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FUNDAMENTOS INDUSTRIAIS DA ESTABILIDADE MACROECONÔMICA PARA O DESENVOLVIMENTO

FOUNDATIONS OF MACROECONOMIC STABILITY FOR DEVELOPMENT

RESUMO

David Kupfer deixou aos economistas industriais e aos interessados nos problemas do desenvolvimento brasileiro um legado acadêmico inspirador e estimulante, com perguntas relevantes e respostas, ou pistas, muito persuasivas. Orientou pessoas e produziu estudos que representam contribuições originais à compreensão de problemas complexos do desenvolvimento brasileiro, em especial à indústria. Um deles é o nível insuficiente e a qualidade deficiente dos investimentos industriais no Brasil no período recente. Por que são medíocres - no volume e na qualidade - os investimentos na economia brasileira? O artigo parte do nó dos baixos investimentos e procura alargar a perspectiva para mostrar que eles serão pífios se não houver um esforço coordenado de superação do atraso industrial: não há investimentos suficientes hoje porque não houve investimentos apropriados no passado e, com isso, o atraso preexistente aumentou. Nenhum investimento, em bases exclusivamente competitivas, será capaz de cercar-se das garantias de rentabilidade que outras atividades de produção (mineral, agropecuária), de comércio (varejo físico) e de serviços (energia, infraestruturas de transportes), além das estritamente financeiras, são capazes de prover. A estabilização macroeconômica só poderá acontecer com esforços concomitantes de reconstrução das bases microeconômicas, do tecido empresarial que forma o sistema produtivo e a lógica da indústria.

PALAVRAS-CHAVE:
Indústria; desenvolvimento; desindustrialização; política industrial; estabilização

ABSTRACT

David Kupfer left industrial economists and those interested in the problems of Brazilian development an inspiring and stimulating academic legacy with relevant questions and very persuasive answers or clues. He has guided people and produced studies that have given original contributions to the understanding of complex problems in Brazilian development, especially manufacturing. Insufficient level and deficient quality of industrial investments in Brazil in the recent period was one of those questions. Why are investments in the Brazilian economy mediocre - both in volume and quality? The article starts from the knot of low investments and seeks to broaden the perspective to argue that they will remain meager if no coordinated effort is made to overcome industrial backwardness: there are not enough investments today since there were no appropriate investments in the past and, thus, pre-existing lags increased. No investment, on an exclusively competitive basis, will be able to surround itself with the guarantees of profitability that other production activities (mineral, agricultural), trade (face-to-face retail), and services (energy, transport infrastructure), in addition to strictly financial, can provide. Macroeconomic stabilization can only happen with concomitant efforts to rebuild the microeconomic bases, the business and institutional fabric that make up the production system and the manufacturing logic.

KEYWORDS:
Industry; development; de-industrialization; industrial policy; stabilization

APRESENTAÇÃO1 1 A redação do artigo beneficiou-se de leituras e sugestões valiosas. Agradeço a Alexandra Almeida, Orlando Martinelli e Thor Ribeiro. Por fim, reconheço a importância das contribuições de dois pareceristas da Revista Economia Contemporânea, cujas críticas foram úteis para esta versão.

O argumento principal deste artigo cabe em poucas palavras: é imprudente pensar uma política macroeconômica que não esteja alicerçada em uma correta compreensão dos problemas microeconômicos que fragilizam o funcionamento da economia brasileira. Para que não haja mal-entendidos, é preciso deixar claro, desde o início de nossa análise, que os problemas microeconômicos para os quais chamamos atenção aqui, e sem a consideração dos quais, como tentaremos demonstrar, qualquer política de desenvolvimento pode estar fadada ao fracasso, não há nenhuma relação com o approach convencional que reivindica a necessidade de se encontrar “os fundamentos microeconômicos” da macroeconomia. Nessa abordagem, constitutiva da macroeconomia “novo-clássica”, trabalha-se com a figura do “agente representativo”, numa operação que visa mostrar a não necessidade de políticas macroeconômicas voltadas ao desenvolvimento. Aqui, ao contrário, vamos discutir a racionalidade empresarial considerada em sua singularidade, para, a partir daí, sugerir medidas que deem consistência às políticas macroeconômicas voltadas ao desenvolvimento2 2 Agradeço à Leda Paulani pelas observações críticas e sugestões que permitiram superar uma dubiedade grave neste ponto. .

Os problemas da estrutura produtiva dizem respeito a um conjunto de debilidades herdadas do período de crescimento acelerado (1930-1980, especialmente 1950-1980) e aprofundadas no período posterior (1980-2020). A crise da economia brasileira, que apareceu de modo explícito no final dos anos 1970 e foi se tornando mais evidente e reconhecida nas décadas seguintes, é um acerto de contas com o nosso passado, com as escolhas que fizemos no período de crescimento acelerado (1930-1980). Mas, enquanto tantas abordagens buscam em elementos externos as razões da crise, procuramos essas raízes internamente, na própria estrutura produtiva, em suas dinâmicas competitivas e nas fragilidades associadas. É assim que queremos ajudar na reflexão rica deixada por David Kupfer.

O crescimento esteve em harmonia com os elementos mais fundamentais e estruturantes da economia e da sociedade brasileira - longevos e profundamente enraizados, modificáveis apenas com grandes dificuldades e enfrentando resistências quase pétreas. Entre esses parâmetros, o destaque é a propriedade concentrada, raiz do poder econômico desmesurado e das escolhas que foram sendo feitas persistentemente ao longo do século XX, sempre em desfavor do trabalho e, portanto, da produtividade. A prevalência de abordagens estritamente macroeconômicas para os problemas brasileiros leva a soluções insuficientes, inadequadas, ineficazes, como mostraram tantas experiências de planos econômicos nos anos 1980 e 1990, até que o Plano Real promoveu a estabilização dos preços ao custo de um brutal desalinhamento das taxas de câmbio e juros Apesar daquelas que consideramos serem falhas da abordagem dominante, de várias orientações teóricas e afiliações políticas, é nela que persistimos há longos - e desanimadores - quarenta anos. Os ciclos curtos, ou curtíssimos, de crescimento e as deformações do padrão - com relação ao padrão industrial internacional - são o resultado mais evidente.

O enunciado do argumento cabe em poucas palavras, mas a argumentação demanda um esforço sistemático. Quem sabe se uma demonstração mais fundamentada, além da argumentação persuasiva e a sensibilização, não surge desta reflexão, pelas mãos de outras pessoas, em um esforço que precisa ser federativo, compartilhado e coletivo, prosseguindo o legado de David Kupfer que se dedicou a essa questão crucial?

É inócuo pensar em uma política macroeconômica desvinculada de uma profunda reestruturação microeconômica, dos padrões de produção e de competição. Talvez seja mesmo nocivo. Os macroeconomistas da corrente dominante, e sobretudo aqueles do seu núcleo duro, acreditam ser possível estabilizar a economia - o que quer que isso seja - para que os mercados, com preços adequados e expectativas consistentes - o que quer que isso signifique -, voltem a funcionar e promovam o crescimento. A economia estaria estabilizada desde 1994, mas o crescimento é pífio desde então. De fato, infelizmente, o que 1994 introduziu no cenário foi uma relativa - e precária - estabilidade dos preços de mercadorias e serviços, mas a custa de um desajuste persistente dos principais preços do sistema econômico - juros e câmbio, em especial.

Os economistas heterodoxos, de afiliação keynesiana, preferem apontar para a insuficiência da demanda efetiva e consequentemente para a necessidade de provisão de estímulos adicionais (investimentos e dispêndios públicos) para restabelecer o crescimento, induzindo os investimentos privados e, por seus efeitos, o emprego e o consumo. O impulso de demanda pode dar-se com uma ênfase maior nos gastos sociais ou nos demais elementos (infraestrutura, por exemplo), mas são vertentes de uma concepção idêntica no fundamental. Não foi justamente uma grande injeção de demanda que fizeram, de formas muito diferentes, os governos nos primeiros anos deste século, após 2008 sobretudo, como havia feito antes, em 1986, o Cruzado, e, em 1994, o Real? Nenhuma injeção de demanda, por grandiosa que seja, poderá revigorar as respostas de um sistema produtivo fragilizado por déficits de competitividade que se tornaram paralisantes. Sem que a resposta aos estímulos de demanda alcance o investimento disseminado, não haverá crescimento. O nó não é a demanda, é a tibiez da resposta à demanda.

Os novo-desenvolvimentistas preferem sustentar que uma mudança dos preços relativos é condição para restaurar a competitividade do sistema industrial, alimentando a produção doméstica com a recuperação de fatias de mercado interno perdidas para importações mais baratas e, ao mesmo tempo, o aumento das exportações3 3 Carlos Medeiros publicou um artigo elucidativo — e muito assertivo — sobre a insuficiência da taxa de câmbio para assegurar uma retomada do crescimento (MEDEIROS, 2020). Leda Paulani (2017) fez uma revisão criteriosa dos termos novo-desenvolvimentismo, sociodesenvolvimentismo e neodesenvolvimentismo. .

As insuficiências e deficiências de cada uma dessas abordagens cristaliza o problema que ocupou as reflexões de David Kupfer após 1994: Como promover o desenvolvimento industrial brasileiro e a criação de estruturas vigorosas e dinâmicas para um processo sustentado de transformação dos segmentos industriais e das demais atividades (primária e terciária)? O crescimento não pode vir exclusivamente de elementos externos ao sistema, tem também que alimentar-se da própria dinâmica. Na economia de mercado, no capitalismo, e sobretudo em uma economia com as dimensões - territoriais, econômicas e diversidade - da brasileira, o vigor duradouro tem que estar alicerçado em competição, investimentos transformadores, novas tecnologias, abertura de fronteiras expansivas. O investimento é insubstituível. E o investimento, sabemos, pode ter elementos preponderantemente keynesianos (associados à demanda efetiva) ou schumpeterianos (associados à competição tecnológica).

Desenvolvemos o argumento de que as diferentes concepções macroeconômicas estão de costas para as realidades das diferentes indústrias e os mercados, para a estrutura real da economia brasileira, para as transformações que ela sofreu e também para aquelas que deixou de promover, empobrecendo-a e enfraquecendo-a, afastando-a ainda mais das trajetórias da maior parte das bases industriais - velhas e novas - do mundo todo. Não podemos esquecer que o Brasil completou, exangue e convulsionado, o II Plano Nacional de Desenvolvimento (1975-1979), e que ele apenas concluía, aos tropeços, a base produtiva da segunda revolução industrial - simplificadamente, os setores de escala de insumos básicos e energia - quando o mundo se lançava à terceira - da microeletrônica, informática, da flexibilidade e da inovação acelerada. Independentemente da visão positiva ou crítica que se tenha do II PND, que ocupou imensas páginas de artigos, teses, livros, e selou a ruptura de amizades de vidas que já duravam décadas, é forçoso reconhecer que ele criou novas fontes de exportações e substituiu importações, alimentando com isso a ilusão de uma indústria competitiva4 4 A interpretação de António Castro e Francisco Souza terá sido a mais enfática defesa dos resultados do II PND, enquanto Carlos Lessa fez uma crítica que reduz o plano a um misto de sonho e fracasso. .

O reconhecimento das fragilidades da estrutura produtiva é condição indispensável para a compreensão dos fracassos das diferentes abordagens macroeconômicas: elas são incapazes, por insuficiência, de restabelecer condições minimamente aceitáveis de funcionamento da economia. A razão para essa impossibilidade está diretamente ligada à reflexão que diversos autores, mas sobretudo David Kupfer, fizeram há muito tempo - e no caso de Kupfer desde o final dos anos 1990, após o Estudo da competitividade da indústria brasileiraCOUTINHO, L.; FERRAZ, J. C. Estudo da competitividade da indústria brasileira. Campinas: Papirus, 1994. 5 5 Projeto contratado pelo governo federal a um consórcio de universidades brasileiras, com participação de diversos organismos nacionais e internacionais, para estudar caminhos acerca do restabelecimento da competitividade da indústria. Coordenado por Luciano Coutinho e João Ferraz, o consórcio produziu uma centena de documentos e muitas proposições. David Kupfer foi uma das pessoas mais laboriosas desse grande projeto. (COUTINHO; FERRAZ, 1994COUTINHO, L.; FERRAZ, J. C. Estudo da competitividade da indústria brasileira. Campinas: Papirus, 1994.), do Made in BrazilFERRAZ, J. C.; KUPFER, D.; HAGUENAUER, L. Made in Brazil: Desafios competitivos para a indústria. Rio de Janeiro: Campus, 1995. 6 6 Esse livro, em coautoria com Lia Haguenauer e João Ferraz, é em parte produto do Estudo da competitividade, mas os autores acrescentaram a ele reflexões muito relevantes. (FERRAZ; KUPFER; HAGUENAUER, 1995)FERRAZ, J. C.; KUPFER, D.; HAGUENAUER, L. Made in Brazil: Desafios competitivos para a indústria. Rio de Janeiro: Campus, 1995. e da sua tese de doutoramento (KUPFER, 1998)KUPFER, D. Trajetórias de reestruturação da indústria brasileira após a abertura e a estabilização. 1998. Tese (Doutorado em Economia da Indústria e da Tecnologia) - Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1998.: por que razão a economia brasileira tem sido incapaz de sustentar investimentos em volume e qualidade para ciclos de expansão típicos, com difusão de efeitos dinâmicos e retroalimentação?

A resposta a essa questão crucial remete a três elementos conjugados, que se articulam de forma perversa para produzir um movimento de aversão ao investimento industrial concomitante a uma fuga para áreas onde predominam vantagens competitivas estáticas, ou áreas em que os déficits competitivos anteriores podem ser preenchidos sem terem que enfrentar o avanço simultâneo de uma fronteira internacional em movimento. O primeiro é o sistema industrial que herdamos do período (dito) “de ouro” da industrialização brasileira, de 1930 a 1980. O segundo é a crise que se sucedeu ao esgotamento daquela trajetória, em boa medida desencadeada - mas não determinada - pela combinação de fatores externos e internos. O terceiro elemento consiste no modelo da estabilização de 1994. É a partir desses três elementos, com destaque para o primeiro, que o sistema industrial brasileiro e as suas fragilidades precisam ser pensadas. Sem essa consideração, a política macroeconômica estará fadada a sucessos limitados e fracassos irrecorríveis.

1. A ESTRUTURA DA ECONOMIA BRASILEIRA E AS DIFICULDADES DA MACROECONOMIA DOMINANTE

É ingênuo pensar em uma economia capaz de prover os brasileiros de produtos de qualidade e empregos portadores de qualidade de vida e prosperidade sem uma modificação substancial da estrutura produtiva - da economia e, em especial, da indústria. Sem isso, os empregos serão insuficientes e de precária qualidade, a gama de produtos fabricados e de serviços prestados será pobre e inadequada aos anseios das famílias e das pessoas, a balança comercial será insustentável - apesar das ilusões dos produtos primários - e o nosso hiato com os países desenvolvidos, incluindo a China e outros em ascensão, será crescente.

Podemos iniciar a demonstração dessa proposição pela produtividade, elemento tão maltratado no nosso debate econômico e, sobretudo, na comunicação do establishment com o público. Afinal, o que é a produtividade que as lideranças empresariais e do capital utilizam regularmente em suas manifestações sobre os problemas da economia brasileira e da indústria?

A produtividade (dita) do trabalho é um conceito complexo traduzido em uma expressão matemática simples: o quociente entre a produção e o trabalho que se utiliza nessa produção. Com ferramentas adequadas produz-se mais do que se produz com ferramentas precárias. No capitalismo brasileiro, mais do que em outros, a decisão sobre as ferramentas e as máquinas é tomada pela direção da empresa, não pelo trabalhador. A produtividade do trabalho depende principalmente das estruturas técnicas e das decisões das empresas e apenas secundariamente do desempenho do trabalhador7 7 O reconhecimento dessa afirmação vem até de vozes insuspeitas, integrantes da linha de frente do pensamento dominante e conservador: “Por que, apesar de a escolaridade média crescer 3% a.a., a produtividade cresce 1% a.a.? A resposta está em nossa dificuldade em prover a esse trabalhador mais qualificado ocupações que lhe permitam usar as habilidades adquiridas. O jovem trabalhador estudou mais que seus pais, mas as ocupações que ele encontra disponíveis não são tão mais produtivas” (PINHEIRO, 2021). Existe uma vasta bibliografia que dá apoio a essa interpretação. Os trabalhos de Fajnzylber e de Tavares citados na bibliografia constituem uma base importante. .

Os economistas medem a produtividade dividindo o valor do produto (valor bruto da produção descontado do consumo intermediário - matérias primas e insumos) pelo trabalho empregado. Essa medida pode ser expressa com um quociente bem simples:

Produtividade do trabalho = valor do produto / número de trabalhadores empregados na produção

É evidente que o valor da produção está determinado pela quantidade do que produz (e vende) e pelas qualidades (em sentido muito amplo) dos produtos, pois elas incluem todos os atributos que permitem obter determinados preços no mercado.

Valor da produção = quantidade de produtos × preço no mercado desses produtos

Se a empresa tem uma estratégia de desenvolvimento tecnológico e de inovação regular e sistemática, ela consegue preços mais elevados pelos seus produtos. Se ela está protegida da concorrência externa ou de competidores locais, poderá impor, no mercado, reconhecimento na forma de preços mais elevados. E, se ela tem poder de mercado, independentemente de ser ou não inovadora, poderá auferir vantagens de preços elevados. Seja fruto de dinamismo tecnológico e inovação, ou de puro e simples poder de mercado. Esses fenômenos aparecem na produtividade e o analista sereno e minucioso terá que esmiuçar a situação concreta para destrinchá-la e apreciar o seu significado.

Quando a empresa tem poder para impor aos seus fornecedores preços e condições de compra mais favoráveis para ela, isso ajuda a elevar a diferença entre o valor da produção e os custos dos materiais. A elevada produtividade da empresa fabricante de uma matéria prima explica a baixa produtividade das milhares de pequenas empresas que dela dependem, quando os preços praticados refletem o poder assimétrico. Portanto, não é só a eficiência produtiva, como o uso do termo sugere, que determina ou influencia a produtividade. O poder econômico e a falta dele também se escondem na produtividade. As assimetrias de poder econômico são um determinante da produtividade econômica das empresas.

Mais grave do que essa relativa falta de clareza do termo produtividade, que elide os seus elementos determinantes, é que ela se presta a equívocos e contorcionismos verbais deliberados. As vozes empresariais que pretensamente representam as indústrias8 8 Na verdade, representam os grandes industriais e o capital que controla as empresas industriais, mas não propriamente a indústria, posto que os demais envolvidos (consumidores, trabalhadores, comunidades) não estão em nenhuma hipótese representados. usam recorrentemente o termo produtividade para denunciar, em ladainha cansativa, as agruras deste país tão inóspito, sobretudo as que estão relacionadas com a má qualidade da educação.

Infelizmente, para esse contorcionismo que manipula palavras a bel-prazer, sabemos que a produtividade é, no Brasil, uma decisão essencialmente empresarial, quer dizer, das direções das empresas, quando realizaram os seus investimentos em fábricas, máquinas, instalações, processos e produtos. Essas são, no Brasil, decisões exclusivamente das direções das empresas e dos seus controladores (proprietários, acionistas, fundos)9 9 Em 2021 foram instalados 380.911 robôs industriais no mundo e, no Brasil, esse número foi 1.702 (ou 0,44%). Uma ilustração de um fenômeno de grande amplitude. Robôs elevam a produtividade. . E, se enfatizamos aqui o fato de que isso é assim no Brasil, é porque, em muitos outros países - e sobretudo naqueles que têm indústrias fortes e com elevada produtividade, embora respeitadores da propriedade privada e do mercado -, os trabalhadores participam, por lei ou acordos sociais, da formulação das estratégias das empresas e da sua operacionalização. As decisões compartilhadas fortalecem o sistema industrial.

O detalhe mais perturbador desse argumento que as representações empresariais das empresas da indústria utilizam sobre a “baixa produtividade do trabalho”, com o dedo acusador apontado aos trabalhadores, é que elas são controladoras do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), a instituição monopolista da formação profissional para a indústria, criada por Getúlio Vargas há quase oitenta anos, e ainda hoje financiada com recursos públicos. Aliás, criada nesse modelo contra a opinião e a vontade do seu titular da Educação, o longevo ministro Gustavo Capanema10 10 Simon Schwartzman e seus coautores dedicaram um capítulo de Tempos de Capanema a esse episódio, mas o relato mais aprofundado e circunstanciado que foi produzido sobre esse tema crucial da vida política brasileira é de Barbara Weinstein em seu magistral A (re)formação da classe trabalhadora do Brasil. .Se a capacitação dos trabalhadores tem algum peso direto na produtividade, mesmo que seja menor do que dizem as vozes públicas da indústria, então ela é responsabilidade das instituições empresariais, pois são elas que - no Brasil, e apenas no Brasil - monopolizam a formação dos trabalhadores para a indústria11 11 Foram três grandes empresários-capitalistas brasileiros (PASSOS; WONGTSCHOWSKI; PIVA, 2017) os autores da mais devastadora crítica das instituições que regem a gestão dos 20 bilhões de reais de recursos fiscais que irrigam as ações empresariais em formação profissional e muitas outras, nem sempre tão aderentes à finalidade. Os dezessete anos do último presidente da federação dos industriais de São Paulo são ilustrativos. . Quando as entidades empresariais organizaram (logo após o impedimento da presidente Dilma) a supressão de direitos trabalhistas dos assalariados, em mais uma reforma redentora, destinada agora a superar uma legislação “atrasada” da era getulista, esqueceram-se convenientemente de suprimir também essa exceção brasileira e preservaram esse aspecto da herança dos anos 1940.

Dentre as frases perturbadoras repetidas pelos porta-vozes dos capitalistas-empresários em relação ao assunto tecnologia está a de que não vale a pena inventar a roda, é melhor comprar a tecnologia ou até mesmo o produto. Desenvolver teria apenas desvantagens: difícil, caro, lento12 12 A meu conhecimento, o primeiro autor que se ocupou desse tema como pesquisa foi Nathaniel H. Leff (1968). Segundo Leff (1968, p. 94): “When the sector’s firms are asked why, for technical knowledge, involving a major discontinuity with their previous work, they have preferred to import know-how rather than develop it themselves, they usually reply that such a procedure would be ‘too difficult’, ‘too expensive’, or ‘too slow’”. Se o setor de bens de capital, objeto de estudo de Leff e cérebro do setor industrial, prefere comprar a desenvolver, os efeitos associados a essa opção são disseminados sobre o setor industrial e as demais atividades usuárias dos equipamentos. .Os três adjetivos parecem razoáveis, mas eles traem a natureza do problema: investimentos em tecnologia são difíceis, caros e lentos, os dirigentes empresariais e os capitalistas que controlam essas empresas preferem alternativas fáceis, baratas e rápidas. Os seres humanos sabem aonde levam as escolhas pela facilidade, o barato e o rápido. A indústria brasileira também.

Tal como um grande artista não alcança a beleza ou a perfeição por magia, muito menos instantaneamente, uma empresa não desenvolve soluções originais sem um persistente esforço de repetição, em prol do domínio dos elementos constitutivos de seus processos, pois é o domínio exímio das técnicas que permite combiná-las em soluções originais13 13 Brian Arthur (2009) apresentou o argumento da importância da combinação de elementos conhecidos para soluções originais. Alice Amsden (1989) e Robert Wade (1990) mostraram o caminho asiático do aprendizado. Keith Pavitt (1984) destrinchou a importância dos diferentes setores na construção sistêmica da produtividade. Linsu Kim (2005) descreveu o caminho coreano da imitação à inovação. . Diversidade e complexidade são fenômenos muito diferentes, porque a complexidade envolve a capacidade de produzir soluções originais. A inequívoca e quase generalizada opção das grandes empresas industriais brasileiras pelo pacote tecnológico completo e pronto e pelo dispêndio mínimo no exercício tecnológico próprio são escolhas exclusivamente de responsabilidade das empresas.

Essa fórmula vigorou por décadas e, mesmo depois de ter-se mostrado tão errada e tão nefasta, continua a ser praticada em todos os segmentos da indústria. O número de pedidos de patentes no Brasil é modesto (menos de 25 mil, em 2018, contra mais de 1,5 milhão na China), e o sintoma se reforça com a constatação de que uma em cada cinco patentes é submetida por nacionais, e quatro por estrangeiros - uma evidência que contrasta com outros países: na China, nove de cada dez patentes submetidas são de nacionais; nos Estados Unidos é meio a meio. A irrelevância patentária da indústria brasileira é apenas uma das manifestações eloquentes dessa opção preferencial pelo raquitismo tecnológico (WIPO, 2019)WIPO - WORLD INTELLECTUAL PROPERTY ORGANIZATION. World Intellectual Property Indicators 2019. Geneva: WIPO, 2019. Disponível em: Disponível em: https://www.wipo.int/edocs/pubdocs/en/wipo_pub_941_2019.pdf . Acesso em: 2 out. 2023.
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Departamentos técnicos robustos existem na indústria do mundo todo há um século. Um autor que consagrou a importância dos laboratórios de pesquisa nas empresas foi Charles Mee, um cientista que deu contribuições relevantes à ciência e tecnologia da fotografia e trabalhou inicialmente em uma empresa que seria comprada pela Kodak, na qual desenvolveu e dirigiu atividades de pesquisa por mais de quarenta anos. Em livro de 1920 sobre a importância das atividades de pesquisa e desenvolvimento nas empresas, ele afirmou:

Os propósitos para os quais a pesquisa é encetada são variados. Uma pesquisa pode começar com o objetivo de fazer avançar o conhecimento puro ou, por outro lado, com o intuito de facilitar a produção industrial e obter lucro comercial. Os métodos e os resultados serão semelhantes em ambos os casos. Em geral, é impossível prever se o valor de um trabalho de pesquisa projetado será maior por suas aplicações industriais ou pelo avanço do conhecimento. Em muitos casos, as próprias pesquisas desenvolvidas no interesse da ciência pura provaram ser do maior valor para a indústria. (MEES, 2007MEES, C. A organização da pesquisa científica industrial. Revista Brasileira de Inovação, Rio de Janeiro, v. 6, n. 1, p. 9-30, jan./jun. 2007., p. 16)

Mesmo laboratórios técnicos são escassos nas empresas no Brasil. E eles são os antepassados dos atuais departamentos de pesquisa e desenvolvimento, que empregam centenas, ou mesmo milhares, de profissionais de altíssima formação científica nas grandes empresas, e um punhado deles nas empresas de médio porte. No Brasil, muitos dos que existem são esquálidos e raramente contam com adequados recursos humanos e técnicos. Sem eles, as sinapses que as empresas precisam fazer com o mundo científico e tecnológico externo são inexistentes, como mostrou Rosenberg (1990ROSENBERG, N. Why do Firms do Basic Research (with Their Own Money)? Research Policy, v. 19, p. 165-174, 1990.). No Brasil, eles cumprem outras finalidades.

As áreas de inovação existem há muito tempo, em muitas empresas, mesmo que apenas mais recentemente tenham aderido a essa denominação. Uma das mais antigas é a de uma multinacional suíça de alimentos e a sua estratégia de “inovação” consistiu principalmente em transformar, desde 1958, a culinária tradicional brasileira substituindo os ingredientes tradicionais (como a farinha de mandioca) por seus produtos modernos, variantes industriais do leite, sobretudo o condensado (OLIVEIRA, 2010OLIVEIRA, D. A transmissão do conhecimento culinário no Brasil urbano do século XX. 2010. Dissertação (Mestrado em História Social) - Departamento de História, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.)14 14 Em sua dissertação de mestrado, Débora Oliveira suscitou um episódio de O Joio e o Trigo, dedicado ao tema da alimentação saudável. Apesar de tratar de leite condensado, é difícil não sentir um gosto amargo. . Muitos anos depois, a sua estratégia de “inovação” ainda faz escola; e uma das maiores empresas industriais brasileiras, fabricante de plásticos para embalagens e outras aplicações, dispõe de uma equipe técnica dedicada primordialmente a conquistar novos mercados substituindo por resinas os materiais tradicionalmente utilizados15 15 A embalagem de vidro de requeijão, a embalagem de madeira de um queijo típico brasileiro, o copo utilizado em uma das companhias aéreas brasileiras: são esses os exemplos de sucesso e inovação dessa empresa. A despreocupação com os temas de conhecimento, pesquisa e utilização adequada de seus recursos cobrou recentemente o seu preço, com um fator de potência muito elevado. A exploração de sal-gema em Maceió, para a fabricação de plástico (PVC), provocou danos ambientais que poderão produzir uma indenização bilionária, muitas vezes maior do que os orçamentos de P&D de muitos anos. Na origem dessa calamidade está o desprezo pelo conhecimento e método científicos, além de relações de poder (político) muito desiguais. . O padrão de inovação da indústria brasileira repousa, basicamente, em pequenas variações em torno da mesma base de produção e de produtos.

2. INSUFICIÊNCIA DAS VANTAGENS (DITAS) NATURAIS

O prosseguimento das trajetórias atuais vai alargar a distância da base industrial brasileira e o padrão industrial do mundo e a consequência será o desaparecimento gradual daquilo que não se encaixa no esquema das vantagens herdadas e dos sistemas naturalmente protegidos. As pessoas informadas saberão rapidamente organizar uma pequena lista de exceções. Além de aves raras, elas não poderão sobreviver se não contarem com um sistema, formado por um número suficientemente grande e variado de empresas de setores conexos que permitam uma coevolução. O que temos, de verdade, além daquela lista excepcional e reduzida, é uma indústria com uma composição da produção muito particular, que não anuncia perspectivas alvissareiras.

Onde estão as grandes vantagens industriais brasileiras? Historicamente, os economistas alinhados às posições dominantes na academia, no governo e no debate público sustentam que é nessas vantagens que devemos concentrar as nossas atenções, sem pretender modificar essa condição por meio de políticas que só conseguem deformar os resultados - “ótimos” - do funcionamento das forças do mercado e incentivar o surgimento, ou o reforço, de mecanismos de captura de rendas (de favorecimento). Há mesmo aqueles para quem a Embraer é um erro e melhor seria se tivéssemos ficado apenas na Embrapa (REZENDE, 2013REZENDE, L. Política industrial para inovação: uma análise das escolhas setoriais recentes. In: BACHA, E.; DE BOLLE, M. (org.). O futuro da indústria no Brasil: Desindustrialização em debate. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.)16 16 Há quem tenha utilizado o termo maquila para se referir à empresa. . Nessa perspectiva, os quase cem anos de pesquisa agrícola, com recursos públicos, desde a criação da Imperial Estação Experimental de Campinas, por d. Pedro II, passando pelas batalhas que definiram o perfil de ensino e pesquisa da Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz, e todas as demais instituições de pesquisa e ensino que criaram bases para uma agricultura relativamente desenvolvida, antes da criação da grande empresa brasileira de pesquisa agropecuária, que prosseguiu esse esforço nos últimos cinquenta anos, contam pouco para o sucesso, que é visto como natural e derivado das vantagens naturais. Mas o sucesso da Embraer tem, para esses intérpretes, a marca indelével da sua natureza artificial e, portanto, indesejada, uma vez que contraria a “vocação” e a “dotação natural de fatores”. Quando o agronegócio recebe benesses, elas são legítimas; quando a Embraer tem sucesso, isso só pode ser o resultado de favores espúrios. As críticas recorrentes ao BNDES advêm em parte dessa atuação subversiva em relação à posição “natural” do Brasil.

A insistência em setores de vantagens naturais é, por isso mesmo, uma decorrência dessa visão. Ela considera que o país da soja, do minério de ferro e das carnes é aquilo que temos e, possivelmente, o máximo a que podemos aspirar17 17 Mas, talvez, uma leitura a partir da matriz de interesses pudesse argumentar que o “melhor a que podemos aspirar” seja coincidente com a forma mais direta e imediata de valorização dos recursos seculares acumulados nas ramificações familiares dos donatários de sesmarias e daqueles outros que aderiram à mesma lógica. Poucos autores terão, tão precocemente, vislumbrado com acurácia esse fenômeno como Guilherme Delgado, em sua tese de doutoramento e em trabalho mais recente (DELGADO, 1985, 2010). . A agricultura de larga escala, centrada em cinco grandes culturas, e os segmentos da mineração intensiva em capital, para a qual o Brasil possui jazidas e outras condições excessivamente favoráveis, permitirão a sustentabilidade do balanço de pagamentos e a sobrevivência daquelas outras atividades que não estão expostas à concorrência internacional (infraestruturas, serviços, segmentos do comércio, bens de consumo industriais sujeitos a custos de transporte elevados).

Pensamos e argumentamos diferentemente: a composição da produção industrial é um fator determinante das possibilidades de competitividade da indústria e da economia toda, e de progresso material, social e humano de qualquer país, e do Brasil também. E antes que alguém se lembre de evocar o bordão do “quer voltar ao orelhão?”, este trabalho defende, como a maioria dos economistas industriais defendem, uma economia aberta ao comércio internacional. Mas a “abertura unilateral” que alguns setores propugnam só pode explicar-se porque eles estão sentados sobre camadas sucessivas de vantagens construídas após longos períodos de proteção de todos os tipos e naturezas, além de alguns elementos espúrios que envergonham o debate público e a própria cidadania.

Produzir a semente da soja não é igual a produzir a soja, como produzir a matriz genética das aves e dos suínos não é igual a produzir os próprios animais para consumo, como produzir o conhecimento não é a mesma coisa que usar, mesmo que de forma proficiente, o conhecimento produzido por terceiros; até porque só quem produz conhecimento está realmente e verdadeiramente em condições de usar o conhecimento de outros, uma proposição intuitiva que tem, além disso, sólidas evidências na bibliografia, incluindo o artigo de Rosenberg (1990ROSENBERG, N. Why do Firms do Basic Research (with Their Own Money)? Research Policy, v. 19, p. 165-174, 1990.).

Entre as muitas possíveis classificações que as atividades econômicas podem receber, existe uma que é especialmente útil para os nossos propósitos de compreender, que é aquela formulada por Keith Pavitt (1984PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory. Research Policy, v. 13, p. 343-373, 1984.) depois de ter examinado minuciosamente um acervo rico de aproximadamente 2 mil patentes depositadas no Reino Unido entre 1945 e 1979. As empresas podem ser classificadas como dependentes dos fornecedores, intensivas em escala de produção, fornecedores (de equipamentos) especializados e baseadas em ciência. As dimensões de uma indústria, medida por seu peso no produto total de um país (o PIB), são menos relevantes do que a proporção que existe entre cada uma dessas quatro categorias.

Fluxograma 1
Padrões setoriais de mudança tecnológica, por Pavitt

Sabe-se que a indústria brasileira sequer dispõe de setores baseados em ciência, embora existam tanto a base científica quanto alguns embriões tardios e empresas de base tecnológica lutando para construir um espaço industrial e mercados, e o seu agrupamento de empresas fornecedoras de equipamentos especializados sempre foi atrofiado e vem sendo fragilizado. A preponderância é de indústrias intensivas em escala e dominadas por fornecedores. Qualquer crescimento no Brasil será insuficiente, efêmero e deformado se não enfrentar as deficiências de nosso sistema industrial e o imenso atraso dele em relação aos sistemas industriais concorrentes. Essa deformação poderá ser camuflada por uma expansão que reforce as características que conhecemos no passado recente, mas as suas marcas e limitações aparecerão, mais cedo do que tarde. E de nada adianta listar as exceções - não é disso que se trata.

Um sistema industrial não é um punhado de empresas excepcionais, mas isoladas. A característica fundamental de um sistema industrial é a capacidade de mover-se em conjunto, de produzir ou responder aos impulsos dinâmicos e amplificá-los, intensificá-los, prolongá-los. Esse processo só se verifica se as empresas que podem eventualmente liderar o processo, pelo vetor tecnológico-industrial, irradiam efeitos dinâmicos harmônicos que são correspondidos por outras partes do sistema. Utilizando os elementos da representação de Pavitt, as indústrias relevantes para comandar o progresso tecnológico do conjunto do sistema são justamente aquelas que, na matriz brasileira, não apresentam peso expressivo na produção - e mesmo os setores que o ufanismo elegeu como os vetores do Brasil para o futuro são extremamente dependentes de modelos tecnológicos externos e raramente adaptados às condições brasileiras18 18 As informações sobre a agricultura liderada pelo complexo milho-soja-algodão no Cerrado são, na sua maior parte, baseadas na obra coletiva AMPA, APROSOJA-MT e Embrapa (2016). A cultura-farol do agro brasileiro é a soja, cujas sementes pertencem a um punhado de empresas, todas internacionais. Os agroquímicos que combatem as chamadas pragas vão perdendo a eficácia, pensadas e desenvolvidas que foram para outro ambiente. Ademais, os agroquímicos são propriedade de uma mão fechada de empresas estrangeiras que sequer os fabricam no Brasil (fabricação e formulação são etapas diferentes). A história se repete em todas as culturas que dominam os vastos territórios agrícolas. . Se as indústrias baseadas em ciência são inexistentes, as denominadas de fornecedores especializados têm raízes locais débeis, o que enfraquece a sua capacidade de gerar tecnologias originais irradiadoras de competitividade.

As atividades típicas das nossas “vantagens naturais” poderão eventualmente ganhar um impulso adicional e, com ele, arrastar os circuitos econômicos associados. No setor primário, as culturas típicas de exportação poderão continuar a sua expansão, pelo menos enquanto não forem alcançadas pelas forças externas que, em uma perspectiva histórica, sempre barraram o seu desenvolvimento em longo prazo. São duas essas forças. Em primeiro lugar, pelo lado da demanda, existe, sem dúvida, um impulso importante representado pelo crescimento da China e de outras economias em processo de industrialização ou de expansão industrial por meio da recepção de investimentos industriais transplantados (sobretudo na Ásia, mas também em alguns países de outros continentes). É muito pouco provável que esse impulso persista além de certos limites - econômicos e não econômicos. O conceito de livre comércio está longe de ter alcançado todos os grupos de produtos e todos os países; e se existem países que levam o conceito de segurança alimentar a sério, eles são as potências e os candidatos a potências (incluindo a China). E não é por outra razão que o comércio mundial de produtos alimentares é importante, apesar de ser uma fração muito reduzida da produção e do consumo mundiais19 19 Uma ilustração: a produção mundial dos três cereais mais importantes (trigo, milho e arroz) foi de 2,96 bilhões de toneladas e o comércio desses produtos totalizou 481 milhões de toneladas (16%) (FAO, 2021a). . E a China, a despeito das alegadas (e propaladas) fragilidades ambientais, da falta de água e de terras agrícolas, bem como da migração rural-urbana observada nas últimas décadas, permaneceu essencialmente autossuficiente em termos de alimentos para humanos, embora seja grande importadora de alimentos para animais (sobretudo soja)20 20 Soja é o único produto agrícola que a China importa em grande quantidade (96 milhões de toneladas ou 31 bilhões de dólares, em 2018). As importações totais de alimentos da China representam historicamente (desde 1979) entre 3% e 4% das suas necessidades totais e são raros os itens em que essas importações representam 5% do seu consumo, mas têm crescido nos anos recentes. Em milho, a maior commodity agrícola globalmente, as importações eram menos de 1% em 2011 e cresceram para 10,4% da produção em 2021; em arroz a China é exportadora líquida e em trigo passou de 1,1% em 2011 para 7,1% em 2021 (com relação à produção). A China é a maior produtora mundial de arroz e trigo e a segunda de milho (FAO, 2021b, 2021c, 2021d, 2021e). O Brasil é importador líquido de arroz e trigo, dois itens básicos das famílias brasileiras que podem alimentar-se regularmente. Mas a autosuficiência alimentar da China também se reduziu nos últimos dez anos. . Essa condição de dependência poderá mudar, num horizonte não distante, com a síntese de proteínas, apenas a mais visível das rotas alternativas às importações (STENGERS, 2021STENGERS, I. Chinese scientists say they can turn emissions into animal food. Bloomberg, New York, 4 nov. 2021).

Em segundo lugar, os efeitos pelo lado da oferta são importantes e precisam ser considerados. A tese de que o Brasil é uma potência agrícola carece de diversos esclarecimentos, que o ufanismo vem evitando. O Brasil tem, de fato, um papel de destaque em algumas culturas relevantes - a começar pelo café, passando pelo açúcar, pela laranja, para alcançar finalmente o tripé da chamada agricultura hiperprodutiva - milho, soja e algodão, que têm praticamente monopolizado a expansão agrícola brasileira. São essas três culturas que ocupam a imensidão do Cerrado brasileiro, esse bioma tão original e frágil que abarca 2,03 milhões de quilômetros quadrados onde se concentra a expansão legal (a ilegal dá-se sobre a Floresta Amazônica).

Nos registros seguintes, utilizamos as 558 microrregiões (em vez dos 5568 municípios) (IBGE, 2019)IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo agropecuário. Rio de Janeiro: IBGE, 2019.. As cinquenta principais microrregiões em termos de produção agrícola (culturas temporárias) concentram mais da metade da produção, e nada menos de 29 estão em áreas do Cerrado. Dessas, 28 estão preponderantemente envolvidas na produção da dupla soja-milho, aproveitando a vantagem oferecida pela segunda safra. Esse modelo acentua as limitações da monocultura e a intensificação das culturas, que promove a multiplicação de problemas fitossanitários. O modelo tem sido rentável, mas os custos crescentes associados à necessidade de múltiplas pulverizações de produtos químicos tóxicos com baixa efetividade são um problema por resolver (AMPA; APROSOJA-MT; EMBRAPA, 2016)AMPA - ASSOCIAÇÃO MATO-GROSSENSE DOS PRODUTOS DE ALGODÃO; APROSOJA-MT - ASSOCIAÇÃO DE PRODUTORES DE SOJA E MILHO; EMBRAPA - EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA. Desafios do Cerrado: Como sustentar a expansão da produção com produtividade e competitividade. Cuiabá: AMPA, 2016. e sem vislumbre de qualquer solução no pipeline de tecnologias das empresas dominantes. A inclusão do algodão ao lado do binômio milho-soja reforça os problemas apontados, como mostra a proliferação do bicudo - erradicado nos Estados Unidos -, que continua a exigir mais de uma dezena de aplicações de agroquímicos, com efeitos também ambientais desconsiderados.

O modelo do Cerrado é dominado por um pequeno grupo de fornecedores de soluções prontas - sementes (oito empresas em milho, sete em soja); agroquímicos (cinco empresas estrangeiras dominam mais de – do mercado)21 21 A Syngenta, comprada pela ChemChina, tem aproximadamente 1/5 do mercado. A Monsanto, empresa de reputação polêmica no mundo todo, foi adquirida pela Bayer e a marca foi “descontinuada”, para usar o eufemismo encontradiço. A Corteva, terceira do ranking, resultou da fusão entre as áreas respectivas da Dow e da DuPont. Entre as dez maiores empresas de defensivos (agroquímicos), há apenas uma brasileira, que detém entre 3% e 4% do mercado. ; e equipamentos (três grupos empresariais estrangeiros dominam 95% do mercado). Também a comercialização dos produtos (algodão, milho, soja) é dominada por um punhado de empresas estrangeiras de alcance global. O mais proeminente dos segmentos da agricultura brasileira é sem dúvida muito dinâmico, apresenta elevado crescimento, movimenta vários segmentos da economia (por exemplo, infraestruturas de armazenagem e transporte), mas é um empregador modesto e tem efeitos dinâmicos limitados, magnificados apenas pela valorização dos ativos que produz, incluindo a terra.

Enquanto o pacote do chamado agronegócio se expande pelo Cerrado e vai penetrando na Floresta Amazônica (RAJÃO, 2020RAJÃO, R.; BRITALDO, S.-F.; NUNES, F.; BÖRNER, J.; MACHADO, L.; ASSIS, D.; OLIVEIRA, A.; PINTO, L.; RIBEIRO, V.; RAUSCH, L.; GIBBS, H.; FIGUEIRA, D. The Rotten Apples of Brazil’s Agribusiness. Science, v. 369, n. 6501, p. 246-248, 2020.), contrariando aquilo que dizem os seus praticantes e adeptos fervorosos, milhões de agricultores e pequenos proprietários rurais continuam abandonados à própria sorte, com acesso muito restrito aos recursos que viabilizaram a expansão dos agronegócios: preços, crédito, tecnologia.

Não é só de agricultura (e pecuária) que vive o setor primário e a inspiração do modelo macroeconômico convencional, que pretende direcionar o desenvolvimento brasileiro para as suas históricas especializações. Há ainda as florestas plantadas e a mineração. Nas florestas domina o eucalipto, que torna o Brasil a maior de todas as florestas cobertas por essa tão controversa espécie vegetal, exótica, mas domesticada, cujo avanço em vastas regiões teve custos ambientais e sociais muito elevados. Na mineração é o minério de ferro o carro-chefe e a força da grande empresa brasileira fundada em 1942 (e privatizada em 1997); todavia, não impediu as duas tragédias que sacudiram o Brasil (em novembro de 2015, em Mariana; e em janeiro de 2019, em Brumadinho) (SERRA, 2018SERRA, C. Tragédia em Mariana. A história do maior desastre ambiental do Brasil. Rio de Janeiro: Record, 2018.)22 22 Cristina Serra (2018) escreveu um documento detalhado sobre Mariana, intitulado Tragédia em Mariana. A leitura suscita indagações importantes sobre a natureza do relacionamento entre os atores envolvidos em atividades econômicas altamente concentradas, sobretudo em comunidades pequenas. Os efeitos dessa condição vêm sendo desconsiderados. . E deixamos de lado a catástrofe do envenenamento da Amazônia.

3. A INDÚSTRIA: TAMANHO E COMPOSIÇÃO

As áreas mais protegidas abarcam também um bom número de atividades voltadas para o mercado interno: indústria, construção civil, energia, serviços e comércio. A indústria, que sobreviveu a tantos anos de recuo gradual, mas persistente, tem um certo número de atividades voltadas para o mercado interno, protegidas de concorrência, e algumas empresas muito competitivas que representam notáveis exceções ao modelo dominante. Entre elas, destaca-se a Petrobras, a mais importante de todas as empresas brasileiras. Apesar de ser considerada uma empresa industrial, é sobretudo uma empresa extrativa, que desenvolveu importante capacidade de exploração de petróleo em áreas marítimas muito profundas, utilizando para isso um mosaico de tecnologias das mais variadas procedências, sobretudo externas. Nas demais áreas, sobretudo no refino, ela é uma empresa comum em termos tecnológicos e industriais, mas o conjunto das áreas representava, por sua integração, um ativo extraordinariamente importante da indústria brasileira.

A Embraer é, possivelmente, o mais excepcional dos contraexemplos à norma industrial vigente no Brasil no último quarto de século, em vários sentidos. Primeiro, é, ao mesmo tempo, uma empresa de engenharia (muito mais do que uma empresa industrial ou de tecnologia) e uma montadora de sistemas, partes, peças e componentes importados em sua grande maioria. Essa originalidade merece uma reflexão por ela representar o exato inverso do padrão industrial dominante nos setores com algum grau de elaboração em termos de engenharia e conteúdo industrial, nos quais predominam modelos (de produto e de processo) transplantados para o Brasil (eventualmente com tropicalizações e frequentes defasagens) por contratos de transferência de tecnologia (mais comuns no passado) e implantação de filiais de empresas estrangeiras (cada vez mais frequentes). A Embraer é uma montadora, contrastando de maneira evidente com a ideia de fabricante: ela constrói o seu valor agregado por meio do projeto dos produtos, mobilizando conhecimentos técnicos e competências de engenharia aeronáutica que não são necessariamente originais, mas também não são replicáveis com facilidade23 23 Essa afirmação não está isenta de controvérsia. A aquisição da Embraer pela Boeing foi defendida com o argumento de que a compra da Bombardier, rival da Embraer em seu segmento de atuação, pela Airbus inviabilizava a existência autônoma da empresa brasileira, não importa quão importantes pudessem ser considerados os seus ativos de engenharia, tecnologia, montagem e comercialização (VASCONCELOS, 2018). . Segundo, porque é uma empresa extremamente internacionalizada em termos de compras. Terceiro, porque a Embraer é a privatização realizada pelos governos de Fernando Henrique Cardoso que entregou resultados efetivos e, ressalte-se, superiores a quaisquer promessas que justificaram a mudança de controle.

Se a Embraer é a exceção de origem estatal, entre as empresas privadas dos setores submetidos a forte concorrência internacional, o destaque maior é sem dúvida a WEG, empresa que consolidou sua posição em uma área industrial madura, com desafios tecnológicos relativamente modestos (e incrementais), mas vem galgando posições em áreas novas e segmentos muito mais desafiadores do que a área industrial original. Isso é tão mais surpreendente, ainda, porque contrasta com a trajetória de fuga permanente - mais lenta ou mais acelerada - de quase todas as empresas e os principais grupos industriais. Ela não apenas conservou áreas maduras, avançou também sobre muitas novas, e com uma ousadia incomum na indústria brasileira.

A fuga do capital da indústria, face da desindustrialização brasileira, pode ser vista por diversos prismas. A redução da fatia da indústria no PIB é uma delas, e não é a mais importante. Afinal, qual seria o peso “ideal” da indústria no produto interno de um país como o Brasil? É aquele que o país tinha em 1985? Ou aquele que têm outros países com a mesma renda média? Não há uma única resposta certa para essa pergunta.

Mas existe, sim, uma pergunta mais conceitual e mais promissora para pensar o problema: qual é o nível ideal e a composição da produção da indústria que permite ao Brasil desenvolver um número suficiente de soluções inovadoras, nos setores tipicamente difusores de progresso tecnológico, para dinamizar a própria indústria e os demais setores de atividade - do primário aos serviços antigos e novos do terciário?24 24 Essa reflexão deve sua inspiração a um argumento produzido por C. H. B. Cruz, que foi diretor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), sobre as diferentes formas de apreciar a importância da ciência brasileira. Comunicação pessoal. Essa pergunta introduz, implicitamente, uma definição de indústria que abandona a mera contabilização de produtos. Porque a indústria não é o que se produz, mas como se produz; quer dizer, com processos que fazem uso de novas técnicas, por geração e incorporação de sucessivos avanços e transformações. E o que Pavitt (1984PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory. Research Policy, v. 13, p. 343-373, 1984.) nos mostrou de forma muito rigorosa é que as oportunidades tecnológicas existem em muitos espaços econômicos, mas elas estão fortemente concentradas em torno daquelas áreas em que a ciência vai abrindo sucessivos cardápios de conhecimentos e ensejando novas aplicações para esses conhecimentos. Embora uma empresa de uma atividade tradicional e há muito estabilizada (digamos, cerveja) possa produzir inovações em seus processos, é mais provável que eles se originem de uma empresa especializada - em fermentação, ou em controle eletrônico de processos, ou em modelos computacionais de logística, que são áreas de aplicação de tecnologias desenvolvidas a partir de ciência de várias áreas. O terreno fértil da ciência é uma sementeira de oportunidades tecnológicas, mas aquele em que cresceram as empresas poderosas pode ser impeditivo de qualquer germinação.

A resposta à pergunta sobre a fatia da indústria envolve, portanto, muito menos o tamanho que ela deve ter e muito mais os seus atributos, incluindo a composição da produção, o protagonismo ou papel secundário de alguns vetores mais relevantes, as competências tecnológicas, industriais e comerciais de seus protagonistas, bem como os vínculos que eles estabelecem com o Brasil e com o mundo exterior. E é aqui que a resposta à pergunta é, definitivamente, sem apelação, muito perturbadora: a indústria que o Brasil constituiu, e ainda possui, não tem as dimensões e as características necessárias ao papel que um setor industrial precisa desempenhar no desenvolvimento de um país, em especial para um país com os contornos do Brasil. Ela carece das qualidades indispensáveis, em termos de vigor industrial, sobretudo de competências tecnológicas; e é incapaz de projetar internacionalmente o país com produtos que correspondam, em termos de volumes e qualidades, àqueles que precisa importar. A indústria brasileira tornou-se pequena, é fato; mas mais do que pequena em seu tamanho absoluto, ela é inoperante em termos de capacidades para produzir progresso tecnológico e dinamizar-se, dinamizar os demais setores e alçar a economia brasileira a um padrão de desempenho superior, promotor de desenvolvimento.

A debilidade da indústria aparece também nos grandes grupos econômicos e um exame da lista dos principais revela isso muito claramente. A maior parte dos integrantes dessa lista é do setor financeiro, de energia e serviços, as poucas empresas industriais estão nas áreas de processamento de recursos naturais e insumos industriais, sem proximidade e com vínculos pobres com as áreas promissoras do progresso tecnológico. O recuo desses grupos que se constituíram a partir de um longo e acelerado processo de crescimento na indústria é patente na constatação de que eles vêm, há muito tempo, fugindo dessas áreas de competição e migrando para aquelas em que a exposição à concorrência internacional é menor, se existente. Os exemplos são tão evidentes que deveriam dispensar enumeração, mas fiquemos apenas naqueles que são ou foram proeminentes, como o Votorantim, refugiado cada vez mais nos segmentos protegidos da concorrência internacional, migrando progressivamente para infraestruturas e agora para habitação e para empreendimentos correlatos. Ou o Ultra, que já teve uma empresa industrial com núcleo tecnológico e promessas de abrir o caminho do Brasil para a química de renováveis, mas hoje se tornou um grupo exclusivamente de serviços, oscilando erraticamente entre os postos de gasolina, as redes de farmácias e os aparelhos de pagamento de pedágios e estacionamentos em complemento às suas áreas tradicionais de comércio (varejista e atacadista de gás). Ou o maior grupo sucroalcooleiro, conquistando posições nas infraestruturas ferroviárias, enquanto claudica nos biocombustíveis avançados. Os grandes grupos oscilam entre uma crescente diluição da indústria ou uma fuga total.

Ao lado desses exemplos de recuo tão significativos e reveladores, há outros que causam ainda mais desconforto e servem para entendermos o que está realmente acontecendo naquelas atividades que contam para a geração de progresso tecnológico para o conjunto do sistema industrial e a economia toda: Bardella, Cobrasma e Villares. Essas três empresas tiveram grande projeção até os anos 1980. No II PND, estiveram entre as beneficiárias dos grandes projetos de investimento planejados pelo governo, com destaque para o Programa Nuclear, em que deveriam ter um papel proeminente para absorver tecnologia alemã, desenvolver progressivamente novas competências tecnológicas e capacidades industriais e se tornarem grandes fornecedoras desse colossal projeto de investimento. Entre as pretensões do II PND e as duras realidades do ambiente macroeconômico menos favorável, houve uma cunha que foi se abrindo ao longo da segunda metade dos anos 1970, e isso foi mortal para a trajetória dessas empresas (como de tantas outras no setor de bens de capital). Contudo, nenhuma dessas empresas, vértice superior da pirâmide industrial brasileira, havia demonstrado uma vocação tecnológica que permitisse antever um sucesso nessa empreitada. Cada uma delas confirma a mesma tragédia de quase todas as empresas brasileiras: uma excessiva confiança em transferência de tecnologia externa como um substituto - supostamente adequado - para os esforços próprios (internos)25 25 A Cobrasma era uma das joias da indústria de bens de capital, mas seus proprietários detinham imensidões de terras no Mato Grosso (FIORAVANTI, 2018) enquanto dependiam de contratos de licenciamento de tecnologia para as suas atividades industriais consolidadas (MOTTA, 2006). Certamente, a debilidade tecnológica não é produto da escassez de recursos financeiros. .

Por isso, qual é a indústria que ainda temos e que parece relativamente protegida de competição externa mais séria? São três segmentos. O primeiro é o dos produtos ligados às cadeias de commodities do agronegócio - suco de laranja, soja, carnes. Até aqui, todavia, essas cadeias têm se especializado nos produtos de base, com pouca ou nenhuma agregação de valor por qualidades intangíveis valorizadas nos mercados. Em alguns casos, pelo contrário, os produtos são “descontados” pela origem brasileira26 26 Considerando os vinte principais exportadores de carne do mundo em 2019, o preço médio de exportação de carne dos outros dezenove é 39,2% superior ao preço médio das exportações de carne brasileiras (FAO, 2021d, 2021e). , por diferentes razões objetivas ou subjetivas que os depreciam e desvalorizam nos mercados externos. O segundo é o dos produtos voltados para o mercado interno e com elevados custos de transporte a longas distâncias - alimentos preparados e bebidas são os dois exemplos mais evidentes. O terceiro grupo de produtos que ainda temos e devemos preservar é o de materiais básicos para atividades de construção - telhas, tijolos, cimento, vidro e outros materiais e artefatos.

Se existe um piso para a participação da indústria no produto interno, parece não haver um nível mínimo para o seu empobrecimento em termos de funções vitais. A estrutura de produção é residual e perdeu capacidade de dinamizar-se com formas autônomas de progresso tecnológico e inovação. Os nichos de exceção confirmam a proposição.

4. MACROECONOMIA: AS ALTERNATIVAS NOVO-DESENVOLVIMENTISTA E HETERODOXA

O pensamento econômico ortodoxo não oferece caminhos para o desenvolvimento, e, aqueles que permitem vislumbrar a construção da sua alternativa pobre, que é alguma prosperidade, não apresentam nenhuma capacidade de percolação e difusão. E o que dizer do pensamento heterodoxo e do desenvolvimentismo em seus diferentes matizes? Eles se apresentam como caminhos para a reindustrialização e o desenvolvimento. A tese heterodoxa enfatiza a necessidade de libertar a economia do jugo - tirânico e estéril - do contracionismo, injetando demanda e revigorando o sistema econômico (efeitos dos gastos que elevam o nível de demanda, de produção, de emprego e salários, para alcançar o investimento em novas capacidades de produção). A centelha do processo é, nessa visão, o gasto público, traduzido em alguma boa combinação de gastos sociais e investimentos (infraestruturas). A tese novo-desenvolvimentista substitui a centelha dos gastos públicos pela ampliação das exportações e a redução das importações, alcançadas por meio de uma desvalorização cambial apropriada. A substituição do deflagrador gasto público pelo encarecimento da moeda estrangeira vem acompanhada de uma preocupação reforçada com as contas públicas e o equilíbrio orçamentário.

Em condições normais, seria possível ver viabilidade teórica em ambas as teses. Mas a hipótese - condições normais - está longe de ser verificável. Não é normal uma economia que acumula há quarenta anos déficits de investimento que somam fragilidades estruturais aos problemas oriundos do período de crescimento acelerado. Não é normal que as empresas tenham reforçado persistentemente estratégias de rentabilidade e sobrevivência pautadas no imediatismo, estratégias cada vez mais distantes das normas de produção e de competição vigentes no mundo industrializado (e cada vez mais estendidas aos países de industrialização mais recente). Não é normal que as empresas que ocupam posições dominantes no mercado local vejam os seus ativos envelhecerem enquanto elevam as importações para continuarem a ocupar um mercado que não dinamizam, enquanto esperam por uma boa oferta de compra, que afinal é um pedágio para o acesso imediato ao mercado em condição monopolista ou oligopolista. Como nada disso é normal, a consistência e a viabilidade de ambas as teses estão seriamente comprometidas.

A desvalorização cambial defendida pelo novo-desenvolvimentismo poderia restabelecer o vigor da indústria e o crescimento industrial, mas apenas limitadamente. Ela pode, sem dúvida, restaurar a rentabilidade de muitas empresas industriais, pois o câmbio desvalorizado permitiria recompor margens de lucro e, ao mesmo tempo, reduzir os espaços do mercado interno ocupado pelas importações e viabilizar aumentos de exportações.

Até esse ponto podemos acompanhar o encadeamento novo-desenvolvimentista. Mas ele suscita outros efeitos, dois deles muito importantes para pensar a viabilidade da tese. A desvalorização cambial eleva o preço das importações e também dos preços internos com algum grau de indexação aos preços externos - do petróleo e seus derivados às commodities, passando pelos lucros das empresas que compraram posições no Brasil, para as quais a desvalorização representaria uma redução de lucros em moeda de origem. E essa elevação de preços representa uma redução do poder de compra de todos os rendimentos fixos - salários, pensões, benefícios.

Além desse efeito sério em uma economia que não apagou inteiramente a memória inflacionária e os seus paliativos de indexação, há um segundo efeito mais sério ainda: a elevação substancial da rentabilidade do setor primário em virtude da desvalorização cambial. Essa elevação da rentabilidade do setor primário deverá promover um reforço do deslocamento de capitais para essas atividades, pelo menos enquanto durar o vigor da demanda por commodities.

Fluxograma 2
Os efeitos indesejados da tese de reindustrialização por desvalorização cambial: redução de salários reais e reforço da primarização

O aumento da utilização da capacidade produtiva da indústria pode até ser alcançado, mas que disso possa advir um surto de investimentos, eis uma tese que consideramos heroica e que não encontra evidências em nenhuma etapa ou ciclo da economia brasileira nos últimos trinta anos. É difícil acompanhar a sedução do novo-desenvolvimentismo pela magia do câmbio restaurador do passado glorioso da indústria, como se os últimos quarenta anos pudessem ser esquecidos - e como se pudessem ser ignoradas as deficiências que já havia na indústria brasileira quando a crise se revelou, no início dos anos 1980, para se agravarem desde então.

A abordagem heterodoxa centrada no gasto público tem o grande mérito de enfrentar o problema de um Estado que poderia ser considerado grande, mas que tem sido extremamente débil no provimento de uma função essencial e insubstituível: o rumo dos investimentos. Ela tem também o mérito de reconhecer que, no Brasil, o gasto social pode reunir todas as condições para ser considerado um investimento público. Mas essas duas grandes qualidades da proposta heterodoxa não preenchem a lacuna remanescente, porque ela acredita no poder revigorante do gasto público, independentemente da condição real e concreta da economia brasileira, sobretudo de sua indústria. O encadeamento proposto, da elevação do gasto público, que leva ao aumento do consumo, da produção e do emprego, realimentando a produção e o consumo, pode verificar-se dentro de certos limites estreitos, mas esbarra logo em seguida nas fragilidades competitivas da indústria, onde são visíveis, e das demais atividades, onde são menos visíveis porque elas não estão expostas diretamente à concorrência internacional.

O ciclo virtuoso não se difunde e não se sustenta porque os efeitos do gasto autônomo não se traduzem em investimentos para o aumento da capacidade de produção e para a elevação das empresas a novos patamares de competição. Não basta haver demanda para que haja investimentos, mesmo que a demanda possa aumentar a produção e os níveis de utilização de uma dada capacidade instalada. Para que haja investimentos é preciso que os projetos prometam, com realismo, um nível de rentabilidade compatível com as alternativas; e a principal dessas alternativas é o provimento de produtos importados, sejam eles de produção própria em outras bases, ou de terceiros. Nós já vimos esse fenômeno e os estímulos de demanda do ciclo 2003-2014 não foram suficientes para desencadear investimentos restauradores do dinamismo macroeconômico, muito menos da competitividade da indústria. E vimos também que a mudança do horizonte internacional de competitividade afugenta os capitais industriais para os refúgios mais seguros das vantagens estáticas, nos recursos naturais e rentismos assemelhados.

Fluxograma 3
Insuficiência da tese heterodoxa para a sustentação do crescimento: desbalanceamento produtivo e insuficiência de dinamismo tecnológico

Curiosamente, tanto o novo-desenvolvimentismo como a heterodoxia encontram-se com a ortodoxia em seu desdém pelo plano microeconômico e a organização industrial, pelo menos enquanto essa dimensão seja um sistema de produção dotado de características específicas e elevado grau de complexidade. Essas abordagens - estritamente macroeconômicas - ignoram as condições concretas do tecido industrial e confiam, igualmente, nos automatismos de uma construção macroeconômica que se desdobra disciplinadamente no plano microeconômico. Nenhuma abordagem exclusivamente macroeconômica poderá ter sucesso para restabelecer o crescimento sustentado (para usar o termo consagrado). Numa economia capitalista, baseada primordialmente em decisões privadas de produção e investimento, o crescimento só pode sustentar-se quando os estímulos do mercado e os estímulos da competição alcançam um número suficientemente grande de indústrias (setores), forçando-as ao abandono peremptório da defesa de sua rentabilidade e posições pelas abordagens minimalistas - dos “desgargalamentos”, da renovação parcial de linhas de produção, das modernizações pontuais, do lançamento de produtos que só localmente parecem avançados, mas estão todavia distantes dos padrões de competição vigentes no mundo industrializado ou em industrialização. Esse abandono só será possível por meio de uma articulação viável - e reconhecida como viável - entre investimentos públicos e privados com o propósito deliberado de promover a restauração da competitividade em indústrias difusoras de produtividade, competitividade e progresso tecnológico. Esse processo não se fará de uma só vez, em todos os arranjos industriais ao mesmo tempo. Mas é mais importante fazê-lo, mesmo que em seções limitadas do sistema industrial, do que confiar que o desenho macroeconômico vai cumprir-se porque ele seria capaz de impor-se às decisões privadas.

ESBOÇO DE CONCLUSÃO: COMO REERGUER A ECONOMIA CONSTRUINDO UMA BASE INDUSTRIAL PARA O CRESCIMENTO

Este artigo dialoga com os temas e as questões que preocupam muitos economistas estudiosos dos temas industriais e do desenvolvimento brasileiro. Em especial, ele desenvolve uma resposta - provisória, tentativa - com a questão que preocupou David Kupfer em diversos dos seus textos acadêmicos e manifestações públicas: por que os investimentos industriais são reduzidos, ou melhor, por que existe uma certa aversão aos investimentos na indústria?

Foi para essa questão que procuramos uma resposta, ou elementos de resposta, que permita reorientar o debate teórico e de políticas públicas. Rigorosamente, o artigo recolocou a pergunta inspiradora de forma ainda mais extremada, mostrando que não apenas a indústria não tem sido objeto de investimentos como, mais grave ainda, os capitais investidos na indústria vêm sendo escoados para outras atividades, reforçando a proposição inicial de Kupfer. O encolhimento da indústria é um processo de fuga dos seus capitais em direção a outras áreas, onde a rentabilidade não enfrenta as mesmas adversidades.

O acúmulo de insuficiências e deficiências do sistema industrial tornou-se um ciclo vicioso de caráter cumulativo. Os investimentos na indústria não ocorrem e não podem ocorrer simplesmente porque a capacidade competitiva da indústria tornou-se excessivamente distante dos horizontes relevantes, representados pelos competidores internacionais. O patamar relevante está distante e a velocidade do seu deslocamento é superior. Por isso, nenhuma injeção de demanda, por maior que pudesse ser, se o ambiente macroeconômico o permitisse, poderá robustecer as respostas privadas de um sistema produtivo fragilizado por déficits de competitividade que levaram as empresas a posições muito defensivas, ou mesmo paralisantes.

O sistema industrial não pode ser reduzido a um grupo restrito de empresas de desempenho excepcional. O elemento fundamental de um sistema industrial é a sua capacidade de transformar-se respondendo aos impulsos dinâmicos, sejam os da demanda (um dado externo às empresas), sejam os das suas capacidades industriais e tecnológicas em expansão (um elemento interno às empresas). Quando esses elementos são de monta, porque abarcam um número suficientemente grande de empresas, esses impulsos amplificam-se, intensificam-se e prolongam-se. A condição fundamental para que esse processo se verifique depende das empresas que podem liderar o processo irradiarem efeitos dinâmicos coerentes e convergentes, correspondidos por empresas de outros setores. Isso só poderá acontecer se houver um esforço consistente para o soerguimento da produtividade e da competitividade das empresas que formam a base do sistema industrial. Consistência no restabelecimento de níveis coetâneos de produtividade e competitividade exige atuar simultaneamente em muitas empresas, setores e regiões. Sem isso, as respostas aos estímulos de demanda serão sempre tímidas, ou seja, os investimentos serão insuficientes. O nó górdio não é a demanda, é a resposta travada aos aumentos da demanda, pois os momentos de prosperidade não se desdobram em investimentos geradores de expansão sustentada.

O destravamento desse processo depende de políticas industriais, quer dizer, políticas de desenvolvimento das capacidades e competências industriais e tecnológicas. Só por meio de políticas promotoras das competências produtivas é que poderá a indústria alçar os seus padrões de produção e competição ao ponto em que os investimentos se tornam atrativos e, portanto, os circuitos da macroeconomia podem recuperar integralmente o seu vigor.

Este resgate do plano microeconômico, da organização industrial e dos padrões competitivos com relevância no componente tecnológico, para a sua integração à estratégia macroeconômica e ao desenvolvimento brasileiro, é a melhor homenagem que posso prestar a David Kupfer - amigo, companheiro e mestre de tantos de nós.

REFERÊNCIAS

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    » https://www.wipo.int/edocs/pubdocs/en/wipo_pub_941_2019.pdf
  • 1
    A redação do artigo beneficiou-se de leituras e sugestões valiosas. Agradeço a Alexandra Almeida, Orlando Martinelli e Thor Ribeiro. Por fim, reconheço a importância das contribuições de dois pareceristas da Revista Economia Contemporânea, cujas críticas foram úteis para esta versão.
  • 2
    Agradeço à Leda Paulani pelas observações críticas e sugestões que permitiram superar uma dubiedade grave neste ponto.
  • 3
    Carlos Medeiros publicou um artigo elucidativo — e muito assertivo — sobre a insuficiência da taxa de câmbio para assegurar uma retomada do crescimento (MEDEIROS, 2020MEDEIROS, C. A structuralist and institutionalist developmental assessment of and reaction to new developmentalism. Review of Keynesian Economics, v. 8, n. 2, p. 147-167, 2020.). Leda Paulani (2017PAULANI, L. A experiência brasileira entre 2003 e 2014: neodesenvolvimentismo? Cadernos do Desenvolvimento, v. 12, n. 20, maio 2017.) fez uma revisão criteriosa dos termos novo-desenvolvimentismo, sociodesenvolvimentismo e neodesenvolvimentismo.
  • 4
    A interpretação de António Castro e Francisco Souza terá sido a mais enfática defesa dos resultados do II PND, enquanto Carlos Lessa fez uma crítica que reduz o plano a um misto de sonho e fracasso.
  • 5
    Projeto contratado pelo governo federal a um consórcio de universidades brasileiras, com participação de diversos organismos nacionais e internacionais, para estudar caminhos acerca do restabelecimento da competitividade da indústria. Coordenado por Luciano Coutinho e João Ferraz, o consórcio produziu uma centena de documentos e muitas proposições. David Kupfer foi uma das pessoas mais laboriosas desse grande projeto.
  • 6
    Esse livro, em coautoria com Lia Haguenauer e João Ferraz, é em parte produto do Estudo da competitividadeCOUTINHO, L.; FERRAZ, J. C. Estudo da competitividade da indústria brasileira. Campinas: Papirus, 1994., mas os autores acrescentaram a ele reflexões muito relevantes.
  • 7
    O reconhecimento dessa afirmação vem até de vozes insuspeitas, integrantes da linha de frente do pensamento dominante e conservador: “Por que, apesar de a escolaridade média crescer 3% a.a., a produtividade cresce 1% a.a.? A resposta está em nossa dificuldade em prover a esse trabalhador mais qualificado ocupações que lhe permitam usar as habilidades adquiridas. O jovem trabalhador estudou mais que seus pais, mas as ocupações que ele encontra disponíveis não são tão mais produtivas” (PINHEIRO, 2021PINHEIRO, A. Educação e crescimento econômico. Valor Econômico, São Paulo, 5 nov. 2021.). Existe uma vasta bibliografia que dá apoio a essa interpretação. Os trabalhos de Fajnzylber e de TavaresTAVARES, M. C.; FAÇANHA, L. O.; POSSAS, M. L. Estrutura industrial e empresas líderes. Rio de Janeiro: FINEP, 1978. citados na bibliografia constituem uma base importante.
  • 8
    Na verdade, representam os grandes industriais e o capital que controla as empresas industriais, mas não propriamente a indústria, posto que os demais envolvidos (consumidores, trabalhadores, comunidades) não estão em nenhuma hipótese representados.
  • 9
    Em 2021 foram instalados 380.911 robôs industriais no mundo e, no Brasil, esse número foi 1.702 (ou 0,44%). Uma ilustração de um fenômeno de grande amplitude. Robôs elevam a produtividade.
  • 10
    Simon Schwartzman e seus coautores dedicaram um capítulo de Tempos de CapanemaSCHWARTZMAN, S.; BOMENY, H. M. B.; COSTA, V. M. R. Tempos de Capanema. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra; Rio de Janeiro: FGV, 2001. a esse episódio, mas o relato mais aprofundado e circunstanciado que foi produzido sobre esse tema crucial da vida política brasileira é de Barbara Weinstein em seu magistral A (re)formação da classe trabalhadora do BrasilWEINSTEIN, B. A (re)formação da classe trabalhadora do Brasil, 1920-1964. São Paulo: Cortez, 2000..
  • 11
    Foram três grandes empresários-capitalistas brasileiros (PASSOS; WONGTSCHOWSKI; PIVA, 2017PASSOS, P.; WONGTSCHOWSKI, P.; PIVA H. Sindicalismo sem resultados. Folha de S.Paulo, São Paulo, 26 abr. 2017.) os autores da mais devastadora crítica das instituições que regem a gestão dos 20 bilhões de reais de recursos fiscais que irrigam as ações empresariais em formação profissional e muitas outras, nem sempre tão aderentes à finalidade. Os dezessete anos do último presidente da federação dos industriais de São Paulo são ilustrativos.
  • 12
    A meu conhecimento, o primeiro autor que se ocupou desse tema como pesquisa foi Nathaniel H. Leff (1968LEFF, N. H. The Brazilian capital goods industry, 1929-1964. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1968.). Segundo Leff (1968, p. 94)LEFF, N. H. The Brazilian capital goods industry, 1929-1964. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1968.: “When the sector’s firms are asked why, for technical knowledge, involving a major discontinuity with their previous work, they have preferred to import know-how rather than develop it themselves, they usually reply that such a procedure would be ‘too difficult’, ‘too expensive’, or ‘too slow’”. Se o setor de bens de capital, objeto de estudo de Leff e cérebro do setor industrial, prefere comprar a desenvolver, os efeitos associados a essa opção são disseminados sobre o setor industrial e as demais atividades usuárias dos equipamentos.
  • 13
    Brian Arthur (2009ARTHUR, B. The nature of technology: What it is and how it evolves. New York: Free Press, 2009.) apresentou o argumento da importância da combinação de elementos conhecidos para soluções originais. Alice Amsden (1989AMSDEN, A. Asia’s next giant: South Korea and late industrialization. Oxford: Oxford University Press,1989.) e Robert Wade (1990WADE, R. Governing the market: Economic theory and the role of the government in East Asia industrialization. Princeton: Princeton University Press, 1990.) mostraram o caminho asiático do aprendizado. Keith Pavitt (1984PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory. Research Policy, v. 13, p. 343-373, 1984.) destrinchou a importância dos diferentes setores na construção sistêmica da produtividade. Linsu Kim (2005KIM, L. Da imitação à inovação: A dinâmica do aprendizado tecnológico na Coreia. Campinas: Editora da Unicamp, 2005.) descreveu o caminho coreano da imitação à inovação.
  • 14
    Em sua dissertação de mestrado, Débora Oliveira suscitou um episódio de O Joio e o Trigo, dedicado ao tema da alimentação saudável. Apesar de tratar de leite condensado, é difícil não sentir um gosto amargo.
  • 15
    A embalagem de vidro de requeijão, a embalagem de madeira de um queijo típico brasileiro, o copo utilizado em uma das companhias aéreas brasileiras: são esses os exemplos de sucesso e inovação dessa empresa. A despreocupação com os temas de conhecimento, pesquisa e utilização adequada de seus recursos cobrou recentemente o seu preço, com um fator de potência muito elevado. A exploração de sal-gema em Maceió, para a fabricação de plástico (PVC), provocou danos ambientais que poderão produzir uma indenização bilionária, muitas vezes maior do que os orçamentos de P&D de muitos anos. Na origem dessa calamidade está o desprezo pelo conhecimento e método científicos, além de relações de poder (político) muito desiguais.
  • 16
    Há quem tenha utilizado o termo maquila para se referir à empresa.
  • 17
    Mas, talvez, uma leitura a partir da matriz de interesses pudesse argumentar que o “melhor a que podemos aspirar” seja coincidente com a forma mais direta e imediata de valorização dos recursos seculares acumulados nas ramificações familiares dos donatários de sesmarias e daqueles outros que aderiram à mesma lógica. Poucos autores terão, tão precocemente, vislumbrado com acurácia esse fenômeno como Guilherme Delgado, em sua tese de doutoramento e em trabalho mais recente (DELGADO, 1985DELGADO, G. C. Capital financeiro e agricultura no brasil, 1965-1985. São Paulo: INCONE; Editora da Unicamp, 1985., 2010DELGADO, G. C. Especialização primária como limite ao desenvolvimento. Desenvolvimento em Debate, v. 1, n. 2, p. 111-125, jan./abr., maio/ago. 2010.).
  • 18
    As informações sobre a agricultura liderada pelo complexo milho-soja-algodão no Cerrado são, na sua maior parte, baseadas na obra coletiva AMPA, APROSOJA-MT e Embrapa (2016)AMPA - ASSOCIAÇÃO MATO-GROSSENSE DOS PRODUTOS DE ALGODÃO; APROSOJA-MT - ASSOCIAÇÃO DE PRODUTORES DE SOJA E MILHO; EMBRAPA - EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA. Desafios do Cerrado: Como sustentar a expansão da produção com produtividade e competitividade. Cuiabá: AMPA, 2016.. A cultura-farol do agro brasileiro é a soja, cujas sementes pertencem a um punhado de empresas, todas internacionais. Os agroquímicos que combatem as chamadas pragas vão perdendo a eficácia, pensadas e desenvolvidas que foram para outro ambiente. Ademais, os agroquímicos são propriedade de uma mão fechada de empresas estrangeiras que sequer os fabricam no Brasil (fabricação e formulação são etapas diferentes). A história se repete em todas as culturas que dominam os vastos territórios agrícolas.
  • 19
    Uma ilustração: a produção mundial dos três cereais mais importantes (trigo, milho e arroz) foi de 2,96 bilhões de toneladas e o comércio desses produtos totalizou 481 milhões de toneladas (16%) (FAO, 2021a)FAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION. FAOSTAT: Production. Rome: FAO, 2021a. Disponível em: Disponível em: https://www.fao.org/faostat/en/#data . Acesso em: 27 set. 2023.
    https://www.fao.org/faostat/en/#data...
    .
  • 20
    Soja é o único produto agrícola que a China importa em grande quantidade (96 milhões de toneladas ou 31 bilhões de dólares, em 2018). As importações totais de alimentos da China representam historicamente (desde 1979) entre 3% e 4% das suas necessidades totais e são raros os itens em que essas importações representam 5% do seu consumo, mas têm crescido nos anos recentes. Em milho, a maior commodity agrícola globalmente, as importações eram menos de 1% em 2011 e cresceram para 10,4% da produção em 2021; em arroz a China é exportadora líquida e em trigo passou de 1,1% em 2011 para 7,1% em 2021 (com relação à produção). A China é a maior produtora mundial de arroz e trigo e a segunda de milho (FAO, 2021bFAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION. FAOSTAT: Production and Import Quantity. Rome: FAO, 2021b. Disponível em: Disponível em: https://www.fao.org/faostat/en/#data . Acesso em: 27 set. 2023.
    https://www.fao.org/faostat/en/#data...
    , 2021cFAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION. FAOSTAT: Production and Import Value. Rome: FAO, 2021c. Disponível em: Disponível em: https://www.fao.org/faostat/en/#data . Acesso em: 27 set. 2023.
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    https://www.fao.org/faostat/en/#data...
    , 2021eFAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION. FAOSTAT: Production and Export Value. Rome: FAO, 2021e. Disponível em: Disponível em: https://www.fao.org/faostat/en/#data . Acesso em: 27 set. 2023.
    https://www.fao.org/faostat/en/#data...
    ). O Brasil é importador líquido de arroz e trigo, dois itens básicos das famílias brasileiras que podem alimentar-se regularmente. Mas a autosuficiência alimentar da China também se reduziu nos últimos dez anos.
  • 21
    A Syngenta, comprada pela ChemChina, tem aproximadamente 1/5 do mercado. A Monsanto, empresa de reputação polêmica no mundo todo, foi adquirida pela Bayer e a marca foi “descontinuada”, para usar o eufemismo encontradiço. A Corteva, terceira do ranking, resultou da fusão entre as áreas respectivas da Dow e da DuPont. Entre as dez maiores empresas de defensivos (agroquímicos), há apenas uma brasileira, que detém entre 3% e 4% do mercado.
  • 22
    Cristina Serra (2018SERRA, C. Tragédia em Mariana. A história do maior desastre ambiental do Brasil. Rio de Janeiro: Record, 2018.) escreveu um documento detalhado sobre Mariana, intitulado Tragédia em MarianaSERRA, C. Tragédia em Mariana. A história do maior desastre ambiental do Brasil. Rio de Janeiro: Record, 2018.. A leitura suscita indagações importantes sobre a natureza do relacionamento entre os atores envolvidos em atividades econômicas altamente concentradas, sobretudo em comunidades pequenas. Os efeitos dessa condição vêm sendo desconsiderados.
  • 23
    Essa afirmação não está isenta de controvérsia. A aquisição da Embraer pela Boeing foi defendida com o argumento de que a compra da Bombardier, rival da Embraer em seu segmento de atuação, pela Airbus inviabilizava a existência autônoma da empresa brasileira, não importa quão importantes pudessem ser considerados os seus ativos de engenharia, tecnologia, montagem e comercialização (VASCONCELOS, 2018VASCONCELOS, Y. Um acordo no ar. Revista Pesquisa Fapesp, São Paulo, ed. 268, jul. 2018. Disponível em: Disponível em: https://revistapesquisa.fapesp.br/um-acordo-no-ar/ . Acesso em: 14 set. 2023.
    https://revistapesquisa.fapesp.br/um-aco...
    ).
  • 24
    Essa reflexão deve sua inspiração a um argumento produzido por C. H. B. Cruz, que foi diretor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), sobre as diferentes formas de apreciar a importância da ciência brasileira. Comunicação pessoal.
  • 25
    A Cobrasma era uma das joias da indústria de bens de capital, mas seus proprietários detinham imensidões de terras no Mato Grosso (FIORAVANTI, 2018FIORAVANTI, L. M. Do agronegócio à cidade como negócio: A urbanização de uma cidade mato-grossense sob a perspectiva da produção do espaço. 2018. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) enquanto dependiam de contratos de licenciamento de tecnologia para as suas atividades industriais consolidadas (MOTTA, 2006MOTTA, A. C. C. R. Cobrasma: trajetória de uma empresa brasileira. 2006. Tese (Doutorado em História Econômica) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.). Certamente, a debilidade tecnológica não é produto da escassez de recursos financeiros.
  • 26
    Considerando os vinte principais exportadores de carne do mundo em 2019, o preço médio de exportação de carne dos outros dezenove é 39,2% superior ao preço médio das exportações de carne brasileiras (FAO, 2021dFAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION. FAOSTAT: Production and Export Quantity. Rome: FAO, 2021d. Disponível em: Disponível em: https://www.fao.org/faostat/en/#data . Acesso em: 27 set. 2023.
    https://www.fao.org/faostat/en/#data...
    , 2021eFAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION. FAOSTAT: Production and Export Value. Rome: FAO, 2021e. Disponível em: Disponível em: https://www.fao.org/faostat/en/#data . Acesso em: 27 set. 2023.
    https://www.fao.org/faostat/en/#data...
    ).
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    CLASSIFICAÇÃO JEL: O14; O43; O54; P16.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    08 Dez 2021
  • Aceito
    04 Maio 2023
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