ao acolhimento à família.

Deste modo, o estudo norteia-se pelo problema: como se desenvolve o processo interpessoal de acolhimento entre enfermeiros e famílias na UTI? E tem por objetivo geral: compreender o processo interpessoal de acolhimento entre enfermeiros e família na UTI; e específicos: conhecer o significado que os enfermeiros atribuem ao acolhimento e analisar o processo relacional entre enfermeiros e família à luz da Teoria de Peplau.

METODOLOGIA

Estudo exploratório, descritivo, observacional e qualitativo, realizado em duas UTIs adulto de um Hospital Geral do interior da Bahia que, juntas, possuem 15 leitos de referência regional com atendimento diversificado, predominante em traumas. Envolveu 10 enfermeiras, escolhidas por amostragem não probabilística por conveniência, delimitadas pela saturação dos dados, com o critério de inclusão ter, no mínimo, seis meses atuando em UTI.

A coleta ocorreu entre junho e agosto de 2013 e envolveu multitécnicas realizadas cronologicamente na ordem: observação não participante, técnica desenho-tema-texto, e, por fim, a entrevista semiestruturada, ordem definida para minimizar a interferência dos instrumentos na postura/fala do sujeito. A observação não participante seguiu um roteiro impresso em forma de checklist, acrescido de anotações em diário de campo realizadas respectivamente à observação. O roteiro norteador seguiu os questionamentos: o enfermeiro se apresenta para a família? Fornece informações sobre a patologia, o estado geral do paciente e sobre as normas e rotinas da UTI? Coloca-se disponível para oferecer ajuda e esclarecimentos? Encoraja a família a tocar e conversar com o paciente? Orienta a família a procurar os serviços de psicologia, assistência social entre outros, caso seja necessário? A família reconhece o enfermeiro como uma fonte de apoio? A relação interpessoal entre o enfermeiro e família é harmônica e benéfica para ambos? A família mantém dependência com relação ao enfermeiro? O enfermeiro orienta a família sobre os cuidados futuros do paciente após a alta da UTI? E a família se sente motivada e confiante para cuidar do paciente independente do enfermeiro? Este roteiro se propôs a desvelar a existência de um relacionamento interpessoal entre enfermeiras e familiares, contemplando as fases da teoria de Peplau, conforme adaptação proposta para este estudo.

A observação foi a primeira forma de coleta para viabilizar a apreensão de comportamentos menos influenciados pela mobilização da temática causada pelos demais instrumentos. Ela se desenvolveu em períodos em dias e horários aleatórios para desviar a atenção dos sujeitos, os quais não sabiam que estavam sendo observados. Transcorreu dividida em períodos de quatro horas contínuas, totalizando 48h de observação, que contemplou horários dos três turnos de trabalho (manhã, tarde e noite), abrangendo a observação repetitiva de situações mais propícias ao conhecimento do relacionamento entre família e enfermeiro tais como admissão, alta, visita e óbito.

A técnica tema-desenho-texto foi coletada individualmente na sala de reunião da equipe, na UTI, possibilitando privacidade ao sujeito e consistiu em oferecer a cada participante folhas de papel branco A4, lápis de cor, giz de cera e lápis de escrever, solicitando a estas que desenhassem a partir do estímulo individual: "o que é acolher?" Após o término do desenho, o participante era convidado a explicar verbalmente o desenho, atribuindo um título a este (falas gravadas e posteriormente transcritas para integrar os resultados e ancorar o significado das imagens que não foram analisadas psicologicamente). Em seguida, no mesmo ambiente, procedeu-se a entrevista semiestruturada, guiada pelas perguntas: "como você percebe a família dos seus pacientes aqui na UTI?"; "Como se estabelece o relacionamento interpessoal entre você, enfermeiro e esta família?"; "Para você, quais as dificuldades no processo de acolhimento destes familiares? E as facilidades?"; "Você está satisfeito com o seu acolhimento? Por quê?" As falas foram gravadas e transcritas a posteriori.

Os dados obtidos foram organizados e analisados manualmente por meio do modelo interativo de análise. Inicialmente os dados foram reduzidos em eixos ao encontro dos objetivos. Em seguida foram exibidos em um conjunto organizado e comprimido de informações, e, por fim, foram verificados/interpretados a fim de expor os seus significados.66. Miles MB, Huberman AM. Qualitative data analysis: an expanded sourcebook. 2ª ed. California (US): Sage, 1994.

Essa pesquisa respeitou os preceitos éticos expressos na Resolução n. 466/2012, aprovada sob parecer n. 297.139/ 2013 no Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal da Bahia, Instituto Multidisciplinar em Saúde. Os sujeitos firmaram sua anuência ao estudo por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e receberam codinomes de pedras preciosas e semipreciosas, para ser preservado o anonimato.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os dados obtidos foram agrupados em 4 eixos, que representam as fases da Teoria do Relacionamento Interpessoal de Peplau: orientação, identificação, exploração e resolução. Além disso, cada eixo inclui três subclassificações que se afinam com as três técnicas de coleta de dados utilizadas: a emoção, que está ligada aos sentimentos e à subjetividade, e representa os dados dos desenhos, expressão subjetiva das enfermeiras; a razão que envolve os pensamentos racionais e intelectuais, sendo expressa pelas respostas formuladas a partir da entrevista; e a volição, representando a intencionalidade e ação, que se compara aos dados da observação em que se verificou a intencionalidade e prática das enfermeiras em acolher.

A ordem de apresentação das multitécnicas nos resultados difere da ordem da coleta pela compreensão de que, para a enfermeira, sujeito da pesquisa, a coleta começa com a expressão de sua subjetividade (desenho), seguida pela racionalidade (entrevista), elementos comparados analiticamente com a ação já observada que passou despercebida pelo sujeito.

Eixo I - Orientação: os primeiros passos do caminho

A orientação, momento permeado por um profundo sofrimento psicoemocional, representa o primeiro contato da família com o ambiente da UTI e também com a enfermeira. É neste momento que a enfermeira deve orientar a família sobre o estado do paciente e normas e rotinas da unidade, principalmente no que se refere às informações de horários de visita.

Emoção: a subjetividade do primeiro encontro por trás dos traços na orientação

Dos dados obtidos da técnica tema-desenho-texto, destacamos as seguintes descrições relacionadas à orientação e recepção da família na UTI, que desvelam a subjetividade do acolhimento exercido pela enfermeira para com a família, num primeiro encontro na UTI.

Eu representei o acolhimento como a questão do receber bem a família, por isso o coração na porta [...] [Desenho: Amparo] (Diamante).

No meu desenho [...] o acolhimento representa a importância do ouvir, e de estar preparado e sensível para perceber as necessidades dos familiares [Desenho: Comunicação] (Safira).

Figura 1
Graphic representation of collaborative care - the nurse as integrator

Percebemos que, na concepção subjetiva das enfermeiras, o acolhimento à família está ligado a duas ideias centrais: o receber bem e a importância do ouvir, atendendo às necessidades de cuidado da família. Entretanto, o acolhimento é mais do que uma escuta interessada, não devendo ser limitado à recepção das pessoas à porta dos serviços de saúde, mas pressupõe um conjunto contínuo formado por atividades de escuta, identificação de problemas e intervenções resolutivas para seu enfrentamento em todo o fluxo de atendimento,7 7. Solla JJSP. Acolhimento no sistema municipal de saúde. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2005 Out-Dez; 5(4):493-503. de modo que as ideias atribuídas pelas enfermeiras ao acolhimento devem ser acrescidas da noção de continuidade, pois receber bem, ouvir e atender necessidades dos familiares são ações a serem executadas em todos os contatos com os familiares na UTI.

Razão: o lado racional do acolhimento na orientação

Na entrevista semiestruturada, as enfermeiras destacaram a admissão como o principal momento de fornecimento de informações à família na fase de orientação.

[...] na admissão eu converso com a família [...], informo sobre os horários de visita, o que o familiar precisa trazer de objetos pessoais e de higiene para o paciente [...] (Jade).

[...] eu explico na admissão quais são os horários de visita, o que precisa trazer de material de higiene, tento também apaziguar a ansiedade do familiar, e responder na medida do possível às suas demandas [...] (Diamante).

Outro momento identificado de fornecimento de informações à família foi o horário de visita, porém, fica claro nas falas abaixo que as enfermeiras fornecem informações à família quando há oportunidade ou quando são solicitadas, e não como parte da rotina do serviço.

Durante as visitas, quando estou prestando algum cuidado, aproveito para orientar o familiar [...], mas infelizmente não é uma coisa contínua que se faz sempre [...] (Ametista).

[...] quando eu percebo que a família tem vontade de conversar, aí eu estou sempre ali presente [...] esperando aquele sinal, esperando ser solicitada [...] (Cristal).

Identifica-se por estes depoimentos que o fornecimento de informações à família durante a admissão ocorre de maneira razoável, devido à existência de um roteiro admissional sistematizado, não se configurando exatamente em um primeiro momento de relacionamento interpessoal. O fornecimento de informações durante as visitas ocorre raramente, apenas quando há oportunidade ou mediante solicitação da família. Um estudo sociopoético8 8. Silva FS, Santos I. Expectativas de familiares de clientes em UTI sobre o atendimento em saúde: estudo sociopoético. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2010 Abr-Jun;14(2):230-5.sobre a dimensão imaginativa dos familiares na UTI identificou que estes imaginam que a partir do acolhimento e do recebimento de informações poderão definir melhor seus sentimentos, direcionando seus objetivos e motivação para aguardar a esperada recuperação do paciente.

Deste modo, percebemos que o fornecimento contínuo de informações à família é um elemento formador de vínculo e essencial ao acolhimento no contexto da UTI.

Volição: a intencionalidade de receber bem a família na orientação

Durante a observação direcionada à fase de orientação, percebeu-se que a admissão realmente é o principal momento em que a enfermeira fornece informações para os familiares, uma vez que estas fazem parte da rotina. Após este momento a enfermeira só fornece informações quando solicitada, geralmente no momento que estão junto ao leito por conta de algum procedimento ou medicação no horário da visita, salvo estas situações, a enfermeira utiliza o momento das visitas para a realização de outras atividades à parte da família.

Deste modo, observa-se uma lacuna relacionada à interação enfermeira-família no que tange à informação, fazendo-se necessário estreitar o contato entre ambas durante as visitas, uma vez que a literatura aponta que os familiares querem receber informações do enfermeiro e consideram que o contato mais próximo com esse profissional atende as suas principais necessidades de acolhimento, de modo que as suas dúvidas e ansiedades diminuem.99. Simoni RCM, Silva MJP. O impacto da visita de enfermagem sobre as necessidades dos familiares de pacientes de UTI. Rev Esc Enferm USP. 2012; 46(Esp):65-70. Assim, compreendemos que o fornecimento de informações à família é essencial para prosseguir à próxima fase da Teoria do Relacionamento Interpessoal, na qual, de posse da ajuda fornecida pelo enfermeiro, a família já é capaz de lidar positivamente com a situação.

Eixo II - Identificação: o vislumbrar das emoções

A identificação representa o momento em que a família, já está mais esclarecida na nova situação em que se encontra e se identifica com a enfermeira, desenvolvendo deste modo a capacidade de lidar de maneira mais positiva com o problema de saúde de seu ente. Neste momento pode-se perceber uma emancipação e motivação da família em superar a situação, e os sentimentos negativos iniciais de angústia, desespero e desamparo diminuem.

Emoção: desvelando as emoções por trás dos traços na identificação

As descrições dos desenhos relacionados à fase de identificação demonstram como a concepção de acolhimento das enfermeiras gera apoio emocional aos familiares.

[...] eu desenhei [...] que acolhimento é essa ideia de trazer para a pessoa uma palavra de conforto, uma tranquilidade num momento difícil como esse [...] [Desenho: Apoio] (Jade).

No meu desenho eu coloquei [...] que para acolher o enfermeiro deve demonstrar compreensão, empatia, apoio para com essa família [Desenho: Empatia] (Turmalina).

Figura 2
Apoio

Estes relatos apontam que as enfermeiras reconheceram a sublimidade do acolhimento à família na UTI ao atribuíram a este, sentimentos positivos. Outro estudo também identificou que a equipe de enfermagem associa o acolhimento às seguintes características de cuidado: proximidade, empatia, recepção, comunicação, dedicação e disponibilidade, e valorizam o acolhimento como estratégia de cuidado relevante no contexto da UTI.1010. Martins JJ, Nascimento ERP, Geremias CK, Schneider DG, Schweitzer G, Mattioli Neto H. O acolhimento à família na unidade de terapia intensiva: conhecimento de uma equipe multiprofissional. Rev Eletr Enferm [online]. 2008 [acesso 2013 Jan 9]; 10(4). Disponível em:http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v10/n4/v10n4a22.htm
http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v10/n4...

Revela-se aqui o dilema da prática da enfermagem em que os profissionais sabem atribuir subjetividade ao cuidado e reconhecem a importância da humanização, mas, por uma série de fatores pessoais, profissionais e institucionais não o fazem, muitas vezes porque estão submetidos a um regime de trabalho mecanicista, sem valorização e incentivo, envoltos em um sistema opressor e estressante, no qual inexiste um apoio psicológico, o que aumenta o desafio à prestação do acolhimento, uma vez que para cuidar do outro é necessário cuidar de si, pois o cuidado perpassa por uma transmissão de sentimentos.1111. Silva GF, Sanches PG, Carvalho MDB. Refletindo sobre o cuidado de enfermagem em unidade de terapia intensiva. REME Rev Min Enferm. 2007 Jan-Mar; 11(1):94-8.

Neste sentido, destacamos a necessidade de abertura da subjetividade dos familiares, mas também dos enfermeiros, os quais até têm a intencionalidade de acolher, entretanto encontram-se envoltos em sofrimentos psicológicos consequentes do desgaste físico, psicológico e social inerentes ao trabalho na UTI, além da falta de valorização por parte da equipe de saúde, da carência de recursos materiais e humanos e da falta de incentivo salarial.1212. Shimizu HE, Couto DT, Merchan-Hamann E. Prazer e sofrimento em trabalhadores de enfermagem de UTI. Rev Latino-Am Enferm [online]. 2011 [acesso 2013 Jan 8]; 19(3). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v19n3/pt_16.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rlae/v19n3/pt_1...

Razão: as emoções por trás da racionalidade na identificação

Na entrevista semiestruturada as enfermeiras afirmaram reconhecer o momento difícil que a família enfrenta e fornecer suporte emocional.

[...] eu sempre tento transmitir para o familiar essa ideia de que a situação é complicada, mas fique calmo, tenha fé que vai dar tudo certo, seja forte e esteja preparado [...] (Jade).

[...] quando eu percebo que tem um familiar que está mais triste, sem esperança, eu tento trazer aquela palavra de conforto [...] (Rubi).

Estes resultados se contrapõem a outros estudos que revelaram a falta de percepção dos enfermeiros do sofrimento psíquico familiar como objeto de sua ação assistencial.1313. Bettinelli LA, Erdmann AL. Internação em unidade de terapia intensiva e a família: perspectiva de cuidado. Avances Enfermería [online]. 2009 [acesso 2013 Jan 9]; 27(1). Disponível em: http://www.enfermeria.unal.edu.co/revista/articulos/xxvii1_2.pdf
http://www.enfermeria.unal.edu.co/revist...
- 1414. Predebon GR, Beuter M, Flores RG, Girardon-Perlini NMO, Brondani CM, Santos NO. A visita de familiares em unidades intensivas na ótica da equipe de enfermagem. Cienc Cuid Saude. 2011; 10(4):705-12.

Entretanto, entendemos que todo ser humano tem a característica de incluir cuidado em tudo que faz, cuidado aqui entendido como uma responsabilidade com o estar no mundo e colaborar para o bem-estar de todos; contribuindo na manutenção da vida.11. Waldow VR. Cuidar: expressão humanizadora da enfermagem. 3ª ed. Petropólis (RJ): Vozes; 2010. De modo que, mesmo contra todas as situações adversas supracitadas, persiste, inerente à natureza do enfermeiro, o cuidado e a motivação de intervir ao perceber uma necessidade.

Volição: a intencionalidade em acolher as emoções na identificação

Na observação voltada para o fornecimento de apoio emocional por parte dos enfermeiros, percebeu-se que, embora estes aparentemente mantenham uma postura distante devido à realização de outras atividades nos momentos da visita, ao identificarem uma necessidade emocional dos familiares se solidarizam e, na medida do possível, procuram ajudar, o que, infelizmente, não ocorre rotineiramente, uma vez que se observou que não existe o estabelecimento de uma relação interpessoal entre enfermeira e família e, deste modo, percebe-se que muitos familiares não se sentem à vontade para expor seus sentimentos.

Compreendemos que o não estabelecimento do relacionamento interpessoal entre enfermeira e família ocorre devido à junção de fatores, tanto inerentes à enfermeira, como a falta de tempo para assistir a família; o receio do envolvimento emocional; o comportamento impessoal com o familiar; e a percepção da família como intrusa; quanto inerentes à família, como tensão, insegurança e medo frente à situação; e falta de confiança na equipe de saúde.1515. Ruedell LM, Beck CLC, Silva RM, Lisboa RL, Prochnow A, Prestes FC. Relações interpessoais entre profissionais de enfermagem e familiares em UTI: estudo bibliográfico. Cogitare Enferm. 2010 Jan-Mar; 15(1):147-52.

Entretanto, destacamos a necessidade de um esforço conjunto, envolvendo a instituição, a equipe de enfermagem e a família, para a superação destes entraves ao estabelecimento do relacionamento interpessoal, uma vez que os sentimentos negativos experimentados pela família neste momento de internação de um ente na UTI são minimizados pelo acolhimento do enfermeiro, preparando-os para o momento da visita, escutando-os, esclarecendo suas dúvidas e atendendo-os em suas necessidades.1616. Frizon G, Nascimento ERP, Bertoncello KCG, Martins JJ. Familiares na sala de espera de uma UTI: sentimentos revelados. Rev Gaúcha Enferm [online]. 2011 [acesso 2013 Jan 7]; 32(1). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v32n1/a09v32n1.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v32n1/a09...

Eixo III - Exploração: o entrelaçar dos esforços

A exploração representa o momento em que a família se aprofunda na relação interpessoal com a enfermeira e passa a se beneficiar desta, utilizando plenamente os serviços que lhe são oferecidos para cooperar no enfrentamento da situação de seu ente na UTI.

Emoção: a subjetividade da cooperação por trás dos traços na exploração

O desenho que se identifica com a fase de exploração destaca o acolhimento como a cooperação entre enfermeira e família para o alcance da recuperação do paciente.

Figura 3
União

Eu desenhei tipo uma corrente porque, para mim, acolhimento significa envolvimento, entrelaçamento. No momento que você acolhe a família você a convida pode unir forças com você em prol do paciente [Desenho: União] (Pérola).

O acolhimento foi associado à valorização das relações, à cooperação e união de esforços da enfermeira e da família para recuperação do paciente. Essa concepção é positiva, pois, em síntese, as intenções para o acolhimento são: o reconhecimento do outro como um autêntico outro; o reconhecimento de cada um como insuficiente que só se completa na presença do outro; as situações são construídas pela junção dos saberes dos indivíduos presentes.1717. Teixeira RR. O acolhimento num serviço de saúde entendido como uma rede de conversação. In: Pinheiro R, Mattos RA (organizadores). Construção da integralidade: cotidiano, saberes e práticas de saúde. 4ª ed. Rio de Janeiro (RJ): UERJ, IMS: Abrasco, 2007. p. 91-113. Destacamos assim que as relações interpessoais, dotadas acima de tudo de respeito, são indispensáveis ao estabelecimento do acolhimento à família no contexto da UTI.

Razão: a racionalidade na união de forças na exploração

As falas da entrevista semiestruturada, que se afinam com a fase de exploração, destacam a importância que as enfermeiras atribuem à família na recuperação do paciente.

A família é fundamental na recuperação do paciente, ela é capaz de devolver a ele faculdades que nós não conseguimos [...] (Ametista).

A família é muito importante [...]. A falta do contato com a família influencia negativamente no estado emocional e consequentemente no estado físico dos pacientes [...] (Pérola).

As enfermeiras destacam aqui a importância dos familiares, atribuindo a estes êxitos no processo de recuperação do paciente, o que compatibiliza com um estudo10 10. Martins JJ, Nascimento ERP, Geremias CK, Schneider DG, Schweitzer G, Mattioli Neto H. O acolhimento à família na unidade de terapia intensiva: conhecimento de uma equipe multiprofissional. Rev Eletr Enferm [online]. 2008 [acesso 2013 Jan 9]; 10(4). Disponível em:http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v10/n4/v10n4a22.htm
http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v10/n4...
que afirma a presença do familiar como um complemento essencial ao tratamento e identificou que os enfermeiros valorizam a importância dos familiares na recuperação dos pacientes.

Entretanto, a cooperação com a família, como explícito nas falas abaixo, ainda é um desafio à prática das enfermeiras na UTI em estudo.

Um problema é o desespero e ansiedade do familiar; [...] esses sentimentos negativos acabam tornando a relação desagradável e desgastante [...] (Jade).

O fato da enfermeira aqui na UTI não poder dar certas informações do paciente, atrapalha a proximidade, porque sempre que há um contato, os familiares vêm e me perguntam, e eu não posso responder [...] isso trava a interação [...] (Cristal).

Para acolher melhor [...] eu precisaria de mais tempo [...], as tarefas, a rotina, seguram muito a gente, [...] Um diálogo com a família é raro [...] (Esmeralda).

Essas dificuldades não são encontradas apenas na UTI em estudo, e já foram relatadas em outros estudos,1010. Martins JJ, Nascimento ERP, Geremias CK, Schneider DG, Schweitzer G, Mattioli Neto H. O acolhimento à família na unidade de terapia intensiva: conhecimento de uma equipe multiprofissional. Rev Eletr Enferm [online]. 2008 [acesso 2013 Jan 9]; 10(4). Disponível em:http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v10/n4/v10n4a22.htm
http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v10/n4...

11. Silva GF, Sanches PG, Carvalho MDB. Refletindo sobre o cuidado de enfermagem em unidade de terapia intensiva. REME Rev Min Enferm. 2007 Jan-Mar; 11(1):94-8.

12. Shimizu HE, Couto DT, Merchan-Hamann E. Prazer e sofrimento em trabalhadores de enfermagem de UTI. Rev Latino-Am Enferm [online]. 2011 [acesso 2013 Jan 8]; 19(3). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v19n3/pt_16.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rlae/v19n3/pt_1...

13. Bettinelli LA, Erdmann AL. Internação em unidade de terapia intensiva e a família: perspectiva de cuidado. Avances Enfermería [online]. 2009 [acesso 2013 Jan 9]; 27(1). Disponível em: http://www.enfermeria.unal.edu.co/revista/articulos/xxvii1_2.pdf
http://www.enfermeria.unal.edu.co/revist...

14. Predebon GR, Beuter M, Flores RG, Girardon-Perlini NMO, Brondani CM, Santos NO. A visita de familiares em unidades intensivas na ótica da equipe de enfermagem. Cienc Cuid Saude. 2011; 10(4):705-12.

15. Ruedell LM, Beck CLC, Silva RM, Lisboa RL, Prochnow A, Prestes FC. Relações interpessoais entre profissionais de enfermagem e familiares em UTI: estudo bibliográfico. Cogitare Enferm. 2010 Jan-Mar; 15(1):147-52.
- 1616. Frizon G, Nascimento ERP, Bertoncello KCG, Martins JJ. Familiares na sala de espera de uma UTI: sentimentos revelados. Rev Gaúcha Enferm [online]. 2011 [acesso 2013 Jan 7]; 32(1). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v32n1/a09v32n1.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v32n1/a09...
porém, entendemos que não podem ser enxergadas como barreiras instransponíveis para que a enfermeira alcance o acolhimento ao familiar, uma vez que para o cuidado humanizado ser reconstruído é necessário o esforço de superar alguns desafios, que podem ser agrupados em três motivações principais: voltar-se à presença do outro em sua totalidade biopsicossocial, através da utilização de tecnologias leves como acolhimento e vínculo; otimizar a interação, através do estabelecimento de uma escuta sensível com capacidade de produzir algum tipo de resposta; e enriquecer horizontes, através do exercício da interdisciplinaridade e intersetorialidade.1818. Ayres JRCM. Cuidado e reconstrução das práticas de saúde. Interface - Comunic Saúde Educ [online]. 2004 [acesso 2013 Jan 8]; 8(14). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v8n14/v8n14a04.pdf. 19 de jan. de 2013.
http://www.scielo.br/pdf/icse/v8n14/v8n1...

Volição: a intencionalidade em contribuir com o acolhimento na exploração

Durante a observação percebeu-se que não há um aprofundamento da relação interpessoal entre a enfermeira e a família. Essa relação quando ocorre é superficial, pois existe pouco envolvimento das enfermeiras com os familiares. Um dos motivos para isso é a apropriação das enfermeiras do horário de visita como um período de fuga, para descansar, para tomar um café e para aliviar as suas próprias tensões. Este tempo da visita é crucial para o relacionamento enfermeira-família, uma vez que, ao dedicar um tempo para ajudar a família a compreender os aspectos da sua situação em que se encontra, a enfermeira torna a experiência hospitalar em uma aprendizagem útil e transformadora.55. Peplau HE. Relaciones interpersonales en enfermería: um marco de referência conceptual para la enfermería psicodinámica. Barcelona (ES): Masson-Salvat; 1990.

Eixo IV - Resolução: a autonomia dos laços

A resolução consiste no fenômeno de ruptura psicológica, uma vez que nem sempre coincidirá com a recuperação completa do paciente, e demandará da família uma liberação gradual da identificação, do vínculo e dependência da enfermeira, e também a construção da capacidade de atuar de forma benéfica para a recuperação completa da saúde de seu ente.

Emoção: a subjetividade por trás dos traços na resolução

O desenho relacionado à fase de resolução demonstra que o acolhimento também perpassa pela resolução das demandas dos familiares.

[...] eu desenhei um caminho sem dificuldades que seria a passagem do familiar a resolução dos seus problemas e a recuperação do seu ente querido Desenho: Assistência (Ametista).

Essa figura maior aqui representa a equipe da UTI, pronta para receber a pessoa a ser acolhida, e resolver todas as suas necessidades [...] [Desenho: Resolutividade] (Cristal).

Figura 4
Assistência

O acolhimento só se concretiza enquanto processo no cotidiano das práticas de saúde por meio da vinculação entre a demanda apresentada e a resposta do serviço de saúde, e se traduz em responsabilização pelas necessidades que não são atendidas de imediato, encaminhando de maneira ética e resolutiva, por meio de um processo interdisciplinar e intersetorial, que se faz numa rede de relações de interação e diálogo permanentes.77. Solla JJSP. Acolhimento no sistema municipal de saúde. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2005 Out-Dez; 5(4):493-503. , 1717. Teixeira RR. O acolhimento num serviço de saúde entendido como uma rede de conversação. In: Pinheiro R, Mattos RA (organizadores). Construção da integralidade: cotidiano, saberes e práticas de saúde. 4ª ed. Rio de Janeiro (RJ): UERJ, IMS: Abrasco, 2007. p. 91-113. Deste modo, percebemos que a enfermeira da UTI nem sempre será capaz de dar resolutividade a todas as demandas dos familiares, pois muitas vezes haverá a necessidade de acionar a equipe multidisciplinar, mas a enfermeira deve se responsabilizar por indicar à família quais os meios que pode utilizar e se certificar que a mesma está tendo acesso a estes meios.

Razão: a racionalidade da despedida na resolução

A entrevista semiestruturada revelou que as enfermeiras identificam a necessidade de preparar a família para a alta da UTI, e que essa programação para a alta raramente ocorre. [...] saem de alta da UTI muitos pacientes traqueostomizados, cujos familiares precisam ser preparados para identificar um sinal de alerta. Eu tento estar conversando e explicando, mas nem sempre consigo [...] esse momento de estar orientando como a família vai atuar para ajudar na recuperação do paciente fora da UTI não tem [...] (Ametista).

Como percebemos, não existe um preparo para alta dos pacientes da UTI em estudo. Entendemos ainda que este preparo deve ser iniciado logo após a admissão na unidade, pois no momento da alta, os familiares dificilmente irão apreender todos os aspectos necessários para o cuidado futuro do paciente, por isso há a necessidade de as orientações aos familiares serem diárias e contínuas, para que se tornem seguros e aptos para exercer o cuidado de forma independente.1919. Silva RB, Oliveira BRG, Collet N, Viera CS. O papel da equipe de enfermagem nas orientações à família sobre os cuidados no domicílio ao RN egresso de UTI neonatal: pesquisa bibliográfica. Online Brazilian J Nursing [online]. 2006 [acesso 2013 Jan 9]; 5(3). Disponível em: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/738/168
http://www.objnursing.uff.br/index.php/n...
Destacamos também que a postura da enfermeira em associar intuição, experiência, interesse, respeito e sensibilidade aos aspectos técnicos e científicos do cuidado no relacionamento com a família levarão estes a se sentirem seguros e confiantes no futuro.11. Waldow VR. Cuidar: expressão humanizadora da enfermagem. 3ª ed. Petropólis (RJ): Vozes; 2010.

Volição: a intencionalidade em resolver bem o acolhimento

Durante a observação percebeu-se a necessidade de programação para a alta, principalmente por parte dos familiares de pacientes que saem da UTI com mecanismos como ostomias e sondas. Entretanto, percebeu-se que essa orientação para a alta geralmente não ocorre, e a família fica insegura com relação ao cuidado futuro do paciente fora da UTI.

Destaca-se que o êxito do cuidado futuro do paciente depende da participação e da instrumentalização da família durante a internação, proporcionando-lhe informações e segurança necessária para sentir-se confiante e independente da equipe da UTI na continuidade dos cuidados do paciente.1919. Silva RB, Oliveira BRG, Collet N, Viera CS. O papel da equipe de enfermagem nas orientações à família sobre os cuidados no domicílio ao RN egresso de UTI neonatal: pesquisa bibliográfica. Online Brazilian J Nursing [online]. 2006 [acesso 2013 Jan 9]; 5(3). Disponível em: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/738/168
http://www.objnursing.uff.br/index.php/n...
Uma vez que o ideal moral da enfermagem consiste em comportamentos e atitudes que beneficiem as potencialidades da família para manter ou melhorar a sua condição, ajudando-a a crescer, se transformar e encontrar significados nos momentos mais adversos, chegando a um estado de restauração da harmonia interior.11. Waldow VR. Cuidar: expressão humanizadora da enfermagem. 3ª ed. Petropólis (RJ): Vozes; 2010.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao buscar compreender o processo interpessoal de acolhimento entre enfermeiros e família na UTI podemos inferir que estes objetivos foram alcançados, embora nenhuma das participantes tenha contemplado todas as fases da Teoria do Relacionamento Interpessoal de Peplau, em nenhuma das três técnicas de coleta de dados utilizadas.

Este fato demonstra que existe uma lacuna na formação do enfermeiro no que diz respeito ao relacionamento interpessoal e, consequentemente, ao acolhimento, além disso, fica evidente a subvalorizarão das teorias de enfermagem, que anteriormente já representaram grandes avanços científicos para a profissão, mas, infelizmente, estão gradativamente sendo lançadas ao esquecimento, o que é preocupante, pois o emprego da teoria permitiu analisar o processo relacional e o encontro de lacunas importantes no relacionamento interpessoal entre enfermeiras e familiares no contexto da UTI, deixando claro sua relevância neste contexto.

A análise e sistematização do relacionamento interpessoal entre enfermeira e família, com na base na Teoria do Relacionamento Interpessoal de Peplau, propiciou identificar que o acolhimento à família na UTI em estudo apresenta importantes lacunas, como falta de fornecimento de informações à família durante as visitas, o não estabelecimento do relacionamento interpessoal entre a enfermeira e a família e a falta de uma programação para a alta; entretanto, com esforço e sistematização do relacionamento interpessoal através do emprego dos pressupostos da teoria e do acolhimento, essas lacunas podem ser preenchidas.

As concepções atribuídas pelas enfermeiras ao acolhimento foram positivas, demonstrando que estas têm intencionalidade e potencialidade em realizá-lo. O estabelecimento do acolhimento no rol de atividades da enfermeira já é realidade em outras UTIs, com resultados satisfatórios, demonstrando que é possível, neste ambiente, a coexistência de cuidado altamente tecnológico com diálogo atencioso e informativo.

Deste modo, sugerimos a implantação do acolhimento aos familiares na UTI, a partir dos pressupostos da Teoria do Relacionamento Interpessoal, para que este deixe de ser escasso, parcelado e insuficiente, e passe a ser cíclico e contínuo, no sentido de fornecer à família os subsídios necessários para que se sinta realmente cuidada. Sugerimos também ações de educação permanente e de suporte psicológico, no sentido de preparar as enfermeiras para o desenvolvimento deste acolhimento, pois, ao se intensificarem as relações interpessoais, intensificam-se também os impactos das emoções sobre os envolvidos, demonstrando assim a necessidade de apoio para lidar com essa sobrecarga emocional.

Por fim, destacamos o compromisso da enfermeira da UTI com o familiar, que é sujeito ativo no processo de cuidado e uma extensão do doente crítico, de modo que é necessário repensar as práticas já existentes e abrir caminhos a vertentes sensíveis e inovadoras capazes de subsidiar a transformação que este contexto necessita.

REFERENCES

  • 1
    Waldow VR. Cuidar: expressão humanizadora da enfermagem. 3ª ed. Petropólis (RJ): Vozes; 2010.
  • 2
    Ministério da Saúde (BR). Portaria n. 881 de 19 Jun. 2001: Institui no âmbito do SUS, o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar. Brasília (DF): 2001.
  • 3
    Ministério da Saúde (BR). ANVISA. Resolução da Diretoria Colegiada de n. 7, de 24 de fev 2010. Dispõe sobre os requisitos mínimos para funcionamento de UTI e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 25 de fev. de 2010. Seção 1: 48-52.
  • 4
    Ismael SMC. A família do paciente em UTI. In: Melo Filho J, Burd M. Doença e família. 2ª ed. São Paulo (SP): Casa do Psicólogo; 2010. p.253-7.
  • 5
    Peplau HE. Relaciones interpersonales en enfermería: um marco de referência conceptual para la enfermería psicodinámica. Barcelona (ES): Masson-Salvat; 1990.
  • 6
    Miles MB, Huberman AM. Qualitative data analysis: an expanded sourcebook. 2ª ed. California (US): Sage, 1994.
  • 7
    Solla JJSP. Acolhimento no sistema municipal de saúde. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2005 Out-Dez; 5(4):493-503.
  • 8
    Silva FS, Santos I. Expectativas de familiares de clientes em UTI sobre o atendimento em saúde: estudo sociopoético. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2010 Abr-Jun;14(2):230-5.
  • 9
    Simoni RCM, Silva MJP. O impacto da visita de enfermagem sobre as necessidades dos familiares de pacientes de UTI. Rev Esc Enferm USP. 2012; 46(Esp):65-70.
  • 10
    Martins JJ, Nascimento ERP, Geremias CK, Schneider DG, Schweitzer G, Mattioli Neto H. O acolhimento à família na unidade de terapia intensiva: conhecimento de uma equipe multiprofissional. Rev Eletr Enferm [online]. 2008 [acesso 2013 Jan 9]; 10(4). Disponível em:http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v10/n4/v10n4a22.htm
    » http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v10/n4/v10n4a22.htm
  • 11
    Silva GF, Sanches PG, Carvalho MDB. Refletindo sobre o cuidado de enfermagem em unidade de terapia intensiva. REME Rev Min Enferm. 2007 Jan-Mar; 11(1):94-8.
  • 12
    Shimizu HE, Couto DT, Merchan-Hamann E. Prazer e sofrimento em trabalhadores de enfermagem de UTI. Rev Latino-Am Enferm [online]. 2011 [acesso 2013 Jan 8]; 19(3). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v19n3/pt_16.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/rlae/v19n3/pt_16.pdf
  • 13
    Bettinelli LA, Erdmann AL. Internação em unidade de terapia intensiva e a família: perspectiva de cuidado. Avances Enfermería [online]. 2009 [acesso 2013 Jan 9]; 27(1). Disponível em: http://www.enfermeria.unal.edu.co/revista/articulos/xxvii1_2.pdf
    » http://www.enfermeria.unal.edu.co/revista/articulos/xxvii1_2.pdf
  • 14
    Predebon GR, Beuter M, Flores RG, Girardon-Perlini NMO, Brondani CM, Santos NO. A visita de familiares em unidades intensivas na ótica da equipe de enfermagem. Cienc Cuid Saude. 2011; 10(4):705-12.
  • 15
    Ruedell LM, Beck CLC, Silva RM, Lisboa RL, Prochnow A, Prestes FC. Relações interpessoais entre profissionais de enfermagem e familiares em UTI: estudo bibliográfico. Cogitare Enferm. 2010 Jan-Mar; 15(1):147-52.
  • 16
    Frizon G, Nascimento ERP, Bertoncello KCG, Martins JJ. Familiares na sala de espera de uma UTI: sentimentos revelados. Rev Gaúcha Enferm [online]. 2011 [acesso 2013 Jan 7]; 32(1). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v32n1/a09v32n1.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v32n1/a09v32n1.pdf
  • 17
    Teixeira RR. O acolhimento num serviço de saúde entendido como uma rede de conversação. In: Pinheiro R, Mattos RA (organizadores). Construção da integralidade: cotidiano, saberes e práticas de saúde. 4ª ed. Rio de Janeiro (RJ): UERJ, IMS: Abrasco, 2007. p. 91-113.
  • 18
    Ayres JRCM. Cuidado e reconstrução das práticas de saúde. Interface - Comunic Saúde Educ [online]. 2004 [acesso 2013 Jan 8]; 8(14). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v8n14/v8n14a04.pdf. 19 de jan. de 2013.
    » http://www.scielo.br/pdf/icse/v8n14/v8n14a04.pdf
  • 19
    Silva RB, Oliveira BRG, Collet N, Viera CS. O papel da equipe de enfermagem nas orientações à família sobre os cuidados no domicílio ao RN egresso de UTI neonatal: pesquisa bibliográfica. Online Brazilian J Nursing [online]. 2006 [acesso 2013 Jan 9]; 5(3). Disponível em: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/738/168
    » http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/738/168

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2014

Histórico

  • Recebido
    31 Ago 2013
  • Aceito
    17 Dez 2013
Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós Graduação em Enfermagem Campus Universitário Trindade, 88040-970 Florianópolis - Santa Catarina - Brasil, Tel.: (55 48) 3721-4915 / (55 48) 3721-9043 - Florianópolis - SC - Brazil
E-mail: textoecontexto@contato.ufsc.br