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Círculos concêntricos

Concentric circles

EDITORIAL

Círculos concêntricos

Concentric circles

Ruth Guinsburg

Editora da Revista Paulista de Pediatria, São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Ruth Guinsburg Rua Vicente Félix, 77/09 – Cerqueira César CEP 01410-020 – São Paulo/SP E-mail: ruthgbr@netpoint.com.br

Há uma relação inversa entre o conhecimento médico e o tempo de graduação(1). A educação continuada é uma das abordagens existentes para minimizar o problema, tentando atualizar o médico por meio de cursos presenciais e, mais recentemente, virtuais, sobre o estado da arte a respeito de determinado tema, com suas implicações biológicas, diagnósticas e terapêuticas. Embora tais cursos sejam requisitos para a recertificação de títulos das mais diversas especialidades médicas, há algumas críticas a se considerar. Por um lado, esses cursos de atualização passam pela interpretação do professor a respeito dos fatos a serem discutidos, o que, em geral, é interessante, dada a experiência e a crítica do conferencista, mas pode também gerar um viés do aprendizado. Por outro lado, sabe-se que esta abordagem para a atualização médica tem um efeito limitado na atuação prática dos profissionais(2). É nesse contexto que a leitura de publicações científicas, com a construção crítica do conhecimento (ou sua atualização) por parte do leitor diferenciado, assume importância ímpar na continuação ou mudança das práticas diagnósticas e terapêuticas em qualquer área do saber médico.

Com base nesta última premissa, a Revista Paulista de Pediatria vem tentando cumprir a missão a que se propôs, ou seja: "divulgar pesquisa de qualidade metodológica reconhecida, relacionada a temas que englobem a saúde da criança e do adolescente". Assim, a revista visa unir dois eixos de atuação da Pediatria: a produção do conhecimento e a aplicação das melhores práticas no contexto clínico. Para tal, é fundamental que os diferentes elos entre ambos os eixos se encadeiem de maneira coerente, com produção do conhecimento de qualidade; sua formatação em artigos que contemplem a validade interna (metodologia) e externa (como o conhecimento se situa frente ao existente); revisão desta validade interna e externa por especialistas; divulgação do conhecimento para o público-alvo; leitura, interpretação e, finalmente, incorporação crítica do conhecimento adquirido por esse leitor.

As extremidades dessa corrente vêm se desenvolvendo no Brasil. As universidades – em especial, os programas de pós-graduação em Pediatria – têm produzido conhecimento de qualidade na área da saúde da criança e do adolescente(3). Na outra ponta, o público-alvo é constituído tanto por pediatras ávidos por manter a sua prática baseada nas melhores evidências disponíveis, como por profissionais de saúde que atuam na produção do conhecimento e buscam validar, de maneira interna e externa, as pesquisas nas quais estão envolvidos. A Revista Paulista de Pediatria visa ser um elo de excelência desta cadeia que liga a pesquisa ao leitor. Nesse sentido, os esforços se dirigem a múltiplas frentes de trabalho como construir artigos científicos com validade interna e externa; contar com um corpo de revisores com expertise e conhecimento nas diversas áreas relacionadas à saúde da criança e do adolescente; elaborar uma revista coerente, com temas atraentes às diversas categorias de pediatras, sejam eles práticos ou acadêmicos, sejam os interessados por Pediatria Geral ou por algum ramo específico; tornar a revista acessível a todos aqueles que dela possam usufruir; e, simultaneamente, fazer da própria Revista Paulista de Pediatria um instrumento reconhecido pela comunidade científica.

A construção dos artigos é exaustivamente feita em parceria com os autores. Busca-se a explicação metodológica clara para valorizar o artigo. Procuram-se a comparação e a discussão consistente dos dados encontrados, usando, como base, referências atualizadas e facilmente recuperáveis por qualquer leitor. Às vezes, tal processo pode demorar meses, mas o enriquecimento do produto final é visível por todos os que podem confrontar o texto original ao publicado. Isso demanda um corpo de revisores altamente qualificados e um grupo de editores empenhados e que doem seu tempo para produzir um artigo que não será de sua autoria. O corpo de revisores da Revista Paulista de Pediatria conta atualmente com 95 membros de dez Estados brasileiros e o conselho editorial tem 40 membros, com liderança no cenário pediátrico nacional.

A construção da revista, por sua vez, tenta atender à diversificação e ao interesse nas várias áreas da saúde da criança, com maior número de artigos publicados em cuidados primários, saúde escolar e aleitamento materno, nutrição e gastroenterologia, neonatologia, nefrologia, endocrinologia, alergia e pneumologia, reumatologia, adolescência e infectologia, entre outros. Ainda, na busca da diversificação, da abertura da Revista Paulista de Pediatria aos diversos grupos que produzem conhecimento na área e do diálogo entre esses diversos grupos, tem havido um aumento da participação de autores de fora do Estado de São Paulo, que, em 2007, foram responsáveis por cerca de 15% dos artigos publicados. Espera-se que tal diálogo seja intensificado e que a diversidade passe a ser uma característica mais marcante da revista.

Além disso, a divulgação e o reconhecimento da Revista Paulista de Pediatria tiveram um salto fundamental com a sua aceitação na Scientific Electronic Library Online (SciELO), que é uma biblioteca eletrônica que abrange uma coleção selecionada de periódicos científicos e tem por objetivo desenvolver uma metodologia comum para preparar, armazenar, disseminar e avaliar a produção científica em formato eletrônico(4). A indexação à SciELO, por um lado, dá credibilidade à revista para atrair publicação científica de qualidade e, por outro, facilita o acesso a artigos nela publicados por milhares de profissionais de saúde, que buscam referências para seu trabalho docente, de pesquisa ou assistencial. Apenas para se ter uma idéia, em abril de 2008, com apenas três fascículos do volume 25 referente ao ano de 2007 incorporados à biblioteca SciELO, o número de acessos ao índice, resumos e artigos foi de 7.486 para o fascículo 3; 7.121 para o fascículo 2 e 6.824 para o fascículo 4(5). Ou seja, milhares de profissionais folhearam virtualmente cada fascículo da revista. Impressionante também é o numero de downloads de artigos completos, citando aqui os três mais visitados até abril de 2008(6): "Conhecimento dos pediatras e nutricionistas sobre o tratamento da alergia ao leite de vaca no lactente(7)" com 1.487 downloads; "Avaliação do estado nutricional e do desenvolvimento neuropsicomotor de crianças freqüentadoras de creche(8)" com 1.189 downloads e "Crescimento e desenvolvimento de filhos de mães adolescentes no primeiro ano de vida(9)" com 1.031 downloads.

Diante da concretização das diversas etapas para a valorização da Revista Paulista de Pediatria, a perspectiva de futuro a seu respeito assemelha-se aos círculos concêntricos que se formam ao jogarmos um objeto na água. O círculo interno precisa ter bordas firmes e estar coeso, significando a qualidade do produto a ser divulgado (artigos tematicamente interessantes e qualificados do ponto de vista metodológico); o círculo seguinte é o da revista propriamente dita (uma publicação consistente, múltipla em seus interesses, diversa em sua abrangência e dinâmica na sua abordagem). Finalmente, os círculos que se seguem e se ampliam cada vez mais se referem justamente ao público-alvo (profissionais de saúde que, além de se atualizarem, precisam construir de forma crítica o seu conhecimento e implementá-lo em sua prática clínica, docente ou de pesquisa).

Como refere James Black, farmacologista ganhador do prêmio Nobel de Medicina em 1998 pela descoberta do propanolol e síntese da cimetidina(10): "na cultura em que cresci você faz o seu trabalho e não o esconde para que os outros não o vejam; você aproveita a primeira oportunidade para tornar o conhecimento disponível". A Revista Paulista de Pediatria quer, com a contribuição de toda a comunidade pediátrica, solidificar-se como um meio de disponibilização deste conhecimento.

Recebido em: 22/4/2008

  • 1. Schulz KF, Grimes DA, editors. The Lancet handbook of essential concepts in clinical research. 1st ed. Edinburg: Elsevier; 2006.
  • 2. Davis DA, Thomson MA, Oxman AD, Haynes RB. Changing physician performance. A systematic review of the effect of continuing medical education strategies. JAMA 1995;274:700-5.
  • 3. Barros Filho AA. 35 anos. Rev Paul Pediatr 2006;24 (Suppl):8-9.
  • 4. SciELO Brasil [homepage on the Internet]. SciELO [cited 2008 Apr 21]. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_home&lng=pt&nrm=iso
  • 5. SciELO Brasil [homepage on the Internet]. Most visited issues Revista Paulista de Pediatria [cited 2008 Apr 21]. Available from: http://www.scielo.br/scielolog.php?script=sci_statiss&lng=en&pid=0103-0582
  • 6. SciELO Brasil [homepage on the Internet]. Most visited articles Revista Paulista de Pediatria [cited 2008 Apr 21]. Available from: http://www.scielo.br/scielolog.php?script=sci_statart & lng=en&pid=0103-0582&dti=20040101
  • 7. Cortez APB, Medeiros LCS, Speridião PGL, Mattar RHGM, Fagundes Neto U, Morais MB. Conhecimento de pediatras e nutricionistas sobre o tratamento da alergia ao leite de vaca no lactente. Rev Paul Pediatr 2007;25:106-13.
  • 8. Biscegli TS, Polis LB, Santos LM, Vicentin M. Avaliação do estado nutricional e do desenvolvimento neuropsicomotor de crianças freqüentadoras de creche. Rev Paul Pediatr 2007;25:337-42.
  • 9. Vieira MLF, Bicalho GG, Silva JLCP, Barros Filho AA. Crescimento e desenvolvimento de filhos de mães adolescentes no primeiro ano de vida. Rev Paul Pediatr 2007;25: 343-8.
  • 10. Knowles E, editor. The Oxford dictionary of quotation. 5th ed. Oxford: Oxford University Press; 1999. p. 116.
  • Endereço para correspondência:

    Ruth Guinsburg
    Rua Vicente Félix, 77/09 – Cerqueira César
    CEP 01410-020 – São Paulo/SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Jul 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008
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