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Sobre o pássaro e o peixe: o tempo na fotografia e na psicanálise

About the bird and the fish: Time in Photography and Psychoanalysis

Sobre el pájaro y el pez: el tiempo en la fotografía y el psicoanálisis

À propos de l’oiseau et du poisson: le temps dans la photographie et la psychanalyse

Resumos

Neste ensaio, proponho uma interlocução entre fotografia e psicanálise. Dentre as diversas análises possíveis acerca deste encontro, inquieta-me, sobretudo, a dimensão do tempo. Com o intuito de pensar a temporalidade pela perspectiva da fotografia, parto, inicialmente, de algumas provocações de Barthes e Soulages, estendendo-as a outros autores que contribuíram com este debate. Para explorá-la a partir da psicanálise, examino algumas contribuições de Freud, Winnicott e Lacan. Por fim, busco tecer, a partir da apresentação de uma vinheta clínica, algumas aproximações entre os dois campos, apontando que os papéis desempenhados pelo instante e pela duração representam temas essenciais para ambos.

Palavras-chave:
Fotografia; psicanálise; tempo; escuta


En este ensayo, propongo una interlocución entre la fotografía y el psicoanálisis. Entre los diversos análisis posibles de este encuentro, mi principal preocupación es la dimensión del tiempo.

Para pensar la temporalidad desde la perspectiva de la fotografía, parto, inicialmente, de algunas provocaciones de Barthes y Soulages, extendiéndolas a otros autores que contribuyeron a este debate. Para explorarlo desde el psicoanálisis, examino algunas aportaciones de Freud, Winnicott y Lacan. Por último, intento tejer, a partir de la presentación de una viñeta clínica, algunas aproximaciones entre los dos campos, señalando que los papeles desempeñados por el instante y por la duración representan temas esenciales para ambos.

Palabras clave
Fotografía; psicoanálisis; tiempo; escucha


In this essay, I propose an interlocution between photography and psychoanalysis. Among the various possible analyses of this encounter, my main concern is the dimension of time.

In order to think temporality from the perspective of photography, I start, initially, with some provocations from Barthes and Soulages, extending them to other authors who contributed to this debate. To explore it from the psychoanalysis, I examine some contributions of Freud, Winnicott and Lacan. Finally, I seek to weave, from the presentation of a clinical vignette, some approximations between the two fields, pointing out that the roles played by the instant and by duration represent essential themes for both.

Key words
Photography; psychoanalysis; time; listening


Dans cet essai, je propose une interlocution entre la photographie et la psychanalyse. Parmi les différentes analyses possibles de cette rencontre, ma principale préoccupation est la dimension du temps.

Pour penser la temporalité du point de vue de la photographie, je commence, dans un premier temps, par quelques provocations de Barthes et Soulages, en les étendant à d’autres auteurs qui ont contribué à ce débat. Pour l’explorer à partir de la psychanalyse, j’examine certaines contributions de Freud, Winnicott et Lacan. Enfin, je cherche à tisser, à partir de la présentation d’une vignette clinique, quelques rapprochements entre les deux domaines, en soulignant que les rôles joués par l’instant et par la durée représentent des thèmes essentiels pour les deux.

Mots-clés
Photographie; psychanalyse; temps; écoute


A gente olha e pensa: Quando aperto? Agora? Agora? Agora?

Henri Cartier-Bresson, O instante decisivo

Aqui de onde o olho mira

Agora que ouvido escuta

O tempo que a voz não fala

Mas que o coração tributa

Gilberto Gil, Aqui e agora

Em um final de tarde, no verão de 2020, eu observava a intensa pescaria dos pássaros à beira-mar. Não raras vezes, tendo uma câmera fotográfica nas mãos, experimentei uma espécie de desaparecimento, como quem se apartasse de si mesmo, inaugurando um tempo e um espaço para outra instância do olhar. Não recordo em que momento apontei a lente para o Trinta-réis-real, mas a lembrança de sua jornada em busca do alimento não poderia ser mais nítida. Tudo parece ter acontecido em uma fração de segundo: o voo impetuoso, tão alto quanto obstinado; o mergulho preciso em direção ao mar; a cabeça desaparecendo entre as ondas; o retorno triunfante, com o pequeno peixe aparentemente preso ao bico vermelho-alaranjado. O que viria a seguir ficaria para sempre fincado em minha memória: o exato instante em que, em pleno voo, o pássaro perdeu o peixe (Figura 1). As informações gravadas na imagem dão conta de que tudo aconteceu em exato um milésimo de segundo (1/1000s). A cena capturada parece ser a de um vitorioso peixe que voa - a despeito da ausência de asas - seguido de um pássaro atordoado, com o bico aberto, os dois cercados por escamas voadoras. Ao pássaro, restaria a falta. Arrisco dizer que, mesmo diante de outro desfecho, cedo ou tarde o peixe haveria de lhe faltar. Tudo seria uma questão de tempo. Para mim, não seria diferente: seguiríamos buscando, cada um a seu modo, algum alimento.

Ao lado da fotografia e da poesia, a escuta psicanalítica - como psicoterapeuta, professora e supervisora de estágio de psicologia clínica em uma universidade pública brasileira - tem se configurado um lugar de fome e alimento, palco de coexistência da falta e do desejo, da angústia e da criação. Há muitos anos, arte e psicanálise parecem não se dissociar em minhas inquietações e descobertas. Nas últimas décadas, esta aproximação tem recebido a atenção de pesquisadores das duas áreas, o que contribuiu para o desenvolvimento de um profícuo campo de estudos. Em um artigo recente sobre o diálogo entre o método psicanalítico e o campo das artes, por exemplo, uma afirmação parece sintetizar a potência deste encontro: “Para a psicanálise, o sujeito se constitui em relação a uma exterioridade íntima e a arte talvez seja o campo que nos dê mais diretamente notícias dessa excêntrica operação constitutiva” (Marsillac et al., 2019Marsillac, A. L. M., Bloss, G. M., & Mattiazzi, T. (2019). Da clínica à cultura: desdobramentos da pesquisa entre psicanálise e arte. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 19(3), 787-808. https://doi.org/10.12957/epp.2019.46918
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, p. 802).

A psicanálise, para além de uma prática clínica, desdobra-se em inúmeras possibilidades de apreensão da condição humana, à medida que pensa o sujeito como um ser de história e cultura. Para Kehl (2002)Kehl, M. R. (2002). Sobre Ética e Psicanálise. Companhia das Letras., sua ética caracteriza-se pela espera, por parte do analista, de que do discurso do paciente surgirá a palavra que “venha a dar notícias, para o próprio falante, da existência de seu desejo inconsciente” (p. 129). A arte, por sua vez, segundo Rivera (2017)Rivera, T. (2017). Dossiê Arte e Psicanálise: O avesso do imaginário. Revista Cult, 20(225), 34-37. https://revistacult.uol.com.br/home/o-avesso-do-imaginario/
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, parece poder dizer deste sujeito desejante “mesmo que isso não se deixe capturar em palavras, em uma teoria - ou talvez graças ao fato de que isso resiste a uma teoria, justamente” (p. 34). Em um trabalho posterior, ao discutir a proposição de que a arte precede o saber psicanalítico, a autora postulou:

Não se trata, portanto, de buscar na arte ecos do que já afirma a teoria psicanalítica, mas sim de tentar compreender e fazer avançar a própria teoria graças à arte. Pois a arte nomeia, de forma imprevisível e sem garantias, o surgimento do sujeito na Cultura, fora dele mesmo. (Rivera, 2014Rivera, T. (2014). O sujeito está na arte. In Viso: Cadernos de estética aplicada, VIII, (15), 236-247. http://doi.org/10.22409/1981-4062/v15i/188
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, p. 245)

São inúmeros os laços entre arte e psicanálise. Interessa-me, aqui, estender este debate propondo uma reflexão acerca da dimensão temporal na fotografia e na escuta psicanalítica.

O tempo na fotografia

No mesmo verão em que registrei a desconcertante aventura do pássaro, debrucei-me sobre a leitura de A câmara clara - Nota sobre a fotografia, de Roland Barthes. O material é apresentado em duas partes, compostas por 24 pequenos capítulos, os quais alguns ensaístas, impactados pela obra, associaram sensivelmente a dois filmes de 24 poses (Fontanari, 2015Fontanari, R. (2015). A noção de punctum de Roland Barthes, uma abertura da imagem? Parlaxe (3)1, 61-74. https://revistas.pucsp.br/index.php/paralaxe/article/view/20000
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; Zorzo, 2018Zorzo, A. (2018). Studium e Punctum: notas sobre fotografia por Roland Barthes. https://medium.com/@alinezorzo/studium-e-punctum-notas-sobre-fotografia-por-roland-barthes-743056ccc357
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). O texto revela-se um delicado manifesto poético acerca do olhar, da temporalidade e da perda, dado o luto do escritor pela morte recente de sua mãe à época da escrita do ensaio:

Dizem que o luto, por seu trabalho progressivo, apaga lentamente a dor; eu não podia, não posso acreditar nisso; pois, para mim, o Tempo elimina a emoção da perda (não choro), isso é tudo. Quanto ao resto, tudo permaneceu imóvel. Pois o que perdi não é uma Figura (a mãe), mas um ser; e não é um ser, mas uma qualidade (uma alma): não a indispensável, mas a insubstituível. (Barthes, 1980/2018Barthes, R. (2018). A câmara clara: nota sobre a fotografia (7ª ed.; Júlio Castañon Guimarães, Trad.). Nova Fronteira. (Trabalho original publicado em 1980)., pp. 66-67)

É interessante pensar que a escrita de A câmara clara em diversos momentos remete a uma busca diante de algo que invariavelmente escapa, bem como à pergunta: O que existe? Avesso às leituras tecnicistas sobre a fotografia, Barthes (1980/2018)Barthes, R. (2018). A câmara clara: nota sobre a fotografia (7ª ed.; Júlio Castañon Guimarães, Trad.). Nova Fronteira. (Trabalho original publicado em 1980). esboçou uma teoria selvagem e apaixonada, na qual a confissão parece se colocar como a única possibilidade diante do desejo de apreensão de sentido. Em relação a isso, no primeiro capítulo da segunda parte o leitor é surpreendido por um relato: “Ora, numa noite de novembro, pouco tempo depois da morte de minha mãe, organizei as fotos. Eu não contava reencontrá-la” (p. 57). Para o autor, toda fotografia afirma-se como um certificado de presença. Assim, não rememora o passado tampouco produz um efeito de restituição do que foi abolido pelo tempo ou pela distância. O efeito produzido é o de atestar que o que é visto de fato existiu, o que considera escandaloso: “A Fotografia sempre me espanta, como um espanto que dura e se renova, inesgotavelmente” (p. 71). Nesse sentido, a fotografia não fala daquilo que não é mais, mas, sim, daquilo que foi, o que considera uma sutileza decisiva: a essência de uma foto consiste em ratificar o que ela representa, e não está na forma, mas no tempo, no isso existiu:

Só posso ter a esperança louca de descobrir a verdade porque o noema da foto é precisamente isso foi e porque vivo na ilusão de que basta limpar a superfície da imagem para ter acesso ao que há por trás: escrutar quer dizer, virar a foto, entrar na profundidade do papel, atingir sua face inversa (o que está oculto é, para nós, ocidentais, mais verdadeiro do que o que está visível). Infelizmente, escruto em vão, nada descubro: se amplio, não há nada além do grão do papel: desfaço a imagem em proveito de sua matéria; se não amplio, se me contento em escrutar, obtenho apenas esse único saber, possuído há muito tempo, desde meu primeiro olhar: que isso efetivamente foi: as voltas não deram em nada (...). Assim é a foto: não pode dizer o que ela não dá a ver. (Barthes, 1980/2018Barthes, R. (2018). A câmara clara: nota sobre a fotografia (7ª ed.; Júlio Castañon Guimarães, Trad.). Nova Fronteira. (Trabalho original publicado em 1980)., p. 84)

Como o pássaro que deseja o peixe, a leitura de Barthes (1980/2018)Barthes, R. (2018). A câmara clara: nota sobre a fotografia (7ª ed.; Júlio Castañon Guimarães, Trad.). Nova Fronteira. (Trabalho original publicado em 1980). levou-me à busca de outras referências acerca do tempo na literatura sobre fotografia. Algumas descobertas me pareceram preciosas nesse trajeto. A concepção do autor sobre o referente, “a coisa necessariamente real que foi colocada diante da objetiva, sem a qual não haveria fotografia” (p. 67), reverbera na afirmação de Kowalsky (2013)Kowalski, M. (2013). O tempo na fotografia. IV Colóquio Internacional de Doutorandos do CES.https://cabodostrabalhos.ces.uc.pt/n10/documentos/6.1.3_Maria_Pereira_Kowalski.pdf
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de que o presente é a imagem fotografada, porém o seu referente já não existe: a fotografia se refere a um registo de um passado, mais ou menos distante. Para a autora, o medo da morte e a impossibilidade de lhe escapar, nesse sentido, seriam negados pela fotografia, que assume um caráter nostálgico, de algo que não mais existe. Coli (2015)Coli, J. (2015). A fotografia, o tempo, a morte. Studium, (37), 94-103. https://doi.org/10.20396/studium.v0i37.12554
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, na mesma direção, concebe que “a fotografia mantém uma relação íntima com o tempo e com esse esforço de retenção. Ela é presença e ausência ao mesmo tempo e traz o paradoxo de um efêmero que sobrevive a si próprio” (p. 94). Para ele, a existência e a morte repousam sobre o tempo e o nada, sendo o presente uma fronteira absurda entre essas dualidades:

Presente é a sensação de ser no estar, num estar que de fato já deixou de existir, já que se dissolve no passado e vem devorado pelo futuro. Essa sensação do presente que não existe é guardada como um ersatz [substituto; tradução nossa] desesperado na memória cuja melhor configuração visual encontra-se na fotografia. (p. 94)

Na obra Estética da fotografia: perda e permanência, Soulages (2010)Soulages, F. (2010). Estética da fotografia: perda e permanência. Editora Senac. também propõe um debate ontológico sobre a fotografia, articulando filosofia e psicanálise na tentativa de apreensão de um processo que, para ele, começa no ato de fotografar e se estende à recepção da imagem pelo espectador. Porém, enuncia um contraponto ao isso existiu, de Barthes: o isso foi encenado. Ocupando-se mais de imagens produzidas com negativos do que por meios digitais, apresenta o conceito de fotograficidade, referindo-se ao que é fotográfico em uma imagem e o que nela é abstrato, configurando sua singularidade. Soulages considera que a criação fotográfica implica três tempos: a captura fotográfica do objeto, o trabalho com o negativo e, por fim, a transformação em obra. Para ele, o ato fotográfico é irreversível, porém o processo posterior, o trabalho com o negativo, é inacabável, “à medida que pode sempre ser retomado e realizado outra vez, e isto de maneira potencialmente diferente” (p. 131). Com isso, Soulages defende que entre o irreversível e o inacabável, inaugura-se um enlace entre perda e permanência. Se, de um lado, ocorre a perda do tempo e do ser passados por conta da perda das circunstâncias que causaram o ato fotográfico (o momento em que foi realizado e o sujeito/objeto fotografado), de outro gera-se a permanência pelas inúmeras imagens que podem ser feitas a partir do negativo, a depender do tempo e dos processos realizados.

Ao abordar o gênero retrato, Soulages (2010)Soulages, F. (2010). Estética da fotografia: perda e permanência. Editora Senac. contraria a ideia de que a realidade nesse gênero se apresentaria de forma direta, sem interferências, propondo que ocorre uma espécie de jogo teatral, atrelado a determinadas escolhas/manipulações do fotógrafo. A subjetividade do fotografado, nesse sentido, passa a ser questionada pelo autor: o eu estaria em uma suposta espontaneidade ou nas personagens assumidas pelo fotografado? Para ele, o retrato sempre se constituirá a partir de uma encenação, não consistindo em uma prova da realidade: “Pode-se fotografar o eu de uma pessoa? Para tal, seria preciso que o eu existisse de maneira permanente e idêntica” (p. 74). Nessa direção, considera que o eu do fotografado se apresenta de forma plural, marcado por diversas dimensões: a fotografia não poderia apreender espontaneamente uma única e permanente natureza de uma pessoa - sempre haverá uma teatralização fotográfica realista, mesmo que inconsciente.

Neste ponto de sua argumentação, o autor defende que mesmo quando as imagens são capturadas de forma espontânea o sujeito fotografado não estaria totalmente destituído de uma postura artificial - considerando as diversas circunstâncias que condicionam o seu comportamento social (Soulages, 2010Soulages, F. (2010). Estética da fotografia: perda e permanência. Editora Senac.). A partir disso, generaliza esta ideia para outras fotos, não só retratos de pessoas, e passa a considerar que o fotógrafo pode ser pensado como uma espécie de deus do instante, um “Deus ordenador que introduz ordem no real que quer fotografar” (p. 67), dada a centralidade que sua autoria ocupa nesse processo. É ele, o fotógrafo, que dá sentidos à imagem, que a cria poeticamente a partir de suas escolhas. Ao conceber que “a ficção talvez seja o melhor meio de se compreender a realidade” (p. 78), Soulages discute que a palavra ficção remete tanto ao que é mentiroso como ao que é imaginado e inventado, sem intenção de enganar. Com isso, enfatiza que o espectador não receberá a imagem como uma reprodução, mas uma ficção.

Bachelard (2007)Bachelard, G. (2007). A intuição do instante. Versus Editora. oferece uma importante contribuição a este debate ao considerar o instante o elemento temporal primordial. Em sua obra A intuição do instante, o autor - ao questionar a concepção do filósofo Henri Bergson de que só existe o passado - propõe que “a duração não tem força direta; o tempo real só existe verdadeiramente pelo instante isolado, está inteiramente no atual, no ato, no presente” (p. 55). Com isso, questiona de que maneira o que é real poderia escapar ao instante presente, considerando que o ser só toma consciência de si mesmo no instante presente e que este seria o único domínio no qual se vivencia a realidade.

Em relação a isso, Cartier-Bresson (2004)Cartier-Bresson, H. (2004). O imaginário segundo a natureza. GG Brasil., fotógrafo francês, considerou que todo evento é dotado de um instante sublime, marcado pela união de diversos elementos que formam imagens geometricamente perfeitas. Para o fotógrafo, esses instantes acontecem com certa frequência, mas é necessário, para que sejam capturados, que se saiba reconhecê-los. Algumas imagens podem capturar um instante decisivo, um acaso, o que não necessariamente significa apenas o registro de uma situação de movimento, tampouco o resultado de um único disparo:

(...) de todos os meios de expressão, a fotografia é o único que fixa para sempre o instante preciso e transitório. Nós, fotógrafos, lidamos com coisas que estão continuamente desaparecendo e, uma vez desaparecidas, não há nenhum esforço sobre a terra que possa fazê-las voltar. Não podemos revelar ou copiar uma memória. (Cartier-Bresson, 1971Cartier-Bresson, H. (1971). O instante decisivo. In M. C. Baccelar (Org.), Fotografia e Jornalismo (pp. 19-26). Escola de Comunicações e Artes (USP)., p. 21)

Porém, ao discutir a oposição entre a primazia do instante ou da duração, Pereira (2016)Pereira, T. B. (2016). Por uma estética do instante: um olhar filosófico sobre a obra de Henri Cartier-Bresson. Dissertação (mestrado), Universidade Federal do Ceará, Instituto de cultura e Arte. Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Fortaleza. http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/21159
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considerou que “por mais que o fato tenha cessado, a sua imagem - ou pelo menos, uma fração - será eternizada para posterior observação e lembrança” (p. 52), o que, para o autor, significa assumir que instante e duração não são excludentes. Segundo o autor, fotógrafo, fotografados e cenários sofrem transformações, desaparecem, e a fotografia, nesse processo, parece ser o que mais resiste, uma vez que “o assunto registrado nas imagens atravessa o tempo e pode ser observado por pessoas diferentes em contextos distintos” (p. 52). Nessa direção, Sanz (2011)Sanz, C. (2011). Quando o tempo fugiu do instantâneo. Studium, (32), 52-69. https://doi.org/10.20396/studium.v0i32.12465
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já apontava que o ato de fotografar estimula o sentido de presença no presente, o qual exige, ao mesmo tempo, percepção de passado e intuição de futuro. Para a autora, é preciso que ocorra, simultaneamente, um trabalho de duração e um esforço de “instantinização”:

(...) o instantâneo fotográfico não se constitui simplesmente como interrupção artificial da duração, mas como apreensão provisória de durações internas que o conformaram. A fotografia traria em si “um pouco de passado e um pouco de futuro”, o fluxo e a apreensão, aparente imobilidade e vibração temporal.

Encarnaria o tempo denso de sua concepção e estabeleceria indissociável relação entre o que se tornará atual naquela imagem e o que nela permanecerá virtual. (pp. 63-64)

É interessante destacar que, para Sanz (2011)Sanz, C. (2011). Quando o tempo fugiu do instantâneo. Studium, (32), 52-69. https://doi.org/10.20396/studium.v0i32.12465
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, quando há o reconhe-cimento na fotografia da relevância do instante, este é arrancando do contínuo, causando uma fratura na continuidade. Nesse sentido, o presente passa a um agora especial, que tem como característica não se repetir, sendo único. O paradigma da instantaneidade, de acordo com a autora, possibilitou à câmera fotográfica uma forma de decifrar e qualificar o tempo: não se trata de uma simples captura do agora, mas a possibilidade de transmutar o instante num agora. Nesta perspectiva, Berger (2017)Berger, J. (2017). Para entender uma fotografia. Companhia das Letras. afirma que o instante fotografado adquire significado quando é possível ao espectador interpretar, para além dele, uma duração que se estende. Assim, quando se considera que uma foto é significativa, ocorre uma atribuição de passado e futuro. Para o autor,

Uma fotografia detém o fluxo do tempo no qual o evento fotografado existiu. Todas as fotografias são do passado, mas nelas um instante do passado é retido de modo que nunca pode levar ao presente, ao contrário do passado de fato vivido. Toda fotografia nos apresenta duas mensagens: uma concernente ao evento fotografado e outra concernente a um choque de descontinuidade. (pp. 88-89)

Por fim, a propósito da questão inicial O que existe?, a filósofa Susan Sontag, em “Na caverna de Platão”, texto que abre o seu clássico ensaio Sobre fotografia (1977/2004Sontag, S. (2004). Na caverna de Platão. In Sobre fotografia. Companhia das Letras (Trabalho original publicado em 1977).), afirma que fotos oferecem um testemunho. Para ela, uma foto representa uma prova inquestionável de que determinado fato aconteceu: “A foto pode distorcer; mas sempre existe o pressuposto de que algo existe, ou existiu, e era semelhante ao que está na imagem” (p. 16). Porém, pondera que embora a câmera, de certa forma, capture a realidade, não apenas interpretando-a, a fotografia se refere a uma interpretação de mundo, na qual o fotógrafo imprime seus padrões e temas.

O tempo na psicanálise

A temporalidade representa um tema muito caro também à psicanálise. No texto “O inconsciente”, Freud (1915/2010a)Freud, S. (2010a). O inconsciente. In Introdução ao narcisismo, ensaios de metapsicologia e outros textos (Vol. 12, pp. 99-150; Paulo César de Souza, Trad.). Companhia das Letras (Trabalho original publicado em 1915). considerou que os processos nesta instância do aparelho psíquico não são ordenados temporalmente, tampouco alterados pela passagem do tempo. Em “Novas conferências introdutórias à psicanálise”, mais especificamente no artigo “A dissecção da personalidade psíquica”, postulou:

Nada se acha [no Id] que corresponda à ideia de tempo, não há reconhecimento de um transcurso temporal e, o que é muito notável e aguarda consideração no pensamento filosófico, não há alteração do evento psíquico pelo transcurso do tempo. Desejos que nunca foram além do Id, mas também impressões que pela repressão afundaram no Id, são virtualmente imortais, comportam-se, após décadas, como se tivessem acabado de surgir. (Freud, 1933/2010bFreud, S. (2010b). A dissecção da personalidade psíquica. In O mal-estar na civilização; Novas conferências introdutórias à psicanálise e outros textos. (Vol. 18, pp. 90-18; Paulo César de Souza, Trad.). Companhia das Letras (Trabalho original publicado em 1933)., p. 216)

Essa concepção remete à noção de Nachträglichkeit, neologismo criado por Freud em 1896 - a partir do termo alemão Nachträglic - para indicar um processo no qual os eventos traumáticos adquirem sentido em um contexto posterior, o a posteriori (Roudinesco & Plon, 1998/2017Roudinesco, E., & Plon, M.(2017). Dicionário de psicanálise. Zahar. (Trabalho original publicado em 1998).). De acordo com Gondar (2006)Gondar, J. (2006). Winnicott, Bergson, Lacan: tempo e psicanálise. Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica, 9, 103-117. https://doi.org/10.1590/S1516-14982006000100008
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, a tradução do termo pela escola inglesa (deferred action) sugere a ideia de processo e continuidade, enquanto para a escola francesa (après-coup) sugere descontinuidade, ruptura. Para a autora, isso equivale a dizer que para os psicanalistas da escola inglesa a realidade temporal seria dada pela duração, enquanto para os psicanalistas da escola francesa ocorreria a partir do instante. De acordo com André (2008)André, J. (2008). O acontecimento e a temporalidade: O après-coup no tratamento. Ide - psicanálise e cultura, 31(47), 139-167. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31062008000200025&lng=pt&tlng=pt.
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, deferred action - ação diferida - “remete a um prazo, a uma latência: um acontecimento inscrito na infância que só exerce verdadeiramente sua ação mais tarde” (p. 140). O autor considera que, a partir dessa tradução, a escola inglesa não apreendeu a intenção de Freud de subverter as representações convencionais sobre a temporalidade, o que o termo après-coup teria conseguido um tanto mais ao ignorar a contradição de um passado-presente e de um presente-passado. Acerca desse debate, Dahl (2011)Dahl, G. (2011). Os dois vetores temporais de Nachträglichkeit no desenvolvimento da organização do ego: a importância do conceito para a simbolização dos traumas e ansiedades sem nome. Jornal de Psicanálise, 44(80), 95-114. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-58352011000100009&lng=pt&tlng=pt.
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considerou que

nenhuma das duas traduções (...) transmite o pleno significado do termo alemão tal qual utilizado por Freud (...) No caso de “deferred action”, a interpretação reconstrói fatos empíricos depois do evento [nachträglich], com a intenção de explicar o presente pelo passado, enquanto em après-coup a interpretação toma a forma de uma tentativa de usar o presente a fim de conferir significado ao passado depois do evento [nachträglich]. A divergência de recepção de Nachträglichkeit nas duas culturas psicanalíticas destaca a controvérsia ainda não resolvida no que diz respeito, por um lado, ao status da realidade externa para o desenvolvimento psíquico, e, por outro, a importância do mundo interno. (p. 98)

O pediatra e psicanalista inglês Donald Winnicott pertenceu ao chamado Middle Group, ou grupo independente, que reuniu na Sociedade Britânica de Psicanálise analistas que, de um lado, questionavam o modelo freudiano da libido como base para o desenvolvimento emocional e, de outro, tinham divergências teóricas quanto à ênfase dada por Melanie Klein às fantasias inconscientes nas primeiras experiências da criança. No acontecer humano, para Winnicott, o tempo e o meio ambiente representam condições essenciais. Ao destacar a importância atribuída pelo autor à dimensão temporal, Safra (1999a)Safra, G. (1999a). A clínica em Winnicott. Natureza humana, 1(1), 91-101. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-24301999000100006&lng=pt&tlng=pt.
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afirmou que para Winnicott

A singularização do homem é um fenômeno de temporalização. É no tempo e com o tempo que se dá o acontecer do homem. Enquanto nas teorias psicanalíticas anteriores a análise privilegiava o conteúdo de um psiquismo existente, na perspectiva winnicottiana o acontecer humano no tempo será o ponto de vista fundamental. (p. 91)

Em uma palestra proferida em 1960, Winnicott (1960/2005)Winnicott, D. W. (2005). Agressão, culpa e reparação. In Tudo começa em casa (4ª ed.) (pp. 69-79; P. Sandler, Trad.). Martins Fontes (Trabalho original publicado em 1960). afirmou que nenhum adulto é adulto o tempo todo, uma vez que “as pessoas não têm exatamente sua idade; em alguma medida, elas têm todas as idades ou nenhuma” (p. 71). O desenvolvimento humano, para o autor (1963/1983), refere-se a um processo de integração no tempo e no espaço, uma jornada da dependência absoluta rumo à independência, que se configura como uma tarefa fundamental no começo da vida. Para que esta integração ocorra, o meio suficientemente bom (mãe-ambiente) desempenha, no período da dependência absoluta, um papel essencial, atendendo às necessidades do bebê antes mesmo que ele se aperceba da existência desse mundo externo; porém, quando essas necessidades não são atendidas, a continuidade da experiência do ser é interrompida. Em relação a isso, uma frase tornou-se emblemática na obra de Winnicott, por enfatizar a unidade relacional formada pelo bebê e sua mãe-ambiente, sem a qual a existência no tempo não seria possível: “não existe algo como o bebê” (Khan, 1958/2000Khan, M. R. (2000). Introdução. In D. W. Winnicott, Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas (pp. 11-54; D. Bogomoletz, Trad.). Imago. (Trabalho original publicado em 1958)., p. 40). Para Dias (2003)Dias, E. O. (2003). A teoria do amadurecimento de D. W. Winnicott. Imago., o fundamento da temporalização, em Winnicott, afirma-se a partir da experiência presente, e isso só é possível em virtude da previsibilidade e continuidade dos cuidados. Nessa direção, Safra (1999b)Safra, G. (1999b). A face estética do self: Teoria e clínica. Unimarco. apontou que

Este núcleo sustentado pela mãe ao longo de um período dá ao bebê duração em qualidades, levando-o a eventualmente constituir o que poderíamos denominar tempo subjetivo... É um tempo que, por ter surgido a partir do ritmo singular da criança, faz parte de e é o seu self. Ele é fruto da continuidade de ser do indivíduo e o retira do vácuo da eternidade e do não ser. (p. 57)

Entre a instalação do tempo subjetivo, forjado na experiência a partir da continuidade nos cuidados do ambiente suficientemente bom, e a apropriação do tempo cronológico, tal como compreendido pelo adulto, a transicionalidade, para Winnicott (1951/2000)Winnicott, D. W. (2000). Objetos transicionais e fenômenos transicionais. In Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas (pp. 316-331; D. Bogomoletz, Trad.). Imago. (Trabalho original publicado em 1951)., exerce um papel fundamental: entre o subjetivo e aquilo que é objetivamente percebido, existe uma terceira área da experiência, o espaço transicional. De acordo com Mack (2011)Mack, L. E. (2011). Uma investigação da temporalidade a partir de Winnicott. Dissertação (Mestrado em Psicologia), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. https://repositorio.pucsp.br/jspui/handle/handle/15024
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, “A temporalidade transicional é uma temporalidade criada no entre da relação mãe-bebê, entre os períodos de presença e ausência da mãe e entre o eu e o não-eu” (p. 53). Conforme a autora, a duração do tempo transicional se dá enquanto a memória da presença materna permanecer, e esse tempo, que se sustenta no tempo subjetivo, marca o começo da criatividade humana.

O psicanalista francês Jacques Lacan também ressaltou a importância da temporalidade para a psicanálise, debruçando-se sobre o tema em alguns de seus seminários e escritos. Em Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (1964/2008), propôs que o inconsciente é apreendido na hiância, na experiência de ruptura:

Tropeço, desfalecimento, rachadura. Numa frase pronunciada, escrita, alguma coisa se estatela. Freud fica siderado por esses fenômenos, e é neles que vai procurar o inconsciente. Ali, alguma outra coisa quer se realizar - algo que aparece como intencional, certamente, mas de uma estranha temporalidade. O que se produz nessa hiância, no sentido pleno do termo produzir-se, se apresenta como um achado (...). Ora, esse achado, uma vez que ele se apresenta, é um reachado, e, mais ainda, sempre está prestes a escapar de novo, instaurando a dimensão da perda. (p. 32)

Em uma análise acerca da temporalidade em Lacan, Amor e Chatelard (2016)Amor, A. R. S., & Chatelard, D. S. (2016). Considerações sobre tempo e constituição do sujeito em Freud e Lacan. Tempo psicanalitico, 48(1), 65-85. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-48382016000100005&lng=pt&tlng=pt
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consideraram que, para o autor, a dimensão do tempo coloca o entendimento da constituição subjetiva no campo do desejo. Para as autoras, a noção espacial e imaginária de continuidade esmorece diante do sujeito do inconsciente e da linguagem. Nesse sentido, o tempo, em Lacan, “é marcado pelos intervalos, pelas pausas, não pela continuidade. Cronometrar o tempo, contar-lhe os minutos, fazê-lo contínuo, é espacializá-lo, imaginarizá-lo” (p. 77).

No texto “O tempo lógico e a asserção de certeza antecipada”, Lacan (1945/1998)Lacan, J. (1998). O tempo lógico e a asserção da certeza antecipada. In Escritos (pp. 197-213; V. Ribeiro, Trad.). Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1945)., valendo-se de um sofisma, aborda a pressa e seu lugar na sessão psicanalítica, propondo três modulações do tempo. Na primeira, o instante de olhar, não há um raciocínio ou subjetivação, mas a constatação do que se pode ver; na segunda, o tempo de compreender, há o tempo de formulação de uma hipótese; a terceira modulação, o momento de concluir, abrange a função da pressa, figurando uma certeza antecipada. Isso posto na situação analítica, explicaria o intento do analista de, a partir de um corte no discurso do sujeito, promover uma relação de descontinuidade.

Para Fingermann (2009)Fingermann, D. (2009). O tempo na experiência da psicanálise. Revista USP, (81), 58-71. https://doi.org/10.11606/issn.2316-9036.v0i81p58-71
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, o tratamento psicanalítico remete a uma questão de tempo, mas não um tempo cronológico, “que engole os instantes na corrida do passado ao futuro, mas um tempo lógico que faz valer o instante como decisivo” (p. 63). Assim, a situação analítica abarcaria fenômenos temporais que, de um lado, ocorrem na continuidade e, de outro, emergem na descontinuidade: os tempos de uma análise veem-se tensionados entre a duração e o instante, uma vez que “a fala do sujeito que se desenrola na associação livre é paradigmática da duração, enquanto a intervenção do analista produz uma descontinuidade no instante de sua intervenção, de seu ato” (p. 66).

Ao analisar as diferentes perspectivas de Winnicott e Lacan acerca do tempo, Gondar (2006)Gondar, J. (2006). Winnicott, Bergson, Lacan: tempo e psicanálise. Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica, 9, 103-117. https://doi.org/10.1590/S1516-14982006000100008
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considerou que é possível supor que em um mesmo sujeito observe-se uma sobreposição de diferentes dimensões temporais, e caberia ao analista, a partir de sua sensibilidade, avaliar um momento de espera ou de corte, de duração ou pontualidade, privilegiando mais a compreensão do tipo de sofrimento apresentado pelo analisante do que a filiação teórica. Para a autora, as duas concepções inspiram estratégias clínicas distintas. Nesse ponto de sua formulação, ela questiona se seria necessário escolher uma ou outra estratégia ou se seria possível uma indeterminação:

Ao escolhermos o ponto, o instante, a pressa e o corte, nossas estratégias clínicas privilegiam a emergência do sujeito e a assunção do desejo: a questão seria fazer o sujeito responsabilizar-se pelo seu desejo, o tempo estando colocado a serviço da assunção de uma diferença. Ao escolhermos o fluxo, a duração, a espera e a criação, nossas estratégias são mais condizentes com o estabelecimento de um holding, como um campo de experiências pré-subjetivo no qual um desejo pode se constituir ou ganhar consistência. Nesse último caso, a questão temporal seria menos a de assumir uma diferença, e mais a de fruir um diferenciar-se. Qual desses tempos seria o melhor? (p. 115)

Permito-me, neste ponto da reflexão, tomá-la para mim e repetir a pergunta-provocação: Qual desses tempos seria o melhor?

O tempo da intersecção

Walter Benjamin, no clássico ensaio Pequena história da fotografia, apresenta uma interessante interlocução entre fotografia e psicanálise. Para o filósofo, a despeito da maestria do fotógrafo e de todo planejamento em relação ao que será fotografado, o espectador sentirá um desejo irresistível de buscar o que chamou de centelha do acaso, o inconsciente óptico que apenas a fotografia permitiria aflorar, posto que

A natureza que fala à câmera é diferente da que fala aos olhos. Diferente sobretudo porque a um espaço conscientemente explorado pelo homem se substitui um espaço em que ele penetrou inconscientemente. Se é vulgar darmo-nos conta, ainda que muito sumariamente, do modo de andar das pessoas, já nada podemos saber da sua atitude na fração de segundo de cada passo. Mas a fotografia, com os seus meios auxiliares - o retardador, a ampliação - capta esse momento. Só conhecemos esse inconsciente óptico através da fotografia, tal como conhecemos o inconsciente pulsional através da psicanálise. (Benjamin, 1931/2017Benjamin, W. (2017). Pequena história da fotografia. In W. Benjamin, Estética e sociologia da arte (pp. 51-78; J. Barrento, Trad.). Autêntica. (Trabalho original publicado em 1931)., p. 55)

A concepção de Benjamin remete à importância do estudo do repertório freudiano acerca das intersecções entre fotografia e psicanálise, o qual se revela, de pronto, instigante. Em diversas passagens de sua obra, Freud utilizou-se de analogias entre instrumentos ópticos e o aparelho psíquico, com o intuito de discorrer acerca do inconsciente. Ainda que o presente ensaio não tenha como objetivo elencar todos os textos em que essa aproximação foi mencionada, a referência a alguns trabalhos torna-se relevante. Em A interpretação dos sonhos, Freud (1900/2019)Freud, S. (2019). A interpretação dos sonhos. In Obras Completas (Vol. 4; Paulo César de Souza, Trad.). Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1900). comparou o aparelho psíquico a um microscópio ou uma câmera fotográfica, situando-os metaforicamente em relação ao inconsciente. Conforme propôs,

Vamos permanecer no terreno da psicologia e apenas seguir a sugestão de imaginar o instrumento que serve para as atividades psíquicas como, digamos, um microscópio composto, um aparelho fotográfico ou algo assim. A localidade psíquica corresponde, então, a um lugar dentro de um aparelho em que um dos estágios preliminares da imagem se forma. (p. 586)

Alguns anos depois, em “Algumas observações sobre o conceito de inconsciente na psicanálise”, Freud (1912/2010c)Freud, S. (2010c). Algumas observações sobre o conceito de inconsciente na Psicanálise. In Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em Autobiografia (“O caso Schreber”), Artigos sobre técnica e outros textos. (Vol. 11, pp. 255-267; Paulo César de Souza, Trad.). Companhia das Letras (Trabalho original publicado em 1912). valeu-se da imagem do negativo fotográfico para abordar as origens do inconsciente, postulando que o negativo não configura uma oposição ao positivo, mas a sua base, e que no processo de constituição psíquica alguns registros poderiam se manter negativos (inconscientes) e outros positivos (conscientes). Para ele, “O primeiro estágio da fotografia é o negativo; toda imagem fotográfica tem de passar pelo processo negativo, e alguns desses negativos, que superam bem a prova, são admitidos no processo positivo, que conclui com a imagem” (pp. 264-265). No final de sua vida, em “Moisés e o Monoteísmo”, Freud (1939/2018)Freud, S. (2018). Moisés e o Monoteísmo. In Moisés e o monoteísmo, Compêndio de Psicanálise e outros textos. (Vol.19, pp. 13-188; Paulo César de Souza, Trad.). Companhia das Letras (Trabalho original publicado em 1939). ressaltou que da mesma forma que um registro fotográfico pode ser revelado muito tempo depois de ter sido capturado, as impressões que atingem a criança em épocas em que o aparelho psíquico não está apto a recebê-las podem retornar e ser percebidas em outro tempo: “Do fato em si não há como duvidar, mas ele é tão estranho que podemos facilitar para nós mesmos sua compreensão ao compará-lo a um registro fotográfico que, após um tempo qualquer, pode ser revelado e transformado em imagem” (pp. 173-174).

Khouri (2015)Khouri, M. G. (2015). Fotografia: realidades e ficções. Ide, 37(59), 97-98. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31062015000100009&lng=pt&tlng=pt.
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, no entanto, considerou que a relação entre fotografia e psicanálise ultrapassaria a compreensão da fotografia como uma metáfora do aparelho psíquico. Para a autora, essa aproximação se dá pelo fato de que a imagem fotográfica remete, sobretudo, a formas de representação e linguagem. Nesse sentido, apontou que a fotografia não se configura como uma representação rigorosa da realidade, uma vez que depende das intervenções do fotógrafo, das técnicas empregadas e da interpretação do espectador, constatando que entre o que se vê e o que não é visto em uma fotografia histórias podem ser construídas, gerando elaborações e narrativas inéditas. Para ela, “Nessas brechas entre o que é e o que não é, naquilo que escapa, podemos capturar os sentidos das imagens que vemos. E toda significação só pode ser encontrada a posteriori” (p. 97).

A partir deste ponto, proponho uma pequena digressão: na introdução do livro O ato fotográfico e outros ensaios, o escritor e professor belga Phillipe Dubois (1993)Dubois, P. (1993). O ato fotográfico e outros ensaios. (M. Apenzeller. Trad.). Papirus. convida o leitor a observar a reprodução fotográfica de uma obra do artista canadense Michael Snow, chamada Authorization. Feito o convite, aponta que três perguntas fundamentais formam uma única e se colocam diante de qualquer obra de arte: O que está representado? Como aconteceu? Como é percebido? Para o autor, “descrever essa obra colocando-se no ponto de vista do espectador e acompanhando o desenrolar de sua percepção é, num mesmo movimento, acompanhar o processo pelo qual a obra se constituiu” (p. 16). Ainda que não pretenda me debruçar sobre a obra em questão, sorrio diante das indagações de Dubois, ao pensar que se assemelham de maneira poética àquelas que têm se colocado em minhas escutas clínicas e supervisões ao longo do tempo, sugerindo-me que arte e psicanálise se enlaçam, invariavelmente. Somado a isso, a palavra-título da obra de Snow - aqui traduzida como Autorização - torna-se relevante neste diálogo, remetendo-me a uma condição necessária tanto à criação e recepção de uma fotografia como aos lugares de fala e de escuta presentes na cena psicanalítica. Penso que, frente à arte e à clínica, lugares de plena inventividade, há que autorizar-se. A seguir, narrarei um pequeno vestígio de uma escuta clínica compartilhada em um processo de supervisão, o qual talvez contribua com esta reflexão acerca da temporalidade na fotografia e na psicanálise.

Nina é uma estudante universitária com pouco mais de vinte anos de idade. Lúcia, a quem foi designada sua escuta, é uma jovem estagiária de psicologia clínica. Em relação ao motivo da busca por atendimento psicoterápico, Nina afirmou: “não tenho foco”. Nesse sentido, queixou-se da dificuldade em se concentrar nos estudos, mencionando o desejo de receber de Lúcia alguma ajuda pontual, como dicas de “tarefas para concentrar”, e um diagnóstico que desse nome ao seu sofrimento, confirmando sua suspeita de “ter TDAH”. A rotina de Nina era atravessada por constantes intrusões por parte de seus pais que, mesmo à distância, cobravam-na em relação aos estudos e a outros temas. No tempo em que residiam juntos, conforme o relato, falavam o que tinha que fazer e controlavam os tempos destinados às atividades de Nina, mesmo na vida adulta. Ainda que se sentisse incomodada com a falta de tempo e de espaço (que atualmente dividia com o namorado), considerava não ter o direito de se queixar.

Nas primeiras sessões, relatou que não se sentia “merecedora das coisas boas que o mundo oferece”, e que carregava muita culpa por não estar rendendo o esperado nos estudos, considerando o compromisso de atuar na empresa familiar após a formatura e a vontade de dizer verdades às pessoas. Além disso, considerou que também carregava muita raiva, o que atribuiu às coisas que não poderiam ser ditas por respeito aos mais velhos. Certa vez, narrou um evento ocorrido em sua infância, o qual, para ela, permanecia sem explicação: a lembrança de um belisco que recebeu de uma tia quando tinha cinco ou seis de idade. O castigo aconteceu depois que contou à tia uma história engraçada, que tinha ouvido e repetido sem entender o significado das palavras. No momento do relato, Nina não lembrava do que tratava a história.

O processo de psicoterapia de Nina com Lúcia aconteceu ao longo de oito meses, sendo encerrado por conta da finalização do estágio acadêmico. Nesse período, Lúcia considerou que, não raras vezes, percebeu-se transferencialmente colocada em pelo menos duas posições, e ambas remetiam à relação de Nina com seus pais: de um lado, havia a demanda de que ocupasse um lugar de quem nomeia as coisas, os tempos e ajuda no estabelecimento de rotinas. De outro, sentia-se impulsionada a oferecer, na psicoterapia, um tempo e um espaço um tanto mais livres de intervenções (“Tem horas que dá um aperto, e as palavras pesam. É quando ofereço o meu silêncio”, disse Lúcia). Em certo sentido, a escuta de Nina pautou-se na tentativa de equilibrar os dois lugares, aceitando a demanda por palavras e ajuda na organização dos estudos, bem como oferecendo um ambiente em que isso ocorresse de maneira um pouco menos intrusiva e no qual o tempo compartilhado pudesse, de alguma forma, abrir espaços para o desejo e a criatividade, para o seu vir-a-ser. Em supervisão, relatou que, mais de uma vez, desejou perguntar a Nina sobre o seu desejo em relação às escolhas presentes, sendo barrada pelo sentimento de que se o fizesse a estaria atropelando, estaria fora do tempo.

Por conta da iminente formatura de Lúcia, após um processo gradativo de encerramento, Nina passou a ser atendida por Flora. Transferencialmente, a relação parecia se caracterizar por uma ligação de Flora a aspectos mais amadurecidos de Nina, quando comparados ao primeiro período de psicoterapia: a demanda por ajuda em relação aos estudos já não se fazia tão presente, mas, sim, referências ao desejo de autocuidado e independência. Em duas sessões com Flora, Nina mencionou o evento do castigo imposto pela tia. Na primeira vez, era, de fato, uma novidade para a nova psicoterapeuta, e alguns detalhes sobre a situação, como a lembrança de que a história contada se relacionava a um chiste sobre sexualidade, que Nina ouviu e repetiu sem saber que poderia ser ofensivo, foram explorados. Na segunda vez, porém, vários meses depois, contou o mesmo evento como se nunca o houvesse feito. Tão logo repetiu a narrativa, permaneceu um longo tempo em silêncio. A seguir, relatou que vinha pensando sobre o sentido de certas coisas, como a realização do seu curso universitário (“eu tenho pensado no que significa para mim, no que eu quero fazer com isso... as coisas parecem mais nítidas”). A partir disso, relatou algumas possibilidades de trabalho muito criativas, as quais se diferenciavam da proposta original da empresa familiar. Em supervisão, Flora afirmou: “Não sei bem o que ocorreu enquanto ela explicava sobre esses planos, mas me parece que aconteceu um salto, uma quebra, e quando percebi meus olhos estavam marejados”.

Consideramos que naquele momento, após a repetição da narrativa da cena do belisco, poderia ter ocorrido uma espécie de ruptura no discurso. Ainda que um corte não tenha sido proposto pela psicoterapeuta, discutiu-se a possibilidade da ocorrência de um estremecimento, uma rachadura - utilizando aqui o termo lacaniano - ou a inauguração de um gesto espontâneo, nos termos de Winnicott, e que este teria sido apreendido de forma sensível e não verbal pela psicoterapeuta. Ao longo das escutas, Flora constatou que o tema da dificuldade para encontrar foco foi cedendo espaço a narrativas sobre eventos nos quais Nina se posicionava em relação aos pais, na tentativa de fazer valer a sua opinião.

Ao fim deste breve relato, tomando a escuta de Nina como quem olha para uma obra de arte, retorno à proposição de Dubois (1993)Dubois, P. (1993). O ato fotográfico e outros ensaios. (M. Apenzeller. Trad.). Papirus. acerca das perguntas que se colocam na contemplação de uma fotografia, a saber: O que está representado? Como aconteceu? Como é percebido?. Considerando que as respostas invariavelmente me escapam, atenho-me à sua afirmação de que descrever uma obra a partir de um ponto de vista de espectador significa apreender o processo pelo qual tal obra foi fundada. Em relação a isso, dentre tantas imagens que se abrem diante desta escuta, atento, nesta breve análise, para a representação de Nina sobre a violência perpetrada pela tia. Ocorre-me, inicialmente, ter em conta a formulação freudiana sobre a existência de um espaço psíquico cujos conteúdos não se veem alterados pelo decorrer do tempo: ao propor o conceito de Nachträglichkeit, Freud possibilitou uma compreensão do trauma em tempos distintos, evidenciando que as marcas mnêmicas ganham novas formas no a posteriori (Freud, 1933/2010bFreud, S. (2010b). A dissecção da personalidade psíquica. In O mal-estar na civilização; Novas conferências introdutórias à psicanálise e outros textos. (Vol. 18, pp. 90-18; Paulo César de Souza, Trad.). Companhia das Letras (Trabalho original publicado em 1933).). Nessa perspectiva, a consideração da noção de après-coup permitiria a inferência de que um evento traumático vivido por Nina em um momento do seu desenvolvimento no qual possivelmente não reunia condições para integrá-lo, encontrou, ao longo do processo de psicoterapia, um caminho para uma atualização posterior, tornando possível a ressignificação da experiência: talvez, agora, fosse um tanto mais possível “dizer coisas aos mais velhos”, compreender os sentidos das palavras pronunciadas e enunciar seu desejo sem que isso resultasse em um desfecho como o vivido com a tia.

É possível pensar que a cena do castigo físico figurasse para Nina como um certificado de presença no tempo frente a um referente que já não existe, o isso-foi, conforme Barthes (1980/2018)Barthes, R. (2018). A câmara clara: nota sobre a fotografia (7ª ed.; Júlio Castañon Guimarães, Trad.). Nova Fronteira. (Trabalho original publicado em 1980). em sua análise sobre a fotografia. Contudo, seu processo de psicoterapia também remete às considerações de Soulages (2010)Soulages, F. (2010). Estética da fotografia: perda e permanência. Editora Senac. acerca do isso foi encenado e aos três tempos implicados na criação fotográfica - a captura do objeto, o trabalho com o negativo e a transformação em obra: ainda que o ato fotográfico/evento traumático seja irreversível (perda), o processo posterior com o negativo/representações é inacabável (permanência), e sua repetição poderá gerar algo potencialmente diferente. No processo psicoterápico de Nina, onde havia repetição tornou-se possível uma nova narrativa, uma nova escrita acerca da própria história. Em relação a isso, a afirmação de Berger acerca do abismo existente entre o momento do registro fotográfico e o presente parece-me inestimável nesta interlocução entre fotografia e psicanálise:

(...) na vida, significados não são instantâneos (...) Sem uma história, sem um desenrolar não há significado (...) quando atribuímos significado a um evento, ele é uma resposta não apenas ao que é conhecido, mas também ao que se desconhece: significado e mistério são inseparáveis, e nenhum deles pode existir sem o decorrer do tempo. A certeza pode ser instantânea; a dúvida requer uma duração; o significado nasce das duas. (pp. 90-91)

A escuta de Nina pautou-se na compreensão da necessidade do desenvolvimento de um ambiente suficientemente bom, no qual a duração e continuidade nos cuidados, no tempo e no espaço, possibilitasse, gradativamente, sua caminhada rumo à independência, em acordo com os pressupostos de Winnicott (1963/1983)Winnicott, D. W. (1983). Da dependência à independência no desenvolvimento do indivíduo. In O ambiente e os processos de maturação: estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional (pp. 79-87; Trad. I. C. S. Ortiz). Artmed. (Trabalho original publicado em 1963).. Porém, entendo que em algum momento inaugurou-se algo de ruptura e descontinuidade, um corte, um achado ou reachado produzido na hiância, conforme proposto por Lacan (1964/2008)Lacan, J. (2008). O seminário. Livro 11. Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (2ª ed.) (Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. M. D. Magno, Trad.). Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1964).. Esse olhar para o processo psicoterápico de Nina aponta para a proposição de Gondar (2006)Gondar, J. (2006). Winnicott, Bergson, Lacan: tempo e psicanálise. Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica, 9, 103-117. https://doi.org/10.1590/S1516-14982006000100008
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sobre a importância de se atentar mais ao tipo de sofrimento do analisante que à afiliação teórica do psicoterapeuta - no que se refere a privilegiar intervenções voltadas à continuidade ou a descontinuidade.

O tempo que escapa

Para finalizar este ensaio, reitero a concepção de Rivera (2017)Rivera, T. (2017). Dossiê Arte e Psicanálise: O avesso do imaginário. Revista Cult, 20(225), 34-37. https://revistacult.uol.com.br/home/o-avesso-do-imaginario/
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de que, a despeito dos autores visitados, o isso não se deixa capturar por palavras: ele escapa à teoria, e esta só poderá avançar a partir da arte. Tal afirmação me faz pensar que a sensação de desaparecimento que me ocorre tendo nas mãos uma câmera, descrita no começo deste trabalho, é muito semelhante a que sinto diante da cena psicanalítica, quando dimensões inauditas de tempo e espaço parecem se abrir à escuta e ao olhar.

Por um instante, ao contribuir com o debate sobre o enlace entre fotografia e psicanálise a partir de uma análise sobre a dimensão temporal nos dois campos, tenho a sensação de ter entre as mãos um pequeno achado. Contudo, como postulou Lacan, todo achado terá um destino: o de escapar novamente, instituindo a perda. Como um peixe que escapasse a um pássaro.

Referências

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  • André, J. (2008). O acontecimento e a temporalidade: O après-coup no tratamento. Ide - psicanálise e cultura, 31(47), 139-167. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31062008000200025&lng=pt&tlng=pt
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    19 Set 2022
  • Aceito
    08 Mar 2023
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