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O mapa da pós-graduação em Direito no Brasil:uma análise a partir do método da Social Network Analysis

The Brazilian law graduate studies map: an analysis through the Social Networks Analysis Method

Resumo

Objetivo

Esta pesquisa objetiva responder como encontra-se estruturada a rede de pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil e qual programa dessa rede possui maior capacidade de influenciar os demais.

Metodologia

O indicador utilizado na pesquisa foi o da “absorção de egressos de um programa pelos demais”. Foram considerados somente os docentes vinculados como membros permanentes dos 94 programas de pós-graduação stricto sensu em Direito em funcionamento até 2016 e cuja área de avaliação é o Direito. Os dados foram recolhidos da plataforma Sucupira e o método escolhido foi a Análise de Redes Sociais (ARS), com recurso aos software Ucinet 6.528 e NetDraw 2.141.

Resultados

A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil revelou-se irregular e desigualmente distribuída ao longo do país, pouco densa, fortemente orientada para as regiões Sul e Sudeste, mas também bastante regionalizada. O programa com maior capacidade de influenciar os demais é o da PUC-SP.

Conclusão

As características estruturais da rede permitem compreender alguns dos fatores que constrangem a qualidade da educação jurídica brasileira como um todo, tal como a falta de oferta formativa em alguns estados ou a pouca troca de talentos entre programas.

Pós-graduação em Direito; redes sociais; endogenia; capacidade de influência

Abstract

Objective

This research aims to answer how the graduate studies in Law network is structured in Brazil, as well as which programs of this network have the higher capacity to influence the others.

Methodology

The guideline used in this research is the “absorption of egresses of a program by the others”. This study has only contemplated the professors who are permanent members of the 94 stricto sensu graduate programs in law, that have been operating until 2016, and whose evaluation area is Law. The data have been collected from Sucupira platform and the method chosen was the Social Network Analysis (SNA), with the Ucinet 6.528 and NetDraw 2.141 software.

Results

The network of graduate studies in Law in Brazil proved to be irregular and unevenly distributed throughout the country: not too dense, strongly oriented to the South and Southeast areas of the country, and quite regionalized. The program which has the strongest capacity of influence is held by PUC-SP.

Conclusion

The structural characteristics of the network allow us to understand some of the factors that constrain the quality of Brazilian legal education as a whole, such as the lack of formation offered in some member states or the low exchange of talents among programs.

Graduate studies in Law; social network; endogeny; capacity to influence

Introdução

Pesquisa recente (VARELLA, 2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/...
) apontou a forte expansão pela qual vem passando a pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil. De 2012, ano em que a pesquisa de Marcelo Varella foi realizada, até o presente momento, 23 novos programas foram criados. Todavia, o conhecimento jurídico produzido no âmbito de todos os programas, assim como o conhecimento produzido no Brasil em geral, tem pouca ou quase nenhuma relevância acadêmica no contexto internacional – uma das razões, aliás, pelas quais a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) ainda não atribuiu nota sete para nenhum programa existente.

Sem embargo, a transformação dessa realidade implica a obrigatoriedade de termos de nos dar a conhecer a própria rede de pós-graduação stricto sensu em Direito do Brasil, assim como o programa que, no seu interior, possui a maior capacidade de influenciar os demais com a difusão, se houver, da sua escola de pensamento. E a razão é simples: é necessário verificar, por um lado, de que modo a estrutura da rede constrange a produção de conhecimento jurídico relevante e, por outro, as razões pelas quais os programas mais centrais ainda não atingiram um patamar de internacionalização.

Ora, a investigação que agora se apresenta incide exatamente sobre esse tema, isto é, objetiva responder às questões de saber, por um lado, como encontra-se estruturada a rede de pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil e, por outro, qual o programa dessa rede possui maior capacidade de influenciar todos os demais com sua escola de pensamento, caso existente, em virtude de ter seus egressos admitidos como docentes nos demais programas existentes.

Para encontrar os resultados, o indicador utilizado foi o da “absorção de egressos de um programa pelos demais” – é dizer, tem maior capacidade de influência o programa que possui o maior número de egressos admitidos como docentes nos demais programas existentes. Para tanto, foram considerados somente os professores vinculados como membros permanentes dos 94 programas de pós-graduação stricto sensu em Direito em funcionamento até 2016 e cuja área de avaliação é o Direito. Os dados, por sua vez, foram recolhidos da plataforma Sucupira e o método escolhido foi a Análise de Redes Sociais (ARS), com recurso aos software Ucinet 6.528 (BORGATTI; EVERETT; FREEMAN, 2002) e NetDraw 2.141 (BORGATTI, 2002BORGATTI, Steve P. Netdraw network visualization. Harvard: Analytic Technologies, 2002.).

O texto estrutura-se em quatro tópicos. O primeiro deles cuida dos elementos e características da pós-graduação stricto sensu em Direito conforme lhe caracteriza a CAPES.

O segundo tópico, a seu turno, expõe a metodologia, sua justificativa e detalhes mais aprofundados sobre as técnicas de análise empregadas. Em seguida, será o terceiro tópico o momento de exposição dos resultados, e dos resultados não apenas da rede brasileira como um todo, mas também das redes de pós-graduação em Direito das cinco regiões do país.

No quarto e derradeiro tópico, o momento será, então, de discutir estes resultados à luz da literatura produzida acerca do assunto, para, ao final, apontarmos algumas considerações.

1 A educação jurídica na pós-graduação stricto sensu em direito no Brasil

Um dos melhores modos de compreender o panorama atual da pós-graduação stricto sensu em Direito é através do Relatório de Avaliação do ano de 2013 da CAPES, discutido e escrito por docentes de diversos programas.

Segundo este relatório, “a Área de Direito caracteriza-se pelo forte envolvimento de seus corpos docente e discente em agendas políticas e sociais, seja na perspectiva local, regional e nacional, e, para parte significativa da Área, internacional” (CAPES, 2013CAPES. Relatório de avaliação 2010-2012: Trienal 2013. 2013. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=Y2FwZXMuZ292LmJyfHRyaWVuYWwtMjAxM3xneDo5NWRiMjBlOGY2ZDQ5ODA . Acesso em: 8 mai. 2016.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 1-2). Isto significa que parte considerável da produção intelectual (seja em artigos, capítulos de livros, dissertações ou outras formas) enfrenta tais debates relacionando os aspectos teóricos com a efetivação dos direitos, o papel do Supremo Tribunal Federal, as políticas públicas, efetividade da democracia e diversas outras questões políticas atuais.

Há considerável heterogeneidade dos programas devido a questões geográficas, culturais e econômicas, sendo as regiões Sul e Sudeste as que possuem a maior quantidade de programas, e em número muito superior aos das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, mesmo quando somadas (PRADO; SANTOS; PEREIRA JÚNIOR, 2015, p. 448). Isto gera um desafio à expansão da pós-graduação e à formação de docentes de maneira equilibrada e autônoma em todo país.

Outra notória característica da área e que, naturalmente, repercute na pesquisa e nos programas de pós-graduação, reside no fato de que é comum cumular-se a profissão de professor com outra profissão jurídica existente (promotor, procurador, juiz, advogado etc.).1 1 Para mais detalhes sobre o tema, conferir: Almeida (2014, p. 42-45). Com efeito, por muito tempo, os profissionais de destaque, principalmente os que ocupavam cargos públicos prestigiados, eram preferidos para o exercício da docência já que, supostamente, os alunos aprenderiam algo a mais devido à sua experiência prática bem-sucedida. Entretanto, recentemente instituiu-se medidas para reduzir esta característica e, assim, valorizar os professores com dedicação integral e perfil acadêmico, tendo em vista que, muitas vezes, a docência e a pesquisa acabavam por serem prejudicadas em virtude da pouca importância que se lhes era dada.

A preocupação com a formação didático-pedagógica dos docentes é igualmente evidente. Em pesquisa realizada no ano de 2015, com um total, à época, de 87 programas, 33 possuíam disciplinas pedagógicas,2 2 Podiam ser estas disciplinas: “Metodologia do Ensino Superior”, “Metodologia do Ensino Jurídico”, “Prática do Ensino Jurídico” e diversas outras nomenclaturas para matérias que envolvam ensino jurídico e pedagogia. 37 não possuíam, 17 tinham estágio de docência e quatro não informaram.3 3 O número fecha em 91 por haver quatro Instituições de Ensino Superior que possuem disciplina pedagógica e estágio docente: UENP, UFJF, UNIJUÍ e UI. Destas 33 disciplinas pedagógicas, 21 eram obrigatórias, 10 optativas e duas estavam como atividade complementar (PRADO; SANTOS; PEREIRA JUNIOR, 2015, p. 465-466). A ideia subjacente seria a de que quanto melhor pesquisador fosse, melhor professor seria,4 4 A CAPES, mesmo tratando da formação de professores, acaba por destacar a formação de pesquisadores: “a) em todos os âmbitos da atividade própria da pós-graduação – pesquisa, orientação, ensino – reflete de maneira unitária, coerente, clara e fecunda o propósito precípuo da especialidade, a saber, formar bons pesquisadores” (CAPES, 2013, p. 7). pois a pedagogia seria importante apenas ao ensino básico.

Percebe-se também que a interdisciplinaridade é uma das marcas das pesquisas. Não obstante, nos estudos mais recentes, há diálogos constantes e consistentes com todas as ciências em geral, mas especialmente com a filosofia, a história, a sociologia, a economia e a antropologia. Também é perceptível a tendência, na linha do que já se faz em diversos países de forte tradição universitária, de publicação de pesquisas através de obras monográficas e em obras coletivas (CAPES, 2013CAPES. Relatório de avaliação 2010-2012: Trienal 2013. 2013. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=Y2FwZXMuZ292LmJyfHRyaWVuYWwtMjAxM3xneDo5NWRiMjBlOGY2ZDQ5ODA . Acesso em: 8 mai. 2016.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 2).

Não há diretriz da CAPES para que os programas adotem obrigatoriamente alguma disciplina, sendo livre a proposição de disciplinas humanísticas ou pedagógicas, por exemplo. Apenas devem ser evitadas disciplinas meramente informativas, as quais devem permanecer na graduação ou especialização. Recomenda-se ao programa oferecer seminários para todas as linhas e áreas. Entretanto, devemos compreender como a CAPES interfere no comportamento dos programas a partir dos seus critérios avaliativos, cuja obediência dita a distribuição dos recursos e o reconhecimento regional e nacional de um programa.

Com efeito, a área do Direito está localizada dentro da área de avaliação do Colégio de Humanidades e do grupo Ciências Sociais Aplicadas. A área atribui “peso 20 ao quesito ‘Corpo Docente’, peso 30 ao quesito ‘Corpo Discente, Teses e Dissertações’, peso 40 ao quesito ‘Produção Intelectual’ e peso 10 ao quesito ‘Inserção Social’” (CAPES, 2013CAPES. Relatório de avaliação 2010-2012: Trienal 2013. 2013. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=Y2FwZXMuZ292LmJyfHRyaWVuYWwtMjAxM3xneDo5NWRiMjBlOGY2ZDQ5ODA . Acesso em: 8 mai. 2016.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 4). Estas avaliações estão estabelecidas numa escala numérica de 1 a 7, sendo as notas 6 e 7 destinadas apenas aos programas de destaque em relação aos demais e com considerável difusão e relação internacional.5 5 Isto gera dificuldade em conciliar a pesquisa de temas pontuais e locais, como questões indígenas e agrárias, com um modelo que prioriza a publicação e inserção internacional. Deste modo, o nosso modelo de produção se subordina ao que possui abertura nas revistas europeias e americanas em regra. A utilidade ao país, portanto, não é um critério suficientemente relevante.

Como visto anteriormente, o principal critério de avaliação remete à produção acadêmica realizada no âmbito do programa, pois este é o elemento de avaliação de maior clareza e objetividade no momento do levantamento dos dados pela CAPES. A pontuação, por sua vez, depende da avaliação que a CAPES concede ao meio da publicação, avaliando periódicos (A1, A2, B1, B2, B3, B4, B5, C) e livros (avaliação surgida em 2003, com os critérios L4, L3, L2, L1).

A atribuição de maior peso ao critério da produção acadêmica constitui algo problemático no contexto da avaliação. Isto porque o modo como o critério encontra-se institucionalizado privilegia a quantidade em detrimento da qualidade dos materiais publicados. Sem embargo, a CAPES estipula que os docentes devem publicar ao menos um título por ano, mas, em termos concretos, os programas passaram a estabelecer metas agressivas de publicação para incrementarem a sua avaliação, de modo que hoje há professores que publicam mais de 10 trabalhos por ano e de qualidade por vezes problemática. Isto é, ao fim e ao cabo, ou programa se insere na lógica para ser bem avaliado, ou então acaba prejudicado.

A CAPES também regula outros elementos dos programas de pós-graduação stricto sensu. Os corpos docentes podem ter no máximo 20% dos docentes permanentes vinculados a mais de um programa, sendo proibido estar em mais de dois (CAPES, 2013CAPES. Relatório de avaliação 2010-2012: Trienal 2013. 2013. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=Y2FwZXMuZ292LmJyfHRyaWVuYWwtMjAxM3xneDo5NWRiMjBlOGY2ZDQ5ODA . Acesso em: 8 mai. 2016.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 7). Apenas 10% dos docentes permanentes podem estar aposentados. Aceita-se docentes com formação em outras áreas, mas deve haver um núcleo docente predominantemente titulado em Direito, e os docentes de outras áreas devem pesquisar e produzir na área jurídica (CAPES, 2013CAPES. Relatório de avaliação 2010-2012: Trienal 2013. 2013. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=Y2FwZXMuZ292LmJyfHRyaWVuYWwtMjAxM3xneDo5NWRiMjBlOGY2ZDQ5ODA . Acesso em: 8 mai. 2016.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 7-8). Também não se credencia doutores com menos de 5 anos de titulação e que não tenham concluído orientação de dissertação para a orientação de doutorandos. E apenas se aceita como parte do corpo docente permanente professores com carga horária de 40 horas/aula semanais (CAPES, 2013CAPES. Relatório de avaliação 2010-2012: Trienal 2013. 2013. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=Y2FwZXMuZ292LmJyfHRyaWVuYWwtMjAxM3xneDo5NWRiMjBlOGY2ZDQ5ODA . Acesso em: 8 mai. 2016.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 8).

Há, também, a exigência de relação entre linhas e docentes. O programa necessita ter o número mínimo de 15 docentes caso possua apenas uma área de concentração e no máximo três linhas de pesquisa. Cada linha deve contar com, no mínimo, três docentes permanentes. E a cada área de concentração nova é desejável que se inclua ao menos cinco novos docentes permanentes a fim de ter-se uma proporção ideal de orientações por docente. Há a possibilidade de exceções justificadas, entretanto (CAPES, 2013CAPES. Relatório de avaliação 2010-2012: Trienal 2013. 2013. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=Y2FwZXMuZ292LmJyfHRyaWVuYWwtMjAxM3xneDo5NWRiMjBlOGY2ZDQ5ODA . Acesso em: 8 mai. 2016.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 61).

Os mestrados profissionais, regulados pela Portaria Normativa n. 7, de 23 de junho de 2009, do Ministério da Educação, possuem iguais condições em relação ao mestrado acadêmico, inclusive em relação à docência. Mas cabe ao mestrado profissional capacitar a prática profissional e transferir conhecimento à sociedade, atendendo o mercado de trabalho. Há, entretanto, uma omissão relativamente à possibilidade de saber se mestres profissionais possuem habilitação para lecionar, já que o seu foco é profissional.

Este, em suma, é o quadro da pós-graduação em Direito no Brasil.

2 Metodologia

O que caracteriza a network analysis e por que esta é a “lente” mais apropriada, digamos assim, para visualizar o mapa da pós-graduação em Direito no Brasil? Isto é, em que assenta essa teoria das redes sociais, e quais são as vantagens comparativas desta metodologia relativamente a abordagens mais quantitativas possíveis de serem aplicadas para responder problemas tal como o nosso? Comecemos com a primeira questão.

Com efeito, a ideia básica por trás do conceito de rede social é a de conectividade. Vale dizer, trata-se de uma específica estrutura em cujo interior encontram-se elementos sociais interligados por força de certas relações ou de certos fluxos, e em cuja totalidade das relações sociais encontra esta estrutura a sua dimensão, os seus limites e a sua constituição enquanto fenômeno social.

Como apontam Wasserman e Faust,

O conceito de rede enfatiza o fato de que cada indivíduo tem laços com outros indivíduos, cada um dos quais, por sua vez, está ligado a poucos, alguns ou muitos outros, e assim por diante. A expressão “rede social” refere-se ao conjunto de atores e de laços entre eles (WASSERMAN; FAUST, 1994WASSERMAN, Stanley; FAUST, Katherine. Social network analysis. Methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994., p. 3, tradução nossa).

A network analysis representa o campo teórico, partilhado por múltiplas disciplinas (PORTUGAL, 2007PORTUGAL, Sílvia. Contributos para uma discussão do conceito de rede na teoria sociológica. Oficina do CES, n. 271, Coimbra, 2007. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina/ficheiros/271.pdf . Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina...
, p. 2), em que se tem desenvolvido os estudos envolvendo o tema das redes. No âmbito das ciências sociais, a teoria das redes sociais constitui, em termos metodológicos, uma perspectiva de investigação peculiar.

Em linhas muitos gerais, essa diferença, e que será também uma das suas vantagens, reside no fato de tornar possível que a análise social deixe de examinar os sistemas sociais em termos de categorizações ou classificações de indivíduos (WELLMAN; BERKOWITZ, 1988WELLMAN, Barry; BERKOWITZ, Scott D. Introduction: studying social structures. In: WELLMAN, Barry; BERKOWITZ, Scott D. (Ed.). Social structures. A network approach. Cambridge: Cambridge University Press, p. 1-14, 1988., p. 4) para, agora, observar e explorar “os sistemas sociais e os processos sociais em termos de relações entre e dentro das suas partes constituintes” (BERKOWITZ, 1982BERKOWITZ, Scott D. What is structural analysis? In: BERKOWITZ, Scott D. An introduction to structural analysis. The network approach to social research. Toronto: Butterworths, p. 1-24, 1982., p. 2, tradução nossa). Isto é, o método da network analysis notabiliza-se e diferencia-se das outras abordagens, sobretudo, por utilizar conceitos e informações sobre relações no seio de uma dada estrutura social (WASSERMAN; FAUST, 1994WASSERMAN, Stanley; FAUST, Katherine. Social network analysis. Methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994., p. 6).

Para Wasserman e Faust (1994WASSERMAN, Stanley; FAUST, Katherine. Social network analysis. Methods and applications. Cambridge: Cambridge University Press, 1994., p. 4), são quatro os princípios sobre os quais se assenta esta teoria das redes sociais: 1) os atores (instituições, pessoas etc.) e o seu comportamento são vistos como unidades interdependentes, embora constituam “nós” autônomos; 2) as ligações entre estas unidades interdependentes são vistas como canais por onde circulam certos recursos, podendo ser estes recursos qualquer objeto material ou imaterial; 3) os modelos de redes sociais encaram as estruturas da rede como meios de constrangimento e/ou de oportunidades da ação individual; 4) os modelos de redes sociais conceptualizam as estruturas da rede social como padrões constantes de relações entre as unidades ou nós.

Esta mudança de perspectiva analítica possui algumas vantagens comparativas relativamente às abordagens mais tradicionais, para responder à segunda interrogação. Em primeiro lugar, ela permite conjugar tanto uma análise macroscópica quanto microscópica do mesmo objeto, isto é, “A análise das redes permite focar a atenção no comportamento individual sem perder de vista a sua inserção nas estruturas sociais” (PORTUGAL, 2007PORTUGAL, Sílvia. Contributos para uma discussão do conceito de rede na teoria sociológica. Oficina do CES, n. 271, Coimbra, 2007. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina/ficheiros/271.pdf . Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina...
, p. 12).

Em segundo lugar, ela permite compreender como se encontra estruturada uma determinada rede, como ela funciona e sob quais regras funciona, como os indivíduos se posicionam no seu interior e quais são essas posições, como a ação individual é influenciada e como esta interação influencia a forma e estruturas da rede.

Em terceiro lugar, a abordagem das redes “fornece uma explicação do comportamento social baseado em modelos de interacção entre os actores sociais” (PORTUGAL, 2007PORTUGAL, Sílvia. Contributos para uma discussão do conceito de rede na teoria sociológica. Oficina do CES, n. 271, Coimbra, 2007. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina/ficheiros/271.pdf . Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina...
, p. 7). Quer dizer, tendo-se em conta as estruturas e a forma da rede, é possível identificar o modo como os indivíduos interagem e a razão da interação, como mobilizam os recursos circulantes e quais as condições que têm para o fazer, como se integram e saem da rede, como influenciam o comportamento dos demais etc.

Em quarto lugar, esse método permite ainda desvendar, dentre outras coisas, as propriedades específicas das relações entre os atores e como estas propriedades – e as estruturas da rede – condicionam a ação coletiva (PORTUGAL, 2007PORTUGAL, Sílvia. Contributos para uma discussão do conceito de rede na teoria sociológica. Oficina do CES, n. 271, Coimbra, 2007. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina/ficheiros/271.pdf . Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina...
, p. 12).

Assim, a justificativa para empregarmos o método da análise de redes assenta-se fundamentalmente no fato de permitir: 1) identificar o modo como se encontra estruturada a rede da pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil e qual a sua dimensão; 2) saber como estão relacionados os programas e quais são as direções dos fluxos; 3) detectar, a partir da quantidade de relações entre os programas, a densidade da rede; e, sobretudo, 4) descobrir quem são os atores mais centrais e quem são os atores que ocupam posição mais periférica – isto é, os programas que têm maior capacidade de influenciar outros programas.

Em suma, o tipo de informação que a análise de redes sociais permite acessar é muito vasto e detalhado e nesse aspecto geral reside a sua vantagem comparativa relativamente a outros métodos possíveis.

Considerada na perspectiva dos aspectos operacionais de uma investigação, “a análise a partir das redes sociais pode sintetizar-se em algumas questões muito simples: Quem? O quê? Como? Quem faz parte das redes? Quais os conteúdos dos fluxos das redes? Quais as normas que regulam a sua ação?” (PORTUGAL; NOGUEIRA; HESPANHA, 2014, p. 936).

Com efeito, fazem parte da rede de pós-graduação stricto senso em Direito no Brasil todas as instituições de ensino superior que mantêm pelo menos um curso de mestrado em Direito, independentemente de ser esse programa de viés acadêmico – a grande maioria – ou de viés profissional.

Para a composição da amostra, foram considerados apenas os programas em funcionamento no ano de 2016 cuja área de avaliação é o Direito – isto é, os critérios utilizados para identificar os programas através da Plataforma Sucupira6 6 Sítio eletrônico mantido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES (https://sucupira.capes.gov.br) onde encontram-se armazenadas e publicizadas informações gerais sobre todos os programas de pós-graduação existentes no Brasil, tais como dados cadastrais do curso, linhas de pesquisa, financiadores, proposta, discentes, docentes, participantes externos, projetos de pesquisa etc. foram “área de avaliação” e “situação do programa”.

Com isto, foram excluídos da rede: 1) os programas já extintos (a exemplo do antigo programa da Universidade Gama Filho), pois já não mais teriam a possibilidade de influenciar; 2) os programas interdisciplinares, pois a possibilidade de influenciar é bastante limitada em virtude da quantidade e do tamanho dos programas existentes, bem como da natureza do conhecimento produzido; e 3) as universidades que não mantém programas específicos em Direito (a exemplo da Unicamp), posto que, embora tenham egressos absorvidos como docentes por programas específicos de Direito, a natureza do conhecimento produzido é essencialmente extrajurídico.

O conteúdo dos fluxos da rede estudada é, tal como apontamos precedentemente, “professores doutorados em Direito”. Para identificá-los através da Plataforma Sucupira foram consideradas apenas as variáveis “ano” e “categoria”. Assim, inserem-se no espaço amostral somente os docentes que se encontram vinculados aos programas como membros permanentes em março de 2016, momento do levantamento de dados, estando excluídos, dessa forma, os membros colaboradores e os membros visitantes.

Sem embargo, tendo-se em conta que abordagem pretendida para esta primeira análise da rede de pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil tem viés mais estrutural – ou seja, está mais centrada na identificação e análise das propriedades morfológicas (densidade, dimensão, centralização etc.) da rede –, a questão de saber quais são as normas que regulam as interações entre os programas foi ignorada.

Por fim, para construir os outputs da pesquisa foram utilizados os software Ucinet 6.528 (BORGATTI; EVERETT; FREEMAN, 2002) e NetDraw 2.141 (BORGATTI, 2002BORGATTI, Steve P. Netdraw network visualization. Harvard: Analytic Technologies, 2002.).

3 Resultados

Por motivo de ordem metodológica e didática, os resultados encontram-se distribuídos em seis tópicos distintos, sendo o primeiro dedicado à rede de pós-graduação stricto sensu em Direito do Brasil como um todo e os demais dedicados à rede de pós-graduação stricto sensu em Direito de cada uma das regiões (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul) do país.

3.1 A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito do Brasil

Até o ano de 2016, de acordo com os dados coletados através da Plataforma Sucupira ao utilizar-se as variáveis “área de avaliação” e “situação do programa”, encontram-se em funcionamento 94 programas de pós-graduação em Direito. No conjunto destes cursos, encontram-se vinculados como membro permanentes 1.824 professores,7 7 É preciso registrar que este não representa um número absolutamente exato, pois existem alguns docentes cadastrados como membros permanentes em dois ou três programas diferentes, tal como autoriza a Portaria n. 174, de 30 de dezembro de 2014 da CAPES. Estes casos, entretanto, são excepcionais e não chegam a produzir grande alteração no número final, razão pela qual diríamos ter uma margem de erro de 15 docentes nesta situação, para mais e para menos. número que pode ainda evoluir se forem considerados membros colaboradores e membros visitantes, ou se novos programas forem criados.

Salvo o caso do programa de Mestrado Profissional em Direito e Gestão de Conflitos da Universidade de Fortaleza – UNIFOR/Ceará, que contém um membro permanente com titulação máxima de mestre, os demais cursos de pós-graduação stricto sensu em Direito são compostos por docentes portadores de, no mínimo, um título de doutorado – o que, aliás, constitui exigência do Ministério da Educação e da CAPES.

Com efeito, a distribuição destes programas e, naturalmente, dos seus docentes permanentes é bastante irregular e desigual ao longo das regiões do país. A região Sudeste é, de longe, a que concentra o maior número de programas e de docentes, seguida das regiões Sul, Nordeste, Centro-Oeste e Norte. O Gráfico 1 ilustra, em percentuais, a concentração de docentes por região do país.

gráfico 1
– Distribuição dos professores por região

Fonte: Dados coletados na Plataforma Sucupira (2016).


O número de docentes que cursaram o seu doutoramento no exterior também se mostra relevante nesse espaço amostral. Os dados obtidos revelam que 205 professores – 11,2% do total – doutoraram-se em universidades estrangeiras. Deste conjunto, três universidades se destacam como as que mais forneceram docentes para a pós-graduação stricto sensu brasileira: a Universidade de Coimbra, Portugal, com 15 doutorados; a Universidad Complutense de Madrid, Espanha, com 12 doutorados e a Université Panthéon Sorbonne – Paris I, França, com 11 doutorados.

Os três países, entretanto, que mais forneceram docentes para a pós-graduação stricto sensu do Brasil foram Espanha (55 professores), França (44 professores) e Alemanha (29 professores). Portugal (20 professores), embora com conexões acadêmicas sólidas com o Brasil, aparece apenas na quinta posição, o que, todavia, não deixa de se justificar se compararmos o tamanho da sua pós-graduação stricto sensu em Direito com a dos países europeus citados.

Quanto ao continente americano, o país que mais forneceu professores para a pós-graduação em Direito brasileira foram os Estados Unidos da América, com 18 docentes. A participação dos demais países americanos, sobretudo os da América do Sul, vizinhos ao Brasil, é praticamente irrelevante, com Argentina, Uruguai e Paraguai tendo fornecido apenas um docente cada. O Gráfico 2 ilustra a distribuição dos docentes doutorados por universidades estrangeiras conforme os países onde obtiveram a titulação.

gráfico 2
– Titulados no exterior distribuídos por países

A distribuição desses docentes titulados no exterior também é irregular e desigual ao longo do país. Naturalmente as regiões Sudeste e Sul, por serem as mais desenvolvidas economicamente e por terem sido as últimas a receber imigrantes europeus, apresentam a maior concentração desses professores, seguidas das regiões Nordeste, Centro-Oeste e Norte. O Gráfico 3 ilustra essa distribuição dos docentes titulados no estrangeiro por região do país.

gráfico 3
– Titulados no exterior distribuídos por região

Tendo registrado os dados de natureza mais quantitativa, passamos agora para análise da rede de pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil. O Gráfico 4 representa esta rede, seus atores e as ligações que cada um mantém com os demais.

gráfico 4
– Rede dos programas de pós-graduação em Direito no Brasil – forma 1

Como se pode observar, o primeiro dado relevante que esta imagem nos revela é a existência de uma conectividade moderada entre os programas, vale dizer, aparentemente, trata-se de uma rede com densidade considerável. Com efeito, embora só a densidade não possa nos dizer concludentemente acerca da centralidade dos atores, o nível em que se manifesta pode indiciar, sendo baixo, a existência de alguns agentes centrais ou de agentes não vinculados à rede e, sendo elevado, a inexistência de agentes centrais ou a existência de múltiplos agentes centrais.

No caso concreto da rede de pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil, temos 94 atores e 387 ligações, o que resulta numa densidade de 4,4%. O software Ucinet 6.528 (BORGATTI; EVERETT; FREEMAN, 2002) calcula automaticamente o nível de densidade de uma dada rede, mas é possível calculá-la manualmente “dividindo o número de relações existentes entre as possíveis e multiplicando por 100 [D = RE / RP x 100]. O cálculo do total de relações possíveis faz-se multiplicando o número total de nós pelo número total de nós menos 1 [RP = NTN x (NTN – 1)]” (ALEJANDRO; NORMAN, 2005ALEJANDRO, Velázquez Álvarez O.; NORMAN, Aguilar Gallegos. Manual introdutório à análise de redes sociais. Medidas de centralidade. Trad. de Maria Aires, Joanne Laranjeiro, Silvia Silva. México: Universidad Autonoma del Estado de México, 2005., p. 17).

Esse valor de densidade indica estarmos, de fato, diante de uma rede com atores consideravelmente centrais. Aliás, o Gráfico 4 e o Gráfico 5 já nos mostram quem são os atores principais da rede de pós-graduação stricto sensu em Direito do Brasil – aqueles que se encontram representados por uma figura geométrica maior relativamente aos demais.

gráfico 5
– Rede dos programas de pós-graduação em Direito no Brasil – forma 2

A Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e a Universidade de São Paulo (USP) aparecem como as mais centrais e como as que conseguem alcançar o maior número de outros cursos, embora a diferença de centralidade entre as duas seja ligeira.

Essa centralidade significa que são a PUC-SP e a USP as instituições de ensino superior que mais tiveram seus egressos absorvidos como membros permanentes de outros programas de pós-graduação stricto sensu em Direito, e, portanto, são as que mais poderiam influenciar o conhecimento jurídico no Brasil divulgando escolas de pensamento, caso existentes.

Entretanto, e como dissemos anteriormente, a baixa densidade da rede indicia a existência de alguns outros atores centrais, não no mesmo nível de PUC-SP e USP, mas igualmente relevantes no plano global da rede. São esses atores, entre outros, as Universidades Federais do Paraná, de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul, de Minas Gerais, dentre outras que a imagem destaca. O Quadro 1 apresenta os índices de centralidade específicos dos 20 programas mais centrais da rede.

quadro 1
– Índice de centralidade dos programas de pós-graduação em Direito no Brasil

A imagem da rede global de pós-graduação stricto sensu em Direito do Brasil conjugada com o quadro de centralidade nos revelam mais algumas informações relevantes.

Em primeiro lugar, na lista dos 20 programas mais centrais, da segunda à sexta posição são ocupadas pelos cursos melhor avaliados (nota 6) pela CAPES. Excetuam-se das primeiras posições, embora não deixem de ter algum destaque na lista geral, somente os cursos de pós-graduação stricto sensu em Direito oferecidos pelas Pontifícias Universidades Católicas de Minas Gerais (PUC-MG) e do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e pela Universidade de Brasília (UNB).

Em segundo lugar, é possível constatar que a rede da pós-graduação brasileira está orientada para as regiões Sudeste e Sul do país, pois todas as universidades que integram a pós-graduação em Direito no Brasil admitiram como docente permanente em seus quadros pelo menos um professor doutorado nos programas do Sul e Sudeste do país.

Mas essa orientação da rede em direção ao sul do Brasil, em terceiro lugar, é compensada com o fato de serem também duas marcas da pós-graduação em Direito brasileira tanto a forte endogenia quanto a regionalização. Isso significa que não só os programas costumam absorver como professores seus antigos alunos de doutoramento,8 8 Embora não tenhamos apresentado nenhuma estatística acerca desta informação, durante o levantamento dos dados constatou-se que grande parte dos programas de pós-graduação stricto sensu contava como membro permanente com pelo menos um antigo aluno de doutoramento. Essa tendência se observou nos programas menores e com pior classificação, mas, principalmente, nos grandes programas e com melhor avaliação por parte da CAPES. como há, também, pelo menos um programa cujos egressos foram absorvidos pela quase integralidade dos demais programas da região.

3.2 Região Sudeste

A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito da região Sudeste do Brasil é a maior das redes regionais. Contabiliza 40 programas – entre eles, os maiores do país –, 989 docentes e abriga, no estado de São Paulo, os dois programas mais centrais da pós-graduação em Direito, fatores todos que fazem com que a rede brasileira esteja fortemente orientada em sua direção. O Gráfico 6 ilustra a rede em questão.

gráfico 6
– Rede dos programas de pós-graduação em Direito na região Sudeste do Brasil

A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito da região Sudeste apresenta 125 interações entre os programas, o que resulta em uma densidade de 8%, superior à média nacional, mas ainda um valor relativamente baixo.

Com efeito, esse valor de densidade, junto com a imagem, evidencia tratar-se de uma rede com alguns agentes centrais. Isto é, fora a PUC-SP e a USP, despontam centrais no quadro regional a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e as PUC-MG e PUC-RJ.

Diferentemente do que ocorre ao nível nacional, em que a PUC-SP aparece como a mais central e, assim, como a mais capaz de influenciar outros programas com a difusão de escolas de pensamento acaso existentes, na região Sudeste, essa centralidade se altera e a USP passa a ser a instituição com maior capacidade de divulgar sua escola de pensamento jurídico, se existente. Em termos concretos, esses índices de centralidade regional situam-se, para a USP, na casa dos 82,1%, e, para a PUC-SP, na casa dos 74,4%.

Essas instituições, tal como todas as demais,9 9 A UFMG, por exemplo, contabiliza um corpo docente de 54 professores, sendo que 40 deles doutoraram-se na própria instituição, o mesmo que vale para a UERJ (81 docentes; 39 doutorados na própria instituição). também se inscrevem na tendência geral de absorver como membros permanentes dos programas de pós-graduação stricto sensu em Direito seus antigos alunos de doutoramento. Por exemplo, dos 115 docentes da PUC-SP, 105 doutoraram-se na própria instituição, e dos 174 docentes da USP, 155 foram admitidos entre os seus antigos alunos.

Chama a atenção o fato de terem se doutorado na USP apenas seis dos 115 professores da PUC-SP e de terem se doutorado na PUC-SP apenas nove dos 174 professores da USP. Isto é, há pouca comunicação de professores entre as duas instituições.

No mais, a rede de pós-graduação stricto sensu em Direito do Sudeste também se mostra consideravelmente regionalizada, mas essa regionalização adquire outro significado, talvez mais próximo à estadualização, pois todos os estados da região contam com uma estrutura de pós-graduação stricto sensu bastante estruturada e prestigiada.

3.3 Região Sul

A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito da região Sul do Brasil é a segunda maior das redes regionais. Conta com 28 programas em funcionamento e 441 docentes, sendo que, desse conjunto, quatro programas (UNISINOS, UFSC, UFPR e PUC-RS) estão entre os cursos mais bem avaliados (nota 6) pela CAPES,10 10 São oito, no total, os programas de pós-graduação em Direito com esta avaliação. correspondendo a metade dos programas em Direito com esta nota. Com efeito, os três estados que compõem a região possuem pelo menos um destes programas, salvo o Rio Grande do Sul, que possui dois (UNISINOS e PUC-RS).

Quanto à distribuição dos programas na região, verifica-se ser o estado do Rio Grande do Sul aquele que concentra a maior quantidade (15 cursos), com Paraná e Santa Catarina contabilizando oito e cinco cursos, respectivamente. O Gráfico 7 ilustra a rede em questão.

gráfico 7
– Rede dos programas de pós-graduação em Direito na região Sul do Brasil

A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito da região Sul contabiliza 84 interações entre os programas, o que resulta em uma densidade de 11,1%, superior à média nacional e à média obtida para a região Sudeste.

Como evidencia o Gráfico 7, trata-se de uma rede de centralidade compartilhada. Isto é, dos 28 atores existentes, cinco deles ocupam posição de centralidade no interior da rede, sendo três deles situados no estado do Rio Grande do Sul. Em termos concretos, o rol dos programas mais centrais da região são: a) UFPR, com índice de 70,4%; b) UFSC, com índice de 59,3%; c) UNISINOS, com índice de 55,6%; d) UFRGS, com índice de 48,1%; e, por fim, e) PUC-RS, com índice de 40,7%.

Estas instituições também se inserem na tendência de absorver como membros permanentes dos programas de pós-graduação stricto sensu em Direito seus antigos alunos de doutoramento. No caso, por exemplo, da UFPR, dos seus 36 docentes permanentes, 21 se doutoraram na própria instituição, enquanto que, para a UFSC, este número é de 24 para um total de 34 professores.

No mais, e devido à grande oferta formativa existente na região, a rede de pós-graduação stricto sensu em Direito do sul do Brasil também se mostra, tal como apontamos para a região Sudeste, consideravelmente estadualizada, posto que todos os estados da região contam com uma estrutura de pós-graduação stricto sensu bastante estruturada e prestigiada.

3.4 Região Nordeste

A região Nordeste do Brasil possui a terceira maior rede de pós-graduação stricto sensu em Direito: encontra-se estruturada sobre 14 programas e 220 professores. Com efeito, diferentemente do que ocorre nas regiões Sul e Sudeste, dos nove estados do Nordeste brasileiro, apenas o Piauí não possui programa de pós-graduação stricto sensu em Direito. Por outro lado, quanto à distribuição dos programas, são os estados do Ceará e de Pernambuco os que concentram a maior quantidade de cursos, cada um com três. O Gráfico 8 retrata a rede em questão.

gráfico 8
– Rede dos programas de pós-graduação em Direito na região Nordeste do Brasil

A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito da região Nordeste contabiliza 22 interações entre os seus 14 programas, o que resulta em uma densidade de 12,1%, superior à média nacional e à média obtida pelas duas outras regiões já analisadas.

É possível verificar por meio do Gráfico 8 que se trata de uma rede com um único ator central: o programa de pós-graduação em Direito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), com índice de centralidade de 100%. Isto significa que os demais programas existentes na região possuem pelo menos um docente doutorado naquela instituição, de modo que a sua possibilidade de influenciar os demais a nível regional é máxima.

Também a UFPE se insere na tendência de absorver como membros permanentes dos programas de pós-graduação stricto sensu em Direito seus antigos alunos de doutoramento. No caso, dos seus 25 docentes permanentes, 20 se doutoraram na própria instituição. Esta não é uma tendência generalizada, pois há programas, tal como o da Universidade Federal da Bahia (UFBA), que apresentam taxa de absorção de professores entre ex-alunos muito baixa (apenas cinco dos 27 docentes do programa da UFBA doutoraram-se na própria instituição).

No mais, embora seja mediana a oferta formativa existente na região, trata-se de uma rede altamente regionalizada e centralizada em um único ator, diferentemente do que se passa nas outras regiões.

3.5 Região Centro-Oeste

A região Centro-Oeste representa a segunda menor rede regional de pós-graduação stricto sensu em Direito. Constitui-se sobre oito programas, 117 docentes e encontra-se distribuída ao longo dos quatro estados (Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul) que lhe compõem.

Com efeito, todos os estados da região possuem ao menos um curso de pós-graduação stricto sensu em Direito, e o Distrito Federal é aquele que concentra o maior número deles (cinco cursos), como também abriga o mais bem avaliado da região, o programa da UNB, com nota 6. O Gráfico 9 ilustra a rede em questão.

gráfico 9
– Rede dos programas de pós-graduação em Direito na região Centro-Oeste do Brasil

A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito da região Centro-Oeste contabiliza cinco interações entre os seus oito programas, o que resulta em uma densidade de apenas 8,9%, ligeiramente inferior aos índices obtidos paras as regiões Nordeste e Sul e ligeiramente superior ao índice obtido para a região Sudeste.

Do gráfico em questão, é possível desde logo extrair-se duas informações importantes. A primeira: os programas de pós-graduação stricto sensu em Direito mantidos pela UFMS e pela UFMT encontram-se desvinculados da rede regional. A segunda: é da UNB o programa mais central da rede: índice de centralidade de 71,4%.

Ora, conjugadas estas duas informações, é possível verificar-se que a centralidade do programa oferecido pela UNB limita-se apenas à região territorial abrangida pelo próprio Distrito Federal e pelo estado de Goiás, isto é, não configura o programa mais central da região Centro-Oeste, e, portanto, aquele teria maior possibilidade de influenciar os demais.

Para além disto, também não se pode dizer que a rede de pós-graduação stricto sensu em Direito da região Centro-Oeste é, tal como as anteriores, fortemente regionalizada, pois o corpo docente dos dois programas desvinculados da rede é composto majoritariamente por docentes doutorados por universidades do sul e sudeste do Brasil.

Por fim, nesta rede, a tendência de absorver como membros permanentes dos programas antigos alunos de doutoramento é menos acentuada – aliás, a maioria dos programas sequer possui ao menos um antigo discente entre os seus quadros (IDP, UDF, UniCEUB, UCB e UFMS).

3.6 Região Norte

A região Norte do Brasil representa a menor rede de pós-graduação stricto sensu em Direito. Embora sua área territorial abranja sete estados, apenas dois deles possuem cursos de pós-graduação stricto sensu em Direito: Pará e Amazonas. Trata-se, portanto, da região com menor oferta formativa a esse nível acadêmico. Com efeito, são apenas quatro os cursos de pós-graduação stricto sensu em Direito existentes na região. Dois são ofertados por instituições de ensino superior públicas (Universidade Federal do Pará – UFPA e Universidade do Estado do Amazonas – UEA), e os outros dois por instituições de ensino superior particulares (Universidade da Amazônia – UNAMA e Centro Universitário do Estado do Pará – CESUPA), o que torna ainda mais condicionada a educação pós-graduada em Direito. Veja-se o Gráfico 10.

gráfico 10
– Rede dos programas de pós-graduação em Direito na região Norte do Brasil

O estado do Pará é o que concentra a maior parte deles (UFPA, UNAMA e CESUPA) e o estado do Amazonas conta com apenas um (UEA). Também é do estado do Pará o programa mais central desta rede (UFPA, com índice de centralidade de 100%) cuja densidade situa-se em 25%. Trata-se, portanto, de uma rede altamente regionalizada.

Por fim, salvo o programa mantido pela UFPA, que dos seus 25 membros permanentes, nove foram absorvidos entre alunos doutorados na própria instituição, nenhuma das outras instituições possui como membro permanente ao menos um antigo aluno de doutoramento – o que se justifica por ser esta a única instituição com oferta formativa a este nível; as demais possuem apenas cursos de mestrado.

4 Discussão

Em recente artigo publicado sob o título “Quem influencia a pós-graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica”, Marcelo Varella (2015)VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
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toma como seu problema de investigação saber se existe, de fato, algum programa de pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil que exerça influência determinante sobre os demais – influência esta que denomina de “nucleação acadêmica”.

O autor considera haver dois indicadores principais para mensurar essa nucleação acadêmica de um programa sobre os demais. O primeiro, “é que seus egressos tornem-se professores em outros programas de mestrado e doutorado”. O segundo, “é a influência direta do conhecimento nela produzido na construção do saber em uma determinada área” (VARELLA, 2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
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, p. 112).

Sem embargo, e como havíamos indicado de modo breve na introdução, pensamos que o primeiro indicador – precisamente o indicador analisado por Marcelo Varella (2015)VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
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– não nos permite concluir acerca da influência ou não de um programa. Isto porque, pensamos nós, a real e verdadeira influência de um programa ou instituição somente pode ser verificada através do impacto que o conhecimento ali produzido gera na área e sobre as demais instituições. É dizer, influenciar o conhecimento de uma área significa, em linhas muito gerais, produzir conhecimento relevante acerca dos seus pressupostos, do seu objeto, dos seus postulados ou dos seus métodos induzindo uma certa maneira de pensar (participando de modo efetivo na construção do saber daquela determinada área), e isto só é possível mensurar verificando-se a adesão que a comunidade científica faz a uma concreta proposta teórica.

Em termos práticos, esta adesão pode ser apurada através de diversos indicadores, por exemplo, a partir do número de trabalhos publicados ou do número de citações dos estudos publicados acerca da proposta teórica em questão ou, também, por meio do número de grupos e centros de investigação dedicados ao seu estudo e aprofundamento etc.

Isto significa que somente é influente o programa ou instituição que consegue obter, quanto ao conhecimento produzido, a maior adesão da comunidade científica. Aquele que possui o maior número de egressos absorvidos como docentes de outros programas, ao contrário, nos parece ter maior possibilidade de influenciar os demais com a divulgação de escolas de pensamento, acaso existentes, e isto porquanto tornam-se estes egressos os seus maiores e diretos divulgadores.

Vale dizer, enquanto o critério “influência” se refere à adesão da comunidade científica a uma certa escola de pensamento, o critério “maior capacidade de influência”, ao contrário, remete à maior ou menor possibilidade desta específica escola de pensamento, caso exista, ser difundida dentro da rede – a eventual e significativa capacidade de influência de um determinado centro de pesquisa não o converte, diretamente, no mais influente, pois é preciso que antes tenha algo a divulgar.

Com efeito, também esta capacidade de influenciar de que tratamos no nosso estudo é possível de ser aferida por diversos indicadores – por exemplo, número de intercâmbios de investigadores e alunos, número de investigações realizadas em cooperação, número de eventos científicos realizados em parceria, participação em redes de pesquisa interinstitucionais etc. O indicador que, entretanto, decidimos utilizar foi, tal como na pesquisa de Marcelo Varella (2015)VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
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, o número de egressos de uma determinada instituição absorvidos como professores pelas demais, pois são estes egressos os maiores instrumentos de difusão de uma escola de pensamento no interior da rede se esta, de fato, existir. Tal indicador, portanto, não é definidor da influência de um programa, mas, em verdade, daquele que teria maiores possibilidades de influenciar os demais por meio de seus egressos e caso existente uma escola ou doutrina de pensamento a ser difundida.

E isto em virtude de não termos eleito como problema de investigação apenas a questão de saber qual é o programa de pós-graduação stricto sensu em Direito que tem a maior capacidade de influenciar o conhecimento jurídico no Brasil, mas, também, a questão de saber como se encontra estruturado o mapa desta rede.

Ora, iniciando a discussão dos dados a partir desta segunda questão importante, podemos constatar desde logo que se trata de uma rede em expansão rápida. Todavia, enquanto Marcelo Varella (2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
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, p. 113) baseou o seu estudo em 71 programas, “todos os programas de pós-graduação em Direito existentes em 2012”, nosso estudo encontra-se baseado num conjunto de 94 cursos, e isto apenas considerados os cursos com área de avaliação em Direito, pois fossem considerados os cursos interdisciplinares este número saltaria.11 11 Em pesquisa realizada no ano de 2014, Prado, Santos e Pereira Júnior (2015) basearam seu estudo num conjunto de 87 programas, ou seja, de 2014 a 2016 mais sete novos cursos de pós-graduação stricto sensu em Direito foram criados.

Vemos, portanto, uma evolução significativa, de pouco mais de 20 novos programas num período de apenas 4 anos. Para Roberto Fragale Filho e Alexandre Veronese, em pesquisa realizada no ano de 2004:

Sem dúvida, a expansão foi intensa e movida por dinâmicas específicas em relação aos cursos de mestrado e de doutorado. Nos primeiros, ela proporcionou uma forte concentração em instituições privadas [...]. Por sua vez, nos últimos, a expansão concentra-se em instituições públicas e confessionais, mais especificamente, nas universidades católicas (FRAGALE FILHO; VERONESE, 2004, p. 56).

Esta expansão, entretanto, não se deu de forma regular entre as diversas regiões do país. De 2012 até 2016, momento de realização desta investigação, quatro novos programas foram criados na região Nordeste e apenas um novo programa fora criado na região Norte do Brasil (o curso de mestrado em direitos fundamentais da UNAMA).

Aliás, vimos que se trata de uma rede estruturada de forma muito irregular e desigual ao longo do espaço, pois enquanto as regiões Sul e Sudeste do Brasil são as que apresentam a maior concentração de programas num menor número de estados, a região Norte foi a que apresentou a menor quantidade de programas no maior número de estados, dado também confirmado por Prado, Santos e Pereira Júnior em estudo semelhante realizado no ano de 2014 e publicado em 2015, utilizando como base os 87 programas existentes até então:

Os 87 programas estão distribuídos nas cinco regiões do país, mas há uma concentração nas regiões Sudeste e Sul. Na região Sudeste destaca-se o estado de São Paulo. Na região Sul, o estado do Rio Grande do Sul é o que apresenta o maior número. A região Nordeste aparece em terceiro lugar com 12 programas. A região Centro-Oeste possui sete programas e a Norte apenas quatro. Cabe observar que se somados todos os programas das regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste o número seria inferior à quantidade de programas da região Sul, mostrando o tamanho do desafio que se coloca para a expansão da pós-graduação em Direito nessas regiões e, consequentemente, para a formação do docente que atuará no ensino jurídico (PRADO, SANTOS; PEREIRA JÚNIOR, 2015, p. 448).

Isto se deve, entre outros fatores, ao fato de as regiões Sul e Sudeste do Brasil serem as mais populosas e as mais desenvolvidas do ponto de vista econômico, o que implica possuírem não apenas maior capacidade econômica para investir na pós-graduação em Direito como, também, deterem um “mercado consumidor” maior, mais consolidado e com possibilidades de esgotar a oferta formativa a este nível.

Mas também a própria CAPES dá sua contribuição para manutenção e alargamento desta desigualdade, e isto na medida em que, paradoxalmente, investe mais recursos nos cursos mais bem avaliados com vistas à sua consolidação nacional e expansão internacional (VARELLA, 2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
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, p. 113).

Ora, para que o Brasil venha, de fato, a constituir-se como um importante polo de produção científica em Direito é necessário não só que a CAPES altere seus critérios de investimento, passando a aplicar mais recursos nos cursos com condições mais precárias, como, também, o próprio Ministério da Educação passe a incentivar materialmente a expansão da pós-graduação stricto sensu em Direito nas regiões mais carentes de oferta formativa a esse nível.

Com efeito, a regionalização apontada como uma das marcas da pós-graduação em Direito do Brasil não é, neste sentido, em nada desvantajosa; ao contrário, é necessária e deve ser incentivada até o ponto de vir a estadualizar-se (VARELLA, 2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
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, p. 125), pois possibilita o acesso mais universal e abrangente à formação pós-graduada, relevando principalmente para quem não possui condições materiais de obter essa qualificação em outras regiões.

Sem embargo, vimos não só a expansão da rede de pós-graduação como também, ao contrário do que encontrou Marcelo Varella (2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/...
, p. 115), o incremento de docentes titulados em universidades estrangeiras. Indiscutivelmente, o intercâmbio científico é etapa determinante para a melhoria da qualificação dos programas de pós-graduação em Direito, mas pensamos que deva ser mais incentivado e buscado ao nível do Mercosul.

E isto não só pelo fato de o Brasil e seus vizinhos compartilharem de uma história e cultura semelhantes – fator de aproximação muito importante –, mas, sobretudo, porque enfrentam e lidam com problemas jurídicos quase sempre muitos parecidos, o que convoca a necessidade de se construir respostas jurídicas latino-americanas para os problemas jurídicos vividos e experimentados somente neste quadrante. A absorção de docentes com formação jurídica nestes países constitui, por isso mesmo, etapa fundamental deste processo.

A pós-graduação stricto sensu em Direito do Brasil não é só irregular, desigual e regionalizada, como é, também, endógena e orientada para o Sul/Sudeste do Brasil. A endogenia deve-se ao fato de ser uma tendência dos programas, sobretudo daqueles mais bem avaliados, admitir grande parte do seu corpo docente entre seus egressos (VARELLA, 2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/...
, p. 116). A orientação para o Sul/Sudeste, por sua vez, deve-se ao fato de terem sido os programas destas regiões aqueles que mais forneceram docentes para as demais instituições da rede.

Ora, estes dois dados conjugados lançam-nos para o nosso primeiro problema de investigação: quais são os programas que possuem maior capacidade de influenciar a pós-graduação stricto sensu em Direito do Brasil?

Como vimos, a PUC-SP encabeça a lista dos programas mais centrais da rede de pós-graduação em Direito do Brasil, mas na lista dos 20 cursos que mais forneceram docentes para outras instituições também aparecem os programas mantidos pelas USP, UFPR, UFSC, UFMG, UNISINOS, UFRGS, UERJ, PUC-RS etc.

A pergunta que então se põe é precisamente esta: por quais motivos são estes os programas mais centrais da rede? Isto é, o que os levou a serem os programas que produziram o maior número de docentes para pós-graduação no Brasil? Com efeito, não há como neste momento oferecer-se uma resposta conclusiva para tal questão. Mas é possível reconhecer alguns fatores intervenientes na configuração desta centralidade.

O primeiro deles é a antiguidade. Se olharmos para a lista veremos que a quase integralidade dos programas se encontra em funcionamento há pelo menos 15 anos, e em muitos casos há mais de 20 anos – dos cinco primeiros programas da lista, por exemplo, só o da UFPR ainda não completou duas décadas de funcionamento, pois os demais inclusivamente já a superaram.

Tendo em conta que a pós-graduação foi implantada tardiamente no Brasil, estes programas acabaram por ser os pioneiros e, consequentemente, os primeiros a começar a produzir mão de obra docente para os demais cursos de Direito do país, o que naturalmente os transformou em atores de grande centralidade nesta rede.

O segundo desses fatores é a sua boa avaliação. Como dissemos anteriormente, à exceção do programa mantido pela PUC-SP, as cinco posições subsequentes na lista de centralidade são ocupadas por programas avaliados em nota 6 pela CAPES.

A procura por esses programas mostra-se elevada não só em virtude de serem cursos de pós-graduação em Direito bastante tradicionais, mas, igualmente, por constituírem programas prestigiados e reconhecidamente qualificados tanto na função de pesquisa quanto na função de docência – para o que a CAPES também contribui, repita-se, ao conceder-lhes mais verbas para investimento (VARELLA, 2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/...
, p. 113).

Em suma, podemos perceber que a centralidade de um programa na rede de pós-graduação stricto sensu em Direito do Brasil, e assim a sua capacidade de influenciar outros programas, encontra-se intimamente vinculada com o seu tempo de permanência na rede com a avaliação recebida pelo órgão do Estado regulador.

Conclusão

A rede de pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil revelou-se irregular e desigualmente distribuída ao longo do país, pouco densa, e fortemente orientada para as regiões Sul e Sudeste do país, embora também bastante regionalizada. Nessas características podemos ver alguns dos fatores que constrangem a qualidade em geral da educação jurídica no país e que impedem a pós-graduação em Direito brasileira de ter uma posição mais central no contexto internacional.

Com efeito, não terá o Brasil uma posição de proeminência no cenário jurídico internacional enquanto algumas regiões do país permanecerem com uma oferta formativa pós-graduada muito pequena para uma área territorial muito extensa e com uma densidade populacional considerável, tal como acontece com a região Norte.

É necessário que a expansão pela qual vem passando a pós-graduação stricto sensu brasileira se distribua mais igualmente entre os estados e regiões, e aqui o papel do Estado e de suas instituições como a CAPES é muito importante, seja para conceder incentivos diretos para a criação de cursos, seja para regular a área. Como dissemos anteriormente, o incentivo à regionalização é uma saída possível para esse problema, embora também reconheçamos que o ideal seja mesmo o de que todos os estados possuam pelo menos um programa.

Sem embargo, também não terá o Brasil uma posição de maior destaque no contexto acadêmico internacional enquanto não houver um maior “intercâmbio” de talentos entre as instituições (VARELLA, 2015VARELLA, Marcelo. Quem influencia a pós-Graduação em Direito no Brasil? Uma análise empírica da nucleação acadêmica. Revista de Direito Brasileira, v. 12, p. 111-127, 2015. Disponível em: http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/213/240. Acesso em: 11 abr. 2016.
http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/...
, p. 126). Isto é, a densidade reduzida desta rede, somada à forte endogenia dos programas mais bem avaliados, revela que há pouca capacidade de difusão, em geral, de escolas de pensamento no âmbito da rede.

Ora, é indispensável, para que haja maior possibilidade de divulgação do conhecimento jurídico produzido no país, que os docentes oriundos de outros programas tenham maior entrada nos cursos de pós-graduação stricto sensu em Direito ofertados pelas instituições mais prestigiadas. A importância no cenário internacional perpassa incontornavelmente pela construção de uma sólida rede de distribuição de conhecimento nacional, e daí que programas altamente centrais como os da PUC-SP e da USP podem ter papel de grande relevância, ao passarem a admitir docentes produzidos por aqueles programas para os quais forneceram a maior parte do quadro de professores.

Referências

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  • 1
    Para mais detalhes sobre o tema, conferir: Almeida (2014ALMEIDA, Elizangela Santos de. A formação stricto sensu dos professores dos cursos de direito e seus reflexos no ensino jurídico. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de Uberaba – UNIUBE, Uberaba, 2014. Disponível em: http://www.uniube.br/propepe/ppg/educacao/arquivos/2014/listaDissertacoes/Dissertacao-Elizangela.pdf . Acesso em: 8 mai. 2016.
    http://www.uniube.br/propepe/ppg/educaca...
    , p. 42-45).
  • 2
    Podiam ser estas disciplinas: “Metodologia do Ensino Superior”, “Metodologia do Ensino Jurídico”, “Prática do Ensino Jurídico” e diversas outras nomenclaturas para matérias que envolvam ensino jurídico e pedagogia.
  • 3
    O número fecha em 91 por haver quatro Instituições de Ensino Superior que possuem disciplina pedagógica e estágio docente: UENP, UFJF, UNIJUÍ e UI.
  • 4
    A CAPES, mesmo tratando da formação de professores, acaba por destacar a formação de pesquisadores: “a) em todos os âmbitos da atividade própria da pós-graduação – pesquisa, orientação, ensino – reflete de maneira unitária, coerente, clara e fecunda o propósito precípuo da especialidade, a saber, formar bons pesquisadores” (CAPES, 2013, p. 7).
  • 5
    Isto gera dificuldade em conciliar a pesquisa de temas pontuais e locais, como questões indígenas e agrárias, com um modelo que prioriza a publicação e inserção internacional. Deste modo, o nosso modelo de produção se subordina ao que possui abertura nas revistas europeias e americanas em regra. A utilidade ao país, portanto, não é um critério suficientemente relevante.
  • 6
    Sítio eletrônico mantido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES (https://sucupira.capes.gov.br) onde encontram-se armazenadas e publicizadas informações gerais sobre todos os programas de pós-graduação existentes no Brasil, tais como dados cadastrais do curso, linhas de pesquisa, financiadores, proposta, discentes, docentes, participantes externos, projetos de pesquisa etc.
  • 7
    É preciso registrar que este não representa um número absolutamente exato, pois existem alguns docentes cadastrados como membros permanentes em dois ou três programas diferentes, tal como autoriza a Portaria n. 174, de 30 de dezembro de 2014 da CAPES. Estes casos, entretanto, são excepcionais e não chegam a produzir grande alteração no número final, razão pela qual diríamos ter uma margem de erro de 15 docentes nesta situação, para mais e para menos.
  • 8
    Embora não tenhamos apresentado nenhuma estatística acerca desta informação, durante o levantamento dos dados constatou-se que grande parte dos programas de pós-graduação stricto sensu contava como membro permanente com pelo menos um antigo aluno de doutoramento. Essa tendência se observou nos programas menores e com pior classificação, mas, principalmente, nos grandes programas e com melhor avaliação por parte da CAPES.
  • 9
    A UFMG, por exemplo, contabiliza um corpo docente de 54 professores, sendo que 40 deles doutoraram-se na própria instituição, o mesmo que vale para a UERJ (81 docentes; 39 doutorados na própria instituição).
  • 10
    São oito, no total, os programas de pós-graduação em Direito com esta avaliação.
  • 11
    Em pesquisa realizada no ano de 2014, Prado, Santos e Pereira Júnior (2015) basearam seu estudo num conjunto de 87 programas, ou seja, de 2014 a 2016 mais sete novos cursos de pós-graduação stricto sensu em Direito foram criados.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    13 Jul 2016
  • Aceito
    28 Set 2017
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