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Trombocitopenia e leptospirose

O propósito do presente trabalho é colaborar para o estudo da patogenia da plaquetopenia que ocorre na Leptospirose. A pesquisa foi feita de maneira prospectiva e o grupo de casos foi constituído por 30 pacientes internados com hipótese diagnostica de Leptospirose na Clínica de Doenças Infecciosas e Parasitárias do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Investigou-se a possibilidade de haver consumo de plaquetas por coagulação intravascular disseminada, ou a possibilidade de destruição periférica de plaquetas por anticorpos e, se poderia haver inibição da produção de plaquetas em nível medular. Para a investigação desejada foram utilizados os seguintes exames: contagem de plaquetas, tempo de protrombina, tempo de recalcificação, tempo de trombina, tempo de tromboplastia parcial ativada, dosagem do fibrinogênio, dosagem do fator V, dosagem do fator VIII, dosagem dos produtos de degradação da fibrina, dosagem da antitrombina III, mielograma e pesquisa de anticorpos antiplaquetas. Foram ainda estudados o hemograma, a dosagem de uréia, a dosagem de creatinina, a dosagem das enzimas hepáticas (aspartatoaminotransferase, alaninaaminotransferase, desidrogenase láctica, gamaglutamiltranspeptidade e fosfatase alcalina), e a dosagem das bilirrubinas. A análise dos dados obtidos no presente trabalho permitiu-se chegar às seguintes constatações e conclusões: 1ª) A plaquetopenia é freqüentemente encontrada na forma grave de Leptospirose ocorrida em nosso meio (86,6%). 2ª) A plaquetopenia da Leptospirose não parece ser mediada por anticorpos antiplaquetas. 3ª) A avaliação dos dados obtidos não mostrou haver evidências clínicas e laboratoriais de ocorrência de coagulação intravascular disseminada. 4ª) Verificou-se existência da relação de dependência entre a plaquetogênese medular e a contagem de plaquetas no sangue periférico (P = 0,0261). A possibilidade de haver inibição da plaquetogênese medular por algum produto bacteriano (toxina) não pode ser totalmente afastada, porém acreditamos que o exame estático da medula óssea não pode dar-nos uma idéia precisa do mecanismo dinâmico da formação de plaquetas na presença de "consumo periférico". 5ª) Embora a plaquetopenia possa representar um fator contribuinte para a síndrome hemorrágica, não chegamos a uma diferença estatisticamente significativa entre a contagem das plaquetas nos pacientes plaquetopênicos que sangraram e nos que não apresentaram sangramento. 6ª) Na maioria dos casos (86,3%) a normalização da contagem das plaquetas ocorreu no período de sete dias após a internação. 7ª) Não houve diferença significativa entre as médias dos tempos de normalização da contagem de plaquetas nos pacientes que apresentaram e nos que não apresentaram sangramento. 8ª) Houve diferença significativa, entre as médias das contagens das plaquetas nos pacientes de níveis séricos menores e os níveis séricos mais elevados de uréia, sendo maior no primeiro grupo (t22 = 1,818 > t22:0.05 = 1,717). 9ª) A média do nível sérico dos pacientes que apresentaram sangramento foi maior do que a média do nível sérico de uréia dos pacientes que não sangraram, podendo-se afirmar que a uremia contribui para agravar o quadro hemorrágico na Leptospirose. A vasculite deve ser considerada como fator mais importante na patogênese dos distúrbios hemorrágicos da Leptospirose1,2,8,23, porém, acreditamos que a trombocitopenia, a uremia e os distúrbios da coagulação, isoladamente ou em conjunto, devem ser incluídos entre os fatores que agravam o quadro hemorrágico o qual representa hoje a principal causa de óbito na doença.


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