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O TEMA DA PROSTITUIÇÃO EM PUBLICAÇÕES RELACIONADAS COM OS ESTUDOS ORGANIZACIONAIS1 1 Recebido em 15/12/2020, aceito em 922021.

THE THEME OF PROSTITUTION IN PUBLICATIONS RELATED TO ORGANIZATION STUDIES

EL TEMA DE LA PROSTITUCIÓN EN LAS PUBLICACIONES RELACIONADAS CON LOS ESTUDIOS ORGANIZACIONALES

RESUMO

Este artigo apresenta o tema da prostituição em publicações do campo dos Estudos Organizacionais. Foi realizada uma leitura interpretativa das publicações encontradas em periódicos nacionais e internacionais do campo, que resultou na organização de três conjuntos de textos. o primeiro compreende publicações que analisam a prostituição considerando aspectos relacionados à psicodinâmica; o segundo inclui textos que abordam os corpos e seus papeis em trocas que ocorrem em serviços comerciais de sexo, nos quais a prostituição está incluída; e o terceiro que compreende publicações que buscam analisar a relação da prostituição com as estruturas sociais e econômicas. Seguem as considerações finais, nas quais indicamos lacunas e potenciais desenvolvimentos.

Palavras-chave:
Prostituição; Trabalho do sexo; Estudos Organizacionais

ABSTRACT

This article presents the theme of prostitution in publications of the field of Organization Studies. An interpretative reading of the publications found in national and international journals in the field was carried out, which resulted in the organization of three sets of texts. The first set comprises publications that analyze prostitution considering aspects related to the psychodynamics; the second includes texts that analyze bodies and their roles in exchanges occurring in commercial sex services, in which prostitution is included; and the third seeks to relate prostitution with socioeconomic structures. Follows the Final Considerations, in which we identify absences and potential developments.

Keywords:
Prostitution; Sex work; Organization Studies

RESUMEN

Este artículo presenta el tema de la prostitución en publicaciones del campo de los Estudios Organizacionales. Se realizó una lectura interpretativa de las publicaciones encontradas en revistas nacionales e internacionales del campo, lo que resultó en la organización de tres conjuntos de textos. En el primer se encuentran publicaciones que analizan la prostitución considerando aspectos de la psicodinámica; en el segundo se encuentran textos que analizan los cuerpos y sus roles en intercambios que ocurren en servicios comerciales de sexo, en los cuales se incluye la prostitución; el tercer conjunto busca relacionar las modalidades de prostitución con estructuras socioeconómicos. Siguen las Consideraciones Finales, en las cuales se identifican lacunas y desarrollos potenciales.

Palabras clave:
Prostitución; Trabajo del sexo; Estudios Organizacionales

INTRODUÇÃO

O tema da prostituição aparece em publicações relacionadas com os Estudos Organizacionais (EO) no início da década de 1980, em conexão com a emergência dos Critical Management Studies (CMS) e com análises acerca da sexualidade predominantemente influenciadas pelo pós-estruturalismo (HEARN, 2011HEARN, J. Sexualities, work, organizations, and managements: Empirical, Policy, and Theoretical Challenges. In: JEANES, E.; KNIGHTS, D.; MARTIN, P. Y. (ed..). Handbook of Gender, Work & Organization. Chichester: Wiley, 2011. p. 299-314., 2014; BREWIS; TYLKER; MILLS, 2014BREWIS, J.; TYLER, M.; MILLS, A. Sexuality and organizational analysis - 30 years on: Editorial introduction. Organization, v. 21, n. 3, p. 305-311, 2014.). Além disso,

[...] embora o comércio do sexo constitua uma indústria globalmente interligada e efetivamente administrada, que oferece alta lucratividade em nível organizacional e para os proprietários, os debates acerca da essência de tal comércio têm levantado de modo surpreendente pouco interesse nos Estudos Organizacionais, em gestão e nos CMS (HEARN; HOLGERSSON; JYRKINNEN, 2015HEARN, J.; HOLGERSSON, C.; JYRKINEN, M. Sexualities and/ in ‘critical’ management studies. In PRASAD, A. et al. (Eds.). The Routledge companion to critical management studies. Oxon: Routledge, 2015. p. 124-139., p. 126).

Tendo encontrado essas indicações iniciais, pensamos que seria importante entender como o tema da prostituição tem sido abordado em periódicos reconhecidos no campo dos EO e quais as lacunas que persistem, além da já mencionada. Para isso, realizamos uma pesquisa em bases de dados. Ressalte-se que não se trata de um estudo bibliométrico ou de um estudo de revisão. A busca foi dirigida não apenas por palavras-chave, mas também para periódicos que são valorizados nesse campo de estudos. O termo de busca foi ‘prostituição’. Na sequência, foi adicionado outro critério de busca, relacionando-o com trabalho, tendo em vista o movimento pelo reconhecimento da prostituição como trabalho do sexo. Não foi incluída nenhuma restrição temporal.

A pesquisa em periódicos nacionais foi feita através do Portal Scielo e resultou em um número pequeno de publicações em periódicos relacionados com os EO. A pesquisa em periódicos internacionais foi feita no Portal de Periódicos da Capes, SCOPUS, Sage e Wiley Pubs., assim como diretamente nos periódicos Organization e Gender, Work & Organization, pela sua relevância nos EO. Além da maior quantidade, foram publicados no periódico Gender, Work & Organization trabalhos de autores reconhecidos em termos de tempo dedicado ao tema, publicações e citações para o debate contemporâneo sobre a prostituição: O'Connell Davidson (1995); Brewis e Linstead (2000aBREWIS, J.; LINSTEAD, S. “The worst thing is the screwing” (1): consumption and the management of identity in sex work. Gender, Work & Organization, v. 7, n. 2, p. 84-97, 2000a., 2000b); e Sanders (2005SANDERS, T. “It's just acting”: sex workers’ strategies for capitalizing on sexuality. Gender, Work & Organization, v. 12, n. 4, p. 319-342, 2005.).

Também foram considerados livros referidos nos artigos encontrados, com destaque para: Sex, Work and Sex Work: Eroticizing Organization (BREWIS; LINSTEAD, 2000cBREWIS, J.; LINSTEAD, S. Sex, work and sex work: eroticizing organization. London: Routledge, 2000c.); Live Sex Acts: Women Performing Erotic Labor (CHAPKIS, 1997CHAPKIS, W. Live sex acts: women performing erotic labor. New York: Routledge, 1997.); Body/Sex/Work: Intimate, Embodied and Sexualized Labour (WOLKOWITZ et al., 2013WOLKOWITZ, C. et al. (ed.). Body/sex/work: intimate, embodied and sexualised labour. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2013.); e Dirty Work (SIMPSON et al., 2012SIMPSON, R. et al (ed.). Dirty work: concepts and identities. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2012.).

Tendo selecionado os trabalhos, foi realizada uma leitura interpretativa para reconhecer o tratamento dado ao tema da prostituição. Essa interpretação resultou na organização de três conjuntos: o primeiro compreende publicações que analisam a prostituição considerando aspectos relacionados à psicodinâmica; o segundo inclui textos que abordam os corpos e seus papeis em trocas que ocorrem em serviços comerciais de sexo, nos quais a prostituição está incluída; e o terceiro que compreende publicações que buscam analisar a relação da prostituição com as estruturas sociais e econômicas.

Na sequência, se encontra a apresentação e discussão da presença do tema da prostituição em publicações relacionadas com os EO e as considerações finais, nas quais indicamos lacunas e potenciais desenvolvimentos.

1 ABORDAGENS COM ÊNFASE EM ASPECTOS DA PSICODINÂMICA

Duas das primeiras publicações sobre a sexualidade ocorreram no periódico Organization Studies e são creditadas a Hearn e Parkin (1983HEARN, J.; PARKIN, W. Gender and organizations: a selective review and a critique of a neglected area. Organization Studies, v. 4, n. 3, p. 219-242, 1983.) e a Burrell (1984BURRELL, G. Sex and organizational analysis. Organization Studies, v. 5, n. 2, p. 97-118, 1984.). Nelas, os autores analisaram a conexão entre processos de sexualidade e relações de trabalho em diferentes instâncias organizacionais a partir de aspectos de poder, controle e resistência (BREWIS; TYLKER; MILLS, 2014BREWIS, J.; TYLER, M.; MILLS, A. Sexuality and organizational analysis - 30 years on: Editorial introduction. Organization, v. 21, n. 3, p. 305-311, 2014.).

Burrell (1984BURRELL, G. Sex and organizational analysis. Organization Studies, v. 5, n. 2, p. 97-118, 1984., p. 100), em Sex and Organizational Analysis, aborda o desenvolvimento, nas sociedades industriais, de um processo de “dessexualização organizacional” que se efetiva na organização racional burocrática e no discurso estrutural-funcionalista dominante. Para o autor, o trabalho e a sexualidade são figurados como aspectos separados da vida e, nas relações de trabalho, opostos. Segundo Hearn (2011HEARN, J. Sexualities, work, organizations, and managements: Empirical, Policy, and Theoretical Challenges. In: JEANES, E.; KNIGHTS, D.; MARTIN, P. Y. (ed..). Handbook of Gender, Work & Organization. Chichester: Wiley, 2011. p. 299-314., p. 307), as consequências dessa cisão incluem a supressão da sexualidade e da dimensão erótica na análise das relações de trabalho. Essas, quanto mencionadas, apareciam de modo estrito e se referindo a temas como pornografia, prostituição e comércio sexual, sintetizados no texto com o uso do termo “sexploitation”.

Foram, então, realizados estudos sobre os aspectos eróticos presentes nas relações de trabalho e a análise da indústria do sexo (sex industry)4 4 Indústria do sexo é a tradução literal de sex industry. No inglês, um dos significados de industry se refere a pessoas e atividades envolvidas em um setor de negócios. Sendo assim, sex industry se refere a atividades comerciais relacionadas a serviços sexuais, tais como prostituição, dança erótica, pornografia, tele-sexo etc. foi ampliada para fenômenos que eram (e, em parte, ainda são) vistos como excedentes à prostituição, tais como as terapias sexuais e as performances eróticas artísticas (BURRELL; HEARN, 1989BURRELL, G.; HEARN, J. The sexuality of organization. In: HEARN, J. et al. (ed.). The sexuality of organization. London: Sage, 1989. p. 1-28.; BREWIS; LINSTEAD, 2000bBREWIS, J.; LINSTEAD, S. “The worst thing is the screwing” (2): context and career in sex work. Gender, Work & Organization, v. 7, n. 3, p. 168-180, 2000b.). Surgiu, assim, no espaço dos CMS, a vertente da sexualidade organizacional (organizational sexuality). Nela, a prostituição é mencionada como um fenômeno particular do trabalho sexual e tratada como uma das diferentes ocupações que lidam com aspectos eróticos, corporais e estéticos (HEARN, 2011).

As publicações referentes a essa perspectiva, em periódicos dos EO, encontram-se sistematizadas no Quadro 1 e estão agrupadas em dois conjuntos: estudos internacionais que abordam a prostituição como uma forma de trabalho emocional, estético, erótico, entre outras derivações explicadas na sequência; e estudos desenvolvidos por autores brasileiros que estudam a prostituição em referência aos sentidos subjetivos do trabalho.

Quadro 1
A prostituição e a psicodinâmica da sexualidade organizacional

No primeiro conjunto, a prostituição é considerada como um tipo específico de trabalho em que se destacam os aspectos emocional, corporal, estético e erótico. Nesse conjunto se encontram os trabalhos mais citados e autores reconhecidos no contexto anglo-saxão dos EO, com destaque para Brewis e Linstead (2000aBREWIS, J.; LINSTEAD, S. “The worst thing is the screwing” (1): consumption and the management of identity in sex work. Gender, Work & Organization, v. 7, n. 2, p. 84-97, 2000a., 2000b, 2000c).

Segundo Fleming (2007FLEMING, P. Sexuality, power and resistance in the workplace. Organization Studies, v. 28, n. 2, p. 239-256, 2007.), essa linha de trabalho foi influenciada pela popularidade dos estudos sobre biopoder e sexualidade realizados por Michel Foucault (1995FOUCAULT, M. O sujeito e o poder. In; DREYFUS, H.; RABINOW, P. (ed.) Michel Foucault, uma trajetória filosófica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995. p. 231-249., 1997, 1999) no final da década de 1970, por autores como Deleuze e Guattari (2004DELEUZE, G.; GUATTARI, F. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia.Vol. 3. Rio de Janeiro: Editora 34, 2004.) e, posteriormente, Judith Butler (1997BUTLER, J. The psychic life of power: Theories in subjection. Redwood: Stanford University Press, 1997., 2000). Para Brewis e Grey (1994BREWIS, J.; GREY, C. Reeroticizing the organization: an exegesis and critique. Gender, Work & Organization, v. 1, n. 2, p. 67-82, 1994.), eles questionam proposições que demarcavam o erotismo e a sexualidade a partir de critérios biológicos e ressaltam que o desenvolvimento desses aspectos da vida ocorre de modo contingencial a relações de poder e epistemes locais.

Inspirada por essas ideias, surgiu a perspectiva da sexualidade organizacional e da re-erotização, que instauraram análises sobre o trabalho sexual. Fundamentando-se na crítica à hipótese repressiva elaborada por Foucault (1999FOUCAULT, M. História da Sexualidade 1: A Vontade de Saber. São Paulo: Edições Graal (Original Publicado em 1976), 1999.), Brewis e Grey (1994BREWIS, J.; GREY, C. Reeroticizing the organization: an exegesis and critique. Gender, Work & Organization, v. 1, n. 2, p. 67-82, 1994.) argumentam que a perspectiva da re-erotização supera proposições libertárias e revolucionárias da sexualidade baseadas em Reich (1981REICH, W. A revolução sexual. 7. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.) e Marcuse (1999MARCUSE, H. Eros e civilização: uma interpretação filosófica do pensamento de Freud. Rio de Janeiro: LTC, 1999.), ao enfatizar relações de poder que não possuem um domínio geral e defender um ativismo de desconstrução e transgressão dessas relações e dos saberes a elas atrelados para que os indivíduos habitem modos mais livres de existir.

Segundo Cohen et al. (2013COHEN, R. L. et al. The body/sex/work nexus: a critical perspective on body work and sex work. In WOLKOWITZ, C. et al. (Eds.). Body/sex/work: intimate, embodied and sexualised labour. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2013. p. 3-27.), essa perspectiva impactou de modo peculiar a compreensão acerca da prostituição, que deixou de ser concebida como uma atividade essencialmente exploratória e destruidora da personalidade para ser analisada como um fenômeno de relações de emprego e processos de trabalho que envolvem a mercantilização e a individualização do corpo, das emoções e da sexualidade.

Nessa perspectiva, a prostituição é analisada em processos de embodiment. São discutidas as concepções estáticas, biológicas e naturalistas do corpo e abordado seu papel em processos contingenciais de subjetivação. Os autores usualmente situam relações difusas de poder que reverberam na constituição corpórea de pessoas assujeitadas que tomam os esquemas difundidos nas estratégias biopolíticas (de biopoder) como próprios. Para exemplificar essa compreensão, segue a o trecho da análise de Pentinnen (2010, p. 31) sobre a indústria global do sexo, na qual a globalização é considerada como uma forma de biopoder que produz subjetividades genderizadas e etnicizadas:

Foucault explica que o poder subjetivante opera de três maneiras: primeiro, ao nomear o sujeito; segundo, por meio de práticas divisórias que diferenciam o normal e o anormal; terceiro, ao transformar os indivíduos em sujeitos. Foucault argumenta que o poder subjetiva os indivíduos ao subordiná-los, mas também os transforma em sujeitos autônomos, amarrando-os a uma identidade própria. Butler desenvolve essa discussão sobre indivíduos se transformando em sujeitos, teorizando onde e como essa transformação ocorre e quais são suas implicações em termos de agência. Ela mostra que tornar-se sujeito, ou seja, sujeitar-se ao poder, é desejável, pois proporciona reconhecimento como sujeito e, assim, também agência. Butler explica que o poder sempre precede o sujeito. Ele atua no sujeito, mas esse poder é uma forma de ativação e ela ativa o sujeito no ser. A subjetividade internalizada é embodied e desempenhada por meio do corpo, mas a interpretação da individualização do poder não é pré-determinada, e essa quebra proporciona a ligação da agência inerente nos processos de subjetivação.

Inserindo-se nessa perspectiva, Brewis e Linstead (2000bBREWIS, J.; LINSTEAD, S. “The worst thing is the screwing” (2): context and career in sex work. Gender, Work & Organization, v. 7, n. 3, p. 168-180, 2000b., p. 174) argumentam que as pessoas em situação de prostituição tomam para si “identidades profissionais” que as auxiliam a conquistar clientes, proporcionar maior aferimento de renda e diminuir os impactos da mercantilização do corpo e da personalidade. Nessa lógica, a prostituição é vista sob a ótica da incorporação provisória de estilos profissionalizantes e gerenciais que proporcionam maior controle na interação com clientes pelo domínio de práticas e ideias relacionadas ao

[...] marketing, contabilidade, planejamento de negócios, gestão de propriedade, controle financeiro, promoção, empreendedorismo, conhecimento legislativo, habilidades políticas, educação, atuação, aconselhamento e gestão de recursos humanos, mesmo sem considerar aquelas mais ligadas à arte erótica (ars erótica) da qual a profissão é fundada (BREWIS; LINSTEAD, 2000bBREWIS, J.; LINSTEAD, S. “The worst thing is the screwing” (2): context and career in sex work. Gender, Work & Organization, v. 7, n. 3, p. 168-180, 2000b., p. 168-169).

Considerando que o trabalho realizado por Brewis e Linstead (2000cBREWIS, J.; LINSTEAD, S. Sex, work and sex work: eroticizing organization. London: Routledge, 2000c.) é muito difundido e utilizado como referência, suas proposições são apresentadas em mais detalhes nos próximos parágrafos.

Além de aspectos gerenciais, Brewis e Linstead (2000cBREWIS, J.; LINSTEAD, S. Sex, work and sex work: eroticizing organization. London: Routledge, 2000c., p. 4) destacam que as pessoas podem atuar, na prostituição, como agentes transgressores no que intitulam “duplo efeito discursivo” da organização do trabalho do sexo, isto é, esquemas que polarizam fenômenos do trabalho sexual entre os extremos da necessidade e abjeção e da profissionalização e perversão. Para os autores, o trabalho do sexo

[...] é o ponto crucial entre a sexualidade e a organização. Isso ocorre porque encontramos o trabalho do sexo sujeito a uma dupla rejeição - a primeira na construção discursiva da sexualidade "normal" em virtude de ser comercializada e organizada e, portanto, inautêntica; a segunda na construção discursiva da organização porque é sexual e, portanto, ilegítima. O trabalho do sexo, portanto, captura e constitui um exemplo de uma categoria de ser psicológico e social que é um elemento importante em nossa compreensão dos processos do desejo - o abjeto (BREWIS; LINSTEAD, 2000cBREWIS, J.; LINSTEAD, S. Sex, work and sex work: eroticizing organization. London: Routledge, 2000c., p. 1).

Apesar de situar a prostituição no interior da polarização entre organização (concebida como trabalho) e sexualidade, Brewis e Linstead (2000bBREWIS, J.; LINSTEAD, S. “The worst thing is the screwing” (2): context and career in sex work. Gender, Work & Organization, v. 7, n. 3, p. 168-180, 2000b.) destacam que na relação entre trabalho sexual e prostituição, a última explicita o território adicional e liminar da sexualidade normalizada e autêntica. Para esses autores, a comercialização do desejo sexual realizada na indústria do sexo “assombra as fronteiras da organização”, pois “[...] parece confundir princípios organizacionais tão importantes como diferenciação, ordem, regulação, padronização, estabilidade e até mesmo tamanho”, ao mesmo tempo em que tensiona os limites do que pode ser publicamente comercializado e privativamente resguardado (BREWIS; LINSTEAD, 2000cBREWIS, J.; LINSTEAD, S. Sex, work and sex work: eroticizing organization. London: Routledge, 2000c., p. 13).

Essas proposições indicam uma análise dos aspectos liminares e contingenciais da prostituição com base nas variações espaciais e temporais dos discursos que objetivam corpos e comportamentos e que subjetivam seres de sexualidade e de trabalho. Dessa maneira, a própria noção de organização pode ser re-erotizada: “Esse tipo de re-erotização não é apenas emancipatória, mas transgressora, não apenas das formas organizacionais, mas potencialmente da própria ideia de organização” (BREWIS; LINSTEAD, 2000cBREWIS, J.; LINSTEAD, S. Sex, work and sex work: eroticizing organization. London: Routledge, 2000c., p. 182).

Segundo Brewis e Linstead (2000cBREWIS, J.; LINSTEAD, S. Sex, work and sex work: eroticizing organization. London: Routledge, 2000c., p. 202), Deleuze e Guattari (2004DELEUZE, G.; GUATTARI, F. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia.Vol. 3. Rio de Janeiro: Editora 34, 2004.) sugerem que

[...] a prostituta pode potencialmente desempenhar uma função radical e politizada, pois o desejo circula em oposição ao capitalismo, ao mesmo tempo que emprega, combina e descarta as formas culturais capitalistas - as botas, as meias, o corpete - para intensificar a sensação. Estar simplesmente envolvido no trabalho sexual é, portanto, potencialmente libertador e transgressivo.

Utilizam, também, a análise sobre a fragmentação do desejo de Lyotard (1974LYOTARD, J. Economie libidinale. Paris: Éditions de Minuit, 1974.). Com esses aportes, definem as pessoas em situação de prostituição como “ativistas da resistência” e empreendedores da indústria do consumo que, ao se profissionalizarem, resguardam aspectos essenciais de sua personalidade e desempenham existências dissidentes em relação ao que é estabelecido como normal (BREWIS; LINSTEAD, 2010c, p. 202). Com base nas proposições de Foucault (1997FOUCAULT, M. Sex, power, and the politics of identity. In RABINOW, P. (ed.). Essential works of Foucault 1954-1984. Ethics: subjectivity and truth. Vol. 1. New York: The New Press,1997, p. 163-174.), Brewis e Linstead (2010c) destacam que as modalidades contemporâneas de sadomasoquismo, com destaque para as que não estão voltadas para a penetração e a dominação de pessoas afeminadas, especulam novos modelos de organização e abrem campo para outras identidades pessoais e profissionais.

Para West e Austrin (2002WEST, J.; AUSTRIN, T. From work as sex to sex as work: networks, ‘others’ and occupations in the analysis of work. Gender, Work & Organization, v. 9, n. 5, p. 482-503, 2002.), essa perspectiva pressupõe que as relações de trabalho que envolvem aspectos eróticos e de sexualidade apresentam um aspecto contingencial da organização social do desejo em que habitam diferentes posições, em um contínuo que vai de atividades exclusivamente necessárias e profissionais a atividades abjetas, imorais e perversas. Esses estudos enfatizam o caráter contingencial dos diferentes fenômenos da indústria do sexo e ressaltaram trocas dissonantes com os consumidores, sem estabelecer suas ligações com o contexto geral. O foco no desejo e na "psicodinâmica da sexualidade organizacional" tem, de acordo com West e Austrin (2002, p. 490), como finalidade exclusiva a difusão de identidades que desconsideram estrutura sociais mais amplas: “[...] o interesse pelo trabalho e a produção convencional é especificamente abandonado pela afirmação de que sua preocupação é em como o sentido particular de organização é produzido, especificamente no sentido de nós mesmos como seres sexuais".

Na revisão dos periódicos, também foram identificados estudos realizados no Brasil e que compartilham a análise sobre os sentidos subjetivos produzidos no ato da troca comercial que se concretiza na prostituição. Silva e Cappelle (2015SILVA, K.; CAPPELLE, M. Sentidos do trabalho apreendidos por meio de fatos marcantes na trajetória de mulheres prostitutas. Revista de Administração Mackenzie, v. 16, n. 6, p. 19-47, 2015.) adotam o conceito de sentidos subjetivos do trabalho, desenvolvido por Rey (2003REY, F. Sujeito e subjetividade: uma aproximação histórico-cultural. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003.), para destacar os processos simbólicos e emocionais que legitimam uma produção subjetiva a partir dos sentidos que os indivíduos atribuem ao próprio trabalho. Nesse estudo, as autoras identificam que as prostitutas incorporam aspectos de violência, insegurança e imoralidade. Em outro estudo, Silva e Capelle (2017) inspiram-se em Vygotsky (1991VYGOTSKY, L. S. Obras escogidas II: problemas de psicología general. Madrid: Visor Distribuciones, 1991.), Dejours (2000DEJOURS, C. Travail, usure mentale: nouvelle edition augmentée. Paris: Bayard, 2000.) e Morin (2002MORIN, E. Os sentidos do trabalho. In: WOOD, T. (ed.). Gestão empresarial: o fator humano. São Paulo, SP: Atlas, 2002. p. 13-34.) para analisar a produção de sentidos na psicodinâmica da prostituição no mercado de luxo. Concluíram que a interação com os clientes é uma relação mercadológica na qual são constituídas diferentes identidades e fantasias. Esses sentidos se intersectam com os estigmas negativos atrelados à prostituição e impactam as relações extratrabalho dos participantes, com destaque para as relações familiares.

Pereira et al. (2018PEREIRA, J. R. et al. 'O Show tem que continuar': encalços e percalços do ser/estar prostituta. Contextus - Revista Contemporânea de Economia e Gestão, v. 16, n. 3, p. 151-180, 2018.) analisam, em Belo Horizonte, como os sentidos atribuídos à prostituição se constituíam no processo de identificação e construção identitária. As análises revelam que a constituição subjetiva dos participantes da pesquisa reflete o modo frágil e fragmentado como percebem o atuar na prostituição, principalmente por ela estar atrelada a uma forma de trabalho sujo (PEREIRA et al., 2018PEREIRA, J. R. et al. 'O Show tem que continuar': encalços e percalços do ser/estar prostituta. Contextus - Revista Contemporânea de Economia e Gestão, v. 16, n. 3, p. 151-180, 2018.). Em outro estudo, Pereira et al. (2020) analisam, também em Belo Horizonte, a construção identitária de prostitutas evangélicas e identificam que elas incorporam os estigmas negativos relacionados à atividade e potencializados pela moralidade religiosa.

Paiva et al. (2020PAIVA, K. et al. Mulheres de vida fácil? Tempo, prazer e sofrimento no trabalho de prostitutas. Revista de Administração de Empresas, v. 60, n. 3, p. 208-221, 2020., p. 216) analisam a influência de percepções acerca do tempo nas vivências de prazer e sofrimento, novamente em Belo Horizonte. Esse estudo identificou que os participantes concebem os aspectos temporais como algo que pode ser mercantilizado, controlado e precificado em função do período e velocidade de realização dos programas. Essas duas dimensões do tempo, período e velocidade, remetem a um aspecto de prazer que é o aferimento mais célere de renda, ou seja, ao “processo latente de empoderamento” pelo dinheiro. A maior duração da atividade é considerada uma fonte de sofrimento relacionada ao desgaste físico e mental, às demandas por terceiros para que realizem maior quantidade de programas em menos tempo, e aos impactos de atuação numa atividade que é concebida como uma forma de trabalho sujo, imoral e pecaminoso. Para os autores, os participantes vivenciam, na prostituição, mais situações de sofrimento do que de prazer, e essa desproporção gera crises e fragmentações identitárias.

2 A PROSTITUIÇÃO COMO UM SERVIÇO COMERCIAL DE SEXO

Na busca realizada também foram encontrados trabalhos que abordam os corpos e seus papeis em interações que ocorrem em serviços comerciais de sexo, nos quais a prostituição, que se distingue por ser um serviço sexual direto (HARDY, 2013HARDY, K. Equal to any other, but not the same as any other: the politics of sexual labour, the body and intercorporeality. In: WOLKOWITZ, C. et al. (ed.). Body/sex/work: intimate, embodied and sexualised labour. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2013. p. 43-58.), está incluída. No Quadro 2 se encontra uma sistematização de temas e autores, deixando claro que se referem à prostituição, mas também a atividades como dança erótica, pornografia, terapia sexual etc.

Quadro 2
Interações em serviços comerciais de sexo

Na abordagem do trabalho emocional, a atividade é concebida e valorizada positivamente com referência a um aspecto terapêutico que remete ao cuidado e satisfação das necessidades físicas e emocionais dos consumidores; ao mesmo tempo em que inclui um aspecto profissionalizante, já que no contexto de realização dos programas são resguardados aspectos essenciais da personalidade e a trocas são condicionadas de acordo com suas finalidades econômicas (BRENTS; JACKSON, 2013BRENTS, B. G.; JACKSON, C. A. Gender, emotional labour and interactive body work: negotiating flesh and fantasy in sex worker’s labour practices. In: WOLKOWITZ, C. et al. (ed.). Body/sex/work: intimate, embodied and sexualised labour. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2013. p. 77-92.). Essa noção de trabalho foi desenvolvida por Hochschild (2012HOCHSCHILD, A. R. The managed heart: commercialization of human feeling. Berkley: University of California Press, 2012.) para enfatizar o gerenciamento das emoções e a criação, por pessoas que realizam serviços que lidam diretamente com usuários e clientes (p. ex., os comissários de bordo), de uma corporalidade publicamente observável. Segundo a autora, o exercício emocional de cuidar dos outros e de si confere aos prestadores de determinado serviço um valor de uso que é comercializado por um salário e, portanto, possui um valor de troca. Seguindo essas ideias, Chapkis (1997CHAPKIS, W. Live sex acts: women performing erotic labor. New York: Routledge, 1997., p. 75) defende que, na prostituição, é realizada uma gestão corpórea e psíquica que contribui para que as emoções sejam mercantilizadas de modo controlado, a exemplo do trabalho realizado por atores, psicoterapeutas e enfermeiros. Em suas palavras: “[...] para trabalhadores do sexo, a habilidade de convocar (summon) e conter a emoção durante a transação comercial pode ser experimentada mais como uma ferramenta útil para a manutenção de limites do que como uma perda do self”.

Foram também encontrados textos nos quais a atividade é concebida como uma forma de trabalho estético, no sentido de que os atributos físicos são utilizados para criar personagens que estimulam eroticamente os consumidores (WARHURST; NICKSON, 2009WARHURST, C.; NICKSON, D. ‘Who's got the look?’: emotional, aesthetic and sexualized labour in interactive services. Gender, Work & Organization, v. 16, n. 3, p. 385-404, 2009.). Essa perspectiva, segundo Hardy (2013HARDY, K. Equal to any other, but not the same as any other: the politics of sexual labour, the body and intercorporeality. In: WOLKOWITZ, C. et al. (ed.). Body/sex/work: intimate, embodied and sexualised labour. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2013. p. 43-58.), identifica a prostituição como uma gestão estratégica do corpo e da aparência cuja finalidade é apelar aos sentidos e cumprir requisitos mercadológicos, a exemplo do cuidado estético realizado por pessoas que trabalham no comércio de alta costura e em serviços ligados à indústria de feiras e do entretenimento noturno. Sanders (2005SANDERS, T. “It's just acting”: sex workers’ strategies for capitalizing on sexuality. Gender, Work & Organization, v. 12, n. 4, p. 319-342, 2005.) utilizou as categorias de trabalho emocional e estético para evidenciar processos de manufatura identitária. Ou seja, no contexto de realização dos programas são criados mecanismos de autoproteção contra o estresse ocorrido durante a venda do sexo. Além disso, é adotado um discurso profissionalizante para atrair e manter a clientela, e capitalizar por meio da sexualidade. Entre as estratégias descritas estão a criação de zonas de exclusão corpóreas, como, por exemplo, a proibição do beijo; a criação de barreiras psicológicas de contato carnal e de fluidos, como o uso de preservativos; e a realização de serviços de dominação (dominatrix). Para a autora, esses modos de desempenhar são estratégias de negócio e criam uma mercantilização situacional benéfica e positiva para as pessoas no exercício da prostituição.

Na abordagem trabalho corporal são tratadas as estratégias de gestão do corpo (WOLKOWITZ, 2006WOLKOWITZ, C. Bodies at work. London: Sage, 2006.). Segundo Hardy (2013HARDY, K. Equal to any other, but not the same as any other: the politics of sexual labour, the body and intercorporeality. In: WOLKOWITZ, C. et al. (ed.). Body/sex/work: intimate, embodied and sexualised labour. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2013. p. 43-58.), essa perspectiva considera os contatos corporais íntimos e traz à tona a relação material e simbólica existente entre o servidor e o cliente, tal como ocorre em serviços de assistência social e estética. Nessa lógica, a prostituição é tratada como parte dos serviços que estimulam processos de aprendizagem háptica (tátil) e simbólica, a exemplo dos serviços de massagem e da anamnese médica (COHEN et al., 2013COHEN, R. L. et al. The body/sex/work nexus: a critical perspective on body work and sex work. In WOLKOWITZ, C. et al. (Eds.). Body/sex/work: intimate, embodied and sexualised labour. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2013. p. 3-27.). De modo similar, alguns estudos a concebem como um trabalho sexual interativo que remete aos jogos realizados entre as pessoas em situação de prostituição e usuários pela cobrança e acesso tátil ao corpo, tal como ocorre nos serviços de dança erótica e striptease (CHAPKIS, 1997CHAPKIS, W. Live sex acts: women performing erotic labor. New York: Routledge, 1997.; SANDERS, 2005SANDERS, T. “It's just acting”: sex workers’ strategies for capitalizing on sexuality. Gender, Work & Organization, v. 12, n. 4, p. 319-342, 2005.).

Hales, Riach e Tyler (2019HALES, S.; RIACH, K.; TYLER, M. Putting sexualized labour in the picture: encoding “reasonable entitlement” in the lap dancing industry. Organization, v. 26, n. 6, p. 783-801, 2019.) analisam a intercorporeidade a partir da fenomenologia existencialista proposta por Merleau-Ponty (1994). As autoras estudam como as subjetividades e configurações organizacionais que constituem uma modalidade de dança erótica chamada de lap dancing (ou dança de colo) moldam as experiências vividas durante as interações íntimas com os clientes. Ao fazê-lo, identificaram como as publicidades presentes em filmes e sites relacionados ao lap dancing são percebidas e, posteriormente, codificadas, incorporadas e incrustadas (embedded) nos programas por pessoas em situação de prostituição. Essa perspectiva defende que a subjetividade se constitui em organizações situacionais e contingenciais e, portanto, a organização é concebida como a situação na qual modos condicionados de perceber o mundo externo são materializados em interações significativas. Assim, essa materialização em corpos e comportamentos traz à tona a existência de cenários refratados do mundo externo. No cenário analisado por Hales, Riach e Tyler (2019, p. 2), as propagandas condicionam um “embodiment organizacional” a partir do qual as pessoas se constituem subjetivamente e agem como objetos a serem consumidos. Ao fazê-lo, desempenham, provisoriamente, subjetividades particulares que articulam, nessas configurações mercadológicas, seus corpos e capacidades afetivas. Para complementar essa análise, as autoras utilizam a analítica performativa de Butler (2010BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.) para fundamentar o caráter efêmero dessa constituição subjetiva. Nesse sentido, as pessoas se subjetivam como uma mercadoria somente no contexto dos programas, quando incorporam e refratam desempenhos particulares que são demandados pela indústria do sexo e, na intercorporeidade, realizam, um trabalho emocional, corpóreo e estético (HALES; RIACH; TYLER, 2019HALES, S.; RIACH, K.; TYLER, M. Putting sexualized labour in the picture: encoding “reasonable entitlement” in the lap dancing industry. Organization, v. 26, n. 6, p. 783-801, 2019.).

Outra perspectiva é a do trabalho sujo, influenciada por autores do interacionismo simbólico, em especial pelo trabalho de Hughes (1962HUGHES, E. C. Good people and dirty work. Social problems, v. 10, n. 1, p. 3-11, 1962.). Ashforth e Kreiner (1999ASHFORTH, B. E.; KREINER, G. “How can you do it?”: dirty work and the challenge of constructing a positive identity. Academy of Management Review, v. 24, n. 3, p. 413-434, jul. 1999.) analisam a construção identitária de trabalhadores de atividades que são socialmente percebidas como nojentas ou degradantes, a exemplo de ocupações que lidam com o lixo, a morte e efluentes, assim como aquelas que são realizadas em condições perigosas ou nocivas. Segundo os autores, os aspectos físicos, sociais e morais associados a essas ocupações estigmatizam os trabalhadores, que podem internalizar esses aspectos negativos ou os converter em fatores de resistência:

[...] o estigma do trabalho sujo torna o papel do trabalho per se saliente, e a ameaça incorporada no estigma promove uma forte coesão e o surgimento de uma cultura ocupacional ou de grupo de trabalho, que ajuda a combater a ameaça. Quanto mais forte a ameaça, mais forte é a cultura e mais as percepções de "nós contra eles" são reforçadas. Uma cultura forte fornece os recursos sociais para reformular, recalibrar e redirecionar o significado do trabalho sujo - ou seja, para fomentar ideologias enobrecedoras. As ideologias do trabalho sujo muitas vezes glorificam precisamente aqueles aspectos do trabalho que são mais estigmatizados (ASHFORTH; KREINER, 1999ASHFORTH, B. E.; KREINER, G. “How can you do it?”: dirty work and the challenge of constructing a positive identity. Academy of Management Review, v. 24, n. 3, p. 413-434, jul. 1999., p. 428).

Segundo Grandy e Mavin (2012GRANDY, G.; MAVIN, S. Doing gender in dirty work: Exotic dancers’ construction of self-enhancing identities. In: SIMPSON, R. et al. (ed..). Dirty work: concepts and identities. London: Palgrave Macmillan, 2012. p. 91-112.), esses processos ocorrem também em uma estrutura que é composta e sobreposta por hierarquias de sexo, estigmas particulares à atividade e ao trabalho sujo. Assim, o tema da prostituição não é relacionado com a comercialização, mas com estigmas sociais. Desse modo, os fatores relacionados a estigmas negativos ou positivos fazem com que as pessoas que se prostituem se construam e sejam socialmente vistas como outros trabalhadores que realizam atividades estigmatizadas (KONG, 2006KONG, T. What it feels like for a whore: the body politics of women performing erotic labour in Hong Kong. Gender, Work & Organization, v. 13, n. 5, p. 409-434, 2006.).

3 EM BUSCA DAS ESTRUTURAS SOCIAIS DA PROSTITUIÇÃO

Finalmente, trazemos os estudos que se propõe a analisar a relação entre prostituição e estruturas sociais, e que são muito influenciados pelos trabalhos de O’Connell Davidson (1995) e de West e Austrin (2002WEST, J.; AUSTRIN, T. From work as sex to sex as work: networks, ‘others’ and occupations in the analysis of work. Gender, Work & Organization, v. 9, n. 5, p. 482-503, 2002.). Em periódicos relacionados aos EO e abordando o tema da prostituição concebida como trabalho do sexo, foram encontradas duas publicações desses autores: The Anatomy of ’Free Choice’ Prostitution’ (O’CONNELL DAVIDSON, 1995O’CONNELL DAVIDSON, J. The anatomy of “free choice” prostitution. Gender, Work & Organization, v. 2, n. 1, p. 1-10, 1995.) e From work as sex to sex as work: Networks, ‘others’ and occupations in the analysis of work (WEST; AUSTRIN, 2002WEST, J.; AUSTRIN, T. From work as sex to sex as work: networks, ‘others’ and occupations in the analysis of work. Gender, Work & Organization, v. 9, n. 5, p. 482-503, 2002.) - ambas em Gender, Work & Organization.

Segundo Ekman (2015EKMAN, K. E. EU project hijacked by the prostitution lobby. Ressources on prostitution, 2015. Disponível em: https://ressourcesprostitution.wordpress.com/2015/09/04/kajsa-ekis-ekman-eu-project-hijacked-by-the-prostitution-lobby/. Acesso em: 13 de fev. de 2020.
https://ressourcesprostitution.wordpress...
), O’Connell Davidson é uma das principais referências europeias no tema da prostituição e tráfico de pessoas para finalidades de exploração sexual. Apesar de ter publicado somente uma vez em periódico do campo dos EO, esse artigo é referido em quase todos os estudos revisados. Sua obra é conhecida por criticar a polarização entre a vertente liberal, que defende o reconhecimento da prostituição como trabalho do sexo, e o neoabolicionismo, que defende a abolição da prostituição. Essa crítica enfatiza a relação entre as desigualdades econômicas e as restrições de ordem extraeconômica que estão presentes em diferentes modalidades de prostituição (WEST; AUSTRIN, 2002WEST, J.; AUSTRIN, T. From work as sex to sex as work: networks, ‘others’ and occupations in the analysis of work. Gender, Work & Organization, v. 9, n. 5, p. 482-503, 2002.).

Para O’Connell Davidson (2015), há um extremo que é composto por pessoas em situação de prostituição que ingressam na atividade devido a limitações econômicas e/ou foram marginalizadas em função de estética, raça, sexualidade, gênero, nacionalidade, entre outros aspectos. As pessoas que habitam esse extremo têm suas possibilidades de agência fortemente limitadas e participam de modalidades de prostituição que se aproximam de formas recentes de escravidão, como o tráfico sexual. O outro extremo é composto por pessoas que ingressam na atividade por cumprirem requisitos estético-comportamentais de mercados de luxo e possuem maior liberdade de atuação na indústria do sexo. Entre esses extremos ocorrem diferentes modalidades de prostituição. Essas variações no exercício da atividade se relacionam com processos de valorização existentes na totalidade da formação socioeconômica capitalista.

Em The anatomy of “free choice” prostitution, O’Connell Davidson (1995) realiza um estudo etnográfico para investigar o tema da livre escolha de pessoas em situação de prostituição que atuavam de modo autônomo (também chamadas de empreendedoras). Após identificar que as pessoas participantes do estudo possuíam um certo controle e poder de negociação com os clientes, a autora argumenta que o neoabolicionismo expressa uma noção simplista e essencialista da atividade, concebendo-a como uma forma de escravidão assalariada e desconsiderando ingressantes que não se encontram em situação de radicais restrições econômicas e possuem possibilidades de agência, mesmo que limitadas.

Ao se referir ao que denomina de modelo liberal, O’Connell Davidson (1995) argumenta que ele também concebe a atividade de modo abstrato, ao considerar que os programas ocorrem nos moldes de trocas voluntárias análogas às relações de trabalho existentes nos setores do entretenimento e da hotelaria. A valorização, na indústria do sexo, ocorre de modo relativamente diferente do trabalho em geral, pois a troca de dinheiro por sexo é, em essência, estigmatizada. O argumento é que, apesar do aumento de investimentos nessa indústria, o estigma do sexo se mantém e se constitui em uma pré-condição e finalidade dessa troca peculiar.

O conceito de valor [na prostituição] pressupõe a troca, e serviços sexuais, diferente da força de trabalho humana, não são geralmente trocados. Nas sociedades capitalistas, a norma é vender a força de trabalho e as pessoas não são desonradas por temporariamente "terceirizarem" esta forma de "propriedade" em sua pessoa. Mas os atos sexuais não são tipicamente vistos como mercadorias, e a sexualidade não é plenamente regulada pela ideologia do mercado. Em vez disso, um conjunto complexo de ideias pré-capitalistas e não mercantis - incluindo honra, vergonha, amor, prazer, lealdade - geralmente governam a interação sexual das pessoas. Prostitutas e clientes são socializados em um mundo no qual significados particulares são vinculados à sexualidade humana (significados que sustentam os códigos e convenções que governam a interação sexual), um mundo no qual é amplamente sustentado que o único sexo legítimo é entre homens e mulheres que amam uns aos outros e que “dinheiro não compra amor”. Ao comprar o acesso à “propriedade sexual” que uma prostituta tem em sua pessoa, o cliente leva a prostituta a um mundo social marginal no qual “'serviços sexuais” são considerados como tendo um valor de troca e no qual não se aplicam os códigos e convenções 'normais' que regulam a interação entre parceiros sexuais. A vida profissional da prostituta, portanto, ocorre em um espaço entre dois mundos, incompletamente dominado pela ideologia do mercado livre e, ainda assim, separado dos valores e códigos pré-mercado (O’CONNELL DAVIDSON, 1995O’CONNELL DAVIDSON, J. The anatomy of “free choice” prostitution. Gender, Work & Organization, v. 2, n. 1, p. 1-10, 1995., p. 9).

Para O’Connell Davidson (1995, p. 8), a prostituição não possui “[...] um valor de troca significativo e mensurável”. O motivo apresentado pela autora é que pessoas mercantilizam algo “[...] que é socialmente construído como parte integrante de sua identidade, sua honra, sua posição na sociedade” (O’CONNELL DAVIDSON, 1995O’CONNELL DAVIDSON, J. The anatomy of “free choice” prostitution. Gender, Work & Organization, v. 2, n. 1, p. 1-10, 1995., p. 9). Nessa proposição, a prostituição habita um espaço liminar entre as determinações econômicas e as da sexualidade. Essa posição impede que a atividade seja plenamente mercantilizada e que as pessoas que vendem os corpos e a personalidade o façam como qualquer mercadoria ou forma de serviço, já que os valores associados à troca sexual íntima são pressupostos nessa troca. Assim, o componente do estigma é uma parte necessária e inerente que, no metabolismo com o dinheiro, é provisoriamente escamoteado. Segundo O’Connell Davidson (1994), o dinheiro é o principium movens que desloca a prostituição a esse mudo liminar que parece ser livre dos códigos e convenções existentes nos encontros sexuais não comerciais. Parece ser possível que as pessoas consigam, no ato de prostituir-se, alienar temporariamente partes do corpo e renunciar aos desejos pessoais e eróticos sem consequências.

Além disso, ela argumenta que na aparência de uma relação contratual5 5 A crítica à lógica liberal e contratualista de mercado usualmente proferida pelos defensores do trabalho do sexo é creditada a Pateman (1988). Segundo a autora, a ilusão de uma relação contratual igualitária na prostituição esconde as finalidades da exploração capitalista. Como uma relação de consumo, discute também que o cliente da prostituição não a toma como uma relação quantitativa e meio para novas trocas e valorizações, mas objetiva o uso qualitativo e o consumo final. voluntária, profissional e neutra, o valor que se consuma na prostituição parte da estigmatização e tem, nela, uma finalidade inerente. Nessa lógica, “[...] o sustento da prostituta realmente depende da manutenção da própria ideologia que a degrada e a torna uma pária social. Seu status liminar como uma pessoa que não é uma pessoa é, simultaneamente, a fonte de seu estigma e de sua subsistência” (O’CONNELL DAVIDSON, 1995O’CONNELL DAVIDSON, J. The anatomy of “free choice” prostitution. Gender, Work & Organization, v. 2, n. 1, p. 1-10, 1995., p. 9). Além disso, “[...] uma quantia substancial de dinheiro não necessariamente compra uma saída do estigma e suas consequências sociais e psicológicas” (O’CONNEL DAVIDSON, 1995, p. 9).

A divergência da autora em relação aos modelos que denomina liberal e neoabolicionista é sustentada pelo seu diagnóstico da liminaridade da prostituição (BREWIS e LINSTEAD, 2000bBREWIS, J.; LINSTEAD, S. “The worst thing is the screwing” (2): context and career in sex work. Gender, Work & Organization, v. 7, n. 3, p. 168-180, 2000b.). O modo de superar a abstração - como escravidão assalariada ou como trabalho assalariado como qualquer outro - seria adotar uma estratégia mista que leve em conta as duas proposições, mas as articule de um modo que, no curto e médio prazo, proporcione melhores condições de realização da atividade, principalmente por meio da conquista de direitos trabalhistas, e, no longo prazo, efetive meios de extinção do comércio do sexo como um todo (O’CONNEL DAVIDSON, 2003). Essa estratégia híbrida, segundo Gall (2006GALL, G. Sex worker union organising: an international study. Hampshire: Palgrave MacMillan, 2006., p. 27), parece questionar a polarização, mas a assume ao se posicionar em um contínuo entre as duas posições.

Sendo assim, apesar de se declarar parcial e provisoriamente favorável às demandas da regularização da prostituição, O’Connell Davidson (1998) defende que há aspectos essenciais à atividade que fazem com que ela deva ser extinta. Um deles é a já mencionada estigmatização. O outro é que a ação coletiva realizada por pessoas em situação de prostituição é inerentemente fraca por estar inserida em relações de consumo em que não haveria produção de mais-valia. Nesse sentido, as pessoas possuiriam menor poder de barganha com terceiros e com os clientes.

Segundo West e Austrin (2002WEST, J.; AUSTRIN, T. From work as sex to sex as work: networks, ‘others’ and occupations in the analysis of work. Gender, Work & Organization, v. 9, n. 5, p. 482-503, 2002.), essa autora erra ao realizar esse diagnóstico, pois o faz, a exemplo da perspectiva da sexualidade organizacional, a partir da interação entre pessoas em situação de prostituição e clientes, ignorando instituições que atuam no nível meso e macro na indústria do sexo, como as diferentes instâncias do aparelho de Estado e investidores poderosos da indústria do sexo que lucram com a atividade. Gall (2006GALL, G. Sex worker union organising: an international study. Hampshire: Palgrave MacMillan, 2006., p. 57) argumenta que

[...] como West aponta, esta análise é comprometida por sua concentração e conceituação de um aspecto específico da prostituição, aquele da interação entre a prostituta independente e o cliente (apesar de considerações anteriores de O'Connell Davidson (1998) sobre a prostituição com o envolvimento de terceiros, como bordéis e agências, bem como os pontos de alavancagem estabelecidos em seu estudo sobre uma prostituta empreendedora). Mas, o mais importante no caso da prostituição independente, é que O’Connell Davidson confunde o consumo com o que é de fato a produção e a realização do valor de serviço por prostitutas (por meio da negociação). Esses processos criam uma relação de interdependência com o consumidor e, assim, pontos de alavancagem para prostitutas. Apesar da prostituta ser frequentemente responsável pela troca de um modo atomizado (tal como uma prostituta independente ou quando o terceiro não determina o preço), a troca deve necessariamente ser baseada na produção de “trabalho” e não está desprovida de um contexto coletivo que define socialmente a "taxa atual".

Para o autor, essa insuficiência é superada pela análise da ação coletiva de pessoas em situação de prostituição, que deve entrecruzar “[...] terrenos meso e macro e níveis gerais e específicos” (GALL, 2006GALL, G. Sex worker union organising: an international study. Hampshire: Palgrave MacMillan, 2006., p. 222). Esse seria o modo de incluir o tema no estudo “[...] dos processos de acumulação e troca, identidades, ideologia, trabalho, mercados e regulação dentro das dinâmicas e formas do capitalismo” (GALL, 2006, p. 222). Nesses terrenos, o autor argumenta em prol da organização coletiva como meio mais sensato para que as pessoas em situação de prostituição conquistem um valor social e exerçam maior controle da sua atividade.

Em outra vertente de análise, West e Austrin (2002WEST, J.; AUSTRIN, T. From work as sex to sex as work: networks, ‘others’ and occupations in the analysis of work. Gender, Work & Organization, v. 9, n. 5, p. 482-503, 2002.) também criticam O’Connell Davidson por se ater ao nível micro da relação. Para superar essa insuficiência, se posicionam com base em proposições de autores pertencentes à Escola de Chicago, como Becker (1963BECKER, H. Outsiders: studies in the sociology of deviance. New York: Free Press, 1963.) e Hughes (1971). Para West e Austrin (2002), essa tradição permite pensar a prostituição como uma organização em rede, composta por diferentes laços e grupos de interesse que disputam entre si o controle da atividade. Nessa lógica, cada entrelaçamento constitui uma modalidade diferente de prostituição e produz dinâmicas particulares que variam “[...] conforme o ambiente de atuação e os discursos específicos de trabalho, consumo, de gênero e sexualidade” (WEST; AUSTRIN, 2002WEST, J.; AUSTRIN, T. From work as sex to sex as work: networks, ‘others’ and occupations in the analysis of work. Gender, Work & Organization, v. 9, n. 5, p. 482-503, 2002., p. 499).

Hardy (2013HARDY, K. Equal to any other, but not the same as any other: the politics of sexual labour, the body and intercorporeality. In: WOLKOWITZ, C. et al. (ed.). Body/sex/work: intimate, embodied and sexualised labour. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2013. p. 43-58.), por sua vez, destaca que a prostituição envolve processos de intercorporeidade. No entanto, o faz de maneira distinta da vertente registrada anteriormente, afirmando que na prostituição se expressam relações entre os agenciamentos internos da indústria do sexo com as determinações mais amplas de sexualidade e classe. Para exemplificar essa dinâmica, relata a estratégia sindical adotada por algumas organizações que defendem a prostituição como trabalho do sexo para criar uma identidade intercorpórea que sintetiza a exploração sexual e de classe, ao mesmo tempo em que cria um meio para ingressar na luta trabalhista e pela libertação sexual.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tema da prostituição em publicações do campo dos EO foi apresentado neste artigo em três conjuntos de textos.

O primeiro inclui aspectos relacionados à psicodinâmica. Os estudos que encontramos em periódicos internacionais se vincula à perspectiva da re-erotização. Nele se encontram autores que analisam a prostituição na ótica da psicodinâmica da sexualidade organizacional e focalizam em processos de construção identitária que ocorrem na interação entre pessoas em situação de prostituição e seus clientes. Essa perspectiva concebe essas interações, predominantemente, em sua particularidade. Abordam, também, como diferentes organizações condensam modos locais e contingenciais de existir na indústria do sexo e como ocorre o controle dos saberes acerca da atividade e das possibilidades de agência. A prostituição é concebida como um exercício do corpo e das emoções, de maneira que as pessoas se conduzam, no mercado, de um modo mais livre e menos danoso como resultado do domínio dos instintos e da criação de personagens mercantilizáveis que, em situações menos condicionadas da atividade, possibilitariam transgredir matrizes de inteligibilidade ou sistemas hierárquicos da sexualidade.

No primeiro conjunto incluímos os estudos publicados no Brasil. É importante destacar que ainda que compartilhem uma construção semelhante do tema de estudo, eles se distinguem pela referência à psicodinâmica do trabalho e, dessa maneira, expressam de maneira mais objetiva o cotidiano das pessoas em situação de prostituição, apontam as contradições e os sofrimentos a ela relacionados, bem como os sentidos produzidos.

O terceiro conjunto se refere a diversas atividades de interação em serviços sexuais comerciais, incluindo o serviço sexual direto que se concretiza na prostituição. A ampliação do espectro de atividades consideradas possibilita ampliar os temas em busca de respostas para a pergunta sobre o que é vendido nesse encontro de serviços, centrando no corpo como aspecto central.

O terceiro conjunto de publicações busca relacionar as modalidades da prostituição com aspectos socioeconômicos. Nele se destacam as proposições de O’Connell Davidson (1995). A autora se refere, de modo superficial e com equívocos conceituais, à teoria marxista do valor, articulando-a com a perspectiva da liminaridade para compreender a prostituição no espaço liminar e interseccional entre as determinações da economia e da sexualidade.

Esses estudos, apesar de suas diferenças e com exceção dos trabalhos publicados no Brasil, apresentam alguns aspectos em comum: (a) assumem, ainda que em alguns de modo implícito, a prostituição como trabalho do sexo e/ou como serviços eróticos e da sexualidade que seguem uma lógica comercial e de mercado; (b) enfatizam análises dos indivíduos em suas particularidades e condutas; (c) secundarizam o cotidiano da atividade em busca de aspectos transgressores dos limites da sexualidade; (d) não questionam as relações de mercado per se, mas buscam modos de nelas existir de modo mais livre; e (f) apresentam uma noção individualista da atividade e de formas de resistências.

Essa constatação expressa a influência de analíticas pós-estruturalistas que inserem o tema da prostituição nos fenômenos da sexualidade moderna e subordinam o tema do trabalho do sexo a essa compreensão. Nessa perspectiva, a prostituição aparece como uma das práticas e saberes que exaltam os processos de diferenciação e singularização da sexualidade. Um dos aspectos fundamentais é o enfoque na individualidade particularizante e o rechaço ao caráter social dos modos de resistir às opressões. O social aparece como uma conexão vazia, abrindo campo para o arbítrio sobre os fundamentos e movimentos de subjetivação e embodiment. Em consequência, as proposições expressam modos relativistas e contingenciais de compreensão. Assim, processos de resistência aos condicionamentos da prostituição ocorrem dentro de limites que excluem a possibilidade de transcender a ordem do presente.

Isso se constata, inclusive, nos estudos que tentam incluir a relação entre aspectos econômicos e de sexualidade, mas que o fazem sem historicidade, tratando-os de modo autonomizado nos espaços liminares e interseccionais. Essa aproximação fica evidente, por exemplo, no fato de que tanto autores de referência na perspectiva da re-erotização (BREWIS; LINSTEAD, 2010c), quanto a autora de referência na tentativa de realizar uma aproximação com a economia política (O’CONNELL DAVIDSON, 1995O’CONNELL DAVIDSON, J. The anatomy of “free choice” prostitution. Gender, Work & Organization, v. 2, n. 1, p. 1-10, 1995.) mencionam valorizam o mito da livre escolha e valorizam o empreendimento como uma expressão do exercício de uma certa autonomia.

Uma lacuna evidente que se encontra nessas abordagens e nos processos e proposições que se orientam pela afirmação da prostituição como trabalho do sexo é a ausência de reflexões e discussões sobre o trabalho. Qual é o significado de trabalho na expressão “trabalho do sexo”? Dessa lacuna decorre a ausência de temas extensivamente abordados no campo da organização e da sociologia do trabalho, tais como controle, alienação, exploração6 6 Apenas de maneira ilustrativas, mencionamos Grupos de Pesquisa (GP) que abordam alguns desses temas: GP Economia Política do Poder em Estudos Organizacionais (UFPR); Núcleo de Estudos Organizacionais, Sociedade e Subjetividade (CEFET-MG); GP Estudos dos Coletivos de Trabalho e das Práticas Organizacionais (UFF); GP Estudos Críticos do Trabalho e Marxologia (UFMG). . As publicações que aqui registramos não apenas contribuem para um tratamento superficial do tema, como naturalizam o trabalho explorado que passa a ser, inclusive, uma condição desejada. Sem abordar o tema do trabalho para além de sua aparência fenomênica, é possível afirmar que a emancipação das pessoas em situação de prostituição poderia se dar por meio de um reconhecimento da condição que se constitui, no sistema do capital, no fundamento da opressão e da exploração: o trabalho alienado e o estranhamento.

Rainieri (2006RAINIERI, J. Alienação e estranhamento: a atualidade de Marx na crítica contemporânea do capital. Ideias, v. 12-12, p. 177-192, 2006., p. 178)) esclarece que o conceito de alienação se refere a uma exteriorização que o ser humano autoproduz e que se forma no interior de sua sociabilidade. É, portanto, traço inerente ao ser humano em suas relações sociais. O estranhamento, por sua vez, designa as “[...] insuficiências de realização do gênero humano decorrentes das formas históricas de apropriação do trabalho”, incluindo a própria personalidade, assim como as condições objetivas engendradas pela produção e reprodução da vida. No sistema do capital, a alienação aparece como um “fenômeno concêntrico ao estranhamento” porque “obstáculos sociais impedem que a atividade de exteriorização, inerente aos seres humanos, se realize em conformidade com suas potencialidades”. Abordar essa dimensão exigiria problematizar “a aceitação do cotidiano da vida como algo inelutável, irrevogável”, evitaria tratar emancipação e resistência subordinando-os aos nexos internos da reprodução das relações sociais de produção que geram as privações e as várias opressões.

Problematizar a prostituição a partir dessa posição teórico-política não implica negar que podem existir formas de proteção a partir da legislação e da organização que propiciem alguma forma de proteção e tornem as condições do exercício cotidiano da atividade mais seguras. Trata-se de reconhecer a complexidade e as contradições que estão presentes nessa concepção, assim como nas relações de mercado e de agenciamento por terceiros, incluindo aspectos relacionados aos direitos humanos, ao tráfico de pessoas, ao abuso de menores. Ou seja, reconhecer que podem existir demandas transicionais que instituam proteções às pessoas em situação de prostituição e que, simultaneamente, fortaleçam sua organização. No entanto, ao fazê-lo, evitar a falácia de que por esse caminho se produz a emancipação ou se resiste às determinações da ordem social.

Para finalizar, rememoramos Alexandra Kollantai (1980KOLLANTAI, A. Selected writings of Alexandra Kollantai. New York: Vintage, 1980.). Escrevendo no início do século XX e no contexto da Revolução Russa, ela defendeu uma moralidade sexual comunista de relações de amor e camaradagem livres e abertas. Relações entre iguais, relações não mercantilizadas e não possessivas. Para tanto, a emancipação das mulheres é indispensável, e requer sua libertação da dependência financeira de indivíduos homens e de relações patriarcais de propriedade7 7 Ebert (1999) destaca que, embora a articulação das relações humanas elaborada por Kollantai era heterossexual (ela fala em relações entre os sexos), a sua visão de relações pós-patriarcais, de relações abertas e não monogâmicas, abre a possibilidade para uma sociedade radicalmente pós-heterossexual. . Ou seja, a luta ideológica sobre gênero e relações sexuais se faz simultaneamente com as lutas econômicas e sociais. Especificamente sobre a prostituição, reconhecia sua existência como um meio necessário de subsistência e criticava “a hipocrisia da sociedade burguesa, que encoraja a prostituição pela estrutura de sua economia exploradora, e ao mesmo tempo cobre de desprezo cada menina ou mulher que é forçada a seguir esse caminho” (KOLLANTAI, 1980KOLLANTAI, A. Selected writings of Alexandra Kollantai. New York: Vintage, 1980., p. 263).

Em um tempo no qual o desejo tende a ser reificado, autonomizado das relações materiais de existência e das relações sociais que nelas se constituem e se expressam, o que importa são os circuitos individuais de expressão e gratificação. Nesse tempo, a exploração do trabalho ganha ares de liberdade de escolha (como na precarização via plataformas ou no mantra do empreendedorismo), o mercado vai se instituindo como uma distopia total em que se compra e vende corpos e representações de corpos, muitas vezes em processos de opressão obscurecidos por abordagens que afirmam a possibilidade de subverter a moralidade por práticas que promovem a gratificação individual e o consumismo.

Esperamos que as informações que trouxemos sobre as abordagens do tema da prostituição nos EO, e as considerações críticas que realizamos ao final, contribuam para que se ampliem os diálogos com os estudos sobre o trabalho e que se produzam contribuições desde uma perspectiva crítica, sem cair em armadilhas dicotômicas e sem naufragar no imediatismo do presente.

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  • 1
    Recebido em 15/12/2020, aceito em 922021.
  • 4
    Indústria do sexo é a tradução literal de sex industry. No inglês, um dos significados de industry se refere a pessoas e atividades envolvidas em um setor de negócios. Sendo assim, sex industry se refere a atividades comerciais relacionadas a serviços sexuais, tais como prostituição, dança erótica, pornografia, tele-sexo etc.
  • 5
    A crítica à lógica liberal e contratualista de mercado usualmente proferida pelos defensores do trabalho do sexo é creditada a Pateman (1988). Segundo a autora, a ilusão de uma relação contratual igualitária na prostituição esconde as finalidades da exploração capitalista. Como uma relação de consumo, discute também que o cliente da prostituição não a toma como uma relação quantitativa e meio para novas trocas e valorizações, mas objetiva o uso qualitativo e o consumo final.
  • 6
    Apenas de maneira ilustrativas, mencionamos Grupos de Pesquisa (GP) que abordam alguns desses temas: GP Economia Política do Poder em Estudos Organizacionais (UFPR); Núcleo de Estudos Organizacionais, Sociedade e Subjetividade (CEFET-MG); GP Estudos dos Coletivos de Trabalho e das Práticas Organizacionais (UFF); GP Estudos Críticos do Trabalho e Marxologia (UFMG).
  • 7
    Ebert (1999) destaca que, embora a articulação das relações humanas elaborada por Kollantai era heterossexual (ela fala em relações entre os sexos), a sua visão de relações pós-patriarcais, de relações abertas e não monogâmicas, abre a possibilidade para uma sociedade radicalmente pós-heterossexual.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Mar 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2021

Histórico

  • Recebido
    15 Dez 2020
  • Aceito
    09 Fev 2021
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